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¹Universidade Federal do Cariri UFCA [email protected] - Autoria ²Universidade Federal do Cariri UFCA [email protected] ³Universidade Federal do Cariri UFCA [email protected] MESA 1: Nuevas Cartografias de lós Feminismo Del Sur AGRICULTORAS FAMILIARES NA LIDERANÇA DE PROJETOS PRODUTIVOS: PERSPECTIVA DE SUSTENTABILIDADE NO ASSENTAMENTO SÃO JOÃO, ANTONINA DO NORTE, CEARÁ - BRASIL. Aíla Maria Alves Cordeiro Arrais¹ Suely Salgueiro Chacon² Adélia Alencar Brasil³ RESUMO A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), definiu 2014 como o Ano Internacional da Agricultura Familiar (AIAF), pela importância que ela desempenha na diversificação e balanceamento da alimentação, no uso sustentável dos recursos naturais, considerando todo o contexto mundial. No Brasil ela é responsável por 70% dos alimentos consumidos pela população. (ASA, 2014). Nesse cenário entra em evidência o papel da mulher agricultora assentada da reforma agrária, na construção da sustentabilidade agrícola familiar, demonstrando o seu potencial de liderança, traçando a convivência com o Semiárido, região de vulnerabilidade, ambiental, reforça assim, ser produtora de trabalho, de alimento, proteção ambiental e formadora de exemplo da alteridade como valor a ser cultivado pela família, articulando dimensões da sustentabilidade. Características presentes a partir de projetos desenvolvidos em quintais produtivos e plantio de goiaba, no Semiárido do nordeste brasileiro, especificamente no assentamento rural São João, Antonina do Norte Ceará, Brasil que é configurada essa realidade por mulheres trabalhadoras. Diante desse contexto tem-se como objetivo geral conhecer o papel das agricultoras familiares assentadas na realização de projetos produtivos motivados pelas políticas públicas rurais na construção da sustentabilidade. Visando atingi-lo foi aplicada como metodologia o estudo de caso, observação participante e entrevista semiestruturada.

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¹Universidade Federal do Cariri – UFCA [email protected] - Autoria

²Universidade Federal do Cariri – UFCA [email protected]

³Universidade Federal do Cariri – UFCA [email protected]

MESA 1: Nuevas Cartografias de lós Feminismo Del Sur

AGRICULTORAS FAMILIARES NA LIDERANÇA DE PROJETOS PRODUTIVOS:

PERSPECTIVA DE SUSTENTABILIDADE NO ASSENTAMENTO SÃO JOÃO,

ANTONINA DO NORTE, CEARÁ - BRASIL.

Aíla Maria Alves Cordeiro Arrais¹

Suely Salgueiro Chacon²

Adélia Alencar Brasil³

RESUMO

A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO),

definiu 2014 como o Ano Internacional da Agricultura Familiar (AIAF), pela

importância que ela desempenha na diversificação e balanceamento da alimentação, no

uso sustentável dos recursos naturais, considerando todo o contexto mundial. No Brasil

ela é responsável por 70% dos alimentos consumidos pela população. (ASA, 2014).

Nesse cenário entra em evidência o papel da mulher agricultora assentada da

reforma agrária, na construção da sustentabilidade agrícola familiar, demonstrando o

seu potencial de liderança, traçando a convivência com o Semiárido, região de

vulnerabilidade, ambiental, reforça assim, ser produtora de trabalho, de alimento,

proteção ambiental e formadora de exemplo da alteridade como valor a ser cultivado

pela família, articulando dimensões da sustentabilidade. Características presentes a

partir de projetos desenvolvidos em quintais produtivos e plantio de goiaba, no

Semiárido do nordeste brasileiro, especificamente no assentamento rural São João,

Antonina do Norte – Ceará, Brasil que é configurada essa realidade por mulheres

trabalhadoras.

Diante desse contexto tem-se como objetivo geral conhecer o papel das

agricultoras familiares assentadas na realização de projetos produtivos motivados pelas

políticas públicas rurais na construção da sustentabilidade. Visando atingi-lo foi

aplicada como metodologia o estudo de caso, observação participante e entrevista

semiestruturada.

