revista transversalidades: v.1 n.3 • 109p. • nov 2009 / abr 2010

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Transversalidade Imperatriz - MA v. 1 n.3 109p. nov. 2009 / abr 2010 Transversalidades ISSN 1984-9524

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Transversalidade • Imperatriz - MA • v. 1 n.3 • 109p. • nov . 2009 / abr 2010

TransversalidadesISSN 1984-9524

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TRANSVERSALIDADESVolume 1 - Número 3 - 2010

Revista da Faculdade de Educação Santa Terezinha - FEST

Diretora da FESTRoza Maria Soares da Silva

Vice-Diretor da FESTKleber Alberto Lopes de Sousa

Diretor da RevistaFrancisco Lima Soares

Impressão:Ética Editora

Conselho CientíficoVincenzo Cicchelli CNRS – Sorbonne, Paris – FrançaPaul-André T urcotte Diretor da Revista Social CompassCássius Guimarães Chai Associação Internacional de DireitoAntônio Paulino de Sousa Chefe do Departamento de Educação - UFMA

Conselho EditorialFrancisco Lima Soares – FESTHerli de Sousa Carvalho – SEEDUC/MATereza Bom-Fim – AILKleber Alberto Lopes de Sousa – FESTAntonio de Pádua Pereira Silva – FESTVanessa Diniz Mendonça Miranda – FESTAparecida de Lara Lopes Dias – FESTRoza Maria Soares da Silva – FEST

Equipe TécnicaLuciléia Lima FreireJosé Bispo de Sousa

BibliotecáriaRaimunda Cortez Moreira Dourado

RevisãoTasso AssunçãoInácia Neta de Sousa

CapaFundação de Amparo à Pesquisa na Pré-Amazônia – FAPPA / FEST

Revist a financiada com recursos da Faculdade de Educação Sant a Terezinha - FEST

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TRANSVERSALIDADES publica artigos científicos da área humanística.

Versão on-line: http://www.fest.edu.br/transversalidades

Projeto gráfico: Luciléia Lima Freire

Normalização: Luciléia Lima Freire Raimunda Cortez Moreira Dourado

Editoração eletrônica: Ética Editora

E-mail: [email protected]

Solicita-se permuta.Nos gusta cambiar.

Nous acceptons exenge.Change.

Tiragem: 1.000 exemplares

Transversalidades: Revista da Faculdade deEducação Santa Terezinha. – Imperatriz: FEST.2011.

V.1, n.3 (2008) –

113 p.

Semestral

1. Direito – Periódico. 2. Educação – Periódico.I. Faculdade de Educação Santa Terezinha.

CDU 34+37 (05)

Dados de Catalogação na Publicação

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SUMÁRIO

EDITORIAL ................................................................................................. 7

ARTIGOS ORIGINAIS — EDUCAÇÃO

FRANCISCA EDIVONÉRIA BARBOSA DE SOUZAA ressignificação do ensino de arte na educação básica .................................... 9

ANA CLÁUDIA DE SOUSAAPARECIDA DE LARA LOPES DIASILMA MARIA DA SILVA OLIVEIRAKLEBER ALBERTO LOPES DE SOUSARITA MARIA GONÇALVES DE OLIVEIRAFormação continuada de professores indígenas Krikati:relato de uma experiência .............................................................................. 36

MARIA ZÉLIA BEZERRA VALEVERÍSSIMA DILMA NUNES CLÍMACOAproximaçaõ entre teoria e prática ................................................................ 48

LÝVIA MAYRA FERREIRA DE MELOPrática de ensino da leitura no primeiro ano do ensino fundamental .............. 55

MARIA TEREZA BOM-FIM PEREIRARemexendo um baú pedagógico: contos da carochinha, velhos costumes,outros olhares, novas histórias ....................................................................... 65

DUCILENE MELO DA SILVAPráticas de educação ambiental em área com carência dos serviçosde saneamento básico: o Café Liberal ............................................................ 92

ROSYJANE PAULA FARIAS PINTOÉtica ambiental: do pensamento antropocêntrico ao ecocêntrico ................... 98

ARTIGOS ORIGINAIS — ECONOMIA

JOSÉ SÉRGIO DE JESUS SALLESODONNIELE COELHO CARVALHOA contabilidade como ferramenta de gestão nas micro epequenas empresas do setor varejista de Imperatriz-MA ............................... 16

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ARTIGOS ORIGINAIS — DIREITO

IVANEIDE PEREIRA LIMAOLÍVIA PEREIRA DA MOTACARLOS HENRIQUE BEFORA concessão dos direitos dentro das normas jurídicas brasileiras .................... 27

MÁRCIA CAVALCANTE DE AGUIARÍndice de criminalidade no Município de Estreito-MA antes barrageme pós-barragem sob a visão criminológica com a comparação de teoriascriminais ........................................................................................................ 83

MARCIO FERNANDO MOREIRA MIRANDAMÁRCIA DA CRUZ GIRARDIMeio ambiente: um direito de todos ............................................................ 107

ARTIGOS ORIGINAIS — TEOLOGIA

MOAB CÉSAR CARVALHO COSTA100 anos de pentecostalismo no Brasil .......................................................... 71

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Manifestamente, a produção científica tem sido em nossa cultura um dos desa-fios mais onerosos. A ruptura com o modelo de aprendizado socialmente e cultural-mente construído pelas instituições de ensino fundamental e ensino médio, tornou-se o modelo dominante para os nossos dias. Este periódico, fruto de aspirações daousadia da Faculdade de Educação Santa Terezinha – FEST, quer contribuir com aruptura deste modelo educacional centrado unicamente no ensino. A região da pré-amanônia é um espaço extremamente desprovido de pesquisa, pois a grande maioriadas produções realizadas é proveniente do sudoeste e do sul do país.

Esta publicação semestral quer ser um instrumento de propagação da produçãocientífica nas áreas de Ciências da Educação, Economia e Direito. Tem o nome deTRANSVERSALIDAES, porque se propõe a trabalhar cientificamente, quer demaneira exploratória, quer de maneira bibliográfica, as mais variadas linhas e áreasde pesquisa destas ciências. As iniciativas de grupos de iniciação científica das insti-tuições de ensino médio estão disseminando um desejo de pesquisa que, recente-mente, tem se estendido até as instituições de ensino superior. Assistimos ao surgi-mento de novos núcleos de pesquisas e percebemos a determinação de jovenspesquisadores saindo da graduação e mestrado procurando ingressar na investigaçãocientífica.

Objetivando legitimar o trabalho destes pesquisadores, este instrumento nascecom a determinação de coletar, analisar e publicar os artigos de graduandos, gradua-dos, especialistas, mestres e doutores em suas áreas específicas. Destina-se a publicardocumentos de docentes e discentes da FEST e outras IES, porque se constatamindícios de formação de um espírito científico nesta região e o papel de uma institui-ção de ensino superior é lançar mão do crivo epistemológico para aproveitar a rique-za dos estudos empreendidos e tornar público a partir de um documento escrito.

A relevância da produção, incluindo a originalidade, constitui o critério para pu-blicação nesta revista. Gastão Bachelard1 diz que só existe ciência quando compara-mos as realidades quantificadas. Neste sentido, esta obra periódica quer receber crí-ticas, porque ela não se propõe ser a última palavra, que seria a própria negação daciência, mas abrir um debate escrito no seio das comunidades científicas que codifi-cam os mesmos signos lingüísticos e os mesmos conceitos. Faz-se um esforço sobremedida para que a honestidade científica seja o princípio norteador deste periódico.Empenhar-nos-emos de zelar pela construção do patrimônio científico e assumimospublicamente que se eventualmente constatarmos um só delito epistemológico nes-te documento, faremos retratação aos leitores e o autor do artigo não mais escreveránesta revista.

EDITORIAL

1 BACHELARD, Gaston. La formation de l’esprit scientifique. Paris: PUF, 1938.

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A RESSIGNIFICAÇÃO DO ENSINO DE ARTENA EDUCAÇÃO BÁSICA

Francisca Edvonéria Barbosa de Souza1

RESUMO

O ensino de Arte apresenta funções específicas junto ao processo de socialização do saber, comvistas ao desenvolvimento intelectual do educando, por meio de experiências que o tornam sensívelaos signos artísticos. Assim, saber arte e saber ser professor de Arte são premissas deste trabalho,o qual, embora em grandes traços, apresenta como diretriz fundamental, as ações voltadas àressignificação da Arte enquanto área do conhecimento, no currículo da Educação Básica. Comoa Arte exige profissionais que saibam posicionar-se frente às questões teóricas, metodológicas,sociais e culturais, entre outras, aborda-se a urgência das ações voltadas para a qualificação doeducador atuante na área.

