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  • 8/12/2019 Teatro Universitario

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    Departamento de Educao e Ensino a Distncia

    Mestrado em Arte e Educao

    Teatro Universitrio

    A experincia do TUT

    (Teatro da Universidade Tcnica de Lisboa)

    Jlio Martn da Fonseca

    Lisboa, 2012

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    I

    Mestrado em Arte e Educao

    Teatro UniversitrioA experincia do TUT

    (Teatro da Universidade Tcnica de Lisboa)

    Jlio Martn da Fonseca

    Dissertao apresentada para obteno de Grau de Mestre emArte e Educao

    Orientador: Professor Amlcar MartinsCoorientadora: Professora Eugnia Vasques

    Lisboa, 2012

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    II

    Resumo

    Este estudo de caso sobre o percurso de 30 anos do grupo de Teatro da Universidade

    Tcnica de Lisboa, pretendeu reflectir e avaliar o contributo que o teatro universitrio

    pode dar para o desenvolvimento pessoal, cultural, artstico e cientfico de docentes e

    discentes, permitindo uma melhor integrao dos aspectos racionais e emocionais e

    potenciando as capacidades de interaco e de comunicao dos universitrios, entre

    eles e com a sociedade em que vivemos.

    Palavras Chave

    Teatro Universitrio; Teatro; Desenvolvimento Pessoal; Desenvolvimento Cultural.

    Teatro Universitrio

    Actividade teatral, especificamente realizada no meio universitrio ou do ensino

    superior, a nvel da formao, da criao e da investigao terica ou prtica.

    Teatro

    Forma de arte dinmica, em que vemos homens e mulheres em aco o que fazem e

    porque o fazem e temos uma ntima percepo do mundo e da condio humana,

    vendo atravs dos olhos dos outros. uma forma de expresso humana, partilhada entrepblico e actores, que tem lugar no presente, mas que nos transporta para outros tempos

    e lugares.

    Desenvolvimento Pessoal

    Temtica que abarca os diversos conhecimentos, conceitos, recursos e tcnicas

    relacionados com o desenvolvimento do potencial humano, tais como:

    Autoconhecimento; Comunicao interpessoal; Relacionamento humano.

    Desenvolvimento Cultural

    Temtica que engloba reas do conhecimento, que se dedicam ao estudo e compreenso

    do comportamento humano e suas realizaes, nomeadamente atravs da literatura e das

    artes.

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    III

    Summary

    This case study about the course of 30 years of theatre group of the Technical

    University of Lisbon wanted to reflect and evaluate the contribution that the University

    Theatre can give to personal development, cultural, artistic and scientific teachers and

    learners, allowing a better integration of rational and emotional aspects and

    strengthening the capacities of interaction and communication between them and the

    society in which we live.

    Keywords

    University Theatre; Theatre; Personal Development; Cultural Development.

    University Theatre

    Theatrical activity specifically held at University or higher education, training, creation

    and theoretical research or practice.

    Theatre

    Dynamic art form, in which we see men and women in action what they do and why

    they do it and we have an intimate understanding of the world and the human

    condition, seeing through the eyes of others. Is a form of human expression, sharedbetween the public and stakeholders, which takes place at present, but that transports us

    to other times and places.

    Personal Development

    That covers the various thematic knowledge, concepts, features and techniques related

    to the development of human potential, such as: Self-knowledge; Interpersonal

    communication; Human relationship.

    Cultural Development

    Theme that covers areas of knowledge, who are dedicated to the study and

    understanding of human behavior and his accomplishments, in particular through the

    literature and the arts.

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    V

    ndice Geral

    Prembulo 2

    Introduo 3

    Primeiro Captulo 5

    1 Quadro terico-conceptual da investigao 5

    1.1 O Teatro Universitrio na Histria do Teatro 5

    1.2 O Teatro Universitrio e a sua projeo no mundo contemporneo 7

    1.3 O Teatro Universitrio em Portugal 8

    Segundo Captulo 13

    2 Consideraes iniciais 13

    2.1 Focos geradores e orientadores da investigao 13

    2.2 Questo orientadora da investigao 13

    2.3 Questes de investigao 14

    2.4 Objetivos da investigao 14

    2.5 Contexto da Aco: Caracterizao do TUT 14

    2.6 Metodologia emprica da investigao 15

    2.7 Procedimentos metodolgicos 16

    2.8 Tcnicas de investigao 17

    2.8.1 Observao participante 17

    2.8.2 Entrevistas em profundidade 17

    2.8.3 Entrevistas de grupo 17

    2.8.4 Documentos do Teatro da Universidade Tcnica 18

    2.8.5 Documentos pessoais 18

    2.8.6 Imagens: vdeos e fotografias 18

    Terceiro Captulo 19

    3 A Cultura e o Teatro na Universidade Tcnica de Lisboa 19

    3.1 A Universidade Tcnica de Lisboa 19

    3.2 A Cultura na Universidade Tcnica 19

    3.2.1 A Dana e o Teatro 20

    3.3 Os Grupos de Teatro da UTL 20

    3.3.1 GTISTGrupo de Teatro do IST 21

    3.3.2 O RastilhoGrupo de Artes Representativas da FA 233.3.3 KULAISEG 24

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    VI

    3.3.4 TEAGROISA 24

    3.3.5 Grupo de Teatro do ISCSP 26

    3.4 Ciclo de Teatro da UTL no Teatro da Trindade 27

    Quarto Captulo 29

    4 A experincia do TUT ao longo de 30 anos 29

    4.1 Apresentao do grupo de estudo - TUT 29

    4.2 Listagem de espetculos19822012 31

    4.2.1 O incio: 1981-1982 33

    4.2.2 Perodo de 19831988 37

    4.2.3 Perodo de 19891999 88

    4.2.4 Perodo de 20002008 102

    4.2.5 Perodo de 20092012 126

    Concluses 140

    Referncias bibliogrficas 143

    Webgrafia 145

    Blografia 145

    Apndices 146

    Apndice 1Historial do TUT 147

    Apndice 2Textos e Autores (apresentados por fases) 153

    Apndice 3Listagem de Colaboradores do TUT 155

    Apndice 4Entrevista a Jorge Listopad 157

    Apndice 5Entrevista ao Professor Doutor Arantes e Oliveira 176

    Apndice 5Entrevista de Grupo 179

    Apndice 7Texto no Boletim do TUT do Professor Dr. J. Lopes da Silva 188

    Apndice 8 - Texto no Boletim do TUT do Professor Dr. Arantes e Oliveira 190

    Apndice 9 - Texto no Boletim do TUT de Jorge Listopad 193

    Apndice 10 - Quando o Teatro Liberdade 194

    Apndice 11 - Boletim do TUT 195

    Anexos (em CD) 196

    Anexo 1Fotografias de espetculos 196

    Anexo 2Programas e Cartazes 196

    Anexo 3Crticas e Notcias 196

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    O que podia ter sido uma abstr ao

    ()

    O tempo passado e o tempo futuro

    O que podia ter sido e o que foi

    Tendem para um s fim, que sempre presente.

    T. S. Ell iot in Quatro Quartetos

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    Prembulo

    Esta investigao foi uma oportunidade, para reconstruir e refletir sobre o

    percurso de um grupo de teatro universitrio, desde 1981, data do seu incio, at este

    momento, ano de 2012, coincidindo justamente com o fim do ano lectivo, e aps a

    apresentao do espetculo mais recente.

    O material recolhido foi abundante, uma vez que esteve disperso ao longo dos

    anos, pois no havia nenhum espao prprio para o conservar.

    Esta investigao que comeou por ser um estudo de caso sobre o Teatro da

    Universidade Tcnica, acabou por adquirir tambm, contornos de uma investigao-

    ao, pois foi necessrio intervir em prol da sua salvaguarda, preservao e

    continuidade, mediante a sensibilizao para que fosse disponibilizado um espao

    prprio, a urgncia em criar uma associao que lhe desse existncia jurdica e a

    prossecuo normal das atividades do grupo em termos de formao complementar,

    cultural e artstica, que consolidasse o TUT na UTL.

    Aps aanlise dos dados selecionados, constitudos por Programas, Fotografias,

    Notcias, Crticas, Dirios de Bordo, anotaes e outros materiais, foi possvel delinear

    uma trajetria que revelou um percurso de significado no desenvolvimento das pessoas

    que fizeram parte desta experincia teatral.

    Sendo uma investigao, que merece ser aprofundada, pelos novos territrios

    que se abrem ao teatro universitrio, no futuro multicultural e multidisciplinar das

    prprias universidades e da sociedade em geral, esta apenas uma primeira abordagem,

    que reconhece, no entanto, a existncia em liberdade, de espaos prprios para o Teatro

    Universitrio.

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    INTRODUO

    O Teatro no Ocidente, desenvolve-se luz da cidade e anuncia a livre reflexo

    sobre o mundo e a existncia humana. Num nico verso, a humanidade pode ver-se e

    ouvir-se. Atravs da Comdia e da Tragdia, ri e chora, ama e odeia, empolga-se e

    aterroriza-se. Parece assim criar instrumentos para compreender e aceitar a trgica e

    paradoxal condio humana.

    O teatro, enquanto espao de interpelao, de descoberta e de dilogo, modelou

    de certa forma a ideia de Universidade. Esta Instituio milenar e local de reunio dos

    vrios saberes, integrou desde as suas origens a inveno teatral, auxiliar de um mtodopedaggico de ensino e aprendizagem, servindo-se entre outras, das potencialidades da

    exposio pblica, da argumentao, do dilogo dramatizado, para fazer passar o

    conhecimento e a aquisio de competncias.

    Hoje, em que o teatro e a universidade se continuam a entrecruzar, torna-se

    contudo importante diferenciar o que so os estudos de teatro na universidade (com os

    seus objetivos de formar profissionais que investiguem, divulguem e ensinem o

    fenmeno teatral e que produzam espetculos) e o que ou deve ser, a funo do teatrouniversitrio enquanto atividade extracurricular, de desenvolvimento pessoal, relacional,

    cultural e artstico. Os estudos de teatro na universidade e o teatro universitrio,

    prosseguindo propsitos diferentes podem no entanto, e sem dvida alguma, iluminar-se

    mutuamente.

    importante reconhecer que uma prtica teatral universitria, constituda como

    um Laboratrio, realiza uma transversalidade de saberes e de mbitos (como a arte, a

    educao, a comunicao e a cincia) e que instala um espao de liberdade, deintimidade e de experimentao de si prprio, com os outros e com o mundo

    circundante.

    Tendo isto em conta, pretendemos refletir e avaliar, atravs de um estudo de

    casoo Teatro da Universidade Tcnica - o contributo que o teatro universitrio pode

    dar para o desenvolvimento pessoal, cultural, artstico e cientfico de docentes, discentes

    e a comunidade em geral, permitindo uma melhor integrao dos aspetos racionais e

    emocionais e potenciando as capacidades de interao e de comunicao dos

    universitrios, entre eles e com a sociedade em que vivemos.

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    No Primeiro Captulo, refere-se o enquadramento terico sobre o Teatro

    Universitrio, a sua relao com a Histria do Teatro e a sua atualidade e projeo no

    mundo e em Portugal.