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INTRUDUÇÃO

As mulheres, ao logo da história da sociedade, tem desempenhado um papel

fundamental no desenvolvimento da agricultura, principalmente como mantenedoras da

segurança alimentar e da boa qualidade de vida da família. Essa realidade nem sempre

foi reconhecida ou expressada no apoio ao potencial da agricultora familiar, somente

através de lutas sociais, em países como o Brasil, é que se tem mudança nesse processo

de valorização do trabalho feminino no campo.

No Semiárido do Nordeste brasileiro, onde as mulheres rurais sempre dedicaram

sua força de trabalho a subsistência familiar, sendo na dedicação ao plantio ou na

segurança hídrica, desafiada pela escassez da água, são grandes exemplos de como o

acesso a políticas públicas adequadas a sua região e as suas aptidões no trabalho com a

terra tem possibilitado o desenvolvimento de seus espaços de moradia e trabalho,

representado neste estudo de caso pelo assentamento São João, localizado no semiárido

brasileiro, no estado do Ceará. É resultante da reforma agrária mobilizada pelo

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, sob a responsabilidade do Instituto

Nacional de Colonização e Reforma Agrária, o INCRA.

No referido espaço são destacados projetos de iniciativa e liderança feminina,

onde alicerçadas por políticas públicas para o desenvolvimento da agricultura semiárida,

prosseguem produzindo e enfrentando as limitações apresentadas pelo paradoxo

apresentado na implantação dessas políticas. Contudo desempenham um papel de força

na perspectiva favorável a sustentabilidade da agricultura familiar local. Assim sendo,

busca-se conhecer o papel das agricultoras familiares na liderança de projetos

produtivos apoiados pelas políticas públicas para o desenvolvimento rural do Semiárido.

Convivência Sustentável com o Semiárido, o reconhecimento da agricultora

familiar.

O Semiárido brasileiro é uma sub-região do Nordeste Brasileiro, ela possuí

1.133 municípios de oito estados nacionais, abriga mais de 22 milhões de sertanejos e

sertanejas, 11,8% da população nacional, são 2 milhões de famílias agricultoras

(Ministério da Integração Nacional, 2010).

É influenciada pelo clima semiárido, justificado por uma combinação de

fatores, entre eles o relevo, funcionando como barreira para penetração de massas

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úmidas de origem oceânica e continental. Nas explicações de (AB’SABER 1999), as

terras rebaixadas entre chapadas, maciços antigos, serras, ou posições interplanálticas e

intermontanhosas são submetidas a temperaturas elevadas e precipitações médias anuais

variando de 400 a 600 e até 700 mm, onde há variação de 800 mm a 900 mm, são faixas

de terras influenciadas pelo clima semiárido moderado a subúmido, exemplo da sub-

região do agreste, situada entre zona da mata e sertão. A explicação para a intermitência

sazonal é a descompensação entre a precipitação (400 mm a 700 mm) na estação das

águas e a evaporação na estação seca (elevadas temperaturas 27° a 29°), diminuindo o

tempo de permanência da água.

A caatinga é a vegetação que abriga esse clima, com uma biodiversidade ainda

pouco estudada, ela tem significado cultural, revelada na etnia de seus primeiros

habitantes e também naturais, pela harmoniosa combinação dos elementos, e de espaço

para vivências pessoais, por acolher os sertanejos. Confirmação exaltada por (AB’

SÁBER, 2009, p.100), afirmando que “a identificação pioneira dos tupis, ao criar o

termo “caa- tinga” (mata branca) reflete uma observação integrada sobre a vegetação

esbranquiçada do longo período mais seco do ano, o calor excessivo que incide sobre

tudo e todos”.

É nesse contexto ambiental que a agricultura dessa região se apresenta, o

desafio de conviver a maior parte do ano com a escassez de água motiva para atitudes

coerentes a adaptação, tanto por parte das famílias agricultoras, bem como dos

fazedores de políticas, que durante décadas tratou a questão como uma política de

combate à seca, através de ações emergenciais, como distribuição de água em carros

pipas, distribuição de cestas básicas, frentes de serviço durante a seca, porém, a partir

dos anos 90, através dos agravantes da situação climática no mundo, e os efeitos

degradantes de um crescimento econômico desigual, motivou a proposta de um

desenvolvimento sustentável, principalmente em áreas vulneráveis do planeta.