Palavras-Chaves: Ensino de Arte. Educação Básica. Aluno. Professor. Qualificação.

1 INTRODUÇÃO

Inicialmente, coloca-se em foco um passa-do que porta em seu bojo a arte como fiel teste-munha da história construída pelo homem.

Ainda no princípio da história da humani-dade, antes mesmo de saber escrever, o homemexpressou e interpretou o mundo em que vivia

1 Graduada em Pedagogia (Habilitação em Supervisão Escolar) na Universidade Federal do Maranhão – UFMA;especialista em Didática Universitária pela Faculdade Atenas Maranhense – FAMA; professora substituta naUniversidade Federal do Maranhão – UFMA (Departamento de Educação II); funcionária pública das redesEstadual e Municipal.

ABSTRACT

The Arts teaching presents specific functions in the process of knowledge socialization, that’saims the intellectual development of the student, through his own experiences with make himsensitive to artistic signs. Thus, knowing arts and knowing how to be a Arts teacher are bothassumptions (premises) of this work, which, although in large view, presents as a fundamentalguideline, the actions for resignification of the Art while an area of science, in the basic Educationcurriculum. Since the Arts requires professionals who know how to behave for theoreticalquestions, methodological, social and cultural, among others, it deals with the urgency of thepolitics directed to the qualification of the teachers that works in the area.

Key-Words: Arts Education. Basic Education. Student. Teacher. Qualification.

pela linguagem da arte, possuindo como ateliê,a caverna de umidade rochosa, onde pintou seussentimentos e necessidades. Estava o homempré-histórico educando-se esteticamente, mui-to antes da palavra.

Mudou o mundo, a arte, a educação. Por-tanto, na contemporaneidade, o termo arteacha-se incorporado ao vocabulário educacio-

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nal, respaldado pela Lei de Diretrizes e Basesda Educação Nacional, LDB de n° 9.394 /96,a qual determina em seu artigo 26, parágrafo2°: “O ensino da arte constituirá componentecurricular obrigatório, nos diversos níveis daeducação básica, de forma a promover o de-senvolvimento cultural dos alunos”. Logo, umaquestão se coloca: como está o fazer do profes-sor de Arte? Está indo ele em busca de umaaprendizagem significativa para o aluno?

Na atual conjuntura, no contexto da educa-ção escolar, tem sido árdua a ação político-edu-cativa de democratizar a “gramática da arte”.A postura emergencial do professor, nessa área,aponta para a necessidade de garantir para si,informação e domínio acerca dessa “gramáti-ca”, já que é de sua competência tornar favorá-vel ao aprendiz, o acesso aos códigos, símbo-los e regras da linguagem, sem impor-se àidealizada responsabilidade de formar artistas.

Nessa medida, o presente trabalho estrutu-ra-se de modo a promover uma reflexão focadana ação docente do professor de Arte, no saberarte e no estar habilitado para trabalhar comotal área do conhecimento na educação básica.Faz-se alusão aos desafios postos à frente des-tes que devem ser os animadores no processoeducativo, os “artistas-educadores”.

2 SABER ARTE E SABER SER PROFES-SOR DE ARTE: um compromisso

Há um instante mágico na vida em que,nem mesmo sabendo por que, ficamosenvolvidos num jogo. Num jogo de apren-der e ensinar.Fazemos parcerias. Não só com os ou-tros, mas também parcerias internas, nospropondo desafios. Porém, só ficamosnesse estado de total cumplicidade como sa­ber se este tem sentido para nós.Caso contrário, somos apenas expectado-res do saber do outro.Em que o ensino de Arte faz sentido paravocê? (MARTINS, 1998, p. 127).

Tomando como referência essa sensível falade Martins, a qual certamente traz a ressonân-cia de quem vivenciou momentos mágicos doaprender e ensinar, questiona-se: será que aqui-

lo que se tem ministrado nas aulas de Arte, éde fato arte? Pensar o ensino de Arte nessa pers-pectiva, é então, pensar na interação do edu-cando com o campo da arte, o seu contato dire-to com ela. E, é sobre a relevância de levar aarte para as aulas de Arte que se tem a preten-são de discorrer, inicialmente, respondendoassim, a esta indagação.

Apesar de o mundo contemporâneo, comtodos os seus avanços, achar-se de alguma for-ma evidenciado nas atividades artísticas, aação pedagógica em Arte tem sido um desafiopara o coletivo dos professores atuantes naárea. Sob essa lógica, julga-se importante des-tacar que o ensino de Arte vem sendo desca-racterizado, ao longo do tempo, tanto pela in-consistência na sua prática, quanto pelafragilidade de qualificação dos professores,existindo na sala de aula, basicamente comoum mero aprendizado de técnicas. Como di-zem os Parâmetros Curriculares Nacionais(PCNs) de Arte:

No ensino de Arte no Brasil observa-seum enorme descompasso entre as práti-cas e a produção teórica na área. Tal des-compasso é fruto de dificuldades de aces-so a essa produção, tanto pela pequenaquantidade de livros editados e divulga-dos sobre o assunto como pela carênciade cursos de formação contínua na área.Nota-se ainda a manutenção de clichêsou práticas ultrapassadas em relação aosconhecimentos já desenvolvidos na área[...]. Em muitas escolas ainda se utiliza,por exemplo, modelos estereotipados paraserem repetidos ou apreciados. [...] Em ou-tras, ainda se trabalha apenas com a auto-expressão, sem introduzir outros saberesde arte. A poliva­lência ainda se mantémem muitas regiões [...] (1998, p. 29).

No que tange à questão, cumpre, pois, men-cionar que na prática educativa escolar emArte, o educador é o responsável em possibili-tar aos aprendentes, o fazer artístico comomarca e poética pessoal, tendo em vista queproduções semelhantes não manifestam formasexpressivas, mas tão-somente “fôrmas” que,por serem re­petitivas tornam-se sem signifi-cado para quem as faz, não passando de cópiasou estereótipos.

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O PCN de Arte propõe que se trabalhe porano uma linguagem artística, escolhendo en-tre teatro, dança, música ou artes visuais, a fimde que se tenha profundidade e continuidadeem cada área.

O conteúdo ministrado em cada linguagem,depende do conhecimento construído peloseducandos nas séries anteriores, a fim de quehaja sequência no processo de aprendizagem.No entanto, a ação docente de desenvolver tra-balhos espontâneos, por meio da ministraçãode aulas isentas de atitudes educativas direti-vas junto aos discentes, bem como a restriçãode tal trabalho pedagógico à organização deaulas fundamentadas em atividades de pinturade desenhos já impressos ou, quando muito,apresentações de “peci­nhas”, canções e dan-ças conhecidas, não estimula a criatividade doseducandos, mas inibe a capacidade criadoradestes, lhes apontando um caminho fácil e po-bre da criação: o da reprodução de fórmulasprontas.

Por outro lado, essa área do conhecimentohumano, na época presente, não tem a preten-são de identificar-se com os princípios moder-nistas, cuja ênfase residia na auto-expressão eo papel do professor resumia-se à facilitaçãodo contato espontâneo do aluno com materi-ais expressivos e com técnicas produtivas.Ensinar e aprender arte tornou-se uma ativi-dade complexa, visto que pressupõe um inten-so diálogo na relação professor-aluno, com oobjeto artístico. A esse respeito, embasada noPCN de Arte, explica Martins:

Só aprendemos aquilo que, na nossa ex-periência, se torna significativo para nós[...]. Uma aprendizagem em arte, só é sig-nificativa quando o objeto de conhecimen-to é a própria arte, levando o aprendiz asaber manejar e conhecer a gramática es-pecífica de cada linguagem que adquirecorporalidade por meio de diferentes re-cursos, técnicas e instrumentos que sãopeculiares (1998, p. 128, 131).