    No Segundo Captulo, apresenta-se a metodologia utilizada para o trabalho de

    investigao. Identificam-se as questes de investigao e definem-se os objetivos.

    Desta forma, contextualiza-se o objeto fundamental da investigao.

    O Terceiro Captulo, enuncia a vivncia cultural, particularmente no mbito do

    teatro, no seio da Universidade Tcnica de Lisboa.

    No Quarto Captulo, descreve-se e analisa-se a atividade do Teatro da

    Universidade Tcnica/TUT ao longo dos seus 30 anos de existncia.

    Nas concluses so expostas as consideraes e reflexes que respondem

    essencialmente questo orientadora e aos objetivos propostos.

    Para a fundamentao terica do trabalho recorreu-se s Referncias

    Bibliogrficas e recolha de documentos do grupo e pessoais, que se encontram nos

    Apndices e nos Anexos.

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    Primeiro Captulo

    1 Quadro terico-conceptual da investigao

    1.1 O Teatro Universitrio na Histria do Teatro

    As Histrias do Teatro do conta de uma convivncia permanente e estreito

    contacto entre a Universidade e a atividade teatral. No entanto, de um modo geral,

    apenas a aparecem breves referncias ao teatro estudado e apresentado pelos estudantes

    nas universidades europeias. Parece pois haver um dfice de reflexo sobre a atividade

    especfica do teatro universitrio ao longo do tempo, e que sabemos ter sido importante

    na vida escolar.

    Desde o alvor das primeiras Universidades na Idade Mdia que era costume

    terem lugar representaes dramticas, quer como diverso, quer como exerccio

    pedaggico. Na primeira metade do sculo XVI, as Universidades eram polos de cultura

    clssica, onde se estudavam os mais admirveis modelos da antiguidade, como

    Terncio, Sneca e Plauto. disso exemplo, o Teatro Humanstico do sculo XVI

    realizado pelos estudantes nas universidades, como no caso de Coimbra e vora em

    Portugal. Foi no ambiente universitrio que foram criadas obras que viriam mais tarde a

    fazer parte do repertrio teatral europeu. sombra da Universidade de Salamanca foi

    criada a Celestina de Fernando Rojas, e em Coimbra a ComediaEufrosina de Jorge

    Ferreira de Vasconcelos, no sendo difcil de aferir que Las aulas de la universidade

    renacentista respiraban, pues, un ambiente teatral (Menndez Pelez, 2003:584).

    Esta tradio do teatro na vivncia universitria, nomeadamente atravs da

    representao de peas teatrais pelos estudantes, teve continuidade e desenvolveu-se dediferentes formas, como o drama escolar protestante que foi muito estimulado e apoiado

    pela Reforma nos pases do norte da Europa, assim como o teatro escolar jesutico, o

    Teatro Novilatino dos sculos XVI, XVII e XVIII.

    Mas somente no sculo XIX comeamos a ter notcias da constituio de grupos

    de teatro exclusivamente universitrios. Por exemplo,na Gr-Bretanha foi formada em

    1855 a Cambridge Universitys Amateur Dramatic Company e em 1885 a Oxford

    University Dramatic Society. No sculo XX e no outro lado do Atlntico, aUniversidade de Harvard, nos Estados Unidos da Amrica, criou em 1912 um curso de

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    escrita dramtica, e destes cursos, segundo P. Mignom, saram jovens dramaturgos

    como Eugne ONeillque comearam por ser representados nas universidades.

    NaThe Oxford Illustrated History of TheatreJ. Brown assinala que uma srie de

    grupos de teatro emergiram nos anos 60 nas universidades americanas, como o caso do

    Yale Repertory Theatre e, na The Cambridge Guide to Theatre, Martin Banham refere

    que no incio da dcada de 90, do sculo XX, cerca de 92,2 % das universidades

    americanas desenvolveram atividades teatrais, tendo-se realizado cerca de 30.000

    produes, que correspondem a 150.000 representaes para 45 milhes de

    espectadores.

    Mais perto de ns, em Espanha, de salientar o grupo de teatro universitrio La

    Barraca dirigido pelo poeta e dramaturgo Federico Garcia Lorca, que fez teatro

    itinerante pela Espanha Republicana, representando os clssicos da dramaturgia

    espanhola. Tambm J. Calvo relembra, que nos anos sessenta do sculo XX muitos

    encenadores, atores e dramaturgos vieram do teatro universitrio, como por exemplo

    Jos Sanchis Sinisterra. Na Historia del Teatro Espaol. Siglo XX, num captulo

    dedicado ao chamado Teatro Independente, aparece uma referncia ao Teatro

    Universitrio de Murcia, que existe desde 1955, mas que se inscreveu no panorama

    teatral em 1967 sob a direo de Csar Oliva e que se considera ser um caso

    representativo do teatro universitrio espanhol por la coherencia y continuidad de su

    trayectoria, por la calidad y la vocacin experimentalista de sus espectculos, por el

    rigor y seriedad de su trabajo y por su trascendencia nacional (Ramn, 2001:479).

    Luciano Garcia Lorenzo, em Aproximacin Al Teatro Espaol Universitario

    (TEU) de 1999, publica uma compilao de textos de encenadores, dramaturgos e

    estudiosos de teatro, mostrando os percursos do Teatro Universitrio em Espanha, numa

    monografia que abarca os anos de 1940 at 1970 do sculo XX. Esta panormica sobre

    a prtica teatral universitria , segundo Garcia Lorenzo, uma contribuio relevantepara o estudo do teatro em geral, dada a importncia deste teatro na vida teatral

    espanhola.

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    1.2 O Teatro Universitrio e a sua projeo no mundo contemporneo

    As notcias da participao em Festivais de Teatro Universitrio portugueses, de

    inmeros grupos de diferentes pases, assim como a deslocao de grupos nacionais um

    pouco por todo o mundo, comprovam por si s a dinmica internacional da atividade

    teatral universitria.

    Um dos lugares privilegiados onde se pode encontrar informao especfica a

    nvel global a Associao Internacional de Teatro Universitrio - AITU/IUTA.

    Fundada na Universidade de Lige, em 1994, a AITU tem como objetivo o

    desenvolvimento e a promoo por todo o mundo, da formao teatral, da criao e da

    investigao terica e prtica ao nvel dos estudos superiores ou universitrios, eest

    presente em todos os continentes, contando com membros em mais de cinquenta pases,

    incluindo o Teatro da Universidade Tcnica - TUT.

    Esta associao internacional pretende ser um frum privilegiado onde

    professores, profissionais, criadores e tericos podem comunicar e partilhar as suas

    investigaes e incertezas. Proporciona tambm um espao para o intercmbio e a

    colaborao entre os grupos de teatro universitrio, incrementando o dilogo e a

    compreenso entre culturas, atravs inclusivamente da presena dos responsveis de

    festivais, estando acessvel a toda a comunidade acadmica interessada no teatro.

    ainda de assinalar que a AITU organiza um congresso bianual, tendo sido j

    realizados na Blgica (1994),Canad (1997),Senegal (1999), Polnia (2001), Grcia

    (2003), Itlia (2006),Mxico (2008), Reino Unido (2010) e o prximo ser este ano, em

    2012, em Minsk, na Bielorrssia. Tm sido abordados temas to diversos como: a

    afirmao da especificidade do teatro na universidade; as relaes do teatro

    universitrio com o teatro profissional e o teatro no profissional; as relaes do teatro

    universitrio com os organismos oficiais; os repertrios e o pblico; as prticas e asinvestigaes no teatro universitrio; o desenvolvimento e a cooperao entre os grupos

    de teatro universitrios; a estruturao dos intercmbios entre os diferentes membros e o

    estabelecimento de comunicaes regulares entre todos, de forma a constituir uma rede

    mundial do teatro universitrio.

    A participao em associaes internacionais deste tipo revela-se da maior

    importncia, no sentido de alargar, enriquecer e aprofundar, a reflexo acerca de

    questes gerais e especficas relativas ao teatro universitrio, assim como aoestabelecimento de colaboraes e parcerias.

    http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/401http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/402http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/403http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/404http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/404http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/394http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/395http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/396http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/396http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/395http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/394http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/404http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/404http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/404http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/403http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/402http://aitu-iuta.org/index.php/public/esp/congresses/401
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    1.3 O Teatro Universitrio em Portugal

    J foi referido que em Portugal no sculo XVI, se apresentava teatro nas

    Universidades de Coimbra e vora e que, estas representaes feitas pelos estudantes

    universitrios envolviam grande pompa e solenidade. S de Miranda, Jorge Ferreira de

    Vasconcelos e Antnio Ferreira oferecem-nos exemplos de um teatro clssico

    representado, segundo se pode inferir quer pelos para-textos (dedicatrias nas obras),

    quer mesmo por documentao dispersa.

    Em Tras a nevoa vem o sol - As comdias de Jorge Ferreira de Vasconcelos,

    uma dissertao de Doutoramento de 2009, Silvina Pereira no captulo Teoria e prtica

    do teatro europeu e portugus no sculo XVI referindo-se quanto s prticas teatrais

    em Portugal no sculo XVI no que concerne ao teatro escolar e humanstico em

    Coimbra e vora, d conta no contexto portugus, dos autores, do repertrio

    representado e de locais de representao, podendo-se concluir quanto a si que No

    temos um trabalho aprofundado sobre o teatro nas Universidades em Portugal e, por

    isso, as notcias sobre as representaes teatrais no sculo XVI so muito incompletas

    (Pereira:2009) pelo que, h que estudar esta poca sem ideias preconcebidas, mas

    fundamentalmente a partir de documentao.

    Tambm sabido que, toda essa atividade teatral decorria da obrigao inscrita

    dos Estatutos das Universidades de promoverem representaes que envolviam lentes e

    alunos, um hbito intimamente relacionado com a vida acadmica. Deste modo, se

    praticavam matrias humansticas como o Latim e a Retrica, e se aplicavam processos

    de aprendizagem assentes em tcnicas de memorizao.

    A tradio das representaes dramticas continuou mas, com o triunfo da

    Contra-Reforma, esta estimulante atividade artstica, rapidamente viria no nosso pas aser substitudo pelo denominado teatro jesutico, um teatro de cariz religioso, cujo

    expoente maior foi o Padre Lus da Cruz e assim, segundo o epitfio de Luiz Francisco

    Rebello A Universidade de Coimbra, que foi o bero do teatro clssico, seria tambm o

    seu tmulo (Rebello, 2000:60). 1

    1

    Claude-Henri Frches que estudou o teatro escolar em Le Theatre Neo-Latim au Portugal (1550-1745),lamenta que o pouco que se sabe decorra do texto e muito pouco sobre os acontecimentos reais e aspessoas envolvidas.

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    Temos testemunhos avulsos de alguns escritores portugueses como, por

    exemplo, Almeida Garrett ou Fialho de Almeida, que tendo realizado os seus estudos

    em Coimbra, contam como participaram na vida acadmica atravs das representaes

    teatrais, ou Ea de Queirs que, enquanto estudante de Direito em Coimbra, fez parte do

    grupo acadmico de teatro, especializando-se em personagens de pai nobre, tendo

    chegado, segundo o prprio, a ponderar enveredar pela vida do teatro. Ou seja, a

    atividade teatral, parece ter sido nuclear na formao dos estudantes mas, segundo a

    viso sarcstica de Fialho de Almeida, Em Coimbra Rcitas de Estudantes, em 1903,

    tais espetculos no mereceram traslado nos arquivos, onde a vida dos acadmicos no

    consta alm do registo da matrcula, e algumas notas de ano, estenografadas em lngua

    seca e burocrtica (Almeida, 1960:1). Ou seja, esta uma histria que est ainda por

    fazer.