O meio ambiente é inserido na agenda política internacional pelo “carro-chefe”

da sustentabilidade, conduzindo essa dimensão na estruturação da formulação e

implementação das políticas públicas na escala dos Estados nacionais, órgãos

multilaterais e caráter supranacional (VEIGA, 2012).

É sinalizado por (BOFF, 2012) que a sustentabilidade é uma adaptação às

necessidades de respeito aos recursos naturais com inteligência, vislumbrada pelo

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respeito às próprias necessidades de cuidado uns para com os outros, propondo a

construção da convivência ambiental, social e cultural.

É fundamental considerar as pessoas que vivem no Semiárido, principalmente

pelos planejadores, que trazem um pacote de ações prontas para serem implantadas. Os

planejadores são convidados a assumirem o desafio de conhecerem a realidade

ambiental, suas vulnerabilidades, decorrentes de ações ameaçadoras, como o

desmatamento da caatinga, principal fator das mudanças climáticas e processo de

desertificação ocorrente no Semiárido, que vai além do clima, vegetação, água e Sol. “É

povo, música, festa, arte, religião, política, história. É processo social. Não se pode

compreendê-lo de um ângulo só” (MALVEZZI, 2007, p.09). É assim um espaço

geográfico, articulador de relações, sendo elas responsáveis pela produção de seus

problemas e condições de alternativas estruturais para sustentabilidade da vida.

A agricultura semiárida resiste aos desafios ambientais e inadequações de

planos políticos, ela é significativa, pois no Estado do Ceará, lugar da pesquisa em foco

(Censo Agropecuário 2006), o último realizado no Brasil, indica a contribuição da

atividade com 12,8% de seu Produto Interno Bruto, PIB. Devendo-se a essa atividade

uma atenção, como forma de fomentar o trabalho que ainda resiste no campo,

oferecendo condição da agricultura familiar prosperar, pela viabilidade de adaptação ao

Semiárido.

As mulheres agricultoras do Nordeste, sempre desempenharam papel

fundamental no desenvolvimento da agricultura familiar, não só considerando suas

atividades domésticas de zelar pelos cuidados alimentares da família, de limpeza e

segurança hídrica, mas pelo trabalho com a terra, no seu cultivo, limpa, colheita,

armazenamento, cuidados com os animais (bovinos, ovinos, caprinos), ao conduzi-los

para o roçado bebedouros, curral , no preparo de garrafadas, ou seja, mistura de ervas e

temperos medicinais engarrafas para aplicar aos bichos, quando necessário ao

tratamento de alguma doença. Elas comercializam os produtos de sua criação como

artesanatos (marcas, bordados), os ovos das galinhas, os doces, hortaliças, queijos,

manteigas.

Vale salientar a segurança hídrica como sendo responsabilidade feminina, pois

foi culturalmente atribuída como uma extensão do trabalho doméstico É a busca pela

água em açudes, cacimbas, poços, lagoas, “[...] o lugar do encontro do feminino, de

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conversas intimas, da socialização de problemas, sonhos e desejos”. (MALVEZZI,

2007, p.14), á água é uma espécie de companhia, são conduzidas em latas d’água ou

baldes na cabeça, para quem ainda não tem disponibilidade de água em casa, encanada

de um açude ou barragem, fonte superficial de maior presença no Nordeste brasileiro,

ou de poço. Isso geralmente ocorre, na atual realidade, quando acaba a água das

cisternas de placa, do Programa P1MC, Programa um Milhão de Cisternas, do Governo

Federal em parceria com a ASA, Articulação no Semiárido, capaz de armazenar 16 mil

litros de água captada da chuva, com objetivo de saciar a sede.

A FAO declarou em 2011, no relatório “O Estado da Alimentação e a

Agricultura”, que as mulheres podiam alimentar mais de 150 milhões de pessoas, se

tivessem acesso igual à terra, crédito, educação. (ASA, 2014).

