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TEMA
RESPONSABILIDADE SOCIAL
EMPRESARIAL
LILIANA JACINTO ALMEIDA
Julho 2012
Universidade Jean Piaget de Cabo Verde
Campus Universitário da Cidade da Praia
Caixa Postal 775, Palmarejo Grande Cidade da Praia, Santiago
Cabo Verde
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SOCIOLOGIA DA
ORGANIZAÇÃO
TEMA
RESPONSABILIDADE SOCIAL
EMPRESARIAL
LILIANA JACINTO ALMEIDA
ORIENTADOR
NARDI SOUSA
Universidade Jean Piaget de Cabo Verde
Campus Universitário da Cidade da Praia Caixa Postal 775, Palmarejo Grande
Cidade da Praia, Santiago Cabo Verde
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Agradecimentos
Quero agradecer, primeiramente a Deus por tudo; aos meus familiares, principalmente
aos meus pais que sempre me ajudaram e me apoiaram em tudo; à Universidade Jean
Piaget de Cabo Verde pela bolsa e pela oportunidade concedida, pois, se assim não
fosse, não estaria aqui; à minha colega Maria Elisabeth que sempre me apoiou; ao meu
orientador Nardi Sousa pelas ajudas oferecidas, que foram fundamentais na elaboração
deste trabalho.
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Conteúdo
Sumário………………………………………………………………………………......6
1 Definição da Problemática e do Objecto de Estudo…………………………………...7
2 Enunciação da Pergunta de Partida e da Hipótese……………………………………..9
3 Objectivos da Pesquisa……………………………………………………………….10
4 Metodologia………………………………………………………………………….11
5 Estrutura do Trabalho………………………………………………………………...12
Capítulo 1: Enquadramento Teórico……………………………………………………13
1.1 Conceitos Básicos…………………………………………………………………..13
1.2 A Visão Clássica da Responsabilidade social……………………………………...19
1.3 A Visão Contemporânea da Responsabilidade social……………………………...19
1.4 Áreas de Responsabilidade Social………………………………………………….20
1.5 Teorias de Responsabilidade Social………………………………………………..21
1.6 Ética e Responsabilidade Social…………………………………………………....25
1.7 Responsabilidade Social/Filantropia…………………………………………….....27
1.8 Princípios de Responsabilidade Social Empresarial………………………………..29
1.9 Ganhos Obtidos com a Prática da Responsabilidade Social………………………..30
2 Reflexão sobre Novos Problemas Sociais na Modernidade........................................33
Capítulo 2: Caracterização da Enapor………………………………………………….40
Capítulo 3: Caracterização das Associações A.C Lénfer, ADMTG, Acrides……….....43
1- Entender o Terceiro Sector para se Agir Socialmente.........................................43
2- Associação Comunitária para Desenvolvimento Lém Ferreira...........................48
3- Associação Djunta Mon Pa Tchada Grande........................................................49
4- Associação Crianças Desfavorecida (Achada Grande Trás)...............................50
Capítulo 4: Análise dos Resultados…………………………………………………….52
Conclusão………………………………………………………………………………58
Bibliografia……………………………………………………………………………..62
Anexos………………………………………………………………………………….65
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SIGLAS E ABREVIATURAS
ENAPOR- Empresa Nacional de Administração dos Portos
ADMTG- Associação Djunta Mon Pa Tchada Grande
A. C Lénfer - Associação Comunitária para o Desenvolvimento de Lém Ferreira
ACRIDES – Associação Crianças Desfavorecidas
S/D – Sem Data
ET AL – E Outros
APUD- Citado por
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Sumário
No âmbito dos cursos ministrados pela universidade Jean Piaget de Cabo Verde,
qualquer certificado para o grau de Licenciatura, tem como parte dos requisitos a
elaboração da tese de monografia. Para tal, propusemos analisar o tema
Responsabilidade Social Empresarial em Cabo Verde, mais precisamente na empresa
Enapor situada na cidade da Praia.
Procuramos desta forma analisar em que medida a Enapor tem assumido o princípio de
responsabilidade social perante as localidades mais próximas, Lém Ferreira e Achada
Grande, e como essas localidades, através das associações locais, têm servido do
princípio de responsabilidade social empresarial para facilitar e estimular seu próprio
desenvolvimento comunitário.
Também procuramos conhecer a opinião de alguns trabalhadores afectos ao
Departamento de Mão-de-Obra Portuário da Enapor, a fim de conhecer as respectivas
opiniões sobre a postura da empresa perante os seus próprios trabalhadores.
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1. Definição da Problemática e do Objecto de Estudo
Nos últimos anos, o envolvimento das organizações privadas nas questões sociais tem
vindo a crescer em todo o mundo. Elas estão mais propensas a investir parte dos seus
lucros na sociedade, através da política de responsabilidade social, no sentido de
disponibilizar mais recursos, juntamente com o Estado, na tentativa de diminuir os
problemas sociais, sobretudo nas comunidades onde operam.
Significa que, cada vez mais, a sociedade e os empresários estão a consciencializar-se
que as empresas não se limitam unicamente a actos que traduzem no aumento de lucro
para as mesmas, mas também a acções que possam promover o desenvolvimento
humano sustentável e melhorar a qualidade de vida da sociedade.
A realização de acções empresariais socialmente responsáveis é algo ainda muito
recente em Cabo Verde. Somente nos últimos anos é que algumas empresas perceberam
da importância dessas acções para a sua afirmação, diante da configuração dos novos
arranjos organizacionais que reflectem as profundas mudanças pelas quais o mundo
vem passando. E também uma certa consciencialização da sociedade civil que tem
alertado para algumas questões.
Partindo do princípio de que a responsabilidade social é um conceito bastante
trabalhado a nível mundial e pouco visível em Cabo Verde, procuramos fazer um estudo
aprofundado acerca desta temática nas empresas cabo-verdianas, mais precisamente a
Enapor na cidade da Praia.
Assim, o objectivo deste estudo resume-se em saber até que ponto a Enapor tem
assumido o princípio de responsabilidade social, mais concretamente perante a
comunidade de Lém Ferreira e Achada Grande, e em que medida essas mesmas
comunidades, através das associações locais, têm aproveitado essa política de
responsabilidade social para facilitar o próprio desenvolvimento comunitário. Dado que
são comunidades localizadas junto do Porto, em que grande parte dos trabalhadores vive
nas redondezas, devido à localização geográfica do Porto e dos armazéns, verifica-se
que uma boa parte da mão-de-obra da Enapor é local. Da mesma forma, a proximidade
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destas zonas com a Enapor pode estimular o desenvolvimento do comércio, devido à
quantidade de pessoas que circulam diariamente nessas localidades, o que pode trazer
alguns benefícios, pois pode ser uma forma de diminuir o desemprego e estimular a
criação de pequenos negócios.
Em contrapartida, essas localidades poderão ter uma série de desvantagens devido a
essa proximidade, pois, são zonas mais afectadas pela poluição da empresa (problema
do lixo), e com maior índice de crianças e jovens a trabalhar no cais e a vender nas ruas,
uma vez que a atractividade do Porto pode provocar o abandono escolar, funcionando,
muitas vezes, como espaços de micro-criminalidade.
Tendem a ser zonas mais vulneráveis a alguns problemas sociais como a criminalidade,
prostituição, tráfico de drogas, violência, entre outros, devido à circulação de pessoas de
todos os cantos do país, com a vinda e ida dos navios. Uma vez que a maioria dos
jovens que ficam nas redondezas do Porto vivem nessas comunidades e estão em
contacto permanente com essas situações, acabam por levar esses problemas para dentro
das localidades, pondo em causa a paz social e a harmonia da comunidade, pois, estes
problemas acabam por criar desentendimentos entre os jovens que têm comportamentos
desviantes e os membros da comunidade, dificultando assim uma boa convivência nas
zonas. Para além disso, esses jovens podem influenciar outros jovens a cometer desvios,
contribuindo para aumentar a delinquência juvenil nas comunidades, um problema
social que tem trazido consequências catastróficas não só para os jovens, mas também
para as próprias comunidades que sofrem desse problema. As comunidades afectadas
por estes problemas, poderão ter menos possibilidades de desenvolvimento, pois, as
pessoas ficam com uma impressão errada da mesma, afastando-as por causa do medo
social que transmitem, enfaquecendo as relações sociais e a coesão social. Estes males
sociais acabam por manchar a imagem das mesmas, dificultando assim uma maior
intervenção por parte de outras instituições que poderão querer investir nessas
comunidades.
Desta forma procuramos saber em que medida as associações locais e a Enapor estão
conscientes das vantagens e desvantagens da proximidade dessas localidades ao Porto, e
como as associações têm servido desses mesmos elementos para exigir à empresa uma
maior responsabilidade social, visto que esta aproximação pode contribuir para criar
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certas patologias sociais, como por exemplo a emergência de marginais, delinquentes,
traficantes, prostitutas, etc, assim como problemas ambientais, dificultando o
desenvolvimento das comunidades.
Justificativa
A escolha do tema responsabilidade social empresarial resume-se na tentativa de
mostrar que é pertinente este estudo para a sociedade cabo-verdiana, onde os
consumidores e a população em geral começam a consciencializar-se do papel
imprescindível que as empresas têm face às questões sociais e a compreender
paulatinamente a importância das mesmas na formação e criação de oportunidades que
traduzem no aumento de bem-estar da sociedade e no desenvolvimento da mesma.
A escolha da empresa Enapor deve-se ao facto de ser uma das maiores empresas de
Cabo Verde, daí a preocupação em saber se uma empresa como a Enapor já assumiu o
papel crucial que as empresas têm e devem desempenhar no que toca a questões sociais,
ou seja, estimulando e promovendo acções sociais que possam reflectir de forma
positiva no desenvolvimento da sociedade e da própria empresa.
2. Enunciação da Pergunta de Partida e da Hipótese
Partindo do pressuposto de que a responsabilidade social é uma ferramenta
imprescindível para o desenvolvimento, tanto da empresa como da sociedade,
elaboramos a seguinte questão de partida, de forma a orientar-nos ao longo da pesquisa:
“Será que a Enapor assume seriamente a política de responsabilidade social, tal como
vem expresso no plano estratégico da empresa, ou é apenas uma questão de marketing,
no sentido de obter uma boa imagem junto da sociedade”?
Em consonância com os objectivos traçados, formulamos a seguinte hipótese:
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“Parece que a política de responsabilidade social assumida pela Enapor não tem
beneficiado o desenvolvimento comunitário das localidades Lém Ferreira e Achada
Grande, visto que nem as associações locais, intermediárias por excelência, têm sabido
construir uma relação de proximidade com a Enapor e mobilizado recursos para um tipo
de desenvolvimento mais inclusivo e sustentável, e nem a Enapor tem procurado
investir nessas localidades”.
3. Objectivos da Pesquisa
Objectivo Geral
Analisar até que ponto a proximidade da Enapor com as localidades Lém Ferreira e
Achada Grande tem estimulado e proporcionado o desenvolvimento comunitário
dessas zonas.
Objectivos Específicos
Demonstrar como as associações locais têm cumprido o papel de
intermediário na relação com a Enapor, no sentido de promover o
desenvolvimento comunitário através da política de responsabilidade social;
Conhecer e compreender as acções de responsabilidade social da Enapor
efectuadas nas localidades Lém Ferreira e Achada Grande e os reais motivos
da efectivação dessas acções;
Conhecer os benefícios sociais gerados com a prática dessas acções sociais
tanto para a Enapor como para as localidades;
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4. Metodologia
Para a elaboração de uma pesquisa científica é imprescindível a adopção de uma
metodologia de trabalho, ou seja, um princípio ou caminho que orienta os modelos e
métodos de pesquisa adequados que se deve utilizar para cada tipo de investigação
que se quer levar a cabo.
Para se chegar ao resultado do problema em estudo e à hipótese ora levantada,
privilegiamos a pesquisa qualitativa mais precisamente a pesquisa documental e a
entrevista, destacando a estruturada visto ser uma excelente técnica de recolha de
dados, onde servimos de um guião previamente elaborado. Dado que, na prespectiva
de Nardi Sousa (2003a:26), o guião é uma ferramenta que funciona como um
excelente auxiliar de memória para o entrevistador e facilita a organização do
entrevistado.
Assim, num primeiro momento será feita a revisão bibliográfica acerca da temática
em estudo, seguindo-se do trabalho de campo em que efectuaremos a recolha de
dados através da entrevista dirigida à Enapor mais precisamente ao Director dos
Recursos Humanos da empresa, a algumas das associações das localidades Lém-
Ferreira e Achada Grande (Acrides, ADMTG e A.C Lénfer) e a 10
trabalhadores/estivadores da Enapor, pois, constituem uma classe social que
desempenha um trabalho de alto risco (carga e descarga dos navios), e saber se a
empresa tem comprido as suas responsabilidades para com os seus colaboradores,
principalmente no que toca à atribuição de condições favoráveis para o desempenho
das suas funções, pois, estão sujeitos a vários perigos. Bem como uma entrevista ao
Director do Departamento de Mão-de-Obra Portuário, afim de esclarecer as opinões
dos Trabalhadores.
Para além dos contactos no Porto, a investigadora realizou um estágio de 300 horas,
no Departamento de Recursos Humanos, Departamento de Mão-de-obra Portuário e
Secretaria da Enapor. Visitou as localidades de Lém Ferreira e Achada Grande,
assim como as associações acima referidas.
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5. Estrutura do Trabalho
Com a pretensão de facultar uma rápida e sólida compreensão do conteúdo deste
trabalho, reconhece-se ser pertinente estruturá-lo em quatro capítulos.
O primeiro capítulo refere-se à fundamentação teórica, no qual procedeu-se à
clarificação dos conceitos básicos que possam ser pertinentes para um melhor
entendimento da temática em causa. Igualmente, discorre-se sobre a reflexão de
alguns teóricos que já dissertaram sobre esse tema, bem como alguns conceitos
relacionados com a responsabilidade social como ética, filantropia. Traz também
uma breve reflexão sobre alguns problemas sociais na modernidade, destacando o
Sociólogo Anthony Giddens.
O segundo capítulo traz uma abordagem e caracterização da Enapor da Praia mais
precisamente história, missão, objectivos, estrutura.
O terceiro capítulo traz uma breve abordagem sobre o terceiro sector e a
caracterização das Associações A.C Lénfer, ADMTG e ACRIDES.
O quarto capítulo procede-se à organização, análise e interpretação dos dados, onde
é analisado e avaliado o real cenário da responsabilidade social empresarial da
Enapor perante as localidades acima referidas, e, onde é analisado também o
contributo das associações locais no desenvolvimento das comunidades.
A parte final comporta para além da conclusão e bibliografias, alguns anexos sobre
os resultados da pesquisa, que poderão ser objectos de consultas e possíveis análises
secundárias.
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Capitulo 1
Fundamentação teórica
1.1 Conceitos Básicos
Com o propósito de primeiramente, melhor entender a problemática em estudo e de
facilitar um melhor entendimento do trabalho, considera-se ser útil apresentar alguns
conceitos pertinentes referidos na hipótese anteriormente levantada.
Responsabilidade Social
Evolução
De acordo com Freire et al (2008) as décadas de 60 foram caracterizadas como o
período em que a literatura sobre a responsabilidade social empresarial se expandiu,
onde o meio académico teve o papel de observar que a responsabilidade social das
empresas ia para além dos interesses exigidos por lei. Nessa época, a responsabilidade
social tinha como princípios fundamentais a filantropia e a governança. Assim, as
acções de responsabilidade social centravam-se na filantropia e obras de caridade,
baseados na obrigação moral e princípios religiosos compatíveis com os valores da
sociedade.
Mais tarde, por volta de 1962, surge uma outra vertente conhecida pela sua postura
clássica, baseado na crença que as forças do mercado impulsionariam a economia,
promovendo assim o bem estar-social (Freire et al, 2008:3).
Essa corrente, que tem Friedman como representante máximo, defendia que a única
responsabilidade das empresas era maximização do lucro e obediência às leis e que as
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acções sociais competia a outras instituições como a Igreja e o Estado (Friedman:1962,
apud, Freire et al:2008).
Nos anos de 1970, continuou a proliferação do tema, tendo surgido abordagens
alternativas relacionando responsabilidade social ao Desempenho Social Corporativo.
De acordo com Freire et al (2008:4), nessa década deu-se a substituição da
responsabilidade do indivíduo pela idéia de que as empresas possuem
responsabilidades, e sendo agentes morais devem responder por seus actos.
Nos anos de 1980, surgiram menos definições e mais pesquisas para se medir a
responsabilidade social empresarial, o que levou ao aparecimento de temas
complementares como: responsividade, desempenho social corporativo, política
pública, ética nos negócios e teoria dos stakeholders, o que estimulou o processo de
institucionalização da responsabilidade social (Carroll:1999, apud, Freire et al:2008).
Freire et al (2008) consideram ainda que os anos 1990 foram marcados por uma
ascendência de mudanças tecnológicas, abertura comercial e consequente abandono do
modelo potencialista do Estado.
Assim, ultrapassando o período em que as empresas estavam preocupadas apenas com a
maximização dos lucros e com os preços competitivos, actualmente uma nova visão
organizacional alerta para questões como a ética, transparência nos negócios,
subjectividade e um maior respeito e garantia aos direitos humanos como sendo fulcrais
na actuação responsável.