    Antnio Pedro em Escritos sobre Teatro, de meados do sculo passado, dedica

    nessa obra, um pargrafo de reflexo sobre o teatro universitrio. Diz-nos ele, que:

    H, ao que suponho, duas espcies possveis de teatro universitrio: oque deveria funcionar como aula prtica duma cadeira de Histria do Teatro e oque poderia servir de laboratrio experimental para uma cadeira de Esttica. Sdentro destas duas categorias o teatro acadmico , de facto, universitrio.Prevejo ainda () a hiptese dum teatro acadmico no universitrio, isto ,ligado vida social dos estudantes, embora desligado da sua vida escolar.(Pedro, 2001: 294).

    Esta reflexo, clarifica o que deveriam ser as prticas dos estudos superiores de

    teatro e o que deve ser o teatro universitrio ou, segundo o autor, o teatro acadmico

    feito pelos estudantes. O escritor e dramaturgo Jorge de Sena, pe o enfoque num plano

    diferente e pertinente, tendo formulado todo um programa de liberdade que se abre para

    a descoberta, experimentao e afirmao da cultura na vida pessoal e social:

    "Cabe, pois, a um teatro universitrio dar o tom das ressurreiesculturais, segundo os ventos mais actualizados da cultura; cabe-lhe, tambm,impor, com a sua autoridade, autores novos, julgando representativos, cujaspeas podem at no ser, para ns, obras-primas, desde que essas peas pareamsignificativas de tendncias artsticas que, no teatro e pelo teatro, urgeesclarecer. Tudo isto o teatro universitrio pode fazer, com outros resultadostericos e prticos que o teatro de amadores no atingir nunca - porque o teatrode amadores abre-se da cultura para a vida, e um teatro universitrio abre-se davida para a cultura" (Sena, 1988: 292).

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    neste sentido que, ao longo do sculo XX, alguns grupos de teatro

    universitrio foram surgindo em diversas cidades do pas. Dos mais antigos e

    paradigmticos destacam-se desde logo, o TEUC/Teatro dos Estudantes da

    Universidade de Coimbra, que iniciou a atividade no ano de 1938 sob a direo artstica

    do Professor Paulo Quintela; o CITAC/Crculo de Iniciao Teatral da Academia de

    Coimbra; o TUP/Teatro Universitrio do Porto, fundado em 1948 por um grupo de

    estudantes; o Cnico de Direito, criado no ano de 1954 e que foi o primeiro grupo de

    teatro universitrio de Lisboa, ou o GTL/Grupo de Teatro de Letras, da Universidade de

    Lisboa, fundado em 1965 e que desempenhou um papel marcante no teatro e no meio

    universitrio durante a crise acadmica de 1969, contando nesse perodo com a

    participao de Lus Miguel Cintra, Jorge Silva Melo e Eduarda Dionsio que se

    estrearam no grupo e, a partir dele, fundaram o Teatro da Cornucpia.

    Em 2009, Jos Oliveira Barata, intimamente ligado ao teatro universitrio, como

    ator e encenador, oferece-nos em Mscaras da Utopia, uma Histria do Teatro

    Universitrio em Portugal entre os anos de 1938 e 1974 . Nas suas concluses enuncia

    que, numa primeira fase, foi possvel constatar que o surgimento do teatro universitrio

    vem dar resposta, por um lado, aos anseios de professores e alunos que compreendem

    que o modelo monolgico do ensino universitrio est esgotado promovendo esta

    atividade como projecto de complementaridade culturale, por outro, numa tentativa

    de melhor compreender o fenmeno teatral procurar descobrir as virtualidades do texto

    dramtico para alm do apertado espao da sala de aula, concluindo que O

    aparecimento do teatro universitrio surge assim, numa primeira fase, como

    necessidade superadora face s limitaes de duas instituies: a literria e a

    universitria. (Barata, 2009: 336).

    Num segundo momento do seu estudo, e dando resposta s necessidades sentidas

    pelos grupos em termos de formao, informao e experimentao Oliveira Barataquestiona a natureza e a funo do teatro universitrio, como sendo distinta da do teatro

    profissional. Para este investigador, nos teatros universitrios, apesar de genericamente

    estarem condicionados na sua continuidade pelos microciclos geracionais (Barata,

    2009:339) houve seguramente, quanto a si, um vector estruturante na estabilidade dos

    grupos que os salvaguardou do regime poltico e social vigente, assim como de

    qualquer lgica de mercado ou de subordinao a gostos estabelecidos (Barata, 2009:

    337) e que lhes permitiu proceder divulgao de repertrios esquecidos,

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    marginalizados ou tidos como exclusiva propriedade de eruditos (Barata, 2009: 337).

    Esse vector foi a independncia(Barata, 2009: 339).

    O trabalho de Jos Oliveira Barata traz para os estudos de teatro uma reflexo h

    muito necessria, mas o seu mbito de investigao termina no ano de 1974, ou seja,

    ficam de fora as quase quatro dcadas mais recentes de Teatro Universitrio, um

    perodo em que a sociedade portuguesa entrou numa era de liberdades cvicas, e uma

    mudana de sculo que nos introduziu num tempo de constantes mudanas e do

    surgimento de mltiplos desafios de acordo com os novos tempos.

    Lembremos que, por exemplo, na Breve Histria do Teatro Portugus, no

    captulo sobre O Teatro depois de 25 de Abril, de Luiz Francisco Rebello, apenas se

    encontra uma breve referncia participao de grupos de teatro universitrio nas

    campanhas de dinamizao cultural, o que diz muito sobre a necessidade de que esta

    vertente especfica se constitua como rea de investigao no nosso pas.

    Outros aspetos h, para alm da atividade teatral desenvolvida por cada grupo,

    que muito tm contribudo para o lanamento e desenvolvimento do teatro universitrio,

    e que merecem toda a ateno, pois so a expresso da fortuna do mesmo, refiro-me,

    por exemplo, realizao de Festivais e publicao de Revistas.

    Momentos de especial relevncia e de conhecimento mtuo, entre as vrias

    experincias teatrais universitrias nacionais e tambm estrangeiras, foram e so os

    proporcionados pelos Festivais de Teatro Universitrio. Entre os vrios, realizados ao

    longo dos anos e promovidos por diversas instituies de ensino superior do pas, so de

    destacar pelas suas repercusses alargadas a toda a comunidade local e nacional, a

    BUC/Bienal Universitria de Coimbra, que floresceu nos anos 80 com as vrias SITU/

    Semana Internacional de Teatro Universitrio, que teve incio em 1978, e mais

    recentemente o FATAL/Festival Anual de Teatro Acadmico de Lisboa.

    O FATAL, partindo da iniciativa e com a coordenao da Reitoria daUniversidade de Lisboa, teve a sua primeira edio em 1999, tendo conseguido reunir

    pela primeira vez, numa mostra do gnero, muitos dos diversos grupos de teatro

    acadmicos da cidade. A partir desse momento fundador, o FATAL foi-se alargando

    progressivamente participao de grupos de teatro universitrio de todo o pas e de

    Espanha, ganhando uma dimenso nacional e internacional, crescendo em nmero de

    espectadores e de reconhecimento por parte da crtica teatral e da comunicao social. O

    Festival foi enriquecendo o seu perfil, com a organizao de Tertlias realizadas aps osespetculos, envolvendo atores, encenadores, convidados e pblico, bem como com a

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    promoo de workshops de diferentes temticas relacionadas com as artes cnicas, e

    incluindo na sua programao, para alm dos espetculos de teatro, a apresentao de

    performancesem diferentes locais da cidade.

    Outra iniciativa da maior importncia a edio de revistas, como foi o caso da

    Revista Teatrouniversitrio, publicada pelo TEUC entre 1978 e 1988. Tambm, mais

    recentemente, a Revista Fatal, deu incio com o seu nmero 1, sada em 2008, ao que

    chamou os contributos para a Histria do Teatro Universitrio que tem permitido, ano

    aps ano, que distintas personalidades partilhem as suas reflexes e experincias nesta

    rea e, que os diversos coletivos de teatro universitrio divulguem o seu historial, sendo

    que em 2011, j se encontravam referenciados 42 grupos em todo o pas.

    de assinalar, no entanto, que apesar de estar a ser recolhida informao e

    testemunhos do ps-25 de Abril de 1974 e dos anos 90 e seguintes, existe, talvez por

    questes geracionais, uma lacuna relativa aos anos 80. Deste modo, experincias

    universitrias que se evidenciaram nesta dcada pela sua diferena e qualidade, como o

    grupo bis/ISCTE, e que influenciaram o aparecimento de outros grupos e a esttica de

    alguns criadores, so desconhecidas ou pouco conhecidas atualmente. Assim como, e,

    alargando esta reflexo ao teatro profissional e a grupos e pessoas que marcaram esta

    poca como o Teatro do Sculo; o Teatro Maizum; o Teatro Persona; o Teatro Espao;

    o Teatro do Mundo; o Grupo de Teatro Hoje/Teatro da Graa, entre outros e,

    encenadores como Carlos Fernando e Mrio Feliciano, fundador do Teatro da

    Politcnica, e tambm os espetculos de Andrzej Kowalsky, o surgimento do Teatro de

    Rua, Teatro-Bar e, Performances ainda sem esse nome, de Joo Grosso e/ou ngela

    Pinto, forneceram, cada um sua maneira, um imaginrio teatral e esttico ao teatro

    universitrio.

    Pelo exposto, parece-me pertinente a continuao de estudos que ofeream uma

    panormica sobre o percurso e a natureza da prtica teatral universitria aps o 25 deAbril de 1974. Nomeadamente este que aqui se apresenta sobre o TUT, mediante o

    acompanhamento, de forma privilegiada, da atividade de um grupo, formado nos anos

    oitenta, na Universidade Tcnica de Lisboa e que visa contribuir para uma reflexo

    sobre a presena e a funo que o teatro universitrio tem tido em Portugal, e que pode

    vir a ter em universidades que se querem projetar para o sc. XXI.

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    Segundo Captulo

    2 Consideraes iniciais

    2.1 Focos geradores e orientadores da investigao

    Esta investigao de mbito qualitativo, partiu de uma viso geral, verticalmente

    histrica e horizontalmente alargada s mltiplas experincias do teatro universitrio, e

    pretendeu realizar uma anlise holstica da vivncia, experincia e reflexo dos vrios

    aspetos que tm integrado o teatro universitrio na realidade acadmica, e no panorama

    cultural, focalizando no percurso do Teatro da Universidade Tcnica de LisboaTUT.