Na orientação de (SALES 2006, p. 89). Os assentamentos representam um

processo de luta, convivência e sociabilidade, por isso é um espaço de relações entre

famílias com a terra, legitimada não pelo decreto de desapropriação, mas pela interação

de seus valores sociais aos valores da terra.

Os assentamentos rurais são uma forma de as mulheres iniciarem o acesso a

terra, crédito e educação, num processo continuado de luta. Pela terra e na terra elas têm

a possibilidade de realizar suas capacidades de interação social e produtiva, ao receber

os incentivos adequados aos desejos e partilha do desenvolvimento pessoal e familiar.

A sustentabilidade é uma forma de viver e planejar o desenvolvimento, ela tem

sua origem após a Segunda Guerra Mundial, em 1960, quanto os riscos ambientais e

anunciação de escassez de recursos emergiu junto aos movimentos ambientalistas,

intensificando o debate, adquirindo três posturas: 1) catástrofe humana em decorrência

do colapso ambiental; 2) capacidade tecnológica de diminuir os impactos ambientais da

produção; 3) solidariedade entre as atuais e futuras gerações visando a garantia das suas

necessidades e preservação biológica (SILVA, 2010). Em seus estudos, o autor faz

referência a Ygnacy Sachs para indicar os avanços da sustentabilidade do

desenvolvimento no campo conceitual e político, não reduzindo a proposta ao vigor

econômico e exclusivamente ambiental, porém combinando multidimensões.

Para Roberto Marinho Alves da Silva as dimensões expressas por Ygnacy

Sachs se entrelaçam, por isso é formadora de postura para dialogar com a realidade do

Semiárido. A dimensão ambiental sugere uma relação de interação entre natureza e

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sociedade, numa territorialidade. A dimensão social é a própria inclusão de direitos à

cidadania no processo de desenvolvimento, possibilitando a liberdade de ser humano. A

sustentabilidade política implica na apropriação dos direitos, principalmente

participativos, proporcionando mudanças nas estruturas de gestões políticas e

econômicas excludentes. A cultura enquanto dimensão do desenvolvimento sustentável

considera a importância do resgate e construção de [...] “novas referências de

pensamentos (consciência) e do agir (comportamento) dos seres humanos” (SILVA,

2010, p. 187).

Pensar uma proposta significativa de desenvolvimento para o Semiárido é

valorizar uma alternativa sustentável, para além do imediatismo da emergência da falta

de chuva, realidade constante do clima semiárido, trata-se de mexer nas estruturas e

concepções dos planos políticos e visões sociais dos sertanejos sobre seu espaço

geográfico. É atuar em convivência com o Semiárido, ou seja, viver com, dar sentido de

interação à vida nesse ambiente.

Para (SILVA, 2010) a convivência apresenta-se em diferentes sentidos, mas

interdisciplinares: o ambiental, o econômico, o cultural, o da conquista política e a

convivência como qualidade de vida, este último merecendo aqui um destaque pela

força representada no sentido da convivência com o Semiárido, pois tem sentido de

inclusão, é o alicerce para a realização das alternativas econômicas e apropriadas a

convivência com a região Semiárida, já que representa a realização da plenitude do ser

humano, expressa pelo acesso aos direitos fundamentais à vida, a melhoria na qualidade

de vida das famílias sertanejas, estabelece um elo de relação para perspectivas de

sustentabilidade ambiental e socioeconômica.

O desenvolvimento com qualidade de vida para o Semiárido baseia-se no acesso

aos serviços básicos de saúde, educação, moradia, acesso digno à terra, ao trabalho, e na

proposta da convivência, mudanças nas relações de dominação ainda presentes, como

classe, de gênero e de gerações, pois para conviver é necessário respeito as diferenças,

principalmente relacionadas as mulheres sertanejas, excluídas de participação decisórias

e responsabilizadas pela educação e zelo hídrico e alimentar da família.

Ações governamentais e não governamentais inibidoras do combate à seca, mais

de incentivos a resistência das atividades econômicas agrícolas, vem demonstrando

caminhos para segurança alimentar e valorização do papel da mulher, bem como da

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agricultura familiar no Sertão, com experiências de canteiros produtivos, com plantio

nos quintais das casas, plantio irrigado, sistema de plantio em forma de mandala, uma

alternativa agroecológica, mistura plantas frutíferas, hortaliças orgânicas e a criação de

animais (peixe e aves).