Conceptualização
De acordo com Miguel Pina Cunha et al (2007) a responsabilidade social das empresas
é uma questão que varia na sua definição de pessoa para pessoa. Para alguns, ela
representa a ideia de responsabilidade ou das obrigações legais. Para outros, significa
um comportamento socialmente responsável em sentido ético. Ainda, para outros, o
significado é o de “ser responsável por algo” no sentido causal.
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Howard Bowen, considerado por alguns autores, como precursor da Responsabilidade
social empresarial, citado por Freire et al (2008) na sua abordagem teórica argumenta
que as obrigações do homem de negócios, ou seja, do empresário, devem estar
alinhados com os valores pretendidos pela sociedade.
Para ele, as empresas devem compreender melhor o seu impacto social, e o desempenho
social ético deve ser avaliado por meio de auditorias e incorporado à gestão dos
negócios.
Para o economista Milton Friedman, citado por Freire et al (2008), a responsabilidade
social das empresas se restringe a duas questões fundamentais: maximixar os lucros e
obedecer às leis. Para ele, as empresas ao administrarem com eficiência, criando
empregos, pagando impostos e gerindo de forma lucrativa, estariam agindo de maneira
responsável.
Contrariando essa linha de pensamento Carroll argumenta que a responsabilidade social
empresarial pode ser entendida como a expansão do papel empresarial além da sua
dimensão económica e das suas obrigações morais (Carroll:1979, apud, Freire et
al:2008).
Na mesma linha de pensamento Poter e Kramer citado por Freire et al (2008) realçam
que a responsabilidade social empresarial “pode ser muito mais de que um custo, um
entrave ou acção filantrópica, pode ser uma fonte de oportunidade e vantagem
competitiva”
A responsabilidade social é definida por Sebastião Teixeira (1998:119), «como grau
que os gestores levam a cabo actividades que protegem e desenvolvem a sociedade,
para além do estritamente necessário para servir directamente os interesses
económicos e técnicos da organização».
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Desenvolvimento Comunitário
As raízes deste conceito de acordo com Ezequiel Ander-Egg e Miriam Baptista citados
por Hermano Carmo (1999), situam-se no período que mediou as guerras mundiais, a
partir das práticas experimentadas em dois contextos diferentes:
- A prática de formação de líderes locais, desenvolvida no sistema colonial britânico de
administração indirecta;
- A experiêcia americana de organização comunitária, como resposta aos inúmeros
problemas de desorganização social, de anomia e comportamentos desviantes que se
registaram nessa época, fruto de consequências da industrialização, da urbanização, da
imigração e das dificuldades socioeconómicas do pós-guerra, culminada com a crise de
1929.
De acordo com Hermano Carmo (1999), foi depois da Segunda Guerra Mundial que o
desenvolvimento comunitário se estabeleceu como método complementar de
intervenção social para fazer face aos problemas sociais da conjuntura.
O termo desenvolvimento comunitário tem sido utilizado com diversos sentidos, de
acordo com o contexto histórico e social em que se inscreve (Carmo, 1999).
É definida por Ezequiel Ander-Egg como uma técnica social de promoção do homem e
de mobilização de recursos humanos e institucionais, mediante a participação activa e
democrática da população no estudo, planeamento e execução de programas ao nível da
comunidade de base, destinados a melhorar o seu nível de vida (Ezequiel Ander-
Egg:1980, apud, Carmo:1999).
Na perspectiva de Patrícia Nassif et al (2004), o desenvolvimento comunitário é
definido como o processo através do qual os esforços do próprio povo se unem aos das
autoridades governamentais, com o fim de melhorar as condições económicas, sociais e
culturais das comunidades, integrar essas comunidades na vida nacional e capacitá-las a
contribuir plenamente para o progresso do país.
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Segundo os autores, os ingredientes básicos do desenvolvimento comunitário são a
participação do povo nos esforços para melhorar o seu nível de vida e o apoio técnico
do Governo para tornar mais eficazes os programas de ajuda mútua.
Associativismo
Na perspectiva de Dominique Melh, o associativismo contribui para uma nova dinâmica
política nas comunidades. Pois, o movimento associativo tem um papel específico na
regulação social, responde a funções sociais particulares e ocupa um lugar original no
sistema político social (Vilaça:1993, apud, Sandra Lima:S/D).
Segundo o mesmo autor, as associações podem revestir-se de uma acção fundamental
na mediação das relações entre o indivíduo e o Estado, assim as associações voluntárias
podem tornar-se um meio de integração dos indivíduos nas sociedades democráticas.
As associações voluntárias, sem fins lucrativos, possuem uma divisão interna do
trabalho, e regem-se por processos de decisão estipulados e codificados nos seus
estatutos. Funcionam também como veículos de preenchimento de um certo vazio
deixado pelos agentes primários de socialização, como a família (Kellerhals:1974, apud,
Sandra Lima:SD).
É neste sentido que Émile Durkheim defendia a necessidade de novos mecanismos que
reforcem a solidariedade social nas sociedades modernas. Assim as associações
voluntárias surgem como organizações naturais que fortalecem esta solidariedade onde
os indivíduos associam-se para defender os seus interesses e comunicarem entre si.
Falar de associativismo, leva-nos a procurar o conceito de terceiro sector, que na
perspectiva de Fábio Ribas Jr (2002), o crescimento desse sector trouxe a oportunidade
das organizações não-governamentais e das empresas socialmente responsáveis
participarem em acções voltadas para o desenvolvimento do país.
De acordo com o mesmo autor, o terceiro sector surge como forma de facultar uma nova
abordagem dos velhos e não resolvidos problemas da sociedade. Na medida em que nele
renascem práticas sociais solidárias com objectivo de fortalecer a autonomia das
comunidades e capacitá-las a resolver seus prórios problemas.
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Segundo Fábio Ribas Jr (2002), trata-se de um sector independente, profundamente
interessado nos problemas sociais, crescentemente organizado e tendente à
profissionalização, baseado no associativismo e na dimensão voluntária do
comportamento das pessoas, que se caracteriza pela defesa de causas e valores, tendo
em conta os princípios de solidariedade e a participação na construção da cidadania
democrática.
O terceiro sector é definido como o espaço institucional que abriga um conjunto de
acções de caracter privado, associativo e voluntaristas, estruturadas informalmente,
voltadas para a geração de bens e serviços públicos de consumo colectivo (Alves citado
por Rodrigo Mendes:S/D).
Na perspectiva de Fernandes o terceiro sector é composto por organizações sem fins
lucrativos, criadas e focadas na participação voluntária, num âmbito não governamental,
dando continuidade às práticas tradicionais de caridade, filantropia e mecenato,
expandindo o seu sentido para outros domínios, graças ao conceito de cidadania e às
suas manifestações na sociedade civil (Fernandes:1995, apud, Rodrigo Mendes:S/D).
Assim o terceiro sector poderá impulsionar o desenvolvimento social na medida em que
puder oferecer alternativas às formas tradicionais de exercício do poder na execução das
políticas públicas e promover a participação efectiva da cidadania na condução dos
assuntos de interesse colectivo.
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1.2 A Visão Clássica da Responsabilidade Social
Segundo Sebastião Teixeira (1998:207), os defensores desta abordagem, consideram
que os gestores são uma espécie de empregados dos accionistas para quem trabalham,
assim a sua única responsabilidade é gerar lucros para os mesmos. Não têm de assumir
qualquer responsabilidade social, pois, só para com eles tem obrigações. Um dos mais
conhecidos e radicais defensores deste ponto de vista é um economista liberal, o
americano Milton Friedman. A visão de Friedman, segundo Sebastião Teixeira, é que:
«Existe uma e apenas uma responsabilidade social das empresas, usar os seus recursos
e aplicá-los em actividades projectadas para aumentar os seus lucros desde que elas se
confinem às regras do jogo, que são envolver-se em competição livre e aberta, sem
logro e fraude».
Para Friedman se os gestores das empresas aceitarem o princípio de responsabilidade
social, isso pode acabar com os fundamentos da sociedade livre. Para ele, a longo prazo
as organizações lucrativas atendem às demandas públicas enquanto prosseguem os seus
interesses e objectivos, promovendo o bem estar dos cidadãos através de uma economia
livre.
Cada vez mais as empresas e os gestores estão mais aptos a aceitar as obrigações
decorrentes da responsabilidade social das organizações, o que faz com que,
actualmente tenhamos poucos subcritores das ideias de Friedman acerca do tema.
1.3 A Visão Contemporânea da Responsabilidade Social
Muitos gestores consideram que os accionistas não são o grupo mais importante, mas
sim um dos vários que têm de servir.
Esta corrente defende que as empresas são vistas como membros importantes e
influentes da sociedade, por isso, são responsáveis por ajudar a manter e melhorar o
bem-estar dessa mesma sociedade como um todo. De acordo com Keith Davis, um dos
mais importantes defensores desta corrente (citado por Sebastião Teixeira 1998:208) «a
longo prazo, quem não usa o poder de uma forma que a sociedade considere
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responsável está condenado a perdê-lo». E apresenta cinco proposições relativas à
responsabilidade social:
1º- A responsabilidade social surge com o poder social, e este poder é conferido pela
própria sociedade, portanto, logo que a empresa tem um determinado poder ou
influência sobre ela, a mesma pode e deve responsabilizar a empresa pelas condições
sociais afectadas pelo uso desse poder;
2º- As empresas devem funcionar como um sistema aberto, recebendo e fornecendo
informações sobre as suas operações com o público;
3º- As empresas devem considerar e calcular os custos e benefícios sociais da sua
actividade na sua contabilidade;
4º- Devem ser publicado para os consumidores os custos sociais relativos às
actividades, produtos ou serviços de uma empresa;
5º- As empresas têm a responsabilidade de se envolverem em certos problemas sociais
que estão fora das suas áreas normais de negócio.
1.4 Áreas de Responsabilidade Social
Na perspectiva de Sebastião Teixeira (1998), podem considerar-se quatro áreas onde a
responsabilidade social é mais discutida e levanta mais preocupações. São os
consumidores, os empregados, o ambiente e a sociedade em geral.
Os consumidores são, na perspectiva deste autor a razão da existência da empresa, é
natural que a primeira preocupação em termos de responsabilidade social tenha a ver
com eles. Assim, deve-se ter em conta a segurança dos produtos que as empresas
colocam no mercado, a qualidade do design e preços justos, publicidade clara e
adequada informação sobre as características dos produtos que são colocados à venda.
Os empregados representam outra área importante onde a responsabilidade social das
empresas de que fazem parte se faz sentir. Preocupações como a segurança no trabalho,
o pagamento do justo salário, a indiscriminação com base no sexo, raça ou religião, o
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treino, educação e desenvolvimento dos trabalhadores, a assistência a empregados com
problemas, não devem passar despercebidos.
O ambiente é a área de responsabilidade social onde a visibilidade e discussão pública
mais tem aumentado nos últimos tempos. A consciencialização colectiva da necessidade
de preservar a natureza, o maior gosto pela vida ao ar livre e as férias no campo, as
preocupações de higiene, nomeadamente nos locais de trabalho, a protecção contra a
poluição do ar, rios, sonora, o maior recurso a embalagens biodegradáveis ou
recicláveis entre outros, são formas de expressão da crescente responsabilidade social
no que se refere ao ambiente.
A sociedade em geral representa uma área vasta da responsabilidade social das
organizações, nomeadamente das empresas. Apoios na educação, arte, saúde ou no
desenvolvimento da comunidade, a consideração do impacto social da implantação ou
transferência de unidades fabris, o fornecimento de informações sobre os negócios e
operações realizadas, o apoio a empreendimentos comunitários ou de minorias, são
formas de fazer valer essa responsabilidade.
1.5 Teorias de Responsabilidade Social
O campo da responsabilidade social das empresas apresenta várias teorias relacionadas
com o tema. Neste trabalho serão destacados quatro dessas teorias:
1.5.1 Modelo Neoclássico da Teoria de Firma
Essa corrente que é representada pelo economista Milton Friedman defende que a
organização da sociedade está dividida em grandes áreas funcionais em que cada uma
delas desempenha a respectiva função.
A função política está a cabo das organizações políticas, como sindicatos e
representantes dos trabalhadores que apoiam e defendem seus interesses; a função social
compete ao governo que é responsável pelo bem-estar geral; e a função económica fica
por conta dos negócios que são responsáveis pela maximização do lucro.
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De acordo com Borger (S/D) essa corrente defende que as questões éticas estão na
esfera individual enquanto que na sociedade elas se manifestam através de normas e
padrões de conduta social estabelecidos pela própria sociedade. Na esfera empresarial
quando essas normas e padrões são violados, tornando insustentável alguns aspectos de
negócios, cabe à sociedade por meio de suas instituições legais coagir as empresas a
cumprir as regras e os padrões legalmente estabelecidos.
Segundo Friedman o negócio é visto como uma auto procura de lucro, enquanto que
outras considerações são da responsabilidade da sociedade e não dos negócios.
Essa corrente foi bastante criticada principalmente por privilegiar a actuação autónoma
das empresas desconectada do ramo político e social.
1.5.2 Responsabilidade Pública
A ideia principal do modelo de Preston e Post citados por Borger (S/D) é que a
responsabilidade social traduz numa função da gestão das organizações no contexto da
vida pública, o que implica uma análise exterior à empresa.
Para eles, os gestores devem considerar as consequências de suas acções, não são
obrigados a resolver todos os problemas da sociedade, mas são responsáveis em ajudar
áreas relacionadas às suas operações e aos seus interesses.
O princípio de responsabilidade pública vai além do cumprimento legal, contudo não
abarca todas as expectativas da sociedade (Preston e Post:1975, apud, Borger:S/D).
Assim, definem duas áreas de gestão da responsabilidade social:
A área de envolvimento primário compreende o comportamento e as transações que
derivam directamente da característica e da operação intrínseca da empresa, nela estão
os clientes, empregados, acionistas e credores orientados pelo mercado. Quando surge
algum problema social a esfera secundária é accionada.
A área de envolvimento secundário inclui os impactos e os efeitos gerados por suas
actividades primárias. Nessa esfera estão a lei e os valores morais que intermediarão a
solução dos conflitos.
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Os autores anteriormente citados, constataram que a responsabilidade social envolve as
áreas primária e secundária e que os negócios e a sociedade são sistemas
interpenetrantes.
1.5.3 Pirâmide de Responsabilidade Social Empresarial
Essa teoria foi desenvolvida por Archie Carroll em 1979 onde propôs um modelo
conceptual para os gestores de empresas que de certa forma contempla o significado da
responsabilidade social.
Segundo Borger (S/D) na proposta de definição de Carroll deve incluir uma variedade
de responsabilidades dos negócios para a sociedade, e ainda esclarecer os componentes
da Responsabilidade Social Empresarial que estão para além de gerar lucros e obedecer
às leis.
Para a autora, “a responsabilidade social dos negócios engloba as expectativas
econômicas, legais, éticas e discricionárias que a sociedade tem da organização num
dado ponto de tempo”(Carroll:1979, apud, Borger:S/D).
A pirâmide de responsabilidade social empresarial proposta por Carroll subdivide a
responsabilidade da empresa em quatro dimensões: económica, ética, legal e
filantrópica, o que segundo Borger integra a maioria dos argumentos do debate sobre a
responsabilidade social num único modelo.
Responsabilidade Económica
Os negócios são a unidade económica básica da nossa sociedade, assim a sua
responsabilidade é de natureza económica. Produzir e vender bens e serviços para obter
lucro é a base do funcionamento do sistema capitalista. Assim a responsabilidade dos
negócios é de produzir bens e serviços que a sociedade deseja e vendê-los com lucro,
pois, a sociedade espera que os negócios realizam lucros, o que é um incentivo e uma
recompensa para a sua eficiência e eficácia.
24
Responsabilidade Legal
O ordenamento jurídico-legal reapresenta as regras do jogo pelas quais os negócios
devem funcionar, assim a sociedade espera que os negócios obedecem às leis e que
realizem sua missão económica dentro dos requisitos legais estabelecidos pelo sistema
legal da sociedade. Espera-se que os negócios ofereçam produtos que tenham padrões
de segurança e obedeçam as regulamentações ambientais estabelecidos pelo governo.
Responsabilidade Ética
Representa o comportamento e as normas éticas que a sociedade espera dos negócios.
Isso implica uma análise e reflexão ética e exige que a tomada de decisões seja feita
tendo em conta as consequências de suas acções, honrando o direito dos outros,
cumprindo deveres e evitando prejudicar os outros. Mais ainda procurar justiça e
equilibrio nos interesses dos vários grupos, ou seja, empregados, consumidores,
fornecedores e a comunidade onde operam.
Responsabilidade Filantrópica
Representa os papeis voluntários que os negócios assumem, ou seja, a filantropia
empresarial consiste nas acções discricionárias tomadas pela gerência em resposta às
expectativas sociais, e essas expectativas são dirigidas pelas normas sociais e ficam por
conta do julgamento individual dos gestores e da corporação. Exemplo disso são:
contribuições filantrópicas, condução de programas interno para usuário de drogas,
treinamento de desempregados, extensão de benefícios para familiares dos funcionários,
programas comunitários, entre outros.
Para Borger (S/D), a definição de Carroll é mais abrangente porque a Responsabilidade
Social é um conjunto de dimensões das relações interpenetrantes entre empresas e
sociedade. Assim, embora a autora destaque essas dimensões não implicam uma
sequência ou estágio de desenvolvimento da Responsabilidade Social Empresarial, pois
a ênfase da sua definição é na dimensão económica e legal. Que segundo a mesma não é
suficiente, mas sim essencial no desempenho económico e cumprimento das leis.