Conquanto possam existir divergências nosencaminhamentos metodológicos acerca doensino de Arte, ministrar tal disciplina exigedomínio de conhecimentos específicos na área,bem como dos fundamentos do seu ensino;

somente a intimidade com o fenômeno artísti-co e educacional poderá possibilitar ao educa-dor o exercício da sua flexibilidade na articu-lação dos conteúdos, recursos e técnicas emsala de aula. No tocante ao ser professor deArte, Fusari e Ferraz pontuam:

Mas, o que é esse conhecimento? O queé ser professor de arte? É atuar através deuma pedagogia mais realista e mais pro-gressista, que aproxime os estudantes dolegado cultural e artístico da humanida-de, permitindo, assim, que tenham conhe-cimento dos aspectos mais significativosde nossa cultura, em suas diversas mani-festações [...] (1993, p. 49).

No início de um curso de formação de pro-fessores, a consultora em projetos educacionais,doutora Weisz, faz uma co­locação esclarece-dora e adequada à questão em foco, quando diz:“Ao aprendiz, como sujeito de sua aprendiza-gem, corresponde, necessariamente, um pro-fessor sujeito de sua prática docente” (2001, p.23). Segundo esse ponto de vista, ressalta-seque o ensino de Arte, pela sua abrangência,exige um competente trabalho docente. Contu-do, em se tratando da ação educativa nessa dis-ciplina, o educador tem de procurar entrelaçara sua práxis artística e estética a consistentespropostas pedagógicas. Em síntese, é precisosaber arte e saber ser professor de Arte juntoaos alunos para que esses, ao fazerem e conhe-cerem-na, sejam protagonistas do próprio pro-cesso de aprendizagem, produzindo a transfor-mação que converte a informação emconhecimento próprio. Nas palavras de Fusarie Ferraz:

O professor de Arte constrói e transfor-ma seu trabalho na sua práxis cotidiana,na síntese entre a ação e reflexão. É nestesentido que precisa saber arte e saber serprofessor de Arte; saber os conteúdos eos procedimentos para que os alunos de-les se apropriem (1992, p. 41).

Dessa forma, é da alçada do professor, or-ganizar a situação de aprendizagem de modo aoferecer informação adequada, pois, essa cons-trução, pelo aprendente, não se dá por si mes-ma no vazio, mas a partir de situações nas quais

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ele possa agir sobre o que é objeto de seu co-nhecimento, pensar sobre ele, sendo desafiadoà reflexão e à interação com o grupo. A inter-venção problematizadora do professor é deter-minante nesse processo, seja nas propostas deatividades, seja encorajando seus alunos a lan-çarem-se na ousadia de aprender.

Compete também a esse pensador-execu-tor, que é o professor de Arte, evitar o caráterpuramente recreativo das suas aulas, que porvezes, se instaura no espaço escolar, pois elanão foi criada com o objetivo de distrair os edu-candos. Logo, é imprescindível a compreen-são de que as experiências com os signos artís-ticos não visam a distração da “seriedade” dasoutras áreas, mas, representam uma produçãoespecífica. Assim, ancorando- se em PCN des-sa disciplina em específico, se pode afirmar quea melhor forma de torná-la uma disciplina tãoconsistente como qualquer outra, é por inter-médio da indicação de como as manifestaçõesartísticas estão presentes no cotidiano e, dacompreensão, por parte dos alunos, do real sen-tido do fazer artístico.

Isso posto, conclui-se que no intuito de ori-ginar transformações positivas no sistema edu-cativo brasileiro, os Parâmetros CurricularesNacionais (PCNs) de Arte são um norte à prá-tica pedagógica dos docentes, contribuindo paraa formação e atualização profissional dos mes-mos. A definição oferecida pelos mesmos so-bre os conteúdos de cada ciclo, não é uma defi-nição rígida, ao contrário, orienta o professor aadequar sua prática ao repertório cultural queo educando traz à escola, ao seu conhecimentoprévio, afinal, criar e conhecer são indissociá-veis e a flexibilidade é condição fundamentalpara a construção e reconstrução do conheci-mento por parte dos aprendizes.

A concepção de arte capaz de auxiliar na fun-damentação de uma proposta de ensino e apren-dizagem artístico-estética, favorável à sua mo-bilidade conceitual, é a que, conformeorientações apresentadas nos PCNs, sugerindoa cada tipo de conteúdo da área, que seja minis-trado nos três eixos da experiência de aprendi-zagem significativa do estudante de arte, quaissejam: a experiência do fazer, do apreciar e docontextualizar. Todavia, cada tipo de conteúdo

demanda diversas maneiras de ensinar e apren-der, isto é, modos distintos de construção e re-construção do conhecimento por parte do dis-cente.

Glosando um pouco mais a respeito das lin-guagens artísticas, vale ressaltar que Fusari eFerraz afirmam ser as vivências artísticas emartes visuais ou audiovisuais, teatro, dança,música, exercidas pelos alunos em ambienteextra-escolar, importantes pontos de referên-cia para o ensino e a aprendizagem dessa áreado currículo. À formação escolar é passível acontribuição dos aprendizes a partir de seusconhecimentos prévios, o que lhes possibilitagerar novas habilidades e saberes significati-vos e ampliadores de suas sensibilidades e cog-nições relativas a tais modalidades artísticas.

3 O DIREITO DO PROFESSOR APREN-DER A ENSINAR ARTE

Ao colocar em pauta a formação continua-da do professor no exercício da docência emArte, cabe ressaltar que, para os alunos teremassegurado o seu direito de aprender, é impres-cindível aos professores, terem assegurado oseu direito de aprender a ensiná-los, pois comodiz Demo: “[...] Somente o professor queaprende bem e continuadamente pode fazer oaluno aprender” (1998, p. 48).

À luz da atual Lei de Diretrizes e Bases daEducação Nacional (LDB n° 9.394/96), no quetange à formação contínua do profissional daeducação em serviço, o artigo 62, inciso IIIdesponta para: “Programas de educação conti-nuada para os profissionais de educação dosdiversos níveis”. Essa perspectiva reforça-seainda mais através do artigo 67, inciso V, quan-do a lei preconiza: “Período reservado a estu-dos, planejamentos, à avaliação, incluído nacarga de trabalho”.

Nessas condições, em que se tem assegura-do legalmente o que poderia se chamar de “di-reito de estudar” no âmbito da profissionaliza-ção continuada, é da alçada do professor de Arteinstrumentalizar-se a fim de compreender quaistarefas e papéis lhe são pertinentes desempe-nhar no processo de ensino e aprendizagemnessa área do currículo.

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Procurando seguir a ordem de raciocíniode que a docência não se faz sozinha, entende-se que a qualidade da formação contínua doseducadores de modo geral e, da área de Arteem particular, não garante por si só, a excelên-cia em educação escolar, mas, é condição pre-ponderante para que isso ocorra. Não obstan-te, existe um conjunto de variáveis queinterferem na qualidade dos conhecimentosconstruídos e/ou reconstruídos pelos estudan-tes, isentando assim, os docentes, de acharem-se unicamente responsabilizados por resulta-dos que apenas em parte lhes dizem respeito.

Evidentemente, os ensinantes de Arte, tam-bém têm sua parcela de responsabilidade pelofracasso escolar na disciplina em que atuam,embora não sejam pessoalmente responsáveis.O que há por trás dessa afirmação, não é a ideiade que o professor não disponha de competên-cia para desenvolver seu trabalho e sim, umamudança na compreensão de seu papel: que aprofissão de educador pressupõe uma práticade reflexo e atualização constantes. Fusari eFerraz remetem o professor da área de Arte ne-cessariamente, a uma revisão de seu trabalhopedagógico ao acrescentarem:

O trabalho com a arte na escola tem umaamplitude limitada, mas ainda assim hápossibilidades dessa ação educativa serquantitativa e qualitativamente bem-fei-ta. Para isso, seu professor precisaen­contrar condições de aperfeiçoar-secontinuamente, tanto em saberes artísti-cos e sua história, quanto em saberes so-bre a organização e o desenvolvimentodo trabalho de educação escolar em arte(1999, p. 19-20).

Diante destas constatações, é perfeitamen-te compreensível a relevância atribuída às prá-ticas de formação continuada, as quais propor-cionam ao ensinante um domínio presente desua disciplina, a capacidade de revelar os as-suntos que realmente cooperem para a forma-ção dos educandos.