    No caso especfico do TUT, que pertence a uma universidade tcnica, talvez

    mais do que em qualquer outra, o teatro vivencia-se como uma necessidade, para que

    aquela cumpra a sua funo de formao global dos indivduos, uma vez que

    proporciona um espao de reflexo, de expresso e de estmulo comunicao,

    criatividade e imaginao, complementar ao ensino das cincias e das tcnicas e que se

    revela como fundamental para qualquer formao de carcter superior.

    2.2 Questo orientadora da investigao

    O ponto de partida e a linha orientadora desta investigao configurou-se na

    seguinte questo:

    De que modo o Teatro Universitrio pode contribuir para o

    desenvolvimento pessoal, cultural, artstico e cientfico da comunidadeuniversitria?

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    2.3 Questes de investigao

    Com este estudo pretendeu-se refletir sobre as seguintes questes:

    - Qual o contributo que o teatro universitrio pode dar (ou d) para o

    desenvolvimento pessoal dos discentes e docentes universitrios?

    - Qual o contributo que o teatro universitrio pode dar (ou d) para o

    desenvolvimento cultural da comunidade universitria?

    - Qual o contributo que o teatro universitrio pode dar (ou d) para o

    desenvolvimento do teatro?

    2.4 Objetivos da investigao

    A investigao pretendeu atingir os seguintes objetivos:

    - Compreender a funo do teatro na universidade.

    - Identificar o contributo do teatro na formao dos estudantes universitrios.

    - Compreender como foi a gnese do TUT.

    - Identificar o percurso do TUT durante a direo do seu fundador.

    - Compreender quais podero ser os novos desafios para o teatro universitrio.

    - Identificar qual o contributo que o teatro universitrio poder dar sociedade.

    2.5 Contexto da Ao: Caracterizao do TUT

    O grupo de Teatro da Universidade Tcnica de Lisboa/TUT foi fundado em

    Outubro de 1981 pelo Professor Jorge Listopad, a convite do ento Reitor da UTL,Professor Eduardo Arantes e Oliveira e, desde ento, tem proporcionado atravs da

    prtica teatral, um espao de formao e desenvolvimento pessoal, cultural e artstico.

    Desde 2009, e com uma nova direo, assegurada por Nuno Cortez, Manuel Vieira e

    Jlio Martn da Fonseca, o TUT uma associao de carcter cultural, pedaggico, e

    cientfico, que integra estudantes, professores e investigadores de vrias Faculdades e

    Institutos Superiores que fazem parte desta Universidade.

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    2.6 Metodologia emprica da investigao

    Os investigadores qualitativos estabelecem estratgias e procedimentos quelhes permitam tomar em considerao as experincias do ponto de vista do

    informador. O processo de conduo de investigao qualitativa reflecte umaespcie de dilogo entre os investigadores e os respectivos sujeitos, dado estesno serem abordados por aqueles de uma forma neutra (Bogdan, 1994:51).

    No estudo intitulado Investigao qualitativa em educao, Bogdan & Biklen

    apresentam cinco caractersticas da investigao qualitativa com graus de evidncia

    mais ou menos importantes: 1- a fonte direta de dados o ambiente natural e o

    investigador o instrumento principal; 2- descritiva; 3- os investigadores interessam-se

    mais pelo processo do que pelos resultados ou produtos; 4- anlise dos dados tende a ser

    feita de forma indutiva; 5- o significado de vital importncia.

    Assim, o objetivo dos investigadores qualitativos o de expandir e no o de

    limitar a compreenso(Bogdan, 1994: 62), tendo dois caminhos que se traduzem na

    abordagem metodolgica mais acertada para esta investigao, que se baseia na

    observao direta do trabalho desenvolvido pelo TUT ao longo dos anos, quer na sua

    atividade formativa, quer na de ensaios, produo e apresentao de espetculos em

    vrios lugares de Portugal e no estrangeiro: o estudo de caso e o etnogrfico.

    De facto, a vivncia etnogrfica foi o primeiro veculo de recolha de informao

    para a anlise deste estudo de caso, dado que durante todos estes anos de trabalho de

    campo, assumi pessoalmente diversas funes: Monitor, Dramaturgista, Produtor,

    Actor, algumas vezes tambm como Espectador, e mais recentemente como Encenador

    e Diretor Artstico. Esta observao a diferentes nveis e o envolvimento quotidiano

    produziram notas de campo de diferente natureza.

    A observao continuada das diferentes atividades e interaes, fez despertar a

    vontade de efetuar algumas entrevistas, e assim coligir as perspetivas individuais dosparticipantes e outros colaboradores artsticos, e conhecer melhor a forma como se

    envolveram no grupo e como depois evoluram os seus percursos profissionais e

    pessoais.

    Por ltimo, propus-me explorar e analisar os diferentes fundos do arquivo do

    grupo e da sua atividade e assim reconstruir a sua histria e o seu percurso. As

    perspetivas pessoais puderam, deste modo, ser confrontadas com o material documental,

    fazendo emergir a memria vivencial destes elementos que do continuidade ao grupo.

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    2.7 Procedimentos Metodolgicos

    Este estudo enquadra-se no paradigma qualitativo de investigao, preconizado por

    Bogdan & Biklen, pretendendo investigar um fenmeno em toda a sua complexidade e

    em contexto natural. Os instrumentos de recolha dos elementos de anlise foram sendo

    construdos ao longo da fase exploratria da investigao, num processo que pretendeu

    ser de reformulao sistemtica. A validao dos elementos recolhidos resultou da

    triangulao dos dados provenientes de vrias fontes, como a observao, entrevistas e

    anlise da documentao.

    Este estudo resultou de uma experincia pessoal, ou seja, da reflexo que foi sendo

    feita ao longo da minha presena no TUT desde o seu primeiro momento, e que

    contribui para desenvolver esta investigao, procurando saber mais sobre a natureza e a

    funo do Teatro Universitrio.

    As razes que, de alguma forma, puderam limitar este estudo so: o estudo de caso

    como estratgia metodolgica, que obriga a uma investigao em profundidade, o fator

    tempo e os recursos humanos disponveis.

    O percurso da investigao envolveu as fases de legitimao junto da direo do

    TUT e de motivao das pessoas para colaborarem; a fase exploratria atravs de

    algumas entrevistas a partir de guies pouco estruturados; a recolha de elementos de

    anlise mediante entrevistas semiestruturadas, observaes participadas e verificao de

    documentos e, por ltimo, a anlise de contedo dos elementos recolhidos.

    Sendo que ao longo destes quase 30 anos de existncia do TUT, passaram pelo

    grupo muitos estudantes e colaboradores artsticos, e no sendo possvel inquiri-los a

    todos, foi foroso recorrer ao processo de amostragem. Sendo que na fase exploratria

    se utilizou o mtodo de amostragem por convenincia e, na fase de recolha de dados a

    tcnica de amostragem de casos tpicos, uma vez que, como investigador, conheo apopulao abrangida.

    Na recolha e anlise de elementos, foram utilizadas as tcnicas de observao

    participante, a entrevista e a anlise de contedo. Como instrumentos de recolha e

    anlise, foram utilizados a gravao, o registo de observaes, notas de campo, pesquisa

    documental e categorizao.

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    2.8 Tcnicas de investigao

    2.8.1 Observao participante

    Este instrumento de investigao flexvel durante a sua aplicao e, tratando-se

    de um estudo qualitativo, combina e permite o levantamento de questes tericas e

    vivenciais.

    A observao atravessa diferentes fases: a insero no grupo e o estabelecimento

    de relaes com os seus membros, o esforo de captao de uma viso de conjunto

    atravs do estudo das anotaes do dirio de campo e dos documentos que permitem

    reconstituir a histria do grupo, e por ltimo sistematizar, organizar e analisar todos os

    dados, para uma melhor compreenso do grupo.

    2.8.2 Entrevistas em profundidade

    A entrevista em profundidade um tipo de entrevista flexvel, dinmica e pode

    ser livre de estrutura ou como foi neste caso semiestruturada. Serve para compreender:

    perspectivas de vida, experincias e, de como as pessoas sentem, expressam e vivem

    determinadas situaes.

    Como seguem um modelo de conversao, podem aproveitar-se situaes

    informais para serem realizadas, de modo a que as pessoas se sintam livres para falar.

    2.8.3 Entrevistas de grupo

    As entrevistas de grupo realizam-se normalmente a um conjunto de pessoas que

    estando reunidas, exprimem livremente os seus pensamentos e as suas experincias.

    Para conseguir este tipo de informao, determinante que o investigador usufrua da

    confiana das pessoas envolvidas.

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    2.8.4 Documentos do Teatro da Universidade Tcnica

    Procedeu-se recolha e organizao de todo o material grfico produzido pelo

    grupo ao longo da sua atividade at ao presente, tais como: programas, folhetos e

    cartazes, e tambm vdeos e fotografias. Foi possvel reunir toda esta documentao, at

    agora dispersa, assim como elencar e organizar os textos da totalidade dos espetculos

    produzidos.

    2.8.5 Documentos pessoais

    Os documentos pessoais caracterizam-se por serem escritos na primeira pessoa,

    e so constitudos por dirios de bordo, memrias e anotaes.

    Foi da maior importncia aceder a este tipo de documentos e recolher deste

    modo, experincias e pensamentos adequados a esta investigao.

    2.8.6 Imagens: vdeos e fotografias

    Os vdeos e fotografias constituram-se como documentos da maior importncia

    na investigao, sobretudo porque recordam, confirmam, e aclaram a realidade descrita

    pelas palavras.

    Com estes procedimentos metodolgicos, brevemente descritos, possvel uma

    aproximao vivncia e atividade do Teatro da Universidade Tcnica.

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    Terceiro Captulo

    3 A Cultura e o Teatro na Universidade Tcnica de Lisboa

    3.1 A Universidade Tcnica de Lisboa

    A Universidade Tcnica de Lisboa/UTL, foi criada em 1930, a partir de quatro

    Escolas j existentes: a Escola Superior de Medicina Veterinria, atual Faculdade de

    Medicina Veterinria/FMV o Instituto Superior de Agronomia/ISA, o Instituto Superior

    de Cincias Econmicas e Financeiras, atual Instituto Superior de Economia e

    Gesto/ISEG, e o Instituto Superior Tcnico/IST. Posteriormente, surgiram trs novos

    estabelecimentos de ensino superior: o Instituto Superior de Estudos Ultramarinos, em

    1961, atual Instituto Superior de Cincias Sociais e Polticas/ISCSP, o Instituto Superior

    de Educao Fsica, em 1976, atual Faculdade de Motricidade Humana/FMH e a

    Faculdade de Arquitetura/FA, em 1979.

    Pode ler-se no site desta Instituio que a UTL entende ter como Misso

    Promover, desenvolver e transmitir o conhecimento cientfico, tcnico e artstico nos

    seus domnios especficos de interveno, privilegiando sempre a qualidade e,

    adaptado s necessidades dinmicas da sociedade, numa perspetiva tico -cultural e de

    crescente internacionalizao. Tem como primeiro objetivo: Promover um ensino de

    referncia, orientado para a inovao e a cidadania, apoiado numa investigao de

    qualidade internacional, capaz de projetar a UTL como Plo de Cincia, Arte e

    Cultura. Esta superior vocao consubstanciada pelo apoio efetivo dado pela

    Instituio, ao longo dos anos, realizao das mais diversas atividades artsticas.