25
1.5.4 O Modelo de Ackerman
Esse modelo foi desenvolvido por Ackerman em 1973, no qual se interessou pela
maneira como as empresas responderiam às pressões sociais e de que forma ajustariam
essas demandas às suas estratégias para obter legitimidade, de modo que a análise
prevaleça orientada para o nível interno da organização.
De acordo com Freire et al (2008), a ênfase do modelo de Ackerman não está na
aceitação moral, mas na acção Gerencial para responder às demandas sociais.
Na perspectiva de Ackerman as empresas passam por três fases no qual desenvolvem
uma reação às questões sociais. A primeira fase refere-se ao surgimento de um
problema social que é detectada pelos executivos do topo gerencial. Na segunda fase é
accionada especialistas para propor solução e apresentar planos de acção. E, na terceira
fase a acção proposta vai ser implementada de forma integrada com a política
empresarial.
De acordo com Freire et al (2008), esse modelo foi criticado principalmente pelo espaço
de tempo concedido entre as fases até se executar a acção, pois, na prática gera uma
demora que pode resultar em cobranças do governo ou da opinião pública, forçando a
empresa a agir.
1.6 Ética e Responsabilidade Social
De acordo com Jorge F.S Gomes et al (2006) a integração da ética no discurso da
gestão, assim como a ascensão de responsabilidades sociais por parte das empresas,
constituem duas mudanças mais significativas ocorridas nas últimas décadas.
Segundo Sebastião Teixeira (1998:212), a ética é a disciplina do conhecimento acerca
do que é bom e mau, certo e errado, dever moral ou obrigação.
26
No plano empresarial, a ética tem a ver com os comportamentos e a tomada de
decisões, ou seja, as escolhas efectuadas face a uma pluralidade de hipóteses, tendo
como pano de fundo o conceito de moralidade aplicado aos negócios.
A preocupação das empresas em transmitir uma imagem eticamente responsável
pressupõe o reconhecimento de que o seu papel na comunidade transcende a esfera
económica (Donaldson e Preston:1995, apud, Cardoso:2006:16).
Admitir que a empresa é eticamente responsável equivale a dizer que ela não se limita
ao mero cumprimento dos normativos legais, mas comporta-se de acordo com o que a
sociedade espera dela (Ferrell, Fraedrich e Ferrell:2002, apud, Cardoso:2006:16).
Segundo Davies citado por Cardoso (2006) uma empresa eticamente responsável é
aquela que assume obrigações de contribuir para o bem-estar da comunidade.
Já Wood vai mais longe dizendo que uma empresa eticamente responsável tem que
actuar em três níveis distintos (Wood:1991, apud, Cardoso:2006).
A nível institucional, reconhece que a sociedade atribui poder e legitimidade à empresa,
mas essa atribuição pressupõe que a empresa os utiliza de forma socialmente
responsável. A nível organizacional, considera que a empresa é sempre responsável
pelos efeitos, consequências e impactos, directos e indirectos da sua actividade. A nível
individual, a responsabilidade social assenta no princípio da responsabilização
individual do gestor, ou seja, a dimensão moral do gestor dá-lhe a responsabilidade de
utilizar a discricionariedade de que dispõe na tomada de decisões, de forma socialmente
responsável.
Para Miguel Pina Cunha et al (2007) quando se fala da ética, as empresas devem ter em
conta o que é correcto fazer e que princípios éticos cumprir. Mais ainda, quais os
princípios éticos pelas quais as empresas e a gestão devem reger-se, independentemente
dos efeitos económicos que daí podem surtir.
27
De entre os actos que motivaram o incremento da ética no mundo empresarial
destacam-se os altos gastos com escândalos nas empresas, multas elevadas,
desmotivação dos empregados e a perda da credibilidade.
A sociedade cobra das empresas uma actuação responsável e o consumidor tem
consciência dos seus direitos e passa a exigir das empresas uma nova postura que
explique suas preocupações com questões sociais e com a ética.
E para garantir que todos os membros de uma organização ajam de maneira ética, há
necessidade da empresa estabelecer um sistema de valores, padrões e políticas
uniformes, ou seja, estabelecer um código de conduta ou código de ética para que os
colaboradores saibam qual a conduta adequada ou apropriada em qualquer
circunstância.
Isso vai de encontro ao pensamento de Gonçalves (citado por Maria Jesus 2007), pois
para ele um código de ética empresarial bem elaborado e implantado pode ajudar a
organização a solucionar questões, antes que estes se tornam grandes problemas. A sua
concepção deve envolver todos os interlocutores com os quais a empresa se relaciona
para que haja sucesso. Onde seu principal objectivo é o de comunicar com precisão
quais os princípios deverão ser seguidos, operando como elemento de padronização da
interpretação da empresa a respeito do que é certo e do que é errado em cada conduta. A
existência de um código de ética na organização evita que os julgamentos subjectivos
deturpem, impeçam ou restrinjam a aplicação plena dos princípios.
1.7 A Responsabilidade Social/Filantropia
A acção filantrópica foi a primeira forma encontrada pelas empresas para
desencadearem as suas acções, tendo em conta os interesses da sociedade, por isso
actualmente é bastante comum confundir a filantropia com acções de responsabilidade
social.
De acordo com Ribeiro (citado por Maria Jesus:2007) «a filantropia foi o primeiro
passo em direcção à responsabilidade social, representando apenas uma pequena
28
parcela do conceito que evolui ao longo do tempo». A compreensão do conceito de
responsabilidade social muitas vezes assume características distintas.
Melo Neto e Froes consideram que a filantropia diverge da responsabilidade social, pois
é praticada de forma isolada ou sistemáticamente, enquanto que a responsabilidade
social abarca acções inseridas no planeamento estratégico como na cultura da
organização praticada com base na sustentabilidade (Ribeiro:2006, apud, Maria
Jesus:2007).
Consideram ainda que as acções de responsabilidade social exigem periodicidade,
método, sistematização e principalmente gestão efectiva por parte das empresas,
enquanto que as acções de filantropia são consideradas acções esporádicas, ou seja, não
necessitam de planeamento, organização, acompanhamento e avaliação e decorrem de
uma acção individual e voluntária.
Na perspectiva de Souza (citado por Maria Jesus:2007) a partir do momento em que o
homem toma consciência dos seus deveres e direitos dentro do grupo no qual está
inserido a responsabilidade torna um valor intrínseco que é concedido ao mesmo. Isso
se transfere para as organizações, pois, possuem responsabilidades e dependendo do
ângulo em que são analisados, apresentam dimensões diferentes.
Realça que com a realização de acções filantrópicas, a responsabilidade social das
empresas foi considerada por muito tempo como satisfeita pela sociedade. Isto é, através
de pequenas doações as empresas ganhavam um grande prestígio dentro da sociedade
pois transmitiam a ideia de uma empresa preocupada com o bem-estar da sociedade e
por isso eram consideradas de socialmente responsáveis.
Houve tempos em que as empresas eram consideradas responsáveis pelo facto de
gerarem lucros aos seus accionistas. Mas, com o evoluir dos tempos a responsabilidade
social passou a ser considerado mais do que uma mera doação, um instrumento de
gestão e parte do planeamento estratégico. Assim com os grandes focos de informação e
conhecimento, a sociedade tornou-se mais crítica e consciente, e está a exigir das
empresas muito mais do que o lucro ou simples doação.
29
A empresa age de forma estratégica quando se fala de Responsabilidade Social
Empresarial, ou seja, são traçadas metas para atender as necessidades, de forma que o
lucro da mesma seja garantido, assim como a satisfação dos clientes e o bem-estar
social (Duarte e Torres:2004, apud, Maria Jesus:2007).
1.8 Princípios de Responsabilidade Social Empresarial
Os princípios de responsabilidade social empresarial foram estabelecidos por Wood em
1991 no seu modelo de desempenho social. «Os princípios de responsabilidade social
empresarial traduzem a ideia de que o negócio e a sociedade são entidades
combinadas, com isso a sociedade prevê expectativas com relação à forma de agir de
uma organização e com os seus resultados»(Sousa:2004, apud, Maria Jesus:2007).
Wood destacou os seguintes princípios:
Princípio da Legitimidade
O nivel de aplicação desse princípio é institucional, ou seja, a forma da organização dos
negócios e o seu foco é virado para as obrigações e sanções. Assim, a sociedade
concede legitimidade e poder ao negócio e espera que as organizações os utilizam da
melhor maneira possível. Aquelas que assim não o fizerem correm o risco de perder
essa legitimidade e poder, ou seja, a própria sociedade se encarrega de sancionar a
organização. Sanções essas que chegam até ao desaparecimento da organização.
Princípio da Responsabilidade Pública
A sua aplicação é organizacional, responsabilizando os negócios pelos resultados
relacionados às suas áreas primárias e secundárias de envolvimento com a sociedade.
Mais ainda, baseia-se nas circunstâncias e relacionamentos específicos da firma com o
ambiente, onde o foco é virado para parâmetros comportamentais das organizações.
30
Princípio da escolha Gerencial ou Prudência
Neste princípio, o nivel de aplicação é individual, baseado nas pessoas como
protagonistas dentro das organizações. Os gerentes são vistos como protagonistas
morais, e dentro do domínio da responsabilidade empresarial eles são obrigados a
exercitar essas escolhas da maneira que lhes é disponível, em direcção aos resultados
socialmente responsáveis. O foco é virado para a escolha, oportunidade e
responsabilidade pessoal, ou seja, devem seguir e exercitar escolhas a serviço da
responsabilidade social.
Assim, nota-se que há alguns princípios de responsabilidade social que orientam a
actuação das empresas, de modo que as mesmas possam enveredar por caminhos certos,
pois, o cumprimento desses princípios traduz-se em ganhos gratificantes tanto para a
empresa como para a sociedade em geral.
Pode-se dizer que uma empresa que prima por esses princípios de responsabilidade
social e pratica as acções anteriormente citadas pode ser considerada como socialmente
responsável.
1.9 Ganhos Obtidos com a Prática da Responsabilidade Social
Vários autores já destacaram os ganhos obtidos com a prática da responsabilidade social
empresarial por parte das empresas, pois, a prática socialmente responsável não tráz
benefícios apenas para os Stakeholders e para a sociedade, mas também para a própria
empresa.
Segundo Guedes (citado por Maria Jesus:2007) a prática da responsabilidade social gera
benefícios como: melhoria da imagem e aumento de vendas pelo fortalecimento e
fidelidade à marca do produto; ganhos dos accionistas e investidores, valorização da
empresa na sociedade e no mercado; retorno publicitário, advindo da geração dos media
espontânea; redução das taxas tributadas, com investimentos fiscais e isenções
oferecidos para empresas envolvidas com projectos sociais; melhoria da produtividade e
31
do bem-estar das pessoas, pelo maior empenho, motivação e comprometimento dos
empregados; ganhos sociais pelas mudanças comportamentais e corporativas da
sociedade.
Uma outra autora que destacou os ganhos da prática da responsabilidade social foi a
Ashlei. A perspectiva de Ashlei de acordo com Maria Jesus é que a empresa ao adoptar
uma estratégia de responsabilidade social alcança grandes benefícios para si mesma tais
como:
Prevenção dos riscos e contratempos que poderão surgir, pois a empresa estará
melhor preparada para enfrentar riscos como (acidentes industriais e ecológicas,
greves, mudança de regulamentos) que possam vir ameaçar a sua reputação e
performance;
Redução de custos ao reduzir a sua produção de resíduos e melhorar a eficácia
com que utiliza os seus recursos naturais e renováveis e não renováveis;
Inovação, pois, há necessidade de integrar novas formas de agir para que a
qualidade dos serviços prestados continuem a agregar valores aos clientes
mantendo-os fiéis;
O processo de inovação leva à diferenciação e aumento de valor para a marca,
fazendo com que a empresa mantenha forte no mercado e actue de forma
responsável social e ambientalmente;
A actuação responsável leva a melhoria da reputação, pois, há maior confiança
por parte dos stakeholders, aumentando sua fidelização, abrindo-lhe novas
oportunidades no mercado e levando à melhoria da performance económica e
financeira.
Rego et al. (citados por Maria Jesus:2007) vão mais longe e destacam
pormenorizadamente os benefícios da prática socialmente responsável.
A prática socialmente responsável cria um melhor ambiente de trabalho, pois,
propicia benefícios para os colaboradores da empresa, a mesma induz níveis
superiores de empenho, facultando mais criatividade e produtividade e menos
absentismo;
32
As empresas ditas cidadãs geram um clima favorável entre os seus colaboradores
que estimula a adopção de comportamentos de cidadania organizacional;
As empresas confrontam com menos custos com acidentes e doenças ao
introduzir sistemas preventivos no que toca à higiene, saúde e segurança no
trabalho;
De modo a melhorar a imagem junto dos consumidores e reforçar o desejo de
compra a empresa pode adoptar medidas filantrópicas;
O cumprimento da regulamentação é uma forma de manter boa reputação e
evitar custos judiciais;
As instituições financeiras antes de conceder empréstimos ou investir nas
empresas verificam o carácter social e ambiental das mesmas de modo a evitar
riscos;
A participação dos trabalhadores ou seus representantes na tomada de decisão
contribuem para decisões de melhor qualidade e maior empenho dos mesmos na
implementação das decisões tomadas;
As políticas de formação dos trabalhadores aumentam as suas competências
técnicas e sociais, aumentando assim o desempenho individual e organizacional;
As empresas que primam pelas práticas socialmente responsáveis podem ter
menores conflitos com ONG, comunidades locais, trabalhadores, entidades
públicas, órgãos governamentais, etc.
Assim, podemos considerar que uma empresa só tem a ganhar com a prática da
responsabilidade social, pois atrai benefícios não só para a empresa como para a
sociedade, o que faz com que a mesma se instale cada vez mais no mercado, ganhando
assim confiança e credibilidade por parte da comunidade onde está inserida, o que
traduz numa mais-valia para a própria empresa.
33
2 Reflexão Sobre Novos Problemas Sociais na Modernidade
Cabo Verde enfrenta hoje novos e velhos desafios (Pobreza urbana, Criminalidade,
Violência, desigualdades sociais, Narcotráfico, Assimetrias regionais, etc) que são
problemas micro e macro que desembocam violentamente nas comunidades. Neste
sentido a sociedade Cabo-Verdiana tornou-se também uma nova sociedade de risco,
com novas ameaças. Por isso, recorremos a Guiddens, de forma a ajudar-nos a
compreender a (ir)responsabilidade das empresas e das políticas.
A sociedade e os individuos são confrontados com novas formas de organização social,
e segundo Guiddens (2002), essas instituições modernas apresentam certas
descontinuidades com as culturas e modo de vida pré-modernos, ou seja, há uma certa
ruptura com as formas tradicionais de estar na sociedade, onde novos padrões de
comportamento emergem, pondo em causa as práticas sociais e os modos de
comportamento pré-existentes.
O mundo moderno, é um mundo em constante mutação, onde o rítmo da mudança
social é cada vez mais rápido, e as influências sobre os padrões comportamentais pré-
estabelecidas são cada vez maiores. Os indivíduos deparam com novas formas de estar e
portar na sociedade, pois, com a globalização, produzida pela própria modernidade,
acabam por assimilar aspectos comportamentais de outras culturas, territórios, tornando-
os como um estilo de vida próprio, por exemplo, a forma de vestir, de comportar na
sociedade, a preferência por determinados tipos de músicas, de outros países, acabam
sendo trazidas para dentro do seu contexto social quotidiano.
Isso pode contradizer os parámetros comportamentais estabelecidos pela própria
sociedade, pois, esses indivíduos, comportam de uma forma que a mesma não prevê,
afastando-se cada vez mais, das formas tradicionais de comportamentos, adoptando um
estilo próprio de estar na sociedade. Assim, não agindo de acordo com aquilo que a
sociedade espera, muitos acabam sendo excluídos da vida em sociedade, por adoptar um
estilo diferente, o que faz com que a convivência e as relações sociais sejam cada vez
mais fracas e distantes.
34
Os principais responsáveis por esse mundo glabalizado, são sem dúvida os meios de
comunicação. Na perspectiva de Guiddens (2002), assim como os jornais, revistas,
periódicos, ou outros tipos de matéria impressa, a televisão, o cinema e os vídeos são
tanto a expressão das tendências globalizantes.
Os meios de comunicação permitem aos indivíduos estar em contacto permanente com
os acontecimentos, no momento em que os mesmos acontecem. Através desses meios
podem ter acesso a particularidades de outras culturas, outros países, sem ter de deslocar
do seu próprio território.
Antigamente, os indivíduos eram socializados primeiramente pela família, hoje num
mundo moderno, onde tanto o homem como a mulher trabalham, essa tarefa está sendo
delegada para outros agentes, e os meios de comunicação não ficam de fora.
Muitas crianças e jovens quando não estão na escola, ficam a maior parte do tempo à
frente da televisão ou do computador, onde são confrontados frequentemente com novos
acontecimentos, em que muitas vezes os mesmos não estão preparados, nem têm
capacidades suficientes para digeri-los. Muitas vezes, são confrontados com formas
violentas e erradas de comportamentos, e, acabam por incutir esses elementos,
reproduzindo aquilo que viram pelo facto de terem visto na televisão ou na internet.