As políticas de inclusão são fundamentais, bem como o despertar dos sujeitos

locais na reivindicação crítica e participativa de direitos à cidadania em todos os

espaços de atuação, nos familiares e institucionais.

Conforme estudos de Medeiros e Ribeiro (2003), a superação da desqualificação

da mulher não passa apenas pelo mercado ou por movimentos sociais, por sua vez, estes

reproduzem as relações de sociedade envolvente, para os autores, as mulheres precisam

investir em lutas específicas, microlocais, domésticas.

As mulheres demonstram essas lutas e conquistas através de sua determinação

pelo trabalho, no incentivo compartilhado entre elas, na ação de políticas públicas

adequadas ao potencial de participação feminina. Ao que se ver, são características

apropriadas por mulheres assentadas da reforma agrária, no assentamento São João, que

dão exemplo de liderança e determinação na sua luta pela qualidade de vida da família.

Atitudes femininas configurando projetos da agricultura familiar assentada

As mulheres que desenvolvem projetos na agricultura familiar do assentamento

São João, fazem parte de uma comunidade de 19 famílias, das três a serem referidas,

duas chefiam suas famílias, estão numa área de 1.021 hectares, deste total, 255,25

hectares, 25% , é destinada a área de reserva da fauna e flora do bioma caatinga.

Encontra-se localizado no município de Antonina do Norte, Ceará, sub-região do Cariri

Oeste, Sudoeste do estado, é resultante da reforma agrária com intervenção do Instituto

de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, os menos representativos nesse território,

explicação pautada na política de crédito rural, que incentiva o acesso à pequena

propriedade rural no Ceará, a partir dos anos 90, sem necessidade de organização dos

agricultores familiares em movimentos sociais, como o Movimento dos sem Terra,

MST, mecanismo social utilizado pelos agricultores e agricultoras no processo de

aquisição da terra. Constitui a primeira experiência registrada no referido município, de

área relativamente pequena, 260 Km².

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O referido assentamento, foi decretado em 2002, resulta de um território

ocupado pelo latifúndio pecuarista, uma estrutura agrária responsável pelo povoamento

do sertão cearense, teve seu apogeu, em decorrência da carta régia de 1701, impedindo a

criação de gado no litoral (JUCÁ, 1995) , como em toda a extensão do nordeste

brasileiro no período colonial. As mulheres a serem citadas acompanharam o processo

de luta, desde a lona, no período da ocupação, à concretização da desapropriação, de

forma direta no território disputado, ou indireta, acompanhando de longe, mas próxima

da situação pela relação de parentesco com os militantes do movimento, este caso sw

aplica a uma delas.

As lutas dos assentados permanecem, pela necessidade da qualidade de vida e

da convivência sustentável com o Semiárido, as políticas públicas para agricultura

familiar no Brasil, são recentes, elas são dos anos 90, e resultam de mobilização de

trabalhadoras e trabalhadores rurais organizados em movimentos sindicais unidos à

Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG) e ao

Departamento Nacional de Trabalhadores Rurais da Central Única dos Trabalhadores

(DNTR/CUT), expuseram suas reivindicações, as chamada “reconversão e estruturação

produtiva” dos agricultores familiares (SHEINAIDER; MATTEI;CAZELLA, 2004)

através da Jornada Nacional de Luta, mobilizada pelo Movimento dos Sem terra, CUT e

CONTAG, em 1994, a atual ação do Grito da Terra Brasil, realizando anualmente uma

jornada de reivindicação em Brasília e nos 26 Estados da federação. Foi através dessa

trajetória, que surgiu o Pronaf, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura

Familiar, Projetos estaduais, com linha de crédito para investimento, custeio e

financiamento, inovando, ao legitimar o reconhecimento da agricultura familiar como

uma atividade especifica, não generalizada.