    3.2 A Cultura na Universidade Tcnica

    O enriquecimento a nvel cultural da comunidade acadmica da UTL insere-se

    na estratgia de construo da identidade da Universidade e do seu papel de fomento

    da cidadania procurando alargar os horizontes dos seus estudantes e o seu

    desenvolvimento enquanto cidados, intervenientes e transformadores da sociedade.

    Neste mbito, existe uma preocupao com o envolvimento dos alunos em toda a

    dinmica universitria, atravs tambm da promoo e realizao de eventos artsticos e

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    culturais e do estmulo sua participao, possibilitando deste modo incutir

    vivencialmente, valores humanistas, ticos e estticos.

    Atividades culturais como o teatro, a msica e a fotografia, entre outras, so

    desenvolvidas nas suas Escolas por inmeros grupos e ncleos e tm, sem dvida, um

    importante papel na promoo, simultaneamente, da cultura na academia e, da

    Universidade Tcnica de Lisboa a nvel nacional e internacional.

    3.2.1 A Dana e o Teatro

    A Dana tem sido uma atividade artstica particularmente desenvolvida na

    Escola da UTL mais vocacionada para a expresso corporal a Faculdade de

    Motricidade Humana.

    O Teatro outra das reas artsticas que tem tradies histricas na UTL

    enquanto atividade complementar dos estudantes, atravs da realizao de diversas

    iniciativas, como cursos e espetculos, e a inscrio no territrio cultural da academia e

    da cidade de Lisboa, de alguns grupos de teatro universitrio. Por outro lado, o

    reconhecimento da importncia do desenvolvimento das capacidades de expresso vocal

    e corporal por parte dos professores, visando captar e estimular um maior interesse dos

    estudantes pelos contedos apresentados, tem levado a UTL a promover vrios cursos

    de Tcnicas Teatrais para Docentes.

    A rea do Teatro tem tido, de facto, uma presena constante na realidade

    acadmica da UTL, e a expresso desse vigor traduz-se na diversidade de projetos e de

    aes de formao realizadas, e na existncia continuada de vrios grupos teatrais.

    3.3 Os Grupos de Teatro da UTL

    O grupo mais antigo, em termos de fundao, o Grupo Cnico da Associao

    dos Estudantes do Instituto Superior Tcnico, que surgiu em 1960, mas que acabou em

    1971. Assim sendo, o grupo com maior atividade ininterrupta at hoje, o Teatro da

    Universidade Tcnica/TUT, que iniciou a sua actividade em 1981.

    Outros grupos com existncia mais efmera marcaram, no entanto, a sua

    presena na UTL e, na histria por fazer, do teatro universitrio ps-25 de Abril. No

    antigo Instituto Superior de Economia, constituiu-se em meados dos anos 80 o grupoKULA que apresentou alguns trabalhos. Tambm nos finais desta dcada, em 1988/89,

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    antigos elementos do TUT criaram o Teagro, no Instituto Superior de Agronomia, no

    que veio a ser de certa forma a gnese do futuro Teatro da Garagem. Outro grupo

    fundado por estudantes que tiveram vivncia teatral no TUT foi o RASTILHO, Grupo

    de Artes Representativas da Faculdade de Arquitectura, que funcionou entre 2001 e

    2010. No interior do Instituto Superior de Cincias Sociais e Polticas, tem havido

    vrias experincias teatrais, sem continuidade, algumas delas estimuladas por antigos

    elementos do TUT.

    3.3.1 GTIST - Grupo de Teatro do Instituto Superior Tcnico

    1 fase1960:1971

    O Grupo de Teatro do Instituto Superior Tcnico/GTIST, surge numa 1 fase, no

    final da dcada de 50 e incio da dcada de 60 do sculo passado, altura em que,

    segundo o historial do grupo desempenhou um importante papel no movimento

    acadmico. O grupo, com a mais longa histria no seio da Universidade, veio a

    extinguir-se por volta de 1971. Segundo uma pesquisa efetuada pelo colectivo em 1992,

    e suportada em algumas publicaes associativas e relatos verbais de antigos elementos

    da altura, sobre a atividade teatral do grupo neste perodo, foi possvel identificar alguns

    trabalhos apresentados nesses anos, como Mrio ou eu prpriode Jos Rgio, com

    encenao de Rogrio Paulo e O dia seguinte de Luiz Francisco Rebello, com

    encenao de Armando Cortez, ambos em 1959/60. Um espetculo muito bem recebido

    pela crtica, e considerado um marco na histria do teatro universitrio em Portugal

    foi Autores modernos, quatro excertos de peas dos dramaturgos Georg Bchner,

    Berthold Brecht, Bernardo Santareno e Jean Paul Sartre, com encenao de Mrio Srio,

    figura intelectual que marcou a identidade do grupo at ao seu final em 1970/71.

    2 fase1992:2010

    Depois de 1971, segundo as informaes disponveis, no parece ter havido

    qualquer atividade at 1992, o ano em que foi fundado o atual Grupo de Teatro. Nesse

    ano lectivo Carlos Pessoa, oriundo do TUT, leciona o primeiro curso de formao.

    Desde ento e, sobretudo a partir de 1996, consolida-se o lado formador do grupo: um

    Curso de Cenografia e Realizao Plstica, dirigido por Jos Espada, tambm antigocolaborador do TUT, e Hernni Gonalves, e o incio da organizao regular do Atelier

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    de Iniciao ao Teatro, ou Curso de Formao de Expresso Dramtica, com uma

    durao de seis meses.

    Em 1994, apresentada a 1 Criao do GTIST Woyzeck de Georg Bckner,

    com encenao de Pedro Matos, encenador que ficar ligado ao grupo at 1997. Em

    1998 apresentada a 4 Criao do GTIST Para acabar de vez com a cultura, um texto

    de Woody Allen, que d incio colaborao de Gonalo Amorim com o grupo. Em

    1999, a 5 Criao do GTIST: Marte (e casas) , assinala o regresso das encenaes e

    dramaturgias de Pedro Matos, uma colaborao que se ir estender at o ano 2000.

    O GTIST tem apresentado uma ou duas produes anuais, procurando com a sua

    atividade teatral o desenvolvimento do pensamento atravs do processo de criao e de

    participao ativa no tecido teatral universitrio em Portugal. O grupo assinala

    tambm, a sua participao em festivais e encontros, dentro e fora do pas,

    nomeadamente o Festival de Teatro Universitrio da Beira Interior, os Encontros

    Internacionais de Teatro Acadmico de Lyon, entre 2002 e 2004, e o CYCLE

    MECHANICS, produzido pelo CITAC. Este coletivo tem organizado regularmente a

    celebrao do Dia Mundial do Teatro no Instituto Superior Tcnico e uma semana

    dedicada ao teatro.

    A partir de 2000, com a apresentao daPerformanceMatei-o porque era meu

    (8 criao do GTIST) Susana Vidal, encenadora e atriz profissional, iniciou a sua

    colaborao com o grupo, que se manteve at 2008, pugnando por uma esttica muito

    prpria e tendo como base a criao experimental, onde os processos e metodologias

    questionam as diferentes formas teatrais e onde os atores tm um envolvimento mais

    ativo na prpria criao. O seu ltimo trabalho com este grupo ANIQUILA, foi a 18

    Criao do GTIST que participou no 9 FATAL/Festival Anual de Teatro Acadmico de

    Lisboa.

    Em 2009, Gustavo Vicente, oriundo do prprio grupo, assume a direo artsticae encena Agora o Monstro, a 19 Criao do GTIST inspirado em O Sono do Monstro

    de Enki Bilal, espectculo que ganha o Prmio FATAL 2009. Em 2010, apresentaram

    Intervalo para Danarinspirado em O Livro do Desassossegode Fernando Pessoa, em

    2011 Cabea de coe em 2012 Queda em Branco, tendo sido, todas elas, criaes

    coletivas com a direo de Gustavo Vicente.

    Este elenco de espetculos produzidos pelo GTIST d conta da expressiva

    atividade teatral deste grupo de teatro universitrio, em plena atividade desde 1992/93,

    http://teatro.ist.utl.pt/pecas/intervalohttp://teatro.ist.utl.pt/pecas/intervalohttp://teatro.ist.utl.pt/pecas/intervalo
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    que reclama um teatro como espao de experimentao e um lugar aberto a novas

    ideias, segundo se infere pela sua prpria formulao:

    O teatro o nosso ponto de encontro, o lugar privilegiado da procura.

    Escolhemos o teatro para a procura de identidades, de possibilidades, de caminhos, delimites. Conhecer-me para poder conhecer melhor o outro. O teatro um dos nossosespaos de aprendizagem e conhecimento. No incio de cada ano lectivo, nasce um novogrupo com a incluso de novos elementos e recomea um novo Curso de ExpressoDramtica em que, qualquer pessoa, do I.S.T. ou no, pode participar. Neste espao quecrimos temos vrias formas de falar, de mexer, de mostrar, de dar. O teatro a nossaddiva e a nossa busca.2

    3.3.2 O RASTILHO - Grupo de Artes Representativas da Faculdade de

    Arquitetura

    Outra experincia representativa da atividade teatral produzida na Universidade

    Tcnica de Lisboa a deste grupo que foi fundado na Faculdade de Arquitetura da UTL

    em 2001, e que apresentou 11 espetculos, tendo quatro deles participado no FATAL,

    assim como noutros Festivais de Teatro Universitrio, portugueses e internacionais,

    como aconteceu em 2008 no XIII MITEU, em Ourense, Espanha.

    O grupo obteve a colaborao de diferentes encenadores como Andrea Bertoni,

    que dirigiu em 2002, o primeiro espetculo do grupo Esboo de Um Jardim Animado

    uma criao coletiva. Trabalharam tambm com o RASTILHO, Jorge Caetano e Slvia

    Valentim, tendo sido David Silva - que passou pelo TUT, assim como outros elementos

    2Site do GTIST.

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    deste grupo - o encenador que mais se identificou com este projeto teatral, desde 2003,

    com Um Pouco Mais Alto, Por Favor! de Woody Allen, at ao ano de 2010. O

    espetculo Othello de Shakespeare, Prmio Pblico do FATAL 2008 e Meno

    Honrosa, foi o ltimo trabalho conhecido deste grupo.

    3.3.3 KULAInstituto Superior de Economia e Gesto

    Nos anos 80, este grupo, dirigido pelo ator e encenador Filipe Petronilho,

    poca ligado ao Teatro Maizum, encenou alguns espetculos no Instituto Superior de

    Economia, sobre os quais existem alguns ecos. O dinamizador deste grupo, encontra-se

    desde alguns anos em Angola e, apesar do nossos contactos, no foi possvel aceder a

    nenhuma documentao, como programas ou folhetos, por forma que possamos falar

    desta experincia e deixar aqui a memria desse trabalho.