Isso acaba por interferir no próprio eu do indivíduo, provocando mudanças a nível
psicológico, influenciando as suas práticas sociais, pois, muitos dos acontecimentos que
são exibidos pelos media acabam sendo experimentados pelo individuo por serem
exteriores à sua realidade e muitos acabam por fazer parte da sua actividade diária. Mais
ainda, acontecimentos que são considerados raros na vida quotidiana, (como a morte),
são frequentemente transmitidos nas representações mediáticas como algo normal.
Assim, há uma certa confusão por parte do próprio indivíduo, visto que, por um lado
temos aquilo que a sociedade estabelece como padrão, e por outro temos aquilo que os
media reproduzem.
35
Segundo Guiddens (2002), a auto-identidade se torna probemática na modernidade de
uma maneira que se contrasta com as relações eu/sociedade em contextos mais
tradicionais.
Cada vez mais os indivíduos estão afastando das práticas sociais e dos modos de
comportamentos pré-estabelecidos, pois, com os novos eventos e acontecimentos,
advindos da alta modernidade e da globalização, estão adoptando novas formas de
comportamento e de estar na sociedade, criando a sua própria forma de pensar, agir,
comportar, rompendo de alguma forma com os padrões ditadas pela sociedade.
Desta forma, muitos acabam sendo influenciados positiva e negativamente pelos
acontecimentos trazidos pela alta modernidade, pois, muitas vezes, acabam por
reproduzir, imitar, tudo o que vêem pela frente, e nem sempre, tudo que advém dessa
modernidade é o ideal a ser seguido.
Da mesma forma que a modernidade traz benefícios para a humanidade, pode trazer
também novas situações de risco e perigo, com que o indivíduo não está acostumado.
Guiddens fala da sociedade de risco, ou seja, a vida social moderna traz consigo novas
formas de perigos que a humanidade terá que enfrentar.
Por isso Bauman (2003) faz referência à comunidade como um paraíso perdido, na
medida em que, na comunidade realmente existente hoje, para termos segurança temos
que abrir mão da nossa liberdade ou parte dela, não devemos confiar nem falar com
estranhos, se quisermos protecção não devemos acolher estranhos na nossa casa e para
termos a sensação de um lar aconchegante temos de istalar alarmes e câmaras nas
nossas moradias.
Fala que há sempre um preço a pagar pelo privilégio de viver em comunidade, e é pago
de certa forma através da nossa liberdade. Para o mesmo não ter comunidade significa
não ter protecção, e se quisermos protecção temos que abrir mão da nossa liberdade.
Segurança e liberdade são dois valores desejados, mas que não podem ser alcançados ao
mesmo tempo, pois para termos segurança privamos da nossa liberdade, e se quisermos
ter a plena autonomia pomos em causa a nossa segurança.
36
Os acontecimentos provenientes da era moderna, ao mesmo tempo que ensina coisas
novas, abre novos horizontes para os indivíduos, traz também disabores para os
mesmos. Muitos dos problemas que temos hoje, são de alguma forma consequências
dessa alta modernidade e globalização.
O que Bauman (2007) chama de glabalização negativa, pois a sociedade está cada vez
mais sujeita aos efeitos e imprevistos da globalização negativa. Uma globalização da
informação, da violência, das armas, do crime e do terrorismo. Fala que numa sociedade
negativamente globalizada a segurança não pode ser obtida, muito menos assegurada, a
justiça uma condição preliminar da paz também não pode ser obtida, visto que a
abertura da sociedade face a essa globalização negativa é a causa principal da injustiça,
do conflito e da violência.
Os jovens são cada vez mais socializados com novas formas de diversão como filmes,
jogos violentos, diferenciando-se das gerações anteriores que tinham como lazer
histórias, contos, anedotas, e uma forte colaboração dos familiares na educação dos
filhos.
Estão a se afastar cada vez mais dos padrões comportamentais anteriormente
estabelecidos, contrariando as normas, valores, costumes, pré-estabelecidos, criando a
sua própria forma de estar e comportar na sociedade.
Com isso, muitos acabam por ser marginalizados e excluídos pela própria sociedade,
pelo facto de terem um estilo próprio de estar e comportar na sociedade.
Tudo torna-se mais complicado quando muitas acreditam que estes jovens estão
envolvidos no mundo da criminalidade, o que os torna mais revoltados. Como constatou
o Sociólogo João José Tavares Monteiro no seu estudo Para uma nova Perspectiva
Sociológica do Fenómeno “Thug” na Cidade da Praia (Estudo de Caso em Achada
Grande Frente e Lém Ferreira), muitos jovens que se identificam com certos grupos
através de tatuagem, dança, rap, vestuário, nunca usaram outra droga para além do
álcool, nem fazem assaltos nem qualquer tipo de agressões. O seu laço com o grupo dá-
se pelo facto de pertencerem à mesma comunidade e pela valorização da cultura hip
hop.
37
Muitas vezes, por causa dessa exclusão dos indivíduos, pelo simples facto de usarem
uma roupa diferente ou de terem um estilo próprio, acabam de facto por adoptar
comportamentos desviantes, pois, se já estão excluídos pela própria sociedade, porquê
continuar agindo de acordo com aquilo que a mesma estabelece. O que leva muitos a
reunirem-se em grupo como forma de defesa pessoal e de grupo, criando uma nova
ordem social periférica, as suas próprias leis e valores simbólicos, onde as instituições
como a Família e o Estado tendem a perder significado e nem os seus valores e
símbolos são transmitidos, aceitados ou respeitados.
O que contribui para criar uma certa desorganização dentro da sociedade, pois, o
individuo já não vai agir de acordo com os padrões comportamentais estabelecidos pela
mesma, as normas, leis, valores, da sociedade deixam de ser seguidos, criando as suas
próprias normas, valores e agindo de acordo com aquilo que o mesmo considera como
sendo certo e errado.
Com isso, o acesso a drogas, ao álcool e às armas de fogo é cada vez mais fácil,
tornando a vida em sociedade mais complicada, pois, estes comportamentos tornam-se
problemáticos nas comunidades, tiroteios nocturnos que tiram o sono e a tranquilidade
às familias, assaltos, ajustes de conta, extorsão, condutas agressivas, são cada vez mais
frequentes.
Os grupos tornam-se mais organizados, os conflitos rivais se intensificam, a divisão de
território dentro dos próprios bairros leva à emergência de conflitos internos nas
comunidades.
Como constata o autor João José muitos jovens sentem-se obrigados a abandonar a
escola por causa dos conflitos rivais, perdendo oportunidades de emprego e de outras
formações, adiando perpectivas profissionais, e passam todo o seu tempo em bairros
que não possuem condições de infra-estruturas para ocupação dos tempos livres.
Muitas vezes, são jovens provinientes de familias pobres, com vínculo familiar
deficitário e disfuncional, com fracos recursos, onde a escola é vista como periférico na
promoção da mobilidade social ascendente, ficando apenas pela escolaridade mínima
38
obrigatória que não lhes dão a garantia de ascenção social, o que provoca mais
desigualdade social.
Pior ainda é o que se nota no quotidiano, vivências em bairros degradados e
desorganizados, ausência de políticas municipais virados para os seus nichos de
desenvolvimento e criação de recursos, equipamentos sociais para os mais vulneráveis,
disfuncionalidades familiares, onde encontramos famìlias vivendo em condições
miseráveis.
Com isso, muitos ficam sem alternativas, viram-se contra a lei e a ordem estabelecida,
caem no desespero e procuram refúgio nas drogas, nos conflitos como forma de
aliviarem as suas preocupações.
O problema intensifica-se, pois não só os jovens ficam marginalizados como a
comunidade transmite uma onda negativa, enfraquecendo as relações sociais e a coesão
social, tornando a convivência entre as pessoas mais distantes por causa do medo social
que a própria comunidade representa.
De acordo com João José (2010) muitos jovens mostram-se dispostos a saírem dessa
vida, desde que lhes sejam facultados meios e oportunidades que constituem motivações
e estímulos suficientes para realizarem as suas expectativas, visto que ao estudar mais
de perto estes jovens, notou profundas diferenças marcadas pelo espírito de convivência
e comunitarismo, onde o desejo de viver, de progredir na vida se nota claramente nas
suas representações simbólicas como rap, dança, pintura, grafitte, desporto entre outros.
Constatou ainda que o que intensifica este fenómeno é a ausência de uma política geral
e prevencão radical, com intervenções psicosociais, comunitárias e judiciais com
tolerância dirigida a certas camadas da população juvenil mais vulnerável, permitindo a
sua inclusão nos mais diversos niveis.
Não se verifica responsabilidade social por parte de empresas locais, com vista à
melhoria das comunidades, pois não promovem acções sociais que ajudem de alguma
forma no desenvolvimento das mesmas, principalmente no que diz respeito à criação de
39
infra-estruturas que permitem aos jovens ter uma educação de qualidade, permitindo-
lhes uma certa ascenção social e infra-estruturas de lazer que lhes permita passar o
tempo livre de forma mais saudável possível, de modo que os mesmos não caem no
desânimo e escolham os meios mais inviaveis para resolverem os seus problemas.
Caso houvesse uma maior responsabilidade social por parte das empresas nas
comunidades onde operam, principalmente nas zonas de Achada Grande e Lém Ferreira
onde estão situadas grandes empresas, teríamos menos problemas sociais afectando
estas zonas. Se procurassem intaragir mais com as comunidades locais através de
associações ou grupos recreativos, procurando compreender as suas necessidades e os
seus problemas e juntos estabelecer linhas de acção, (uma vez que as associações
comunitárias estão mais aptas para identificar quais os problemas carecem de uma
intervenção rápida), como forma de resolver ou minimizar tais problemas, não teriamos
graves problemas assolando a sociedade.
Como sabemos muitos problemas que existem nas comunidades devem-se ao facto das
mesmas não reunirem condições adequadas que permitam aos jovens terminarem a sua
formação académica, inexistência de infra-estruturas onde possam aprimorar melhor o
seu conhecimento e locais onde possam divertir, conviver nas horas livres. Com isso,
muitos ficam com a ideia de que nessas comunidades não têm oportunidades nem
possibilidades de ascender socialmente, que as mesmas não ofrecem alternativas aos
jovens, o que os torna mais revoltados e leva muitos a procurar solução nos
comportamentos desviantes, comportamentos estes que se tornam cada vez mais
problemáticos nas comunidades, pois não só os jovens ficam penalizados com essas
condutas, como a convivência fica condicionada e a imagem denegrida.
40
Capítulo 2
Caracterização da Enapor
Criação da Empresa Nacional de Administração dos Portos-ENAPOR-E.P
A ENAPOR-EP foi criada com sede em Mindelo, a partir do Decreto nº 58/82 de 19
Junho de 1982, que extinguiu por completo a Junta Autónoma dos Portos de Cabo
Verde e criou a ENAPOR com o objectivo de administrar e explorar economicamente
os Portos de Cabo Verde, sob tutela do Ministério dos Transportes e Comunicações e
com um capital social de 150.000.000$00.
Em 1992 foi alterada os estatutos da ENAPOR-EP, através do Decreto nº 20/92 de 8 de
Fevereiro. O capital social da Enapor passou de 150.000.000.$00 para 750.000.000$00
e o conselho de Direcção passou a designar Conselho de Administração, tendo sido
reforçada a sua competência.
A partir da publicação do Decreto Regulamentar nº 4/2001 de 4 de Junho onde foram
criadas condições objectivas para a participação dos privados na gestão portuária, deu-
se a transformação da ENAPOR-EP para Sociedade Anónima de capitais públicos de
direito comercial privado. Manteve-se o capital social de 750.000.000$00 que foi
dividido em 75.000 acções com o valor nominal de 10.000$00 cada. A Assembleia
Geral, o Conselho de Administração e o Conselho Fiscal, são os novos órgãos sociais da
Enapor-S.A.
Missão e Objectivos
A Enapor SA destaca como missão continuar a criar um contexto de negócios portuário
saudável, competitivo, diversificado e sempre crescente, num quadro de parcerias e
cooperação, com o compromisso assumido por todos os trabalhadores da empresa;
almeja construir infra-estruturas adequadas, apetrechar-se com as suas super-estruturas
necessárias e adoptar as novas tecnologias para servir, num nível de excelência, todos os
41
clientes portuários; realça a vontade de atender ao ambiente envolvente e ao bem-estar
das populações e preparar, hoje, o desenvolvimento futuro do negócio portuário em
Cabo Verde.
No cerne dos seus objectivos a Enapor realça o desejo de apostar sempre na expansão e
melhoria da qualidade dos serviços para dar vazão ao aumento natural da quantidade do
tráfego e diversificar os serviços portuários com vista a melhor servir os utentes e
aumentar o seu volume de negócios, a nível nacional; a nível internacional a empresa
prospera preparar e especializar gradualmente um porto para internacionalização do
sistema portuário cabo-verdiano nos sectores de transbordo de contentores, turismo de
cruzeiro e transbordo de pescado; almeja ainda prestar um serviço portuário de
passagem de mercadorias e passageiros em condições de segurança e qualidade,
promovendo ao mesmo tempo uma viva interacção entre os portos e as comunidades, ao
menor custo.
No que diz respeito à orgânica, a Enapor dispõe das seguintes estruturas: Assessoria
Jurídica e Técnica; Direcção de Operações (Departamento de Tráfego de Mercadorias,
Serviço de Assistência ao Navio, Serviço de Mão-de-Obra Portuária, Serviço de
Segurança e Ambiente, Serviço de armazenagem); Direcção Financeira (Departamento
financeiro, Serviço Contabilidade geral, Analítica e património, serviço de
Aprovisionamentos); Direcção de Engenharia (Serviço de Equipamentos, Serviço de
Infra-estruturas); Departamento de Recursos Humanos (Serviço Administrativo e de
Pessoal, Serviço de Desenvolvimento dos Recursos Humanos); Departamento
Comercial; Departamento de Informática.
O Porto da Praia, a primeira infra-estrutura do país em movimento de carga geral,
funciona com um staff de cento e setenta e sete trabalhadores. A maioria do pessoal
encontra-se afecto à Direcção de Operações, que engloba um total de noventa
trabalhadores. O segundo serviço em termos de afectação do pessoal é o Departamento
dos Recursos Humanos, que movimenta trinta técnicos. A Direcção de Engenharia é
outro departamento importante na vida do Porto da Praia. O seu staff é composto por
vinte e um técnicos, quinze deles quadros da Enapor. O resto dos recursos humanos está
afecto à Direcção Financeira (17 pessoas), Departamento de Informática (2), Comercial
(11) e Gabinete de Apoio ao Porto da Praia, com seis técnicos. A expressiva maioria dos
42
trabalhadores do porto da Praia tem entre 36 e cinquenta anos de idade. Esta faixa
envolve um total de cento e vinte trabalhadores. Deste grupo, oitenta e sete estão na
faixa etária dos 41 aos 50 anos de idade. O funcionário mais jovem tem vinte e seis anos
e o mais antigo já ultrapassou a casa dos sessenta.
Um corpo de estiva experiente, com mais de 200 trabalhadores, garante as operações de
carga e descarga como também as demais operações dentro do porto.
43
Capítulo 3
Caracterização das Associações A.C Lénfer, ADMTG, ACRIDES
1- Entender o Terceiro Sector Para se Agir Socialmente
Internacionalmente fala-se do terceiro sector como uma nova forma de economia
alternativa e de promoção da política de emprego, um modo de induzir a sociabilidade,
ou um espaço favorável ao desenvolvimento da democracia local.
As instituições do terceiro sector começaram-se a fragmentar nos finais do século XIX e
inicios do século XX, onde estabeleceram-se três sub-conjuntos: cooperativas,
principalmente de consumo, habitação, agrícolas, que inseriram na economia de
mercado, embora a intensidade capitalista permaneceu fraca; associativismo em que as
associações tiveram um papel de pressão social, possibilitando a expressão de
reivindicações e mobilizando redes que estimulavam a criação de prestações de serviços
públicos. Por fim, o mutualismo, em que o surgimento do Estado Providência modificou
o papel desempenhado pelas mutualidades, onde muitas iniciativas foram organizadas
para resolver problemas relacionados com a incapacidade no trabalho, doença e velhice,
de modo a reagrupar membros de uma profissão ou de uma localidade.
De acordo com Nardi Sousa (2003b) muitos termos utilizados para definir o terceiro
sector tiveram origem no contexo anglosaxónico. De acordo com Stanzani (citado por
Nardi Sousa) os termos mais utilizados são charities ou charitable sector que diz
respeito a organizações com fins criativas, que gozam de tratamento fiscal priviligiado,
orientado pela acção organizada, consistente na ajuda a pessoas desfavorecidas. Um
outro termo muito utilizado é voluntary sector que traduz o envolvimento voluntário
dos membros da organização, o fornecimento voluntário do trabalho gratuito e a doação
voluntária de recursos económicos por parte de cidadãos e empresas privadas.
Philanthropy ou philanthropic sector também bastante utilizado, refere-se a uma acção
voluntária, gratuita, orientado por um objectivo benigno.
44
Ainda no contexto anglosaxónico existem outros termos usados para referir ao terceiro
sector. São eles: independent sector, informal sector e non-governamental sector.
O primeiro referindo às organizações que por realizarem actividades de caracter
público, têm plena autonomia para determinar a metodologia e destinatários da sua
acção, a forma de emprego dos seus recursos e os dirigentes da própria organização. O
segundo realça a informalidade, espontaneidade, voluntariedade e ausência de
constrangimentos políticos da organização. O último caracteriza a independência da
organização dos departamentos governamentais, imposto pelas entidades ou
representantes públicos.