Nesse contexto, surgem vários programas para incentivar a atividade da

agricultura familiar, destacando o papel da mulher como decisivo ao desenvolvimento

rural, através, por exemplo, do Pronaf mulher – O objetivo da linha de crédito de

investimento visa atendimento de propostas de crédito mulher agricultora, via projeto

técnico ou proposta simplificada. Mas elas podem assumir outros projetos

disponibilizados pelo governo, como são as experiências vividas por Dona Zuíla, Dona

Genesseuda e a jovem Eliete, assentadas da reforma agrária. Elas são destacadas por

representarem no assentamento, as únicas mulheres, identificadas em lócus, diretamente

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envolvidas em projetos produtivos, motivado por política pública para agricultura

familiar.

Os projetos dos quais elas fazem parte são O São José e quintais produtivos, as

duas primeiras estão integradas ao primeiro projeto, do governo cearense, elas plantam

goiaba e banana, sócias de um companheiro assentado, no plantio de goiaba, a cultura

da qual se dedicam, o objetivo do projeto é melhorar as condições de vida de famílias

carentes da zona rural cearense e elevar a qualidade de vida da população beneficiada.

Ele está sendo desenvolvido há cinco anos, no início eram vinte sócios, pelas

dificuldades de organização ficou reduzido a três pessoas. A área corresponde 2

hectares com algumas dificuldades, pois não tiveram acesso a todo o recurso financeiro

previsto pelo governo, dos R$ 60.000,00 previstos, receberam o valor de R$ 32.000,00

para aquisição de mudas e equipamentos para irrigação, mas contudo mantém o plantio

irrigado por microaspersão, com a água proveniente do açude do assentamento, as

despesas e lucros são compartilhados, a assistência técnica é inconstante, porém as

mulheres, junto ao parceiro empregam mão de obra familiar e garantem a contribuição

do resultado com o complemento da renda familiar, ao vender a goiaba em locais como

o assentamento, distrito vizinho e na sede de Antonina do Norte, situação

experimentada desde 2011, quando iniciou a primeira safra.

A produção regular, sem interferências na irrigação, seja por estiagem ou por

problemas mecânicos é seguida de três safras, com aproximadamente 1.500 kg de

goiaba colhidas, equivalendo um rendimento total estimado em R$ 3.000,00. Este ano

de 2014, foi colhido o fruto de uma safra, devido a problema mecânico da bomba,

dificultando o aguamento periódico do plantio.

Nessa sociedade, entre homem e mulheres observa-se que a mulher é formadora

de trabalho e não só ajudante. Reconhecidas como igualmente importantes nas suas

tarefas, pelo companheiro de trabalho, no enfrentamento das dificuldades e alternativas

próprias. Na colocação de (CHACON, 2006, p.217), para haver êxito em uma estratégia

de desenvolvimento rural, depende do saber fazer a mobilização, envolvimento dos

cidadãos, ações de atendimento das diferentes necessidades, baseadas nos princípios da

consideração da igualdade de gêneros e suas participações. Neste caso, o envolvimento

dos cidadãos dá continuidade a um projeto viável à agricultura familiar do Semiárido,

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onde as mulheres lideram não por ser maioria, mas pela participação nas decisões e

rumos do projeto produtivo, um elo de realização de parceria.

O Segundo projeto, dos quintais produtivos tem à frente a jovem Eliete como

responsável, o objetivo é motivar a produção agroecológica integrada e sustentável para

segurança alimentar desses territórios. O projeto é conhecido como PAIS, justificando

o objetivo, pertence ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

(MDA) em convênio com os governos estaduais, por meio de edital público, atua nos

Territórios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (Consad), constituídos

pelas regiões brasileiras com os Índices de Desenvolvimento Humano ( IDH) mais

inferiores. A família é beneficiada com um kit para iniciar a unidade de produção

(cisterna, encanamentos, sementes, mudas etc.) e ATER.

Segundo CARVALHO (2007, p. 233) a alternativa mais apropriada para o

desenvolvimento rural do Ceará é aquela condutora para convivência com o Semiárido.

Ressalta o autor as medidas voltadas para o “manejo adequado do solo, água e

vegetação”.

A referida agricultora aceitou o desafio de liderar a atividade e desempenhar seu

esforço a ele e declarou:

“Tirando os meus gastos, eu tinha os meus R$ 300,00 livre. Faz

um ano que eu fiquei assim. O esposo dizia: não você tá certa!