    3.3.4 TEAGROInstituto Superior de Agronomia

    Sobre este grupo e esta experincia que decorreu nos anos 90, procedeu-se a

    uma entrevista a um dos seus fundadores e Diretor do grupo, o Nuno Cortez - Professor

    do ISA, um dos primeiros elementos do TUT e atual Presidente da sua Direo - que

    lembrou o percurso realizado, refletindo no propsito que o animou aquando da sua

    fundao. Vejamos um excerto do seu testemunho:

    NC: Bem, assim, embora Agronomia seja uma escola com mais tradio degarraiadas, touradas, fados e coisas do gnero, em tempos, um ex-presidente doconselho diretivo em conversa comigo, disse-me que chegou a haver l, de facto, um

    grupo de teatro, mas eu nunca vi qualquer documentao sobre esse grupo, isto, antesdo 25 de Abril, portanto, uma coisa mais antiga. Nos anos mais recentes, tivemos assimdois grupos. Houve um grupo que se formou em 1988/89, isto , quando aquele ncleoprincipal do TUT se desfez ou se desmembrou. Eu estava l em Agronomia e estava oCarlos Pessoa tambm, e com ele fizemos l um incio de trabalho que no chegou a terpropriamente uma designao, chamamos-lhe simplesmente Teatro em Agronomia.Inicialmente organizou-se uma exposio de fotografia com base naqueles trabalhos quea gente ia fazendo de improvisao, dentro dos ensaios e etc. Portanto o corolrio desseprimeiro ano de atividade foi uma exposio de fotografia encenada, com msica,portanto foi um elemento cnico especfico, sem ser propriamente uma pea de teatro.Depois, o Carlos Pessoa comeou a dar, de facto, um cunho muito pessoal a esse grupo,a ponto de, nos ltimos tempos, j no ter quase ningum de Agronomia, j ser com

    pessoal que entretanto estava com ele na Escola Superior de Teatro, estudantes de l.

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    Isso acabou por dar origem ao projeto dele, ao Teatro da Garagem, entretanto eledesligou-se de Agronomia e depoisJMF:Isso foi durante quanto tempo?NC:Isto durou a uns dois, trs anos Depois disso, na sequncia de um sarau culturalde uma semana africana, os estudantes que a organizavam, sabendo que eu tinha estadoligado ao teatro, vieram-me pedir apoio para encenar uma coisa. Assim, a um ms de sefazer o sarau cultural, queriam preparar alguma coisa. E ento, o que eu acabei por fazercom eles foi uma leitura encenada de poesia, de poesia africana, que acabou por ser umacoisa engraada. Na sequncia disso, houve ento um grupo de meia dzia de estudantesque vieram ter comigo no sentido, de facto, de se criar um grupo. Esse grupo nsbatizmo-lo mesmo de TeAgro. Esse grupo comeou a trabalhar textos variados, fez-seum primeiro espetculo com base em textos avulsos, porque os textos eram contos doJos Eduardo gua Lusa, que tinha andado l em Agronomia, e havia assim uma certaligao, e tambm com vrias coisas que foram introduzidas com base nos improvisossobre esses contos. Portanto, isso foi feito l em Agronomia e foi feito no Teatro daComuna tambm, no mbito da semana acadmica de Lisboa, na altura no havia aindao FATAL. Depois, esse grupo, no ano a seguir, preparou uma coisa, digamos assim, um

    bocadinho mais elaborada que teve umas trs ou quatro representaes, todas l emAgronomia, com base em textos, tambm variados. Textos humorsticos do Po comManteiga, havia um texto do ONeill, havia um texto do Woody Allen, foi tambm umespetculo montado com vrias histrias, digamos assim, que foi feito l E havia oprojeto de se fazer o No bebas dessa gua do Woody Allen, que chegou-se a fazerum trabalho de dramaturgia, chegou-se a comear a ensaiar, mas depois nunca sechegou a concretizar. Entretanto o grupo, as pessoas que estavam no ltimo ano,acabaram o curso e saram, como acontece. Ainda chegou a haver num outro ano aseguir, uma coisa com base em poesia, essencialmente, que foi feito l em Agronomiatambm. Esse foi s um espetculo, uma coisa nica, um evento nico. J foi um grupomais pequeno, mas em que se trabalharam quatro, cinco textos, desde o Allan Poe, atuma coisa do Pessoa, e que se fez tambm assim uma coisa desse gnero. Esse grupo,

    portanto, este grupo de Agronomia funcionou, se no me engano, isso eu no consigoprecisar exatamente a data do incio, mas foi na segunda metade da dcada de 90.Digamos, o toque de finados desse grupo, foi, no fundo, a ida para o ISA, do TUT, queno fundo, absorveu as pessoas que l estavam e que queriam fazer teatro () Depoisdisso, ainda houve um outro projeto de um grupo de Agronomia, por iniciativa l de umaluno que mobilizou algumas pessoas e que acabou por fazer um espetculo que at foifeito numa sala de aula, mas que foi um espetculo que teve s uma ou duasrepresentaes e pronto. Eles acabaram por utilizar a designao de TeAgro, falaramcomigo e eu disse-lhes que sim senhora. Embora tivesse sido assim um bocadinho paido nome, no pus qualquer problema a que eles fossem herdeiros do nome, digamosassim, mas foi tambm um evento nico, uma coisa espordica. Acho que fiz o historialtodo.3

    Nesta entrevista com o Nuno Cortez foi possvel comprovar como o TUT, pelo

    facto de reunir pessoas de vrias Escolas e Institutos Superiores se tornou, de certa

    forma, um polo de criao de outras experincias teatrais universitrias ou profissionais.

    3Excerto da entrevista concedida por Nuno Cortez a Jlio Martn da Fonseca, realizada na sede do TUT,no Palcio Burnay, em Maio de 2011.

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    3.3.5 Grupo de Teatro do Instituto Superior de Cincias Sociais e Polticas

    O Teatro no ISCSP tem existido pontualmente. Conhecem-se algumas tentativas

    de criao de um grupo com mais continuidade, nomeadamente por parte de antigos

    membros do TUT. Entre os anos de 1998 e 2000, assistiu-se a uma atividade mais

    regular, em que o grupo de teatro se apresentou com alguns espetculos com direo do

    ator Joo Cabral e com o Apoio Plstico de Mariana S Nogueira e a colaborao de

    Paula S Nogueira, como foi a apresentao de Tran-glo-mango que chegou a ser

    representado no Teatro Cinearte

    A 13 de Julho de 2011, foi apresentado um musical no Teatrinho do Palcio

    Burnay por uma denominada Companhia de Teatro CC ISCSP, uma pea escrita

    por Ana Lusa Reis e Eurico Graa, com o ttulo de Que Histria a Tua?, e com

    encenao de Ana Lusa Reis.

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    Em conversa com a encenadora fiquei com a ideia de que seria um projeto para

    continuar, no entanto, at ao momento, tal no se verificou.

    3.4 -Ciclo de Teatro da UTL no Teatro da Trindade

    Assinalando o 75 Aniversrio da sua criao a Universidade Tcnica de Lisboa

    desenvolveu ao longo do ano letivo de 2005/2006 um conjunto de iniciativas destinadas

    a apresentar ao pblico o testemunho das suas mltiplas atividades.

    As comemoraes, numa organizao conjunta da Reitoria da UTL e do Teatro

    da Universidade Tcnica/TUT, proporcionaram a apresentao de um ciclo de teatro,

    que teve como objetivo transformar-se num encontro dos grupos de teatro existentes

    nas Escolas que integram a Universidade. O programa que ora divulgamos fazia justia

    desse propsito:

    No dia 22 de Fevereiro

    ORASTILHOPinquio & Capuchinho, com texto e encenao de David

    Silva.

    23 de Fevereiro

    O GTIST (Grupo de Teatro do Instituto Superior Tcnico) apresentouVertigens, com texto e encenao de Susana Vidal

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    25 e 26 de Fevereiro

    Estreia, da ltima produo do TUT"S, no Quartier Latin", a partir do poema

    de Antnio Nobre "Lusitnia no Bairro Latino" com direco de Jorge Listopad.

    O TUT, que nesse ano celebrava o seu 25 Aniversrio, apresentou tambm a

    sua primeira criao de 1982 " espera dos Brbaros", uma dramatizao do poema de

    Constantin Kavafy.

    Veja-se, a propsito deste Ciclo de Teatro da UTL, o parecer do ento Reitor, o

    Professor Doutor Jos Lopes da Silva:

    No palco da existncia, momentos h em que deixar um marco assinalarimportncia.E sendo importante assinalar os 75 anos de vida da UTL, no menos importanteser dar lugar expresso de uma outra forma de agir no confinada dimensoestrita de docente, de aluno ou de no docente.Todos somos actores.Mas alguns sentiram-no de uma forma mais intensa e deram corpo e voz apersonagens, organizando-se em grupos de actores.Todos so actores.Ao corporizar esta dimenso cultural e artstica, e ao associar-se sComemoraes em curso, agradeo a colaborao dos Grupos de Teatrointervenientes.

    Pela sua precedncia, seja-me permitido distinguir a participao do TUT,nascido h 25 anos pelo apoio do ento Reitor Arantes de Oliveira e ao longo dotempo moldado pelo Professor Jorge Listopad, mestre da obra de excelncia queo TUT tem revelado ser.4

    Este testemunho representativo da importncia que a UTL tem reconhecido s

    atividades complementares de formao, como o Teatro e, neste caso especificamente,

    ao trabalho desenvolvido nesta rea pelo Teatro da Universidade Tcnica.

    Aqui chegados irei passar ao tema nuclear desta dissertao, a descrio e

    reflexo dos 30 anos de percurso do TUT, e da sua contribuio para o desenvolvimento

    pessoal, cultural, artstico e cientfico da comunidade universitria.

    4Programa do Ciclo de Teatro da UTL, apresentado no Teatro da Trindade em 2006.

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    Quarto Captulo

    4 A experincia do TUT ao longo de 30 anos

    4.1 Apresentao do grupo de estudo - TUT

    O grupo de Teatro da Universidade Tcnica de Lisboa/TUT constitudo por

    estudantes, professores e investigadores das vrias Faculdades e Institutos Superiores

    que integram a Universidade Tcnica de Lisboa. Foi fundado em Outubro de 1981 por

    Jorge Listopad,a convite do ento Reitor da Universidade Tcnica de Lisboa, Professor

    Eduardo Arantes e Oliveira, sendo atualmente dirigido pelo ator e encenador Jlio

    Martn da Fonseca.

    Desde ento o TUT tem cumprido o seu papel de formao cultural, visando a

    expresso artstica teatral nas suas diversas vertentes: o movimento e a expresso

    corporal, a otimizao respiratria e o controlo vocal, a comunicao verbal e no-

    verbal, o trabalho de ator. Longe dos auditrios e salas de aula, o TUT proporciona aos

    seus formandos os instrumentos que lhes permitem vislumbrar um olhar outro sobre o

    mundo que os rodeia, nomeadamente atravs do jogo teatral, da linguagem cnica e das

    emoes dramticas, sem esquecer uma experincia vivencial de inter-relacionamento

    humano, fundamental para habitar na nossa complexa sociedade.

    Como fruto deste trabalho coletivo, tm sido apresentados regularmente ao pblico

    espetculos diversos, variando consoante a capacidade e apetncia dos seus elementos.