Outra vertente é a maneira de aprender aensinar. Diferentemente do procedimento deidentidades isoladas, comumente desenvolvi-

do pelos docentes, as novas práticas surgem apartir de dimensões coletivas. O modo de tra-balho individualizado, em que educadores exer-cem a ação docente sem compartilhá-la em equi-pe, nem relacioná-la aos acontecimentos intrae extra-escolares, tem mostrado-se cada vezmais inadequado. Antonio Nóvoa confirma aomanifestar2: “[...] Novas práticas de ensino sónascem com a recusa do individualismo [...].Falta uma dimensão de grupo que rejeite o cor-porativismo e afirme a existência de um coleti-vo profissional [...] “ (2001, p.13).

A despeito de todos os esforços em mani-festar a necessidade de o educador continuaraprendendo como cidadão responsável e parti-cipativo, integrado ao projeto de sociedade emque se vive e, ao mesmo tempo, crítico de suasmazelas, o ensino de Arte, através de Barbosa,indaga:

Se a arte é, de fato, este tesouro compar-tilhado através do exercício da cidadania,como se explica que a mesma sociedadeque se estrutura para guardá-lo não seestrutura para, juntamente, repartir entresi a possibilidade igualitária de fluí-lo?Como entender que grandes somas se-jam gastas na constituição de museus dearte por sociedades que não investem emeducar para a fluição da arte? (2001, p. 3).

Frente a essa situação, manter-se professorde Artes, é um ato de valentia. Se a sociedadedemanda profissionais habilitados a prestaremum trabalho de qualidade à população, faz-senecessário que as instituições formadoras cum-pram seu papel de habilitá-los adequadamente,lhes favorecendo constantes oportunidades deformação, encarando-a como uma construçãocontínua de pessoas, seus saberes e aptidões,sua capacidade de discernir e agir.

Parafraseando Nóvoa (2001), pode-se afir-mar que o ideal seria a implantação, por partedas políticas públicas para a educação, de umprograma de formação continuada remunera-do, no intuito de que os educadores fossem opor-tunizados a se dedicarem à formação, indepen-dentemente dos salários.

2 Em reportagem à revista Nova Escola n. 142, p. 13, 2001).

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando a relevância da arte e, porconseqüência, em qualquer forma de instituci-onalização da vida, a bem dizer, a escola, a aven-tura de ensiná-la nas instituições de ensino, ésinônimo de saber operar com a construção dossentidos para si e para o mundo, por intermé-dio de suas distintas e expressivas linguagens.Logo, muito mais une o ensino de técnicas, quenão raro leva o professor a forçosamente que-rer moldar os aprendizes à própria imagem, o“artista-educador”, em primeira instância, ne-cessita impor-se a missão de procurar compre-ender o profundo sentido do fazer artístico.

Na escola, a arte não tem por fim formarartistas, como a matemática não tem por fimformar matemáticos, embora tais disciplinasdevam ser igualmente bem-vindos numa soci-edade desenvolvida. O que a arte na escola pri-oritariamente anseia é formar o conhecedor,fruidor, decodificador da obra de arte.

Ao longo deste ensaio, buscou-se, por meiode um conjunto integrado, onde referências te-órico-metodológicas se entrelaçam, dar mos-tras ao educador artístico, que sua prática é re-sultado do saber, do fazer e, principalmente, doser, significando compromisso consigo mesmo,

com o aluno, com o conhecimento e com a so-ciedade e sua transformação.

Desta forma, quando colocados na condi-ção de responsáveis pelo processo de ensino eaprendizagem de tal disciplina, os “arte-edu-cadores” na sua maioria, despreparados e inse-guros, desprovidos até de uma formação inici-al para o ingresso na área, passam a apoiar-secada vez mais nos livros didáticos de Educa-ção Artística. Assim, temas e técnicas ocupamo lugar de conteúdos e objetivos, reduzindo asatividades artísticas a uma sucessão de fazeresem que o aprendente é “deixado a fazer”, mui-tas vezes sem nenhuma orientação ou interven-ção do professor, uma história contraproducen-te aos novos marcos curriculares que vêmorientando a prática educacional nessa matériacurricular básica.

Nesse sentido, considerar que o aprenden-te, desde cedo interage com o conhecimentoconcernente às linguagens da Arte, concorrepara que o educador atente para os reais inte-resses e necessidades destes, promovendo umensino no qual figura e fundo se interpretem,onde um recorte cultural seguro preceda a co-lagem criadora e enriquecedora de experiênci-as artísticas no campo das artes visuais, músi-cas, teatro e dança.

REFERÊNCIAS

ARANHA, Maria Lúcia Arruda. MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. SãoPaulo: Moderna, 1986.BARBOSA, Ana Mae. John Dewey e o ensino da arte no Brasil. 3. ed. rev. São Paulo: Cortez, 2001.

BARBOSA, Ana Maria. A imagem no ensino da arte. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2001. (Coleção estudos)

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A CONTABILIDADE COMO FERRAMENTA DE GESTÃO NASMICRO E PEQUENAS EMPRESAS DO SETOR VAREJISTA

DE IMPERATRIZ/MA

José Sérgio de Jesus Salles1

Odonniele Coelho Carvalho2

RESUMO

Observou-se que a taxa de mortalidade de micro e pequenas empresas é muito elevada em relaçãoao tempo de duração das mesmas. Destarte, o objeto deste trabalho está fulcrado em fomentar aessencialidade das demonstrações contábeis e financeiras como ferramentas de apoio na gestãodesses empreendimentos, bem como identificar as ferramentas contábeis que podem ser utilizadasna tomada de decisão gerencial. Utilizou-se como métodos: pesquisa quanti-qualitativa, pesquisade capo e bibliográfica, instrumento de pesquisa, questionário fechado. Chegou-se a conclusãoentre outras coisas, que a mortalidade destas modalidades de empresas se deve a deficiênciasgerenciais dos próprios empreendedores.

Palavras chave: Micro-empresa. Mercado. Empreendimento. Gestão. Decisão.

ABSTRACT

It was observed that the mortality rate of micro and small enter­prises is very high relative at theduration the same. Thus the object of this work are centered in foster the essentiality of thefinancial statements and financial as tools to support management these enterprises and identifyaccounting tools which may be used in the management decision making. Was used as methods:quantitative and qualitative research, research capo and bibliographical research tool, closedquestionnaire. He came to the conclusion among other things, that the mortality of these proceduresfor companies is due to managerial shortcomings of the entrepreneurs themselves.

Keywords: Micro-enterprise. Market. Venture(undertaking). Management. Decision.

1 INTRODUÇÃO

Ainda que as micro e pequenasempresas representem a maioria das empresasformais do país, as estatísticas recentescomprovam que 80% atingem sua mortalidadeprecoce. Nesse contexto, o que pode serobservado é que os empresários constituem

uma empresa basicamente por realizaçãopessoal, sem o mínimo de experiência demercado e controle de uma organização.

Sendo assim, vê-se a necessidade do gestorobter melhores instrumentos gerenciais paraum maior grau de segurança no seu planeja-mento estratégico e nas suas decisões. A neces-sidade de manter-se competitivo no mercado

1 Servidor público federal; professor da Universidade Estadual do Maranhão; graduado em Agronomia, Adminis-tração e Direito, com especialização em Docência do Ensino Superior, Gestão Empresarial, Direito Tributário eDireito Público; mestrando em Direito Internacional – UAA/ASUNCIÓN-PY. E-mail: [email protected]

2 Graduada em Administração e Ciências Contábeis. E-mail: [email protected].

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vai além da utilização de métodos empíricos ede decisões que visam apenas um curto hori-zonte da empresa.

É nesse sentido, que a contabilidade surgecomo base para as informações que o empreen-dedor necessita. Essa ciência auxilia principal-mente no controle e no planejamento, bemcomo em situações cotidianas simples, como aformação do preço de venda de um produto oua análise da liquidez da empresa.

No entanto, ainda não existe essa percep-ção da contabilidade como ferramenta geren-cial. O senso comum é de que a contabilidadesó existe como uma simples obrigação fiscal,ignorando assim, as inúmeras vantagens queessa ferramenta pode oferecer.