Nardi Sousa realça ainda que no contexto europeu também produziram-se alguns termos
para definir o terceiro sector. O mais utilizado é economia social, que faz referência a
uma acção económica baseada no princípio da supremacia da pessoa e guiada por
valores de mutualismo e solidariedade. Esssa nova economia foi usada para designar
novas iniciativas, novos actores, respostas a novos pedidos ou ainda novas formas de
organização. Tem uma noção de utilidade social, inovação e contribuição ao
desenvolvimento local e gere à volta das noções de inserção pelo económico, de
desenvolvimento comunitário e de luta contra exclusão. A economia social faz
referência a formas organizativas como as associações, cooperativas e mutualismo. Está
regido por regras como: “um homem, um voto”, que indica a supremacia da pessoa
sobre o capital; porta aberta em que os membros tem a plena liberdade para entrarem e
saírem da organização; escolha democrática dos dirigentes; indivisibilidade do lucro e
devolução do património aquando da dissolução da organização.
Um outro termo bastante utilizado é o de empresa social referindo a empresas que
funcionam com base numa forte orientação solidária e pró-social, caracterizando-as para
além das suas finalidades sociais e dinâmica empresarial, mas também por uma forte
dimensão de produção de bens e serviços e uma intensa participação das partes
envolvidas na vida da empresa.
Assim, podemos ver que é possivel fazer uma distinção à volta de duas terminologias
diferentes, a de origem anglosaxónica que centrou a sua atenção no princípio de não
distribuição de rendimentos, indicando a utilidade pública das organizações do terceiro
sector, embora não faz referência aos tipos de organizações que podem fazer parte do
45
terceiro sector, e a de origem europeia destacando a economia social que integra
organizações com fins lucrativas como as cooperativas que têm uma condição de
distribuição dos lucros. Essa última, caracterizada principalmente pela democraticidade
dos membros, em que a representação dos mesmos não é baseado no capital investido,
mas na simples pertença ou solidariedade que liga os membros da organização. No
entanto, ambos primam pelo princípio da livre participação e voluntariedade dos
membros na vida da organização. Na primeira, a voluntariedade expressa-se pelo
contributo voluntário gratuito em dinheiro ou em trabalho prestado e na outra a
liberdade é traduzida no princípio de porta aberta no qual os membros têm a plena
liberdade para entrar e sair da organização.
Ainda segundo Nardi Sousa (2003b) com essas duas terminologias surgiu uma
tendência sincrética do termo terceiro sector, caracterizando um sector da sociedade
diferente do primeiro sector, o mercado e do Estado segundo sector. Uma definição que
por subtrair algumas características específicas do tipo de relações sociais organizadas,
consegue aperfeiçoar o conceito exposto nos dois contextos. Desta forma, o terceiro
sector seria visto como uma esfera composto pelas cooperativas, mutualismo e
organizações não- lucrativas.
Fala que apesar desse sincretismo a categoria do terceiro sector mantém-se fraca do
ponto de vista conceptual, falta uma visão puramente sociológica do fenómeno, que o
defina de forma positiva, a partir das suas características específicas. Neste caso, faz
alusão ao termo privado social que pode relacionar-se com o terceiro sector. Para Donati
(citado por Nardi Sousa:2003b) o terceiro sector é a modalidade como as relações do
privado social se organizam e se relacionam com o Estado e o mercado. Para ele, o
termo terceiro sector faz referência a aspectos de ausência de fins lucrativas, de não
distribuição de rendimentos, de trabalho voluntário, enquanto que privado social indica
aspectos de solidariedade, de bens relacionais de auto-organização de esferas de
relações sociais caracterizadas pela reciprocidade e orientação pro-social. Privado social
refere a uma nova forma de ser da sociedade ocidental que pretende caracterizar
relações privadas que para além de prosseguir uma orientação privada, busca uma
orientação pro-social ou aberta ao outro, segundo uma perspectiva universalista. O
terceiro sector exprime a emergência da relacionalidade típica da modernidade, deste
modo, privado social e terceiro sector são duas prespectivas de observação do mesmo
46
fenómeno, que não pode ser considerado externo/excluído à sociedade mas sim
intrínseca à mesma, visto que enquanto privado social exprime essa relacionalidade.
Alguns autores já deram a sua contribuição para um melhor entendimento do terceiro
sector.
Lucia Boccacin (citado por Nardi Sousa:2003b) entende o terceiro sector como um
conjunto de formações sociais dotadas de características de comunidade e sociedade,
movidos por um agir colectivo com mecanismos estáveis de solidariedade, entendidos
como um conjunto de ligações afectivas e morais que unem os homens entre si,
movendo-os para a ajuda recíproca, produzindo um bem comum.
Já Colozzi também (citado por Nardi Sousa) fala que reentra no terceiro sector ou sector
não-lucrativo toda a organização não governamental que produz/fornece serviço de
interesse colectivo e que está vinculado na não distribuição de nenhum tipo de
rendimento aos próprios membros nem no momento de dissolução da organização.
Nardi Sousa realça que Henri Desroche entende que a economia social ou terceiro
sector seria composta por três sub-conjuntos principais: as empresas cooperativas, as
associações e o mutualismo. De acordo com o mesmo ao longo dos anos essas
experiências foram realizadas através de modelos e formas organizativas diferentes, e
teria movido actores colectivos interagindo em quatro ambientes diferentes: sector
público, comunitário, sindical e o sector privado de economia de mercado.
Por seu lado, Victor Pestoff considera o terceiro sector como a esfera de relações sociais
que são privadas, formais e não lucrativas. O que no endender de Nardi Sousa é
limitado, pois, formal, privado e não lucrativo são categorias importantes mas não
chegam para oferecer uma definição específica do sector.
Rudolf Bauer (citado por Nardi Sousa:2003b) vai mais longe e elabora uma reflexão
teórica mais sociológica. Considera que a realidade social é constituida pela intersecção
de três polos diferentes: a esfera informal do mundo da vida, correspondente ao mundo
pessoal do indivíduo; o Estado constituido pelo sistema político administrativo e a
economia com o sistema de mercado, estas últimas representando a esfera formal. Cada
um deses sectores da vida social tem fins sociais diferentes e características específicas.
47
E entre as duas esferas informal e formal existe um sistema intermédio de associações
que não é regulado por critérios característicos, mas sim por uma mistura de critérios
dos dois sectores formais e da esfera informal.
Por isso Bauer considera que só um sistema intermediário de novas organizações
respectivamente renovadas, reformadas, reorganizadas, reafirmadas, reelaboradas,
redescobertas e reestruturadas, parece possibilitar uma forma de mediação entre o
governo, o mercado e o mundo dos indivíduos.
Daí a denominação do terceiro serctor como sistema de organizações de mediação ou
sistema intermediário, pois esse sistema não tem, segundo Bauer, uma estrurura
específica mas deve ser visto como uma forma de intermediação de aspectos dos três
sectores sociais.
Assim, podemos ver que vários olhares são lançados sobre o terceiro sector, cada um
com a sua terminologia específica. O caso de Boccacin que procura uma reflexão de
caracter social para definir o terceiro sector, concebendo-o como uma forma de produzir
um bem comum, através de características de sociedade como a solidariedade e dos
laços afectivos e morais que unem os homens entre si. Por seu lado, Colozzi entende o
terceiro sector como um conjunto de organizações que produzem/fornecem serviços
públicos, mas que não tem por objectivo a distribuição de rendimento. Seguindo essa
linha de pensamento encontramos Pestoff que considera que as organizações do terceiro
sector não estão pautadas pela distribuição de rendimentos, são formais, privadas mas
não tem por fim o lucro. Ao contrário de Desroche que considera que no terceiro sector
estão inseridas tanto organizações sem fins lucrativas como as com fins lucrativas como
as cooperativas. Já Bauer encara o terceiro sector como um sistema de organizações de
mediação, pois só este sistema intermediário poderá servir de elo de ligação entre o
Estado, o mercado e o mundo individual.
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2- Associação Comunitária para o desenvolvimento de Lém Ferreira (A.C
Lénfer)
A.C Lénfer é uma Associação de Desenvolvimento Comunitário, sem fins lucrativos
que exerce a sua actividade independentemente do Estado, das confissões religiosas e
dos partidos políticos e suas organizações afins. Assim a A.C. Lénfer reconhece e
defende a liberdade associativa e em coerência com este princípio garante a todos os
cidadãos o direito de se associarem independentemente das suas opções políticas,
filosóficas ou religiosas.
A situação preocupante vivida em Lém Ferreira, levou ao surgimento dessa associação a
10 de Outubro de 2010, na tentativa de minimizar a delinquência juvenil e os maus
comportamentos dos jovens dessa localidade, dando aos mesmos novas oportunidades.
A educação é um dos pontos forte da associação, assim as crianças e jovens que
abandonam a escola para trabalhar à beira do cais tornam-se um facto preocupante para
a associação. Muitas crianças e jovens vêem no Porto um meio de sustento da própria
familía, pois, passam o tempo que é reservado aos estudos nos arredores do cais a ajudar
os pais nos negócios, ou à procura de algo que lhes possa dar algum rendimento. A
situação é tão preocupante que a associação já tem em vista a criação de um pelouro de
educação juntamente com professores e encarregados de educação, de modo a controlar
e minimizar o abandono escolar e, mesmo os jovens que terminam o ensino secundário
e não têm condições para ingressar nos estudos superiores, ver através de outras
instituições como integrar esses jovens.
A associação tem desempenhado um papel proponderante de modo a solucionar os
problemas sociais que tendem a surgir na comunidade, a associação vem apostando na
ocupação dos tempos livres dos jovens, fazendo com que os mesmos se interagem uns
com os outros, através de actividades desportivas e recreativas, extinguindo assim a
ideia de supremacia de uns em relação a outros, que é um dos principais motivos da
rivalidade entre os jovens, um problema assustador, que tem trazido consequências
nefastas não só para os familiares desses jovens, como também para a população em
geral. E assim mostrá-los que todos são partes integrantes da comunidade e que a sã
convivência entre seus membros é um passo importante para o desenvolvimento da
mesma.
49
Além disso, a associação procura sensibilizar a população acerca dos males sociais e da
situação vivida na comunidade, para que juntos procurem e encontrem soluções para
esses problemas que aflijam Lém Ferreira. A associação pretende com a ajuda de outras
instituições, criar um Centro de Juventude equipada e estruturada, para que os jovens
possam ocupar de forma saudável o seu tempo livre. Uma vez que por falta de
alternativas e por ausência de ocupação, muitos jovens acabam por enveredar por
caminhos obscuros, o que acarreta consequências negativas não só para os mesmos mas
também para a própria comunidade.
3- Associação Djunta Mon pa Tchada Grande (ADMTG)
ADMTG é uma associação sem fins lucrativos que visa orientar e aprofundar os
esforços no sentido da harmonização, do desenvolvimento sociocultural da zona.
É uma associação de carácter comunitário, mas desde a sua fundação deram prioridade à
juventude e crianças, pois, são as camadas que mais necessitam de intervenção e as mais
vulneráveis a certas situações sociais. O abandono escolar é um facto preocupante para
a associação, pois, muitos jovens deixam de estudar para procurar um meio de sustento
no Porto. Um lugar onde vão estar sujeitos a todo tipo de situações, principalmente as
drogas, pois, o Porto é a porta de saída e entrada de todo tipo de mercadorias. Para isso,
a associação chamou a atenção dos jovens, em vez de ficarem a trabalhar no porto,
porque não numa associação que opera para o bem da própria comunidade. Assim, deu-
lhes a oportunidade de fazer parte dessa associação, que busca o melhor para essa
camada, de modo a se engajar nessa iniciativa para o bem de todos.
A associação tem trabalhado muito, juntamente com os jovens, de forma a colmatar os
malefícios sociais que a comunidade enfrenta. Tem desenvolvido várias actividades, que
vão desde realização de palestras com os jovens sobre temáticas sociais vividas na
comunidade, intercâmbios entre os jovens, onde não há apenas a intenção de
conviverem e relacionarem uns com os outros, mas também debruçar sobre um dado
problema social, onde todos possam discutir, emitir as suas opiniões e juntos apresentar
possíveis soluções a este problema. Para além dos jovens, a associação procura através
de actividades culturais sensibilizar a população sobre a situação vivida na comunidade,
50
onde os jovens possam encontrar na música uma forma de passar mensagens positivas
para a população em geral. Actividades essas que têm sido bem recebidas e surtido
impactos positivos, pois, as pessoas felicitam a associação e dão força para continuar a
desenvolver melhor Achada Grande.
4- Acrides (Associação Crianças Desfavorecidas) Achada Grande Trás
ACRIDES é uma associação de direito privado, sem fins lucrativos, dotado de
personalidade jurídica e completa autonomia, designadamente nos planos
administrativos, financeiros e patrimoniais, vocacionada para a solidariedade social em
prol das crianças/ famílias desfavorecidas.
Essa associação desempenha um papel fundamental na comunidade de Achada Grande
Trás, pois, trabalha com o desenvolvimento comunitário integrado, com crianças,
jovens, idosos e famílias. Acolhem cerca de trinta e poucas crianças de 6 a 12 anos,
consideradas as mais desfavorecidas da comunidade, de modo a ocupar o seu tempo
livre de forma produtiva. Quanto aos jovens tem apostado na formação profissional,
pois, muitos terminam a escola e não têm condições para ir mais longe. Assim,
juntamente com outras instituições como Instituto de Emprego e Formação Profissional,
Centro Profissional de Variante, Centro de Emprego, têm proporcionado várias
formações aos jovens, estando alguns inseridos no mercado de trabalho. No que toca à
família, procuram alertá-los sobre o papel fundamental da mesma na educação dos
filhos, para isso trabalham temas importantes que servem de guia no dia-a-dia da
mesma. Quanto aos idosos, procuram inteirá-los na rotina da comunidade, de modo a
não se sentirem isolados da mesma.
A associação tem-se engajado, de modo a resolver certos problemas que tendem a surgir
na comunidade, para isso tem apostado na ocupação dos tempos livres dos jovens, pois,
por falta de alternativas e ocupação muitos acabam por procurar refúgio em
comportamentos desviantes como forma de aliviarem a sua preocupação. Desta forma,
tem desenvolvido o projecto de capoeira, torneio de futebol, jogo de cartas, damas e
acima de tudo atribuição de formação profissionalizante nas áreas de informática,
canalização, electricidade, carpintaria, entre outros, de modo a ocuparem os tempos
51
livres de forma saudável e enriquecedora, com conhecimentos profissionais, que
servirão de auxílio no meio laboral e na vida futura. Uma vez que muitos desses jovens
são de familias carenciadas, sem condições para dar uma boa educação aos filhos. Os
bairros não estão apetrechados com infra-estruturas adequadas que contribua para tal.
A Acrides tem privilegiado a realização de palestras, não só com os jovens, mas com
toda a comunidade em geral, de modo a estarem conscientes dos problemas da
comunidade e de como actuar perante eles. Na medida em que estes comportamentos
desviantes tornam-se cada vez mais problemáticos nas comunidades, rivalidade entre
jovens, assaltos, drogas, que tiram a paz e tranquilidade das mesmas. A associação tem
empenhado para alertar não só os jovens, mas também a população em geral, das
consequências que estes maleficios acarretam, para que juntamente trabalham de modo
a minimizar esses problemas que podem contribuir para a destruição das comunidades.
52
Capítulo 4
Análise dos Resultados
Terminado a fase de investigação, em que propomos analisar até que ponto a empresa
Enapor tem assumido o princípio de responsabilidade social perante as comunidades de
Lém Ferreira e Achada Grande, e em que medida, essas mesmas comunidades, através
das associações locais, têm aproveitado essa política de responsabilidade social para
estimular o seu próprio desenvolvimento comunitário, pudemos constatar que a política
de responsabilidade social adoptada pela Enapor não tem tido nenhum impacto no
desenvolvimento dessas comunidades. Segundo o Director dos Recursos Humanos, essa
política está mais virada para o público interno (conjunto de incentivos que são dados
aos trabalhadores, desde apoios, empréstimos para resolução de problemas, condições
favoráveis de trabalho e atribuição do salário atempadamente) e além disso as parcerias
e protocolos que têm desenvolvidos com instituições sociais tais como Aldeias S.O.S,
Escolas do Ensino Básico e Associação Black Panters (que a empresa apoia na
aquisição de materiais necessários, mesmo não sendo solicitado, pois, é sempre uma
preocupação da Administração assumir a parte social) não trazem nenhuma mais-valia
para essas localidades, pois, são instituições exteriores a essas comunidades e essas
parcerias não trazem nenhum benefício que possa reflectir significativamente no
desenvolvimento comunitário das zonas.
A política de responsabilidade social adoptada pela empresa tem privilegiado uma área
importante que são os colaboradores, abarcando um pouco a área social, que é uma
vertente fulcral quando se fala de responsabilidade social empresarial. Só que têm
contemplado associações/instituições de outras comunidades, em vez de privilegiar
associações locais que podem trabalhar para o desenvolvimento das comunidades no
qual a mesma está inserida e consequentemente o desenvolvimento da própria empresa.
O que garantiria uma boa imagem perante a sua comunidade local, fazendo com que a
empresa tenha cada vez mais prestígio e credibilidade, não apenas por parte dos seus
membros, mas sim de toda a população.