    Nas suas mais de duas dcadas de existncia, sempre sob direo de Jorge Listopad at

    2008, o TUT tem apresentado criaes coletivas, construdas, quer a partir de poemas e

    outros textos no teatrais, quer de obras teatrais clssicas, visitando autores to diversoscomo Constantin Kavafy, Jorge Luis Borges, Claudel, Alberto Pimenta, Francisco

    Tenreiro, Bchner, Goldoni, Ibne Azme, Chaucer, Caldern de la Barca, Ghelderode,

    Cames, Almeida Garret, Jorge de Sena, Gabriel Garcia Marques, Kafka, Lioubomir

    Simovitch, Cesrio Verde, Alexandre ONeill, Ruy Belo, Grabato Dias, lvaro de

    Campos, Vasco Graa Moura, Bertold Brecht, Antnio Jos da Silva, Gil Vicente,

    Anrique da Mota, Robert Walser, St-Exupry, George Steiner, Teolinda Gerso, Edel

    Atemkristall, Ramiro Osrio, Eurpides, Almada Negreiros, Antnio Patrcio, DinoBuzzatti, Jorge Listopad, Antonin Artaud, Jaime Salazar Sampaio, Karel e Josef Capek,

    http://www.slovnikceskeliteratury.cz/showContent.jsp?docId=1063http://www.slovnikceskeliteratury.cz/showContent.jsp?docId=1063
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    Sfocles, Jean Anouilh e Maria Zambrano, conquistando o elogio unnime do pblico e

    da crtica e tendo recebido, apesar de no ser um grupo profissional, trs prmios da

    Associao Portuguesa de Crticos de Teatro.

    Tambm com o TUT tm colaborado, quer a nvel da formao quer dos

    espetculos, inmeros profissionais das mais variadas reas, como Vera Castro e Nuno

    Carinhas, como Figurinistas, os Telectu - Jorge Lima Barreto e Vtor Rua, e Carlos

    Zngaro, como Msicos, Bernardo Gama, como Coregrafo, Lus de Almeida e Jos

    Carlos Nascimento, como Desenhadores de Luz, e muitos outros, sendo de destacar o

    inesquecvel e estruturante trabalho de corpo e voz, realizado ao longo dos primeiros

    anos do TUT pela atriz e professora Clara Joana.

    O TUT tem apresentado os seus espetculos nos mais diversos locais, interiores

    ou exteriores, desde Palcios, Jardins, Bibliotecas, Museus, Navios, Torre de Belm,

    Central Tejo, Armazns ou Auditrios, revelando uma hbil adaptao a diferentes

    espaos.

    Tem participado tambm em Festivais de Teatro, nacionais e internacionais,

    sendo de realar as deslocaes a Pontevedra (Espanha), Grenoble (Frana), Bratislava

    (Eslovquia) e Olomouc (Repblica Checa).

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    4.2 Listagem de espectculos (19822012)

    1982 Espera dos Brbaros

    1983 Everything and Nothing

    Anncio feito a Maria

    1984 Lencio e Lena na Estalagem de Mirandolina

    1985 O Jardim das Delcias

    Orfeu Dizem Negro...

    Doce Inimigo

    1986 Doce Inimigo

    Jardim das Delcias

    Viagem ao Mundo do Teatro - Esta Noite Improvisa-se

    1987 Sentimento de um Ocidental

    Cristvo Colombo

    1988 Segismundo na Torre de Belm

    As casas no acontecem, habitam-se!

    Macbeth

    1989 Acuso, Gilles de Rais

    1990 Portugal Trs

    1991 Marques & Kompanhia

    1992 Ivanov

    Marques & Kompanhia II

    1993 Marques & Kompanhia II

    Para onde foram os pedreiros na noite em que ficou pronta a muralha da

    China1994 O Teatro Ambulante Chopalovitch - 1aparte

    O Valente Soldado Schveik

    1995 A Deteno dos Actores do Teatro Ambulante Chopalovitch

    1996 Lusofonias

    A Deteno dos Actores do Teatro Ambulante Chopalovitch

    A Arte e a Engenharia

    1997 Hotel SavoyA Ronda dos Meninos

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    1998 A Ronda dos Meninos

    A Porta da Lei

    Os burros no Teatro portugus - 1 Parte

    1999 Os burros no Teatro portugus2001 Gata Borralheira

    2002 Quem foi o Arquitecto da Torre de Babel?

    Histrias de ver e de andar

    2003 Quem foi o Arquitecto da Torre de Babel? - Excertos

    Amor cinza perfeito

    Hiplito e Fedra: 1 Assalto

    2004 Pierrot e Arlequim na Reitoria

    O Principezinho, Pierrot e Arlequim

    Deserto Habitado

    2005 Deserto Habitado

    2006 S no Quartier Latin

    2007 Triplo Salto

    2008 Os Cenci

    2009 Os Cenci II

    2010 Venenos Indispensveis

    2011 Comdia de Insectos

    Venenos Indispensveis

    Comemoraes dos 30 anos do TUT e Homenagem a Jorge Listopad

    Barion

    2012 Antgonas

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    4.2.1 O incio: 1981-1982

    Tudo comeou com a leitura do folheto que anunciava a realizao de um Curso

    de Teatro promovido pelo Departamento de Atividades Culturais da UTL. Feitas as

    inscries em Dezembro de 1981, o Curso teve incio no dia 7 de Janeiro de 1982, na

    Reitoria da UTL, na Alameda de Santo Antnio dos Capuchos. Como Nuno Cortez

    recorda num documento interno do grupo eram seis e meia da tarde, chovia

    copiosamente.

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    Aguardando-nos, no interior da antiga Capela do Palcio Centeno,5estava Jorge

    Listopad, professor de Teatro do Conservatrio Nacional e que iria ser o orientador

    destes 30 jovens, que iam chegando molhados da chuva invernal mas curiosos. Aps

    uma breve apresentao, teve incio o trabalho, comeando com um aquecimento de

    corpo e voz dirigido pela actriz Clara Joana. Deste modo, segundo documentao

    interna nascia um grupo de jovens amantes de teatro, com toda a disponibilidade para a

    aprendizagem, sensibilizao e informao do fenmeno teatral.

    Ao ritmo semanal de segundas e quintas das 18h30 at s 21h, fomos penetrando

    de forma autntica e crtica no mundo do teatro, ligando a prtica com a teoria, atravs

    de uma dinmica gerada pelo trabalho de voz e corpo (expresso corporal, dico,

    desinibio) efetuado pela Clara Joana, em colaborao estreita com Jorge Listopad e,

    com o qual todo o universo teatral ia sendo revelado, quer atravs de informaes

    tericas (histria, escolas, filosofias), quer atravs de prticas (improvisaes,

    interiorizaes).

    Este processo de trabalho proporcionou a descoberta e o domnio progressivo

    das capacidades corporais e vocais dos jovens candidatos a atores, criando

    simultaneamente um espao de encontro vivo e atuante e, progressivamente elaborado,

    o qual acabou por dar origem a uma seleo natural que culminou num grupo mais

    homogneo de quinze elementos.

    5Mandado construir pela Rainha D. Catarina de Bragana, para as suas aias, aquando do regresso aPortugal, aps a morte, em 1685, de seu marido, Carlos II de Inglaterra.

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    Ao longo do curso, que incluiu inmeras idas em conjunto a espetculos, que

    contriburam para o desenvolvimento de um olhar mais lcido e crtico em relao aos

    espetculos teatrais e outras propostas culturais, fomos desenvolvendo um trabalho em

    torno do poema espera dos Brbaros de Constantin Cavafy, que despertou no grupo

    uma verdadeira paixo e que foi ao encontro da vontade de criar algo coletivo que

    desse realizao prtica e sedimentasse os conhecimentos obtidos.

    A dramatizao do poema de Cavafy foi apresentada em Maio, nos trios do

    Teatro Trindade, includa no espetculo de encerramento do ano lectivo da UTL,

    constituindo-se como a estreia e primeira apresentao pblica do TUT. O acolhimento

    caloroso e o interesse demonstrado pelos que no tiveram oportunidade de assistir

    apresentao pblica da dramatizao, foi to grande, que levou a que voltssemos a

    apresent-la, semanas depois, no Salo Nobre do IST.

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    Em Janeiro de 1983, fomos convidados a participar na abertura do ano

    acadmico, que teve lugar na Biblioteca do ento Instituto Superior de Economia, atual

    ISEG. Desta vez, o texto que serviu de motor do trabalho foi o El hacedor de Jorge

    Luis Borges. Foram escolhidas duas pginas e meia denominadas Todo o mundo e

    Ningum, uma reflexo potica, com ecos vicentinos, sobre a condio do ser criador.Esta foi tambm uma oportunidade de trabalharem em conjunto, pela primeira vez,

    todos os grupos culturais da UTL (coro, dana e grupo de metais), contando-se ainda

    com a colaborao da cantora lrica Dulce Cabrita.

    O novo ano letivo, trouxe naturalmente novos elementos ao grupo, o que

    motivou um reajustamento de horrio, sendo acrescentado mais um dia de ensaios, a

    4feira, de forma a permitir, por um lado, a partilha dos conhecimentos adquiridos e, por

    outro, possibilitar que cada um dos grupos isoladamente experimentasse outros

    caminhos. Assim, o recm chegado 1 ano desenvolveu um percurso prprio, apoiado

    pelos membros do ano anterior, que entretanto foram preparando, lendo, estudando e

    improvisando sobre a pea Lencio e Lena de Georg Bchner.

    No final do ano letivo 1982/83, surgiu a oportunidade e o convite aliciante para

    o grupo participar, enquanto figurao especial, na pea de Paul Claudel O anncio

    feito a Maria, encenada por Jorge Listopad, uma produo do Teatro Nacional D.

    Maria II e apresentada no vizinho Palcio da Independncia, ao Rossio. Este foi um

    momento privilegiado de vivenciar a construo e carreira de um espetculo de teatro

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    profissional, possibilitando a convivncia com um conjunto excelente de atores e

    atrizes, como Eunice Muoz, Joo Perry, Manuela de Freitas, Antnio Rama e Catarina

    Avelar, entre outros.

    O grupo participou com dezassete elementos, tendo os restantes treze criado um

    espetculo baseado na dramatizao de poemas de Alberto Pimenta e Francisco Jos

    Tenreiro, espetculo que foi apresentado no doutoramento honoris causa do Doutor

    Azeredo Perdigo.

    Com estas duas criaes, encerrou-se mais um ano letivo, e em Outubro desse

    ano, de novo reunidos, sentiu-se a necessidade de materializar o trabalho desenvolvido,

    na forma de encenao e montagem de peas teatrais, objetivo este que por querer ser

    concretizado, no permitiu (por falta de tempo, meios e espao), a entrada a novoselementos no incio desse novo ano escolar.

    4.2.2 Perodo de 19831988

    Com o incio do ano letivo 1983/84, o grupo de novo solicitado para colaborar

    no encerramento de um Congresso, organizado pela Faculdade de Medicina Veterinria.

    Para este efeito foi encenada uma cena de A Estalajadeira de Carlo Goldoni e ateatralizao de dois poemas africanos.