Portanto, é objetivo desse trabalho demons-trar para os empresários de pequeno porte, quea Contabilidade pode servir e é fundamentalcomo instrumento de apoio na gestão dos ne-gócios. Concomitantemente, direcionar osempreendedores ao uso constante dessa ciên-cia para a busca da correta interpretação de re-latórios e a administração de seu negócio demaneira eficiente.

O método utilizado no trabalho foi o depesquisa bibliográfica, em conjunto com a pes-quisa de campo realizada em uma amostra de10 empresas do setor varejista de Imperatriz,previamente selecionadas pelo programa deexpansão desse setor, desenvolvido pelo Servi-ço Brasileiro de Apoio as Micro e PequenasEmpresas – SEBRAE.

2 MICRO E PEQUENAS EMPRESAS– MPE’S

As micro e pequenas empresas (MPE´S) sãoum dos pilares de sustentação da economiabrasileira. Em termos estatísticos, esse seg-mento empresarial representa 98% das 4,1milhões de empresas formais na indústria, co-mércio e serviços (SEBRAE, 2006). Esse tipode empreendimento, também contribui para adiminuição do desemprego, uma vez que cons-titui uma alternativa para uma parcela da po-pulação que quer desenvolver seu próprio ne-gócio, e por outro lado, uma alternativa para aparcela da força de trabalho excedente, e com

pouca qualificação, que não encontra empre-go em empresas de grande porte. Nessa análi-se, segundo dados do Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística (IBGE), na economiainformal, as MPEs representam 9,5 milhõesde empreendimentos, envolvendo trabalhado-res por conta própria e pequenos empregado-res com 1 (um) a 5 (cinco) empregados.

Considerando o cenário internacional, es-sas empresas também se destacam. Segundo aAgência de Promoção de Exportações do Bra-sil, em 2007, o valor exportado pelo segmentodas micro e pequenas empresas bateu recordehistórico de US$ 2,1 bilhões, com alta de12,4% em relação ao ano anterior. Sendo queem 2008, 61% das firmas exportadoras brasi-leiras se enquadravam no padrão de micro epequeno negócios (APEX, 2008).

É importante ressaltar, que as MPE´s sãoresultantes da redução do rítmo de crescimen-to da economia ocorrido em 1980. A partirdisso, os pequenos negócios foram considera-dos uma alternativa para a massa excedente detrabalhadores e, conseqüentemente, surgiramos primeiros incentivos à abertura de micro epequenas empresas na economia brasileira,culminando com o advento da Lei Comple-mentar no 123, de 14 de dezembro de 2006,que aprova a Lei Geral da Micro e PequenaEmpresa.

2.1 Definição de Micro e Pequenas Empresas

Segundo o artigo III da Lei Complementarno 123, de 14 de dezembro de 2006, conside-ram-se microempresas ou empresas de peque-no porte a sociedade empresária, a sociedadesimples e o empresário a que se refere o art.966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002,devidamente registrados no Registro de Em-presas Mercantis ou no Registro Civil de Pes-soas Jurídicas, conforme o caso, desde que:

I. No caso das microempresas, o empresá-rio, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, au-fira, em cada ano-calendário, receita brutaigual ou inferior a R$ 240.000,00 (duzentos equarenta mil reais);

II. No caso das empresas de pequeno por-te, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela

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equiparada, aufira, em cada ano-calendário,receita bruta superior a R$ 240.000,00 (du-zentos e quarenta mil reais) e igual ou inferiora R$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocen-tos  mil reais).

2.2 A mortalidade das micro e pequenas em-presas

Conforme pesquisa do Serviço Brasileirode Apoio às Micro e Pequenas Empresas, oíndice de mortalidade dos empreendimentosbrasileiros é alto, 22% das empresas com atédois anos de funcionamento fecham suas ativi-dades. Ainda nessa análise, se consideradas asempresas com até 04 anos de existência os ín-dices sobem para 59,9% (SEBRAE, 2007).

Com base nessas pesquisas, foi constadoque na maioria dos casos, a mortalidade des-ses empreendimentos se dá por falta de plane-jamento financeiro e falta de ferramentas ade-quadas no processo decisório da empresa. Napesquisa apresentada pelo SEBRAE (2007), oíndice de empresários que atribui alguma im-portância ao processo decisório não passa de8%. Para RAMOS (1989), que seres humanostomam decisões e escolhem, levados por duasforças: causas finais e não apenas causas efici-entes. Nesse sentido, vê-se que os gestores so-brepõem o seu desejo particular ao universodo mercado financeiro. A falta de visão sobreo empreendimento leva os administradores adecisões tendo por base a conjuntura atual emque se encontra a empresa, esquecendo do pro-cesso de planejamento estratégico que influen-cia a sua permanência no mercado.

Conclui-se, portanto, que a falta de planeja-mento financeiro nas tomadas de decisões dasempresas ainda é um problema no desenvolvi-mento dessas e constitui-se como um fatorimportante na mortalidade precoce desses mi-cro e pequenos empreendimentos.

2.3 A mortalidade das micro e pequenas em-presas no Maranhão

Segundo estudo do SEBRAE (2005), o prin-cipal fator que conduz ao fracasso dos negóci-os reside em erros gerenciais na condução da

atividade. Nessa perspectiva, o estudo aindaconclui que algumas das hipóteses que são le-vantadas para essa questão são: ausência deplanejamento, gestão empresarial e conheci-mentos contábeis.

A taxa de mortalidade apurada no Mara-nhão revela que 64,4% das empresas encerra-ram as atividades com até 2 (dois) anos de exis-tência, 57,6% com até 3 (três) anos e 51,3%não sobreviveram além dos 4 (quatro) anos.

Neste contexto, segundo a pesquisa, o con-tador é o profissional mais requisitado entreos empresários que buscam auxílio profissio-nal para a condução dos negócios. No entanto,há evidências de que as informações contábeissão, aparentemente de uso restrito para aten-der às exigências fiscais, sendo subutilizadasno processo de tomada de decisão.

3 INSTRUMENTOS DE APOIO GE-RENCIAL: A CONTABILIDADEPARA ADMINISTRADORES

Segundo MARION (2004), “a Contabili-dade é o instrumento que fornece o máximo deinformações úteis para a tomada de decisõesdentro e fora da empresa”.

IUDÍCIBUS (1998) complementa dizendoque a contabilidade é uma: Metodologia espe-cialmente concebida para captar, registrar,acumular, resumir e interpretar os fenôme-nos que afetam as situações patrimoniais,financeiras e econômicas de qualquer ente,seja este pessoa física, entidade de finalida-des não lucrativas, empresa, seja mesmo pes-soa de Direito Público, tais como Estado, Mu-nicípio, União, Autarquia, etc.

Portanto, a contabilidade visa à orienta-ção do controle e do registro relacionadosaos atos e fatos da administração da empre-sa, informando ao administrador sobre asalterações ocorridas no patrimônio, baseadono planejamento efetuado por ele.

3.2.1 Os usuários das informações contábeis

Os usuários são pessoas que utilizam asinformações contábeis da empresa, procuran-do analisar a situação em que ela se encon-

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tra, podem ser divididos em internos e exter-nos. Os primeiros são os gerentes e osfuncionários, que se utilizam das informa-ções para gerir e planejar o futuro da empre-sa. Já os últimos, são os investidores, quebuscam nos relatórios contábeis a realidadeda empresa, visando obter lucros; os forne-cedores, que utilizam as informações parraanalisar a questão de adimplência em relação aempresa; os bancos, que observam a questãode pagamento da empresa em caso de forneci-mento de linhas de crédito e o governo, quequer saber quanto de impostos tem de serrecolhidos aos cofres públicos.

Segundo WARREN (2001), a informaçãocontábil é dividida em duas áreas: financeira egerencial. Nesse contexto, tem-se que aContabilidade Financeira direciona as infor-mações contábeis ao público externo - os acio-nistas, os credores, entidades reguladoras e au-toridades governamentais tributárias;objetivando assim, o conhecimento dos agen-tes externos, das consequências das decisõesde administradores e funcionários da empre-sa.6

Nessa perspectiva, os relatórios contábeisda área financeira são regidos de acordo comos Princípios Fundamentais da Contabilidade,que, segundo o Artigo 3º da Resolução doConselho Federal de Contabilidade CFC nº750/93, são: o da Entidade, da Continuida-de, da Oportunidade, do Valor pelo RegistroOriginal, da Atualização Monetária, da Com-petência e da Prudência.