53
As associações locais não têm procurado criar uma interface com a empresa no intuito
de estimular o desenvolvimento comunitário das zonas. Na opinião dos presidentes das
associações A.C Lénfer e ADMTG, nunca se estabeleceu nenhuma parceria concreta
com a empresa tendo em vista o desenvolvimento comunitário, apenas solicitam apoios
esporádicos na realização de actividades comunitárias, o que fica muito aquém de um
desenvolvimento comunitário mais inclusivo e sustentável, pois, esses apoios são
usados para fins lúdicos e não para um trabalho mais sustentado com vista à melhoria
das comunidades. Têm consciência das vantagens e desvantagens que as comunidades
têm, devido à proximidade com a empresa, mas mesmo assim, ainda não serviram
desses elementos para tentar estabelecer uma ligação entre comunidades/empresa, na
tentativa de estabelecer uma parceria, geradora de recursos, que pudesse traduzir no
aumento do bem-estar das mesmas. Reconhecem que alguma parceria com a empresa
seria benéfica para todos.
A associação ACRIDES, por exemplo já apresentou alguns projectos de
desenvolvimento à empresa no intuito de estabelecer uma parceria entre ambos que
pudesse traduzir-se no desenvolvimento das localidades, mas nunca tiveram respostas
positivas. O que traduz na prática numa falta de responsabilidade social da empresa
perante as comunidades mais próximas, visto que, na perspectiva de Ackerman (1973)
as empresas têm que estar aptas a detectar problemas relacionados com o seu meio
envolvente e propor planos de acção de acordo com a política empresarial.
Quanto às acções sociais da Enapor nas localidades de Lém Ferreira e Achada Grande,
podemos dizer que ainda não estão num patamar elevado de responsabilidade social,
mas sim numa fase de filantropia, visto que de acordo com o pensamento de Archie
Carroll (1979) «A filantropia empresarial consiste nas acções discricionárias tomadas
pela gerência em resposta às expectativas sociais (…)» assim, de acordo com os
presidentes das associações e do director da empresa, são apenas apoios esporádicos
concedidos às associações na realização de actividades comunitárias sem um projecto
elaborado e estruturado. O motivo da efectivação desses apoios face essas comunidades
deve-se ao facto de serem comunidades mais próximas, o que faz com que sintam partes
integrantes da comunidade portuária, o que engrandece o prestígio e a imagem da
empresa, pois, as comunidades ficam satisfeitas com os apoios concedidos.
54
A empresa planeja investir mais nas comunidades próximas, pois, segundo o director da
Enapor, a empresa assume seriamente a política de responsabilidade social e não é
apenas uma questão de marketing e prestígio, visto que, tem um tecido social bastante
heterogêneo, com pessoas de diferentes níveis. E quanto às comunidades mais
próximas, há sempre uma preocupação em investir nelas, mas ainda não têm nada
concretizado. De acordo com o Director dos Recursos Humanos da empresa, já têm em
vista a criação de uma equipa para actuar junto das comunidades locais, de modo que
sintam partes integrantes da comunidade portuária, e de forma a mostrá-los que essa
proximidade pode contribuir para criar uma relação saudável entre
empresa/comunidades, e principalmente ajudar no desenvolvimento de ambas.
Pode-se afirmar que a proximidade das localidades de Lém Ferreira e Achada Grande
com a empresa Enapor não tem estimulado, nem proporcionado o desenvolvimento
comunitário das mesmas, visto que as associações locais estão conscientes das
vantagens e ganhos que poderiam auferir com essa proximidade, mas até agora, com a
excepção da Acrides, não desenvolveram nem apresentaram nenhum projecto de
desenvolvimento comunitário à empresa que contribuísse para tal. Nem a empresa tem
preocupado em contribuir no desenvolvimento das comunidades, pois, ficam apenas
pelos apoios financeiros na realização de actividades comunitárias e não procuram
contribuir de forma mais profunda no desenvolvimento das comunidades.
A empresa deveria por iniciativa própria procurar investir nessas comunidades,
principalmente nas camadas que mais necessitam de intervenção, o que traria vantagens,
não só para as localidades, mas também para a própria empresa, pois seria vista como
uma empresa que contribui para o desenvolvimento das localidades circundantes. Isso
permitiria uma maior confiança por parte das comunidades onde está inserida, fazendo
com que a empresa se fixasse e intervisse cada vez mais no território.
Podemos constatar ainda que as associações locais têm-se engajado muito e reunido
esforços para colmatar certas patologias sociais (emergência de marginais, delinquentes,
traficantes, prostitutas, etc.), que tendem a surgir nessas localidades, devido à
proximidade com o Porto e com a presença massiva de pessoas, uma vez que o porto é a
55
porta de entrada e saída de tudo. E esses problemas sociais podem acarretar vários
outros problemas, que podem afectar o desenvolvimento das comunidades.
Há que atacar as camadas mais sensíveis a estes malefícios, mostrando-as que esses
problemas podem surtir efeitos negativos para os mesmos e para a comunidade em
geral. Para isso, têm apostado muito na ocupação dos tempos livres dos jovens e das
crianças, uma vez que são as camadas mais vulneráveis. Cada um procura levar essa
acção avante da melhor forma possível. A associação AC Lénfer tem desenvolvido
actividades desportivas e recreativas, de forma que os jovens possam ter o seu tempo
livre preenchido o mais saudável possivel. A associação ADMTG tem apostado na
realização de palestras, intercâmbios dos jovens com outros jovens, afim de
consciencializá-los dos males sociais que assolam as comunidades, também têm
realizado actividades musicais onde procuram sensibilizar toda a comunidade em geral.
Já a associação Acrides tem pautado pela realização de algumas actividades desportivas
e principalmente pela profissionalização dos jovens para que os mesmos não caem no
erro de seguir esses caminhos do mal.
Para além disso, têm procurado sensibilizar a população acerca dos problemas sociais
existentes nas comunidades, de modo que todos possam envolver nessa acção, que é
para o bem de todos e principalmente para o desenvolvimento da própria comunidade.
Um outro problema que vem afligindo muito as associações é a presença constante de
jovens e crianças nos arredores do porto, pois, muitos desses jovens passam a maior
parte do tempo nessas redondezas à procura de algo para fazer em vez de estarem a
estudar. A associação ADMTG considera a situação preocupante, mas até agora não
fizeram nada para ajudar esses jovens, pois, pensam ser um trabalho muito dificil que
exige muitos custos, mas se tiverem a ajuda de outras instituições poderão fazer algo,
para que os jovens passem esse tempo na escola e não à beira do cais. Para a associação
A.C Lénfer, uma forma de resolver esse problema é criar um pelouro de educação
juntamente com professores e encarregados de educação, afim de controlarem o
abandono escolar, pois, a educação é um dos pontos essenciais dessa associação, e é
uma preocupação verem crianças e jovens em idade escolar a trabalharem no cais. A
associação Acrides é a única que tem feito algo pelos jovens da sua comunidade, pois,
existia um grupo de jovens que trabalhavam na descarga de contentores, a associação
56
conseguiu atribuir formações aos mesmos, e hoje muitos desses jovens são voluntários
da associação, trabalhando conjuntamente para um melhor desenvolvimento da sua
comunidade.
Quanto ao problema ambiental, no que toca à poluição da empresa, problema do lixo,
nas comunidades circundantes, a empresa está consciente dessa situação. Por isso, para
minimizar essa calamidade, a empresa sempre que pode ajuda nas campanhas de
limpeza, disponibilizando materiais e até trabalhadores para ajudar nesta acção. Só que
a mesma pensa que esta situação não é da sua responsabilidade, mas sim da Câmara
Municipal. O que contrapõe a ideia de Sebastião Teixeira (1998), pois, o ambiente é
uma área onde a discussão pública tem aumentado muito, onde a consciencialização
colectiva da necessidade de preservar a natureza, as preocupações com a higiene,
protecção contra a poluição devem ser levados em conta.
Podemos dizer que uma empresa que prima pelo princípio de responsabilidade social,
não deve preocupar apenas em ajudar as suas comunidades locais, mas também procurar
saber quais os efeitos secundários causados ao meio ambiente, em decorrência da sua
actuação. E assim, adoptar medidas, de forma que o funcionamento da empresa não
prejudique a natureza.
Quanto à tentativa de saber qual a imagem que os trabalhadores têm da empresa,
pudemos verificar que as opiniões se divergem, pois, para uns a empresa não tem
cumprido as suas responsabilidades para com os trabalhadores, no que diz respeito às
condições de trabalho, pois, não lhes fornecem as condições adequadas para a execução
das tarefas nem lhes pagam o salário justo. Ao contrário, muitos consideram que a
responsabilidade da empresa para com os seus trabalhadores vem crescendo cada vez
mais, pois, para além das condições propícias de trabalho, a empresa vem apostando
nos seus trabalhadores, atribuindo formações frequentes aos estivadores, de modo a
enriquecerem os seus conhecimentos e desempenharem as funções de melhor forma
possível. Tem-se verificado uma certa progressão na carreira, três dos entrevistados já
foram beneficiados. E isso vai de encontro com a opinião do chefe do departamento de
mão-de-obra portuário que considera que a empresa faz promoção de carreira dos
estivadores, só que não é tão linear, para isso acontecer tem que haver alguma vaga em
alguma escala, ou por reforma ou qualquer outro motivo para que o trabalhador possa
57
ser enquadrado. Considera ainda que a empresa tem cumprido à risca as suas
responsabilidades com os trabalhadores, desde salário justo, condições favoráveis de
trabalho, em que são fornecidas todos os equipamentos necessários aos trabalhadores,
de modo a desempenharem as suas funções com eficácia e segurança.
E isso é crucial, pois, os trabalhadores são uma área importante da responsabilidade
social, que todas as empresas devem ter em conta, visto que segundo Sebastião Teixeira
(1998), os empregados representam uma área importante de responsabilidade social das
empresas de que fazem parte, onde questões como segurança no trabalho, salário justo,
indiscriminação com base no sexo, raça ou religião, educação e desenvolvimento dos
trabalhadores, entre outros devem ser levados em conta.
Uma ponte de consenso entre os trabalhadores é a questão de reuniões entre chefes e
trabalhadores, pois consideram que a realização de reuniões na empresa ainda é fraca,
visto que não fazem reuniões com os trabalhadores para saberem o que se passa no seio
deles e quais são os seus problemas e preocupações, assim cada um resolve o seu
problema da maneira que achar conveniente. O que faz com que a relação entre chefes e
trabalhadores seja cada vez mais distante. Quanto a isso o chefe do departamento de
mão-de-obra portuário realça que tem uma relação próxima com os seus trabalhadores e
têm estado a estimular a proximidade entre os estivadores e o pessoal de quadro, através
de actividades, onde todos possam conviver e sentir partes integrantes do grupo, pois,
antes havia uma separação entre os mesmos. Frisa ainda que não fazem reuniões
sempre, porque é muito difícil reunir todos os trabalhadores, e quando isso acontece,
não dá em nada, pois, cada um procura expor o seu problema e não chegam a nenhum
consenso, assim a empresa procura fazer reuniões por sector com pequenos grupos, por
isso os trabalhadores falam que a empresa não faz reuniões com os trabalhadores.
58
Conclusão
O trabalho que agora terminamos, escolheu como objecto de estudo a Responsabilidade
Social Empresarial. Mais precisamente a responsabilidade social da empresa Enapor na
cidade da Praia, para com as suas comunidades locais de Lém Ferreira e Achada
Grande.
Encontramos dados suficientes que nos permite dizer que a hipótese levantada “Parece
que a política de responsabilidade social assumida pela Enapor não tem beneficiado o
desenvolvimento comunitário das localidades Lém Ferreira e Achada Grande, visto que
nem as associações locais, intermediárias por excelência, têm sabido construir uma
relação de proximidade com a Enapor e mobilizado recursos para um tipo de
desenvolvimento mais inclusivo e sustentável, nem a Enapor tem procurado investir
nessas localidades”, confirma-se, pois, as associações locais não têm aproveitado esse
princípio de responsabilidade social empresarial, para estabelecer uma ligação com a
empresa, motivando-a a investir mais nas comunidades próximas. Não têm sabido
mediar essa ligação entre as comunidades e a empresa, dado que as associações locais
estão mais bem preparadas para identificar os problemas prioritários e levar essas
preocupações para a empresa, para que conjuntamente tracem linhas de acção,
geradoras de oportunidades, que possam contribuir para o bem-estar e desenvolviento
das zonas.
Nem a empresa tem procurado participar mais no dia-a-dia das comunidades onde está
inserida, pois, ainda não desenvolveram nenhum projecto em que essas zonas tivessem
sido contempladas. Até agora têm ajudado essas comunidades apenas financeiramente,
na realização de actividades comunitárias. Nem tem procurado saber o que se passa no
seio dessas comunidades, quais os seus problemas e a suas necessidades, e tentar fazer
algo que possa ajudar de alguma forma na superação dessa situação.
Isso demonstra que a empresa precisa mudar a sua postura perante as suas comunidades
locais, e contribuir mais no desenvolvimento das mesmas, apoiando e investindo em
áreas susceptíveis de intervenção, como a educação, apoio às famílias desfavorecidas,
criação de infra-estruturas adequadas para o lazer dos jovens, pois, muitos jovens e
59
crianças dessas comunidades passam bastante tempo nos arredores do porto em vez de
estar a estudar. Muitos pertencem a famílias que possuem mínimas condições de
sobrevivência, que não têm condições propícias para facultar uma boa educação.
Muitos têm de sair à procura de algo para fazer, de modo a ajudar no sustento da
família. Caso tivessem melhores condições de habitação e tivessem uma educação de
qualidade, que lhes permitisse estudar em perfeitas condições, não estariam à beira do
cais.
A empresa tem procurado assumir seriamente a política de responsabilidade social, pois,
têm desenvolvido alguns protocolos com algumas instituições sociais, o que mostra a
preocupação da mesma com a parte social. Mas, é preciso fazer mais, ou seja, procurar
desenvolver acções sociais que possam gerar beneficios não só para algumas
instituições, mas também para a sociedade em geral, principalmente as comunidades
locais. Qualquer actividade que contribua para o desenvolvimento das mesmas, vai
repercutir de forma positiva no desenvolvimento da empresa. A empresa passa a ser
bem vista, não apenas pela sua comunidade local, mas também pelos clientes,
fornecedores e pelos próprios trabalhadores, que terão mais motivação para trabalhar
numa empresa que se preocupa com a questão social.
As associações locais precisam desempenhar o seu papel com mais eficiência e eficácia,
e não solicitar apoios apenas na realização de actividades comunitárias, mas sim,
procurar juntamente com entidades empresariais locais, desenvolver projectos que
possam contribuir de forma mais eficaz no desenvolvimento das comunidades. Visto
que das três associações estudadas, apenas a ACRIDES tentou estabelcer alguma
parceria com a Enapor, enquanto que as outras não o fizeram, limitaram-se apenas aos
apoios financeiros.
Desta forma, a proximidade das comunidades com a empresa, não tem servido de
estímulo na criação de acções sociais, geradoras de oportunidades, que possam traduzir
no aumento do bem-estar das zonas.
O que nos permite dizer que as associações não têm sabido cumprir o seu papel de
intermediário entre as comunidades/empresa, na tentativa de facilitar uma maior
atracção de recursos para o desenvolvimento das zonas, ou seja, não têm sabido
60
procurar quais as áreas que mais necessitam de intervenção e melhoramento, e levar
essas preocupações para outras entidades, para que juntamente desenvolvam políticas de
intrevenção com vista ao desenvolvimento das comunidades.
As acções sociais da empresa perante as comunidades locais, que até agora tem sido
mais a nível financeiro, deve-se ao facto de serem as localidades mais próximas da
empresa, e para a mesma é importante que sintam partes integrantes da comunidade
portuária. Essas acções não trazem nenhum benefício concreto para as comunidades,
pois, se para a empresa isso eleva o seu prestígio e sua imagem, para as comunidades
não passam de simples apoios que vão ser utilizados na realização de actividades
comunitárias, actividades essas que não vão interferir de uma forma profunda no
desenvolvimento das comunidades.
Há muito ainda por fazer, a empresa precisa consciencializar-se e assumir o seu papel
social perante as suas comunidades locais, pois, muitas vezes são bairros degradados e
desorganizados que não fornecem as mínimas condições de habitação, que não possuem
políticas municipais destinados ao desenvolvimento e a criação de recursos e
equipamentos sociais para os mais vulneráveis, onde encontramos famílias vivendo em
condições desfavorecidas.
É preciso estar atento a estas questões, e propor planos de acção que ajudem a
solucionar ou minimizar essa situação. Só assim a empresa será vista como uma
empresa que prima pelos princípios de responsabilidade social, o que não serve para
engrandecer apenas a imagem e o prestígio da mesma, mas também, fazer com que a
sua comunidade local tenha mais confiança e credibilidade na empresa, contribuindo
assim para uma relação mais sustentada.
Essas comunidades não possuem infra-estruturas suficientes para a ocupação dos
tempos livres dos jovens, uma das causas que levam muitos a embarcar no caminho do
“mal”. Uma situação que tem sido motivo de preocupação das associações locais, pois,
esses problemas acabam por interferir no desenvolvimento das comunidades. Os
comportamentos desviantes dos jovens, que optam por esse caminho, contribuem para
instalar o caos nas comunidades, pois, acabam com a paz e tranquilidade das mesmas,
fazendo com que os seus membros fiquem cada vez mais distantes. Assim as
61
associações locais têm tentado preencher essa lacuna, através de formas mais saudáveis
possível, mostrando aos jovens que a aderência a esses comportamentos pode trazer
resultados negativos, não só para os mesmos, mas também para a própria comunidade
que passa a ser marginalizada e evitada por causa do medo social que a mesma
transmite.