Quando ele via que sempre tinha o dinheirinho de comprar as

coisas, quando faltava o açúcar e o café, a gente sempre tinha.

Pode trazer que tá aqui o dinheiro. Ele dizia:” o negócio é

sério mesmo, é verdade”.

É possível perceber o resultado da atividade que se destina não só a produção,

mas a convivência com o ambiente, de forma sustentável durante o processo, bem como

o respeito as capacidades da agricultura familiar em administrar trabalho e recursos,

nota-se um entusiasmo pela autoestima e reconhecimento do parceiro, bem como a

autonomia econômica.

Para (Pinheiro apud Carneiro et al 2013) essa forma de plantio representa mais

do que uma condição econômica, mas “símbolo de identidade cultural”, pelo

pertencimento de relações com esse espaço da casa, pois ele é lugar de encontro,

descanso, festa,colheita, brincadeiras. Assim, do quintal de casa foi possível tirar

sustento e dar significado a um projeto para produzir alimentos saudáveis (hortaliças,

frutas e galinha), espaço de participação no convívio familiar, de pertencimento.

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Uma outra políticas pública que tem favorecido atividade desenvolvida pelas

mulheres do assentamento, no qual as duas primeiras estão envolvidas é o PAA –

Programa de Aquisição de Alimentos, do Governo Federal, através do Ministério do

Desenvolvimento Social, visa a inclusão social no campo por meio do fortalecimento

da agricultura familiar, pelo acesso a alimentos em quantidade e qualidade, adquirindo-

os para o consumo no mercado local, no caso destinado à merenda escolar do

município. Este é o ano de início das agriculturas no programa, com o fornecimento de

carne de ovino, estando previsto o rendimento anual, para cada qual em R$ 5.500,00.

A liderança das mulheres agricultoras nos citados projetos, sinalizam para

perspectiva de sustentabilidade no assentamento, a ambiental, pela inclusão de práticas

agroecológicas a partir quintais produtivos, racionando o uso da terra, evitando a

intensificação do desmatamento da caatinga, pode-se citar a criação de ovino caprinos,

animais adaptados ao Semiárido. A econômica, pelo acesso à terra, programas

governamentais para produzir, associado às tecnologias sociais de cisternas,

possibilitando o desenvolvimento de pequenos projetos de convivência com o

Semiárido e segurança alimentar e social, relacionado aos direitos de participação de

homens e mulheres, no respeito às diferenças para compartilhar da convivência.

METODOLOGIA

Com o intuito de compreender a importância das mulheres agricultoras

familiares para as atividades agrícolas no Semiárido, com o desenvolvimento de

projetos produtivos, priorizou-se como metodologia o estudo de caso, do assentamento

São João, onde foi realizada a observação participante das atividades das mulheres e a

entrevista semiestrutural.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A participação das mulheres, através de projetos incentivados pelo governo

brasileiro, tem dinamizado a agricultura familiar pela determinação das agricultoras em

enfrentar adversidades, construindo perspectivas de sustentabilidade no assentamento

São João tanto social pelo direito ao trabalho com a terra, reconhecendo a presença da

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mulher como formadora do trabalho familiar, pela sua autoconfiança e decisões no

sustento familiar, representa uma conquista na busca pela igualdade de direitos de

gênero. Traz uma perspectiva de sustentabilidade ambiental ao incluir práticas

agroecológicas a partir do plantio em quintais produtivos, variando a produção de

plantas e possibilitando o controle da água, sem uso de agrotóxico, racionando o uso da

terra, evitando a intensificação do desmatamento, bem como introduzindo culturas

frutífera, adequadas ao clima semiárido e controle da água por microaspersão e a

criação de ovinos, animais adaptados ao Semiárido e sustentabilidade econômica pela

viabilidade dos projetos governamentais ao acesso do alimento para a família e para

comercialização, motivando a manutenção da agricultura familiar.

BIBLIOGRAFIA

AB’ SÁBER, Aziz. Ecossistemas do Brasil. Ecosystems of Brazil. Metalivros. São

Paulo, 2009.p.100.

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