Por outro lado, a Contabilidade Gerencialdireciona a informação contábil ao apoio nasdecisões da empresa. As informações da Con-tabilidade Gerencial incluem os dados usadospela administração em operações cotidianase no planejamento estratégico e são influen-ciadas pelas necessidades da gestão da em-presa. Este também é o entendimento de CRE-PALDI (1998), ao proferir que:

A Contabilidade Gerencial é o ramo daContabilidade que tem por objetivo forneceros instrumentos aos administradores de em-presas que os auxiliem em suas funções geren-ciais. É voltada para a melhor utilização dosrecursos econômicos da empresa, através de

um adequado controle dos insumos efetua-dos por um sistema de informação gerencial.

3.3 Necessidade das noções básicas da Conta-bilidade para tomada de Decisão nas Em-presas

3.3.1 Demonstrações Contábeis3.3.1.1 Balanço Patrimonial

Segundo IUDÍCIBUS (1998), o Balanço éa demonstração contábil que tem por finalida-de apresentar a situação patrimonial daempresa em dado momento, dentro de deter-minados critérios de avaliação. Nessa análi-se, a grande relevância do Balanço Patrimoni-al reside na demonstração das aplicações feitaspela empresa (Ativos) e a fonte desses recur-sos, que geralmente são devidos à terceiros(Passivos). Podemos observar então, desde onível de endividamento, a liquidez da empresae o capital próprio.

Segue abaixo a estrutura do balanço pa-trimonial alterada pela lei 11.638/07.

Tabela 1: Balanço Patrimonial

F o n t e :F o n t e :F o n t e :F o n t e :F o n t e : h t t p : / /www . f a cape . b r /wa l den i r / c f /

Demonstracoes_Financeiras_Alteacoes_Lei_6404.pdf

3.2.1.2 Resultado do Exercício

Com base em Iudícibus (1998), a funçãoprincipal das de­monstrações contábeis é ana-lisar as variações do patrimônio líquido e con-sequentemente, definir se a empresa obtevelucro ou prejuízo em um determinado exercí-cio. Assim, essas demonstrações, em con­juntocom o Balanço Patrimonial, visam mostrar asituação patrimo­nial e econômico-financeirada empresa.

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Tabela 2: Demonstração de resultado de exercício

FonteFonteFonteFonteFonte: HOJI 2003

3.2.1.3 Demonstação do Fluxo de Caixa

Apesar de ser obrigatória somente nas soci-edades de capital aberto ou com patrimôniolíquido superior a R$ 2.000.000,00 (dois mi-lhões) conforme Lei 11.638/2007, a DFC émais um importante relatório para a tomadade decisões gerenciais, seja em qualquer tipode empresa. De acordo com SANTOS (2001),o fluxo de caixa é uma ferramenta que norteiao planejamento da empresa, propici­ando a re-flexão e adoção de novas estratégias. É atravésdele que os administradores apresentam aosacionistas informações sobre a entrada e saídade dinheiro do caixa e planejam o futuro daorga­nização.

Mesmo não sendo uma demonstração obri-gatória para as mi­cro e pequenas empresas, éde suma importância esse tipo de con­trole,para avaliar a situação financeira além de utili-zar essas in­formações como base para o plane-jamento estratégico da organi­zação.

3.3 Necessidade das noções avançadas de Con-tabilidade

3.3.1 Análise de Balanço

A análise de balanço é feita com os dadosdos balanços pa­trimoniais e da demonstraçãodo resultado do exercício. Ela oferece aos ges-tores relatórios que identificam quais proble-

mas a empresa está enfrentando, possibilitan-do a eles, a visão correta que os solu­cione.NEVES e VICECCONTI (2004), percebe-seque a análise de balanço é o que vai fornecer asinformações sobre a real condição financeirada empresa.

Por sua vez, PANDOVEZE (1997), nosleva a concluir que a avaliação sobre a empresaé necessária para que a mesma possa, caso ne-cessário, tomar novos rumos..

3.3.2 Análise Vertical

A Análise Vertical facilita a avaliação daestrutura patrimo­nial, bem como a participa-ção de cada ítem da Demonstração de Resulta-do na formação do lucro ou prejuízo. Assim,ela mostra aos gestores da empresa as partici-pações dos elementos patrimoniais na totaliza-ção dos resultados, permitindo a eles a identifi-cação de algum item fora de suas proporçõesnormais. Para Iudícibus (1998), este tipo deanálise é importante para avaliar a estrutura decom­posição de itens e sua evolução no tempo.

3.3.3 Análise Horizontal

A Análise Horizontal objetiva mostrar aevolução dos itens das demonstrações contá-beis por períodos, buscando trazer aos seus ges-tores a situação da empresa naquele período eidentificar se houve um crescimento ou umdecrescimento de determinada conta analisa-da.

Iudícibus (1998), também comunga comesse entendimento ao afirmar que “a finalida-de principal da análise horizontal é apontar ocrescimento de itens do balanço e das demons-trações de resul­tado, através dos períodos, afim de caracterizar tendências”.

Tabela 3: Análise Vertical

FonteFonteFonteFonteFonte: NEVES e VICECCONTI (2004)

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Tabela 4: Análise Horizontal

FonteFonteFonteFonteFonte: NEVES e VICECCONTI (2004)

3.4.2 Análise por meio de índices

A análise dos índices consiste em relacio-nar contas e grupos de contas para extrair con-clusões sobre tendências e situação econômi-co-financeira da empresa. Esses indicadorestrarão aos administradores da empresa a situa-ção presente que ela se encontra, proporcio-nando o que poderá acontecer no futuro e con-sequentemente auxiliando nas decisõesestratégicas da empresa. Padoveze (1997), con-clui que: Os Indicadores econômicos - finan-ceiros são os elementos que tradicionalmenterepresentam o conceito de análise de balanço.São cálculos matemáticos efetuados a partir dobalanço patrimonial e da demonstração de re-sultados, procurando números que ajudem noprocesso de classificação do entendimento dasituação da empresa, em seus aspectos patri-moniais, financeiros e de rentabilidade.

TTTTTabela 5:abela 5:abela 5:abela 5:abela 5: Indicadores da situação econômico-

financeira

FonteFonteFonteFonteFonte: HOJI 2003

Tabela 6: Indicadores de rotação e rentabilidade

Nesse ínterim, Hoji (2003) fala dos Índicesde Estrutura de Capital indicam o grau de de-pendência da empresa com relação a capitaisinjetados e o nível de imobilização do capital.Quanto menor o índice, melhor. Por outro lado,ressalta que os índices de liquidez mostram asituação financeira da empresa. E continua afir-mando que: Os índices de rotação são calcula-dos relacionando-se os elementos patrimoni-ais com os ítens da demonstração de resulta­dose evidenciam o prazo de renovação dos ele-mentos patrimoniais dentro de determinadoperíodo, bem como, conclui que os índices derentabilidade medem quanto está rendendo oscapitais investidos.

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4 FORMAÇÃO DO PREÇO DEVENDA E DO LUCRO

4.1 Análise do Custo

4.1.1 Custo dos Produtos

Conforme Sá (1995), custo é um investi-mento efetivado com fins de aquisição. Sendoque, é importante ressaltar que os custos sãodivididos em custos fixo e variáveis. Assim, oscustos variáveis são os que variam de acordocom a produção, se a produção aumentar, oscustos aumentam, e se diminuir, eles tendem acair. Já os custos fixos são aqueles que não de-pendem da quantidade produzida, permanecen-do o mesmo independente da quantidade.

Com efeito, Santos (2001), ressalta que aapuração, análise e controle de custos geraminformações necessárias à tomada de decisões,como precificação, definição da carteira de pro-dutos e serviços, além da avaliação econômicade novos projetos de investimentos. Vê-se, por-tanto, que é de extrema importância que os ad-ministradores tenham conhecimento dos cus-tos, a fim de estudar a rentabilidade do produtoe desenvolver técnicas para a redução desses, econsequentemente, obter maior lucro para aempresa.