Quanto à responsabilidade da empresa perante os seus colaboradores (neste caso os
estivadores), que é uma das áreas importantes quando se fala de responsabilidade social
empresarial, podemos dizer que a empresa tem demonstrado alguma preocupação com
os seus colaboradores, pois, a maioria dos entrevistados (6) afirmam que as
responsabilidades da empresa para com os seus trabalhadores vem aumentando cada vez
mais, têm atribuído formações aos mesmos, o que contribui para aumentar as suas
competências técnicas, melhorando assim o seu desempenho individual e
organizacional. Na medida em que a capacitação dos colaboradores pode contribuir para
o desempenho de qualquer empresa, pois, estarão mais preparados para enfrentar os
desafios do meio laboral e desempenhar as suas funções com mais eficiência,
contribuindo assim para uma maior produtividade da empresa.
Por outro lado, a empresa precisa rever as suas políticas, e procurar melhorar a sua
forma de interagir com os seus colaboradores, pois, nem todos estão satisfeitos.
Procurar interagir mais com os seus colaboradores, de modo a saber quais os seus
problemas e preocupações, fazer com que os mesmos participem mais das tomadas de
decisões, visto que a maioria dos entrevistados reclamam da falta de interacção entre os
chefes e trabalhadores. Tentar criar uma relação saudável entre ambas as partes para que
juntamente, encontrem soluções aos problemas. Assim a empresa terá um ambiente de
trabalho saudável, fornecendo óptimas condições na realização das tarefas.
62
Bibliografia
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Outros Documentos
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ACRIDES, (2011), Apresentação: “não basta amar a criança é necessária que ela se
sinta amada”, Praia.
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Estatutos da Associação, A.C Lénfer -Associação Comunitária para o desenvolvimento
de Lém Ferreira.
Guia do Porto da Praia, edição 2009/10.
65
Anexos
I. Guião de entrevista para a Enapor
1- Política de Responsabilidade social na Enapor
1.1-Será que a Enapor tem uma política de responsabilidade social? Se sim, como está
enquadrado nas políticas da empresa?
1.2-A Enapor considera-se uma empresa eticamente responsável? Como? Dê exemplos.
1.3-Será que a Enapor assume seriamente a política de responsabilidade social ou é
meramente uma questão de prestígio e marketing?
1.4-Que projectos de responsabilidade social são desenvolvidos pela Enapor?
1.5-Qual a área da empresa responsável pela responsabilidade social?
1.6-Como é que a sociedade tem avaliado a actuação da Enapor no mercado?
2- Relação Enapor/comunidades circundantes
2.1-Como é que a Enapor tem procurado apoiar as comunidadesde de Lém Ferreira e
Achada Grande, de modo a impulsionar e estimular um maior desenvolvimento
comunitário das mesmas?
2.2-Quais os reais motivos da prática de acções sociais nessas localidades e que
beneficios essas acções têm gerado tanto para a empresa como para essas zonas?
2.3-A Enapor é uma das maiores empresas locais, que está em pleno processo de
transformação e modernização. Que impacto essas transformações poderão ter na
sociedade em geral e nas comunidades circundantes em particular?
66
2.4-Será que a Enapor planeia beneficiar ainda mais as comunidades circundantes
através da política de responsabilidade social?
2.5-A Enapor está consciente do problema ambiental (poluição, lixo) nas comunidades
circundantes ao Porto?
2.6-Que iniciativas a Enapor tem vindo a tomar de modo a colmatar essa situação?
3- Relação Enapor/Associações locais
3.1-Será que, as associações locais tentaram alguma vez estabelecer algum tipo de
contacto com a Enapor na tentativa de estimular a empresa a investir nessas
localidades?
3.2-Se sim, de que forma?
67
II. Guião de entrevista para as Associações Locais
1-Sabemos que Lém Ferreira e Achada Grande são as localidades mais próximas da
Enapor, e essa proximidade pode trazer tanto consequências positivas como negativas
para as mesmas.
1.1. Que papel desempenham as associações nestas comunidades?
1.2. As associações estão conscientes das vantagens e desvantagens que as
localidades têm devido à proximidade com a Enapor?
1.3. Como têm desempenhado o papel de intermediário entre as comunidades e a
Enapor, de modo a facilitar a atracção de recursos e um maior desenvolvimento
comunitário?
1.4. Em que medida a proximidade da Enapor com essas localidades tem promovido
o desenvolvimento comunitário? Que benefícios pode trazer?
2- Problemas sociais
2.1- Que medidas as associações têm tomado, de modo a diminuir a presença de
crianças e jovens à beira do cais (Porto)?
2.2- Como têm actuado para solucionar certos problemas sociais (como a criminalidade,
tráfico de drogas, prostituição, entre outros) que tendem a surgir nessas localidades
devido à presença massiva de pessoas?
2.3- Alguma vez as associações desencadearam algum tipo de actividade para
sensibilizar a população sobre os problemas que assolam as comunidades?
2.4- Como essas comunidades têm reagido face a essa situação?
68
2.5-Alguma vez tentaram estabelecer algum tipo de relação com a Enapor, de modo a
consciencializá-la sobre a situação vivida nessas zonas? Se sim, qual foi a reação da
Enapor face ao problema?
69
III. Guião de entrevista para 10 trabalhadores do Departamento de Mão-de-
Obra Portuario
1- Há quanto tempo trabalha/trabalhou na Enapor?
2- Qual é/era a função?
3- Ao longo desse tempo teve progressão na carreira?
4- Durante esse tempo a Enapor tem demonstrado interesse nos seus colaboradores?
5- Como a Enapor tem actuado no que toca à responsabilidade social da empresa
perante os seus colaboradores e comunidades circundantes?
6- A Enapor tem propiciado condições trabalho (segurança, salário justo, promoção,
regalias, etc) para o desempenho das respectivas funções?
7- Se sim, de que forma a empresa tem proporcionado essas condições?
8- Considera a Enapor uma empresa que se preocupa com o bem estar dos seus
colaboradores?
9- Existe uma relação de proximidade entre a Enapor e os seus colaboradores?
10- Os colaboradores estão satisfeitos com a actuação da empresa ou preferem que a
Enapor mude a sua forma de actuar junto dos seus colaboradores e da sociedade?
11- Existe um fórum onde a Enapor e os colaboradores discutem os problemas e
preocupações?
12- Que beneficio tráz para os colaboradores?
13- Os trabalhadores têm um representante que interceda por eles? Quem e como?
70
IV. Entrevista dirigida ao Director dos Recursos Humanos da Enapor da Praia
Dr. Nelson Martins
Na opinião do director a Enapor tem uma política de Responsabilidade Social, só que
actualmente está mais virado ao público interno, mas para além disso tem estabelecido
alguns protocolos, actividades desenvolvidas com algumas instituições como aldeias
S.O.S, Escolas na Várzea e com a associação Black Panters. A política de
responsabilidade social está a cabo do departamento dos Recursos Humanos que
estabelece um conjunto de incentivos que são dados aos trabalhadores, desde apoios,
empréstimos para solução de vários problemas, aquisição de viaturas entre outros.
Na opinião do director Nelson Martins a Enapor considera-se uma empresa eticamente
responsável, pois segundo o mesmo a empresa tem sempre a preocupação em honrar os
compromissos com os trabalhadores, principalmente no que toca à atribuição do salário
atempadamente.
Segundo o director, a Enapor assume seriamente a política de responsabilidade social e
não é apenas uma questão de prestígio e marketing, é sempre uma preocupação da
administração assumir esta parte social, visto que a Enapor é uma empresa que tem um
tecido social bastante heterogéneo, com pessoas de diferentes níveis, assim teve sempre
essa preocupação com a parte social. Exemplo disso são alguns projectos de
Responsabilidade social que a Enapor desenvolve, como o mesmo já tinha frisado
algures na entrevista, o protocolo com Aldeias S.O.S onde anualmente a Enapor oferece
apoios relativamente a alguns materiais que necessitam, também algumas escolas do
ensino básico da Várzea, a associação Black Panters que a Enapor apoia sempre.
Mesmo não sendo solicitado a empresa procura por iniciativa própria apoiar estas
instituições.
Quanto às comunidades circundantes, Achada Grande e Lém Ferreira, o mesmo realça
que há sempre uma preocupação em investir nessas comunidades, até que após a
inauguração da expansão do Porto da Praia, o concelho de administração já está
planeando a criação de uma equipa para actuar junto das comunidades, pois actuando
junto das mesmas torna-se mais fácil mostrar que a expansão do Porto é uma mais-valia
para ambos e também é uma forma de sensibilizar a população a não danificar esse bem
que pode contribuir para a sobrevivência de todos.
71
Os reais motivos da prática de acções sociais nessas comunidades devem-se ao facto de
serem as comunidades mais próximas e são pessoas que frequentam muito a área do
porto, mas os apoios têm sido mais esporádicos, pois às vezes algumas associações ou
organizações das zonas solicitam apoios, às vezes transporte ou alguma quantia em
dinheiro para a realização de actividades, mas isso pode vir a melhorar com a criação da
equipa para trabalhar junto das comunidades com projectos mais claros e estruturados.
Quanto aos benefícios a imagem e o prestígio da Enapor são bem vistos, pois as pessoas
ficam com um sentimento de gratidão com os apoios concedidos.
A Enapor planeia beneficiar ainda mais as comunidades, pois é uma orientação clara da
empresa, de modo que as pessoas sintam parte integrantes da comunidade portuária, até
porque são as comunidades mais próximas, também no caso de sensibilizar as
comunidades a ajudar a Enapor a conservar o novo espaço, pois pode ter algum acto de
vandalismo, que pode danificar e prejudicar o espaço.
Enapor está consciente do problema ambiental nas comunidades circundantes ao porto,
embora pensa ser um problema da Câmara Municipal, a Enapor sempre que pode ajuda
nas campanhas de limpeza, fornecendo materiais e até disponibilizando trabalhadores
para participar nas campanhas de limpeza.
Actualmente as associações não chegaram perto da Enapor de modo a estimular a
empresa a investir mais nas comunidades, só quando realizam actividades esporádicas
solicitam o apoio da Enapor, mas de forma sistemática com um projecto estruturado não
procuraram a empresa.
Segundo o director não publicam o relatório de Responsabilidade social e se querem
saber dos gastos com as actividades sociais, têm que recorrer ao departamento de
contabilidade para tal.
72
V. Entrevista dirigida ao Presidente da Associação Comunitária para o
Desenvolvimento de Lém Ferreira (A.C. Lénfer), Guilherme Espírito Santo
Segundo o presidente da associação A.C. Lénfer, Guilherme Espírito Santo, já tentaram
várias vezes criar uma associação em Lém Ferreira, mas nunca conseguiram, haviam
três grupos recreativos mas não associação. Devido à preocupação com a situação
vivida em Lém Ferreira criaram a 10 de Outubro de 2010 essa associação com o intuito
de rever a situação relativamente à delinquência juvenil e os maus comportamentos dos
jovens dessa localidade, ou seja, procurar uma forma de solucionar estes problemas,
dando aos jovens novas oportunidades.
O mesmo realça que a associação está consciente das vantagens e desvantagens devido
à proximidade com o Porto, pois estando ela mais próxima ao porto estará mais propícia
ao lixo e à poluição, para além das muitas crianças e jovens que abandonam os estudos
para trabalhar no cais. Mas também, esta proximidade pode trazer ganhos pois tem
muitas famílias que ganham o seu sustento com o comércio à beira do cais, mais ainda,
segundo o entrevistado, essa proximidade pode ser vantajoso para a comunidade na
medida em que pretendem estabelecer um protocolo com a Enapor de modo que juntos
encontrem uma melhor forma de ajudar essa comunidade.
Ainda não entraram concretamente em contacto com a Enapor de modo a facilitar uma
maior atracção de recursos para o desenvolvimento comunitário, mas segundo o mesmo,
a Enapor tem apoiado muito nas actividades que realizam na comunidade
esporádicamente. Com isso pretendem estabelecer uma relação mais concreta com a
Enapor para que a empresa possa ajudar na concretização dos objectivos traçados, de
modo a desenvolver melhor Lém Ferreira.
As crianças e jovens à beira do cais é um facto preocupante para a associação, pois um
dos pontos da associação é a educação, na medida em que pretendem criar um pelouro
de educação juntamente com professores e encarregado de educação, de modo a
controlarem o abandono escolar e, mesmo os jovens que terminam o ensino secundário
e não têm condições de continuarem os estudos, ver através de outras instituições como
integrar esses jovens.
73
Quanto aos problemas sociais que tendem a surgir nas localidades, a associação vem
apostando na ocupação dos tempos livres dos jovens, através de actividades desportivas
e recreativas e não só, também têm em vista a criação de um centro de juventude
equipada e estruturada para que os jovens possam ocupar de forma saudável o seu
tempo livre. Para além disso, têm apostado na sensibilização da população acerca dos
males sociais, para que os mesmos sintam parte integrantes da comunidade e juntos
acabar ou minimizar esses problemas. Segundo o entrevistado, nos anos atrás Lém
Ferreira não constava na lista das comunidades mais conflituosas da cidade da Praia,
mas actualmente está entre as seis mais piores.
74
VI. Entrevista dirigida ao presidente da Associação Djunta Mô Pa Tchada
Grande (ADMTG), Lourenço dos Santos Andrade.
De acordo com o presidente da Associação Djunta Mon pa Tchada Grande, Lourenço
dos Santos Andrade, ADMTG é uma associação de carácter comunitário mas desde a
sua fundação deram prioridade mais a juventude e às crianças, pois pensam que são
essas camadas que necessitam mais de intervenção. Para isso, deram prioridade aos
jovens, onde existe um conjunto de jovens que juntos trabalham para o desenvolvimento
da zona. A associação está consciente das vantagens e desvantagens que a comunidade
tem devido à sua localização próxima ao Porto. Segundo o mesmo, tem muitos jovens
que já abandonaram a escola e hoje procuram um meio de sustento no Porto. Frisa
ainda, que muitos desses jovens consomem drogas, pois o Porto é a porta de entrada e
saída de todo tipo de mercadorias. Por isso, quando criaram a associação chamaram a
atenção aos jovens, pois, em vez de trabalhar no Porto porque não numa associação que
opera para o bem-estar da própria comunidade.
O presidente realça que já estabeleceram parcerias com muitas empresas que estão
localizadas em Achada Grande, mas com a Enapor não têm nenhuma parceria. A
associação nunca tentou estabelecer uma parceria com a mesma, o que traria grandes
benefícios, visto que a Enapor é uma empresa que tem muito para dar, na opinião do
entrevistado. Segundo o mesmo, talvez a associação não soube aproveitar essa próxima
localização para estabelecer um elo de ligação com a Enapor, mas talvez ainda esteja
em tempo de fazê-lo. Por exemplo poderiam estabelecer um acordo com a empresa, no
que toca aos jovens, pois em vez de ficarem a mendigar no porto, poderiam colocar-lhes
para fazer algo de útil.
No que toca à tomada de medidas na tentativa de diminuir a presença massiva de
crianças e jovens à beira do cais, o mesmo fala que não é um trabalho fácil, pois ainda
não fizeram um trabalho de reinserção de crianças, visto que a associação tem algumas
limitações, e esse tipo de trabalho exige muitos custos e disponibilidade de tempo. Mas
com o apoio de outras instituições, como ICA (Instituto da Criança e Adolescente),
Acrides podem fazer algo para ajudar essas crianças. É uma preocupação da associação
ao ver crianças e jovens em idade escolar a mendigar no porto.
75
Têm desencadeado várias actividades com o intuito de sensibilizar os jovens acerca dos
problemas sociais, exemplo disso foi a realização de um leque de palestras sobre males
sociais que a comunidade enfrenta, mas segundo o presidente da associação, já
repararam que os jovens não gostam de palestras, para isso adoptaram uma outra forma
de passar essas informações, ou seja, realizavam intercâmbios entre as associações,
onde convidavam um palestrante para debruçar sobre um dado problema social e depois
abriam secção de debate, onde todos participavam e conviviam uns com os outros.
Assim constataram que dessa forma a informação passa-se mais rápido, não só para os
jovens, como também para a comunidade em geral, só que um trabalho desses é muito
dispendioso e nem sempre conseguem fazê-lo.
Na óptica do presidente da associação sempre leva em conta os problemas de bairro
quando estão a realizar qualquer actividade, pois procuram sensibilizar não só os jovens
como a população em geral. Já realizaram concurso de “hip hop,” onde os jovens
podiam expressar o que sentem e passar mensagens positivas para a comunidade. As
pessoas aderem em massa a essas actividades e dão força à associação no sentido de
continuar a desencadear essas actividades, visto que a comunidade precisa muito e têm
tido impacto positivo na vida das pessoas.
Nunca tentaram estabelecer uma relação com a Enapor no sentido de consciencializá-los
sobre a situação vivida nessa localidade, apenas procuram a empresa na realização das
actividades, para emprestar atrelados que servem de palcos para efectivação da mesma.
Segundo o entrevistado são sempre respondidos de forma positiva.