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    Aps a participao nesta iniciativa, e livre de outros compromissos, o grupo

    teve a possibilidade de se debruar sobre as obras teatrais, e as condies necessrias a

    nvel de produo, que permitissem viabilizar a concretizao da montagem de um

    espetculo. Por essa altura, tinha-se vindo a trabalhar duas peas, sendo difcil a escolha

    de uma delas. O impasse foi ultrapassado, quando surgiu a ideia, ousada e aliciante, de

    fazer a fuso das duas peas e encen-las num nico espetculo. Eram elas: Lencio e

    Lena de Georg Bchner, e a A Estalajadeirade Carlo Goldoni. O projeto comum

    viria a chamar-se, com toda a propriedade Lencio e Lena na estalagem de

    Mirandolina.

    No dia 5 de Dezembro de 1983, anotava no meuDirio de Bordo, que este era

    um compromisso de no interrupo do trabalho de grupo no sentido de no

    corresponder a outros convites e solicitaes. Ficou decidido que o espetculo seria

    apresentado no Palcio Centeno e nos seus jardins, no Vero, com a possibilidade de vir

    a ser integrado na programao do Festival da Cidade de Lisboa. Segundo Listopad

    seria necessrio criar um Grupo de trabalho para Organigrama. Criatividade

    Organizada.

    Para a concretizao desta montagem, foram encontrados dentro dos elementos

    do grupo, dramaturgistas, que a par dos ensaios e improvisaes iam entrecruzando as

    duas peas; cengrafos, que tiraram partido dos espaos interiores e exteriores do

    Palcio-Reitoria; figurinistas e assistentes de encenao; responsveis pela produo,

    que conseguiram com o apoio da Cmara Municipal de Lisboa e da Polcia fechar uma

    das ruas laterais, durante o perodo do espetculo, para que o rudo do trnsito no

    perturbasse as cenas exteriores; luz e som; promoo, relaes pblicas e frente de casa;

    todos os membros se empenharam na construo de um espetculo que fosse digno e

    belo, e no qual fosse possvel transparecer a experincia de trs anos intensos de

    aprendizagem teatral.

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    Vejamos o texto escrito para o Programa do espetculo, por Jos Artur Pestana,

    um dos elementos do grupo na altura:

    A Isabel fazia anos, e chovia.Havia bolos, poucos, e seis ou sete pessoas em volta de uma mesa improvisada.Eu comi o ltimo pedao do bolo, e em resposta questo: Fazemos o Lencio eLena ou fazemos A estalajadeira? disse: - Porque no fazer Lencio e Lena naestalagem de Mirandolina?. O Listopad, para espanto meu, agarrou a ideia e disse-me: - Podes comear a fazer a dramaturgia. Assim, vi-me a fazer algo que nuncatinha feito, nem nunca pensara fazer.Ideias havia muitas, mas comear a trabalh-las, foi um pouco difcil.

    O Listopad disse-me: - Pe o Alexandre a trabalhar contigo. Vai ser uma grandeajuda.E foi. Szinhos, cada um no seu canto dirio, em minha casa, em cafs cheios dequartas-feiras europeias, em Madrid, o trabalho foi avanando timidamente, noincio, tinha medo dos cortes, como se fossem censura.O Listopad tinha sempre ideias que discutamos. Regularmente os resultados eramsubmetidos prova do grupo: O Lencio e Lena est a perder sentido Esto afavorecer A estalajadeira Cortaram a cena mais bonita Este dilogo era togiro.Chegou-se a um ponto em que o puzzle parecia no ter soluo. Mas a soluo iaaparecendo, e deu-se o trabalho por acabado.Mas o lpis est sempre pronto a cortar uma frase que durante os ensaios se chega

    concluso que no resulta, e o cesto de papis rebuscado procura de outra queafinal faz falta.O produto final o trabalho possvel da nossa virgindade, inexperincia, do nossogozo, prazer. ainda Goldoni? ainda Bchner? Lencio e Lena na estalagem de Mirandolina.6

    Alexandre Leito deixou registado o seu testemunho quanto experincia

    vivida:

    6ProgramaLencio e Lena na estalagem de Mirandolina. Sublinhados do autor.

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    Da exploso da ideia, nuvem de fumo disforme; passo a passo como ser emgestao vai a obra tomando forma, desenhando-se-lhe os contornos. Primeiro agestos largos. Lascas que saltam. Curvas que se ajustam. Peas do puzzle que seencaixam.

    Mais uma volta do princpio ao fim. O trao do cume dos montes torna-se exacto.Uns toques de lima. Retomam-se pedaos antes eliminados. Novos golpes. Asutura mais cuidada, os ns menos volumosos.H que no deixar que o fim desfie. Que o cordel esgace de alto a baixo. H umacastanha por estoirar presa entre os dentes.Os pormenores tm agora o volume de alicerces. Fios como panos de fundo. Oequilbrio vai infectando a balana. A mo ao de leve alisa as cicatrizes, uma ououtra aspereza fasca ainda em toques de esmeril.Vai o barco encostando ao cais. So os ajustes finais, exigncias de conjunto.A obra a est.Por detrs est tudo o que foi sonhado. No mundo de peas construdas naimaginao entre colheradas de sopa, trambulhes nos autocarros, cigarros calmos

    de fim de noite.Fica o gozo das metamorfoses, das coisas impossveis, de tudo o que aconteceudentro da caixinha que se chama crnio.7

    E Jorge Listopad, escrevia no programa, a sua viso do Teatro Universitrio:

    Turismo

    Eis a nossa jornada. Jornada? Cada viagem a srio uma aventura. O teatro deestudantes isso mesmo, aventura. E neste caso por razes acrescidas, a saber:

    a) inauguramos para o teatro um novo espao plural, no convencionado, percorridopela aco crismada pelo pblico que nele participa;

    b) juntamos duas grandes peas de dois sculos diferentes, uma clssica mas no tantocomo parece, outra heterodoxa em travesti clssico, mediante um acidenteorganizado, se possvel no mortal, pelo contrrio belo ou, como se diz hoje,produtivo;

    c) confrontamos assim o mundo fechado que quer abrir-se (Lencio e Lena) com ummundo aberto (A estalajadeira) em demanda de definio. Dois mundos,efectivamente: de chuva, do spleen e do protestantismo cultural de um lado, do sol,do rudo, do catolicismo temperamental do outro. Nem um nem outro pior ou

    7ProgramaLencio e Lena na estalagem de Mirandolina.

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    melhor. So apenas diferentese complementares. O abstracto de Georg Bchnerfoge para o concreto italiano de Carlo Goldoni que aprende as novas dosrefugiados, dissidentes, dir-se-ia hoje. A conferncia Norte-Sul, e Sul-Norte. Se oNorte ensina a sonhar, o sul ensina o valor do real. O smbolo setentrional, torna-sesinal do meio-dia. A linguagem completa-se.

    Quanto aos actores que praticamente pisam o palco (palco?) pela primeira vez,os de Lencio e Lena precisam de poesia e sensibilidade que forjam a sua tcnicapara se exprimirem. Os intrpretes de A estalajadeira tm de erguer personagens decarne e osso, embora deformadas pela verve do autor. O gesto, tal como aindumentria de Lencio e Lena, esto sequiosos de cor e temperamento, porquanto o movimento e o guarda-roupa dos goldianos exibem mais do que so.

    Talvez no valha a pena confirmar que tudo o que o espectador v, feito,como diz algures Mirandolina pela mo prpria: pela mo prpria do grupo. Sero teatro o ltimo cozinhado artesanal?

    Texto meu intil? Oxal. O espectculo modesto e orgulhoso ao fazer daspoucas foras algo, se for minimamente convincente, condena estas linhas atornarem-se caducas. Ser vitria neste tempo de poucas vitrias em geral e do

    palco em particular, e do turismo apenas oficial e oficioso.

    8

    O espetculo teve um excelente acolhimento por parte do pblico e mesmo de

    muitos profissionais da rea. de assinalar que as sesses estiveram sempre esgotadas,

    e que foi conseguido um interesse muito especial por parte da crtica, que foi prdiga

    em elogios, conforme se pode inferir pelos excertos apresentados:

    () uma alegria esfuziante.

    Orlando Neves, Dirio de Notcias, 5/7/1984

    (...) possvel ver o espectculo de mil maneiras: deixarmo-nos penetrar pelo ar danoite, pela musicalidade das palavras e dos sons e a pea passa a ser cheiros,arrepios, langores, convite. Ou compenetrarmo-nos bem dos textos de origem,surpreender neles a interveno dramatrgica, as sonoridades prprias dos dois eto diferentes sculos ali representados e tudo passa a ser jogo de inteligncia,piscadela de olho cultural.

    Helena Vaz da Silva, Dirio de Notcias, 6/7/1984

    () Sobre o Teatro da Tcnica e seu encenador caem os aplausos do pblico. Pelanoite agradvel. Pelo espectculo.

    Anabela Mendes, Expresso, 7/7/1984

    () No vero sufocante que vivemos, esta representao dos estudantes daUniversidade Tcnica uma nota de frescura e de qualidade num panorama teatralno muito animador.

    Tito Lvio, a capital, 7/7/1984

    () Mirandolina recebe em sua casa, aqui tomada de emprstimo num notvelaproveitamento do magnfico espao do Palcio Centeno. Mas a eficcia doespectculo no poderia ter sido atingida, se no fosse o perceptvel trabalho comos actores, que aqui me parece uma das conquistas maiores do Teatro da tcnica.

    No h uma personagem mal definida, no h uma nica figura que no se recorte,8ProgramaLencio e Lena na estalagem de Mirandolina. Sublinhados do autor.

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    com coerncia, ao longo do espectculo, no h uma nica situao qual no setenha emprestado o rigor da concepo cnica e a inteligncia da composiodramtica.

    Antnio Mega Ferreira, Jornal de Letras, 10/7/1984

    Paralelamente, alguns dos elementos do TUT, ainda fizeram no dia 30 de Junho,

    Sbado, pelas 10h, uma leitura da Cena 1 do I Ato e Cena 1 do II Ato da pea de

    Garrett Frei Lus de Sousa, na nova Embaixada dos Estados Unidos da Amrica, a

    convite de Helena Vaz da Silva, Presidente do Centro Nacional de Cultura.

    Recordo com emoo o meu trabalho com a personagem Telmo.

    Depois das frias de Vero, o grupo voltou a encontrar-se no dia 24 de

    Setembro, tomando a deciso de abrir um novo 1 ano em 1984/85, e segundo Listopad

    filtrar desde o princpio para grupo de 15. Dos anos anteriores, mantinha-se um

    ncleo coeso de cerca de 10 elementos, que desejavam ardentemente continuar juntos a

    trabalhar com o Listopad. Manteve-se a regularidade dos encontros, duas vezes por

    semana, e planificou-se para Outubro/Novembro/DezembroDireo centrpeta e,em JaneiroDireo centrfuga.Foram surgindo vrias ideias, desde a preparao de

    Espectculo ambulante que permitisse a participao em Festivais, nomeadamente no

    SITU em Coimbra, ou repetir a Colaborao com Teatro profissional. De facto,

    devido experincia e qualidade reconhecida, que o grupo tinha atingido, em termos de

    conseguir apoios podamos Cultivar ambiguidade do grupo, no sentido de sermos

    grupo estudantil (Fundao Calouste Gulbenkian) e grupo no estudantil (Ministrio da

    Cultura). Eramos na verdade um Grup