Nesse sentido, Martins (2001), afirma que aContabilidade de custos tem duas funções rele-vantes: no auxílio ao controle e na ajuda a toma-das de decisões. No que diz respeito ao contro-le, sua mais importante missão é fornecer dadospara o estabelecimento de padrões, orçamentose outras formas de previsão e, num estágio ime-diatamente seguinte, acompanhar o efetivamen-te acontecido com os valores anteriormente de-finidos. Logo, constitui-se em importante armade controle e decisão gerencial.

4.1.2 Margem de Contribuição

A margem de contribuição é o valor resul-tante das vendas líquidas, deduzidas dos custose despesas variáveis. Logo, ela propicia infor-mações ao administrador para a avaliação dasalternativas de investimentos, bem como a de-cisão sobre as estratégias de preço, serviços ou

produtos e avaliação do desempenho da em-presa.

4.1.3 Ponto de Equilíbrio

O Ponto de Equilíbrio mostra qual é o vo-lume que a empresa precisa produzir ou ven-der, para que consiga pagar todos os custos edespesas fixas, além dos custos e despesas vari-áveis, necessários para a fabricação e venda deseus produtos. Portanto, é uma ferramenta uti-lizada pelos administradores para determinaro ponto que a empresa precisa vender para co-brir os custos e despesas da fabricação de deter-minado produto, não trazendo prejuízo aos in-vestidores.

4.2. Formação do Preço de Venda

A formação do preço de venda é uma ques-tão crucial para a empresa, uma vez que é atra-vés dessa característica que a empresa atrai ocliente, bem como cobre os custos e despesasgerados pelo produto.

Em essência, as técnicas de fixação de pre-ços variam em função do porte da empresa, dosetor em que ela atua e das condições de merca-do, sendo que, segundo Santos (2001), os méto-dos escolhidos são à base de custo (total, parci-al, estimado ou padronizado), apurada combase num nível estimado de produção ou ope-ração, e acrescenta uma margem de lucro.

4.2.1 Formação de preço com base no custo

Segundo Hoji (2003), a formação de preçobaseado nos custos é bastante simples. Uma vezcalculado o custo de produção, sobre ele adici-onam-se os impostos, as despesas de comercia-lização e administrativas, e o lucro desejado.

Mantendo essa perspectiva, o processo deformação do preço de venda compreende 6 (seis)etapas: o cálculo do custo da merca­doria, orateio dos custos fixos, o cálculo dos custos decomercializa­ção, a definição da margem delucro, a definição do Mark-up e, o cálculo dopreço unitário de venda.

Analisando cada uma dessas etapas, temosque o cálculo do custo da mercadoria compre-

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ende os gastos que a empresa teve de efe­tuarpara adquirir o produto, já a etapa de rateio doscustos fixos, significa apropriar a cada unidadevendida um valor que recupere os custos fixosda empresa, como custo de pessoal, deprecia-ção, aluguel, água, entre outros. Conhecidos oscustos fixos, o passo se­guinte é estabelecer ocritério de rateio, sendo que usualmente é esta-belecido um percentual sobre as vendas.

Em se tratando de cálculo dos custos decomercialização, ana­lisamos os impostos egastos que a empresa tem para a venda do pro-duto. Já a definição da margem do lucro é esta-belecida le­vando em conta o padrão e a neces-sidade da empresa. Quanto à etapa de definiçãodo mark-up, dizemos que é uma taxa demar­cação sobre o valor do custo de produção,sendo que é apurado através do mark-up multi-plicador ou divisor.

Por fim, temos o cálculo do preço unitáriode venda, que também pode ser feito pelo mark-up multiplicador ou divisor.

4.2.2 Formação de preço com base no mercado

O enfoque moderno utiliza a seguinte equa-ção do preço de venda: lucro = preço de venda– custos – despesas. Assim, para aumentar olucro, as empresas precisam reduzir os custose despe­sas, mantendo ou melhorando a quali-dade dos produtos.

Ademais, podemos perceber que os custossão medidas de es­forços que a empresa incor-re para atingir seus objetivos e que o preço devenda deve acrescentar a esse custo, uma mar-gem de lucro para a empresa. Claro está, quepara esse processo de cál­culo de custos e for-mação do preço de venda, é necessária umabase bem estruturada de dados e informaçõescontábeis.

5 ANÁLISE DA APLICAÇÃO DOS CON-CEITOS NO CAMPO PRÁTICO

Diante dos conceitos e noções básicas decontabilidade, temos que o administrador, uti-lizando-se das ferramentas contábeis tem con-dições de atuar nos quatro pilares básicos daorganização: estratégico, planejamento, execu-ção e controle.

No nível estratégico, a contribuição dasdemonstrações finan­ceiras visa à elaboraçãode ações futuras e a implantação de no­vas ini-ciativas com base em informações históricasfornecidas pela contabilidade.

Quanto ao planejamento operacional, a con-tribuição das no­ções contábeis está no sentidode organizar os recursos a partir de uma análisedo ambiente interno e externo, visando à exe-cução dos planos de ações. No nível de execu-ção, a contabilidade contribui no sentido daadministração do fluxo das atividades operaci-onais e transações dos eventos econômicos.

E por fim, no nível de controle, as informa-ções contábeis vêm demonstrar que são utili-zadas não só em eventos a posteriori, sendo queestão presentes também nos níveis de planeja-mento es­tratégico, tático e operacional. Porém,é importante ressaltar que o conceito de con-trole contábil não é um conceito apenas de con-trole a posteriori. A função contábil na empre-sa e, consequentemente, sua grande importânciaimplicam um processo de acompanhamento econtrole que perpassa todas as fases do proces-so decisório e de e de gestão e, seguramente, asetapas do planejamento.

5.1 Pesquisa de Campo

5.2 Descrição e análise dos dados da pesquisa

5.2.1 Resultado e Discussões

FonteFonteFonteFonteFonte: Pesquisa de campo (2009)

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Nessa análise, verificamos que a maioriados questionados, utilizam as demonstraçõescontábeis na gestão, no entanto, uma grandeparcela, não utiliza qualquer tipo de demons-trativo para analisar o andamento da empresa,restringindo a análise das demonstrações con-tábeis apenas ao contador. Isso pode refletirnegativamente na análise econômica e finan-ceira da empresa, bem como resultar na faltade controle operacional, uma vez que o empre-sário estará aquém dos resultados do seu em-preendimento.

FonteFonteFonteFonteFonte: Pesquisa de campo (2009)

O que pode ser visualizado é que a contabi-lidade ainda é vista simplesmente como umaobrigação fiscal, sendo utilizada na maioria dasempresas para esse único fim. A falta de conhe-cimento das ferramentas contábeis pelos admi-nistradores, facilitam o senso comum de queessa ciência está restrita apenas ao fornecimen-to de informações à respeito do faturamento daempresa, bem como ao recolhimento dos im-postos aos cofres públicos. A ausência de no-ções da modalidade gerencial da contabilidadeimpede os administradores de administrar o seuempreendimento com maior eficiência e con-trole da real situação econômico-financeira dasua empresa.

Voltando-se para o resultado operacional daempresa a mai­oria dos empresários responde-ram que fazem essa análise pelo saldo positivode caixa, enquanto 30 % analisam através dasde­monstrações contábeis. O que podemos per-ceber é que os empresá­rios, ao analisar apenaso saldo positivo de caixa, estão obser­vando ohorizonte da empresa a curto prazo, principal-mente por­que na maioria dos casos, o saldo éobservado somente pelo dia corrente, sem umestudo completo e a formação de um fluxo decaixa mensal.

FonteFonteFonteFonteFonte: Pesquisa de campo (2009)

Analisando a situação financeira e econô-mica da empresa, vi­sualizamos que a maioriados gestores, utilizam apenas os processos queocorrem na área financeira, reforçando a visãode curto prazo da organização. Nesse contex-to, os empresários são incapazes de ter a per-cepção da empresa no sentido de ser rentávelou não. O simples fato de ter numerário emcaixa não significa que a empresa tem um bomdesempenho ou que é sustentada por seus pró-prios recursos. Apenas 40% desses gestoresutilizam as ferramentas cor­retas para esse tipode análise, concluindo-se que é necessário amudança da cultura da maioria dos empreen-dedores para que es­ses saibam utilizar as fer-ramentas corretas para melhor gestão do em-preendimento.