76
VII. Entrevista dirigida à presidente da Associação ACRIDES, Lourença
Tavares
De acordo com a entrevistada, a ACRIDES em Achada Grande Trás é uma associação
que trabalha com o desenvolvimento comunitário integrado, pois, trabalham com
determinadas camadas da sociedade, mas precisamente, crianças, jovens, idosos e
famílias. Acolhem cerca de trinta e poucas crianças de 6 a 12 anos, consideradas as mais
desfavorecidas da comunidade, ajudando-as nos deveres escolares, na compreensão dos
direitos e deveres das crianças, desenvolvem aulas de expressão plástica e muitas outras
actividades consideradas essenciais na ocupação dos tempos livres.
Quanto aos jovens têm apostado na formação profissional, pois muitos terminam a
escola e outros abandonam-na e ficam sem o que fazer. Assim, juntamente com outras
instituições como IEFP, Centro Profissional de Variante, Centro de Formação
Profissional da Praia e Cento de Emprego, têm atribuído várias formações aos jovens,
onde muitos já estão inseridos no mercado e outros esperam financiamento de materiais
para abrirem seu próprio negócio. No que toca à família, têm a preocupação de chamá-
los atenção no papel fundamental da mesma na educação dos filhos, para isso trabalham
temas como direito e deveres das crianças, direito das mulheres, violência doméstica e
muitos outros que servem de auxílio no seio familiar. Quanto aos idosos, procuram
inteirá-los na vida da comunidade, desenvolvendo intercâmbios com outros idosos,
onde debruçam sobre temas relacionados com a comunidade.
De facto a presença de crianças e jovens nos arredores portuários é uma situação
preocupante, assim sempre que a associação tem possibilidades procura ajudar, pois,
existia um grupo de jovens dessa localidade que trabalhavam na descarga de contentores
da Enapor, foram beneficiados com formações e hoje são voluntários da associação.
De modo a colmatar certos problemas sociais que tendem a surgir na comunidade,
apostam na ocupação dos tempos livres dos jovens. Assim, de modo a não enveredarem
para maus caminhos, têm desenvolvido projecto de capoeira, torneio de futebol, cartas,
damas, e acima de tudo atribuição de formação profissionalizante, a nível de
informática, canalização, electricista, pedreiro, carpintaria, entre outros. Têm promovido
intercâmbios entre os jovens, tornando a relação entre eles mais próxima, de modo que
77
sintam todos membros integrantes da comunidade. Para além disso, têm privilegiado a
realização de palestras, não só com os jovens, mas com toda a comunidade em geral, de
modo a consciencializá-los dos malefícios que a comunidade enfrenta. Procuram
também passar essas informações através de conversas porta a porta com as pessoas,
onde são apoiados e incentivados a continuarem com estas actividades, na medida em
que em Achada Grande Trás tem surgido muitos conflitos por causa da rivalidade entre
os jovens.
Segundo a presidente da associação, a ACRIDES já tentou várias vezes estabelecer uma
relação com a Enapor no intuito de facilitar o desenvolvimento comunitário da
comunidade, mas nunca teve resposta. Já apresentaram vários projectos de
desenvolvimento à empresa, mas sem feedback. E segundo a entrevistada, a Enapor
sendo uma empresa da sua estrutura deveria preocupar em investir nessas comunidades
mais próximas, pois a associação só entrou na comunidade de Achada Grande Trás
porque teve a ajuda da ASA. Hoje com a falta de financiamentos já cortaram várias
actividades que a associação desenvolvia nessa comunidade.
78
VIII. Entrevista dirigida a 10 trabalhadores do Corpo Estiva do Porto da Praia
Armando Fernandes Oliveira (Estivador)
O entrevistado já tem vinte e um anos de serviço, e sempre foi estivador, nunca houve
progressão na carreira. Segundo o mesmo, a Enapor não demonstra interesse para com
os seus colaboradores, pois cada um faz o seu trabalho e pronto, nem vêem o chefe. O
que é na sua perspectiva uma falta de responsabilidade para com os seus colaboradores,
pois, têm que supervisionar os trabalhadores para verem se estão desempenhando as
suas funções de forma favorável e adequada. No que toca às condições de trabalho, o
mesmo não está muito satisfeito, pois considera que não recebem o salário justo pelo
trabalho efectuado, nem propiciam os devidos instrumentos para o desempenho da
função. Com isso, o entrevistado não está de acordo com a forma de agir da empresa e
realça que a empresa deveria mudar a sua postura perante os estivadores, para que as
coisas possam correr bem. Segundo o mesmo, não existe uma relação próxima entre os
estivadores e a Enapor, não existe nenhum fórum onde os trabalhadores possam discutir
os seus direitos, nem fazem reuniões mensais ou anuais com os estivadores para
saberem os seus problemas ou o que passa-se no seio deles. Não têm nenhum
representante, e se tiverem algum problema têm que dirigir ao chefe responsável pela
área de estiva.
Manuel Lopes da Silva (Estivador)
Já tem vinte e dois anos de serviço e desde sempre foi estivador. De acordo com o
entrevistado, para que a Enapor demonstre interesse nos seus colaboradores, antes estes
têm de mostrar interesse para com a empresa. Assim, considera que vem aumentando a
responsabilidade da empresa perante os seus colaboradores, visto que, actualmente estão
apostando nos estivadores dando formações, o que antigamente não acontecia. Fala que
antes isso não era visível, mas hoje devido às formações que estão implementando no
quadro de estiva, pode-se considerar que a Enapor vem demonstrando alguma
preocupação em melhorar e aumentar as capacidades profissionais dos estivadores
futuramente. Assim, fala que a empresa vem demonstrando algum interesse no bem-
estar dos trabalhadores, pois com essas formações podem aprender muitas coisas que
servem para melhorar o seu desempenho. No que toca às condições de trabalho, o
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mesmo fala que a empresa fornece os equipamentos necessários, pois, é um trabalho
muito perigoso. Mas quanto ao salário, o mesmo acha que deveria existir um salário
padrão mensal, pois, o salário depende do trabalho que desempenham, trabalham tipo à
sorte segundo o mesmo, se conseguiram bons barcos podem receber um bom salário e
se pegarem maus barcos, podem ter um vencimento que se calhar, nem chegue para o
sustento da família. O entrevistado considera que não existe uma relação muito
próxima, existe desrespeito de ambas as partes. Com isso, espera que tanto a empresa
como os colaboradores mudem a sua forma de actuar. De acordo com o entrevistado,
não têm um representante e é raro fazerem reuniões com os trabalhadores, segundo o
mesmo, se existisse um fórum onde pudessem discutir os problemas com os chefes,
existiria menos desrespeito de ambas as partes.
Albertino Tavares (Guincheiro)
Trabalha desde 1996 na Enapor e sempre foi guincheiro. Considera que actualmente a
empresa vem demonstrando maior interesse e responsabilidade para com os
colaboradores, pois tem proporcionado equipamentos necessários para o desempenho
das funções em óptimas condições e segurança, contribuindo assim para o bem-estar
dos colaboradores no seu local de trabalho. Pensa que a empresa vem melhorando muito
a sua forma de actuar perante eles, uma coisa em que não estão satisfeitos é a questão de
salário, uma vez que considera que recebem pouco pelo trabalho que exercem. Na sua
opinião não existe uma relação próxima entre os estivadores e os chefes, na medida em
que, é muito raro fazerem reuniões entre eles, pelo menos de anos em anos. Os
estivadores não têm um representante, por isso quando querem expor algum problema
têm que recorrer ao sindicato.
Adalberto Elias Correia (Guincheiro)
Trabalha na Enapor desde os treze anos e hoje está com 48 anos, teve progressão, antes
era estivador, mas actualmente trabalha como guincheiro. Na opinião dele é muito
difícil a Enapor demonstrar interesse e responsabilidade perante os colaboradores, pois
afirma que antes não tinham férias, mas com a ajuda dos Sindicatos conseguiram auferir
metade das férias. Afirma que os equipamentos atribuídos são insuficientes, não chegam
para usar durante um ano, e só dão equipamentos de dois em dois anos, e ainda o salário
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não é fixo, às vezes conseguem auferir um bom salário e outras vezes não. Na sua
opinião, não estão satisfeitos com a actuação da empresa perante eles, mas têm que
suportar, pois já têm muitos anos de trabalho e não têm para onde ir, assim aquilo que
os chefes disserem têm que ser cumprido. Não existe uma relação de proximidade entre
as partes, pois não têm um representante nem uma associação capaz de mostrar-lhes os
seus direitos. Não fazem reuniões e quando têm problemas recorrem aos Sindicatos.
Quando o problema for levado aos superiores fica tudo na mesma, segundo o
entrevistado.
Anastácio Mendes (Estivador)
Trabalha há 16 anos na empresa, era ajudante de máquinas e actualmente é estivador.
Segundo o entrevistado a Enapor tem um grande interesse e responsabilidade para com
os seus colaboradores, visto que lhes fornecem as condições propícias para o
desempenho das funções, só que às vezes falta alguma coisa porque os equipamentos
vêm de fora e ficam muito tempo à espera. Têm o seu salário todos os meses, só que
varia porque trabalham por escala, podem receber bom salário e por vezes não. De
acordo com o entrevistado, existe uma certa relação entre os colaboradores e os chefes,
pois relaciona-se bem com o seu chefe. Nunca participou de uma reunião, mas na sua
opinião é de costume reunirem com o pessoal de estiva, o que na sua opinião é muito
importante, pois há trocas de ideias e experiências, ajudando-os na sua forma de agir.
António Mendes da silva (Estivador)
Tem vinte e dois anos de serviço e sempre foi estivador. Na sua opinião a empresa não
preocupa com os colaboradores, não demonstra nenhum interesse e responsabilidade
para com os mesmos, visto que os próprios estivadores não se ajudam mutuamente,
existe muita desavença entre eles, aquilo que é para ser feito em conjunto torna-se
individual, cada um preocupa-se com os seus interesses. Não lhes fornecem as
condições necessárias para o desempenho das funções, uma vez que dão-lhes
equipamentos incompletos, e com isso podem correr perigo na execução da tarefa. De
acordo com o entrevistado, não existe uma boa relação entre chefes e estivadores, as
coisas são feitas à maneira deles, fazem aquilo que querem, não respeitam as leis. As
reuniões com os chefes não dão em nada, cada grupo fala da sua maneira, surge sempre
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conflitos e não chegam a nenhum resultado. Não está satisfeito com a actuação da
empresa, segundo o mesmo, é necessário mudar para que as coisas possam ir para
frente.
João de Barros Júnior (Contra mestre de Rebocador)
Já tem uma média de vinte e poucos anos na empresa, trabalha desde 1987. Segundo o
mesmo, teve uma grande progressão na carreira, visto que desempenhou a função de
estivador durante dois anos, depois progrediu para encarregado de apetrecho, onde
trabalhou por doze anos e actualmente desempenha a função de contra mestre de
rebocador. Segundo o mesmo, a empresa preocupa com os trabalhadores e a
responsabilidade para com eles é cada vez maior, até as pessoas de fora podem ver isso.
A empresa tem os trabalhadores em perfeitas condições, com todos os equipamentos
necessários (bota, fardas, capacete, luvas), segurança adequada para desempenharem as
suas funções, meio de transporte, pois em todas as localidades onde a empresa tem
trabalhadores existe carros para transportá-los. Uma coisa que não se conforma é o
salário, pois recebem pouco em relação a outras empresas e não é justo pelo trabalho
que desempenham. De acordo com o entrevistado, existe uma óptima relação entre os
colaboradores e chefes, pois qualquer trabalhador que tem o seu problema é bem
recebido pelo chefe, mas o que penaliza a empresa é a falta de reuniões entre as partes,
de modo a exporem os seus problemas e preocupações.
José Adelino Lopes da Silva (Estivador)
Tem vinte e dois anos de trabalho e sempre foi estivador, nunca teve progressão na
carreira. Na sua opinião os interesses e responsabilidades da empresa para com os
trabalhadores não estão muito bons, pois, apesar de trem o salário mensal e as suas
férias, não lhes fornecem boas condições de trabalho, visto que trabalham com
equipamentos incompletos, o que põe em risco a sua própria segurança. Além do mais,
o salário recebido pelo trabalho efectuado não é justo, assim considera que a empresa
falha muito nesta questão. Não existe uma relação saudável entre os estivadores e
chefes, pois é muito difícil reunirem-se entre eles para falarem dos problemas. Não têm
nenhum representante, por isso quando têm problemas recorrem aos Sindicatos de modo
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a encontrar soluções. Apesar de tudo, têm que aceitar a forma como a empresa lida com
eles, pois não têm para onde ir, aquilo que a empresa dita tem que ser feito.
Valter Fernandes dos reis (Estivador)
Tem dez anos de serviço e desde sempre foi estivador. Considera, que a empresa
preocupa com os trabalhadores fornecendo condições adequadas no desempenho das
funções. Atribuindo-lhes equipamentos necessários, segurança no trabalho e salário
justo. O que mostra segundo o entrevistado, a responsabilidade da empresa para com os
seus trabalhadores, na medida em que, fazem tudo para estarem em harmonia no seu
local de trabalho. Uma coisa negativa na empresa é a relação entre estivadores e chefes,
visto que não há interacção e raramente fazem reuniões. Para resolverem os seus
problemas servem dos Sindicatos que encarregue-se de levar a mensagem aos chefes
superiores.
Eduino Moreno Fortes (Apontador)
Trabalha na Enapor há doze anos e durante esse tempo teve progressão na carreira, pois
desempenhou a função de estivador por seis anos, depois fez um estágio na secção de
estiva onde conseguiu o cargo de apontador que actualmente desempenha. O mesmo
considera que a empresa demonstra um grande interesse e responsabilidade para com os
seus trabalhadores, são lhes dadas todas as condições necessárias para o desempenho
das funções, desde equipamentos, segurança no trabalho, salário justo e até promoções
na carreira, que segundo o entrevistado, o mesmo é um exemplo disso. Isto demonstra
consoante o entrevistado, a preocupação da empresa com o bem-estar dos trabalhadores,
pois são atribuídas muitas formações aos estivadores de modo a aumentarem as suas
capacidades técnicas, desempenhando assim as suas funções com mais
profissionalismo. Na sua opinião a relação dos trabalhadores com os chefes é saudável,
mas uma coisa que falha na empresa é a questão das reuniões, pois não é costume
fazerem reuniões com os trabalhadores, para saberem o que se passa no seio deles.
Como não têm um representante, cada um dirige-se ao seu chefe na resolução dos
problemas. Segundo o mesmo, os estivadores não estão satisfeitos com a actuação da
empresa, pois são um grupo que reclamam muito, nunca conformam com nada que
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acontece, e não têm motivos para isso, visto que a direcção da empresa age de melhor
forma com os estivadores.
IX. Entrevista dirigida ao chefe do departamento, Serviço de Mão-de-Obra
Portuária Dr. José Joaquim Bitenkour
Na tentativa de contrabalançar as informações recolhidas das entrevistas efectuadas aos
trabalhadores afectos ao serviço de mão-de-obra portuário, procuramos saber a opinião
do chefe responsável por essa secção.
Segundo o entrevistado, a empresa faz promoção de carreira dos estivadores, só que a
nível de estiva não é tão linear quanto ao pessoal de quadro. Dentro da secção de estiva
tem várias escalas - Capataz/ conferente/ Guincheiro/ portalós/ Estivadores, assim para
que um outro trabalhador, por exemplo um conferente tornar capataz, automaticamente
tem que sair um capataz, ou por reforma ou qualquer outro motivo, para que fique essa
brecha e possam enquadrar o trabalhador ali. A progressão não faz-se hierarquicamente,
não é porque um trabalhador é conferente por muitos anos tem o direito de tornar
capataz, só acontece se tiver uma vaga.
De acordo com o entrevistado, a Enapor tem cumprido à rica as suas responsabilidades
com os trabalhadores, pagam-nos um salário, no qual considera que é justíssimo, visto
que o Porto da Praia é um dos portos que pratica tarifas mais alto, mesmo a nível de
estiva, têm cumprido as suas responsabilidades com o IRS e INPS. Sem falar das
condições de trabalho, a empresa fornece equipamentos necessários (fardas, botas,
capacete, luvas, óculos e máscaras) todos os anos, permitindo o desempenho das
funções em boas condições e segurança, pois há coisas que acontecem e não
conseguimos prever. O problema é que os trabalhadores fazem mau uso dos
equipamentos, em vez de usar no desempenho da função preferem vendê-lo ou trocar
por algo. O mesmo realça que se o serviço fosse rigoroso, mais de 50% dos
trabalhadores não trabalhavam por falta do equipamento completo.
Fala que tem uma relação próxima com os trabalhadores, e o serviço de mão-de-obra
portuário fomente esta atitude, pois faz com que os trabalhadores sintam parte
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integrante do grupo. Têm estado a promover actividades de modo a estimular a
convivência entre os estivadores e o pessoal de quadro, criando assim uma interface
entre eles, o que antigamente não acontecia, pois havia uma separação entre os dois
grupos.
O entrevistado pensa que qualquer empresa não tem de fazer reuniões todas as semanas,
faz-se reuniões no momento que achar conveniente. Têm estado a fazer reuniões
periódicas porque é muito difícil reunir todo o grupo de trabalhadores, assim a Enapor
promove reuniões sectorialmente. Fazem reuniões com grupos pequenos, pois quando
se reúne todos os trabalhadores nunca dá certo, isso porque cada um procura expor o seu
problema e não entendem o problema geral. Por isso, os trabalhadores falam que a
empresa não faz reuniões com trabalhadores. Segundo o entrevistado, querem um
precário onde possam expor todos os seus problemas.
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