FonteFonteFonteFonteFonte: Pesquisa de campo (2009)

Seguindo o contexto das outras perguntas,podemos analisar que o planejamento estraté-gico realizado nessas empresas se torna muitosuperficial ao observarmos que a maioria des-ses gestores, não usam as ferramentas contá-beis para auxiliar a elaboração desse planeja-mento.

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6 CONCLUSÃO

O que se observa atualmente é que a morta-lidade de micro e pequenas empresas nos pri-meiros anos de suas vidas deriva, principalmen-te, das deficiências gerenciais dos própriosempreendedores, em particular daquelas rela-cionadas com o desconhecimento e a negligên-cia das técnicas de administração mais indica-das para o controle das operações. Entretanto,parte essencial dessa função administrativa con-centra-se no conhecimento dos procedimentosfinanceiros e contábeis disponíveis e na sua uti-lização para acompanhamento, coordenação econtrole das operações da empresa, o que nota-damente se constitui em verdadeiro entravepara a grande maioria dos micro e pequenosempresários não só da cidade de Imperatrizcomo de todo o Brasil. Ainda nessa análise,aqueles, em sua maioria, utilizam-se da conta-bilidade apenas para cumprimento das obriga-ções fiscais. Hodiernamente, diante da escas-sez dos recursos, é preciso escolher entre asmelhores alternativas e, para identificá-las, sãonecessários os dados contábeis.

A contabilidade pode desempenhar umsuporte importante, em uma pequena empre-sa, durante o planejamento da determinação daspolíticas de vendas, incluindo pesquisa de mer-cado, promoção, vendas e distribuição. Pois,os sistemas financeiros, contábeis e de custosnão diferem em função do portda empresa aoqual são aplicados, os princípios básicos e osobjetivos fundamentais são os mesmos. Geren-ciar com eficácia é obter informações signifi-cativas sobre as margens de lucro apuradas nasvárias cadeias de suplemento e distribuição,assim como, manter o controle através de umasérie de padrões estratégicos estabelecidos, re-latórios de desempenho e tomadas de açõescorretivas.

Assegura-se que uma eficiente administra-ção financeira tem o condão de reduzir a vul-nerabilidade da pequena empresa no decursodo seu planejamento, para que os objetivos es-tabelecidos sejam alcançados. Tudo isso vemdemonstrar a importância da pesquisa desen-volvida junto aos micro e pequenos empresá-rios do setor varejista de Imperatriz, tendo em

vista que os resultados obtidos nos fornecemdados que se consubstanciam com a realidadedas micro e pequenas empresas no cenário na-cional. É importante frisar que quanto menorfor a empresa, quanto mais limitados forem osseus recursos e a sua capacidade de reação efe-tiva às mudanças de mercado ou aos efeitosadversos dos seus erros de avaliação, tanto maisimportante será a lucidez da sua gerência e,consequentemente, a confiabilidade dos dadoscontábeis/financeiros nos quais essa gerênciase apóia para tomar as decisões.

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A CONCESSÃO DOS DIREITOS DENTRODAS NORMAS JURÍDICAS BRASILEIRAS

Ivaneide Pereira Lima1

Olívia Pereira da MotaCarlos Henrique Befor

* Acadêmicos(as) do curso de Direito da Faculdade de Educação Santa Terezinha, 6.º Período (noturno).

RESUMO

A dada pesquisa se mostra como um instrumento de difusão acerca da aplicação e do entendimentodo Direito Natural, do Direito Positivo, da Norma Jurídica, da Relação Jurídica e do Critério deJustiça, tecendo a análise com fundamento no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Discorre-se ahistória de 5 (cinco) exploradores de cavernas que foram vítimas de um fato natural. Com basenos dados oferecidos na obra, tecemos juízo e conceitos a respeito de vários fatos jurídicosocorridos na história. Utilizou-se pesquisa bibliográfica, método indutivo e abordagemqualitativa.

Palavras-Chave: Direito Natural. Direito Positivo. Norma Jurídica. Relação Jurídica. Critériosde Justiça.

ABSTRACT

This search shows itself as an tool of disseminating about the knowledge and application of theNatural Law, Positive Law, Legal Rule, Legal Value andJustice´s criterion. We do this by analyzingthe Brazilian Laws in contrast with the well-known masterpiece, “The Case of SpelunceanExplorers” In this work, his author tells us about five caverns explorers who were victims of anatural fact. Based on the data of this masterpiece, we make some judgments and concepts regardingvarious events occurred in legal history.

Key-words: Natural Law. Positive Law. Legal Standard. Juridical Relationship. Criteria ofJustice.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem a finalidade de ana-lisar, dentro das normas jurídicas brasileiras, oDireito Natural, o Direito Positivo, NormaJurídica, Relação Jurídica e Critérios de Justi-ça. Com intenção de transparecer os seus con-ceitos, fundamentos e argumentos de algunspensadores, bem como o modo de entendimen-to de alguns doutrinadores, acerca dos itensmencionados nas palavras-chave. A fonte depesquisa baseia-se na obra “O caso dos explo-

rados de cavernas”. O trabalho contempla umasérie de aspectos relacionados a alguns fatos na-turais e fatos jurídicos. Colocamos, em evidên-cia, assimilações com as normas jurídicas brasi-leiras para a concessão dos direitos subjetivosque, supostamente, deixaram de ser concedidosaos exploradores da caverna. Mostramos, tam-bém, considerações sobre concepção do Direi-to Natural e dos elementos que iremos abordar.Por fim, a ideia é fazer um julgamento, paramelhor compreensão do estudo e entendimentodo Ordenamento Jurídico em vigor.

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2 DESENVOLVIMENTO

Após várias análises sobre o que seria oDireito Natural, observamos que o caso dosexploradores de cavernas contempla, perfeita-mente, as regras do referido Direito, pois, quan-do os homens estavam presos naquele local,prevalecia o princípio daquele Direito. Assimcomo afirma o Juiz Foster, a saber:

Concluímos que estes homens, quandotomaram sua trágica decisão, estavam tãodistantes de nossa ordem jurídica comose estivessem a mil milhas além de nossasfronteiras. Mesmo em sentido físico, suaprisão subterrânea estava separada dosnossos tribunais e dos oficiais de justiçapor uma sólida cortina de rocha que sópôde ser removida depois dos maioresdispêndios de tempo e de esforço (1976,p.9-10).

Entendemos que o Direito Natural advémdo Direito Costumeiro, que é considerado his-toricamente como a primeira fonte do Direito.Por que não poderíamos pensar como sendoele (direito costumeiro) o próprio Direito Na-tural?

Na antiguidade temos códigos originadosde compilações de costumes tradicionalmenteaceitos por um grupo ou tribo. Também nassociedades arcaicas temos esse tipo de Direitocomo predominante, posto que não havia efeti-vamente a escrita e que as formas de perpetua-ção de historias e crenças eram feitas oralmen-te, de geração em geração. O Costume éreconhecido e seguido pela sociedade mesmosem saber por qual razão ele foi feito ou deonde surgiu. Há apenas uma conscientização,primeiro individual e depois coletiva dessasregras ditas “tradicionais”. Ainda sobre os cos-tumes como fonte do Direito Natural, pode-mos dizer que ele floresce a partir de fatos econdutas sociais seguidas por um longo tempo.Um exemplo mais próximo foi no período co-lonial brasileiro com a Lei da Boa Razão de1769. Esta lei dizia que a validade jurídica docostume seria dada de acordo com a “boa ra-

zão”, que deveria ser seguida e usada na socie-dade por, pelo menos, cem anos.

Naceas, ents, que posteriormente passou aser uma norma e que, antes eram apenas nor-mas citadas como costumes, posteriormentepassaram a ser uma norma na forma escrita.Ora, não é na necessidade que nascem as nor-mas? Então por quê não dizer que o Costumegera o Direito Natural e este dá início às nor-mas positivadas. O Direito Natural não é prin-cípio de todas as Normas Positivadas? Anali-semos então algumas citações sobre o DireitoNatural: Del Vecchio considera que o DireitoNatural acompanha.

Para Miguel Reale, existem dois princípiosgerais de direito: o imediato que, segundo ele, éreconhecido como valor sempre a humanidade.Para ele é o nome que se designa, desde as épo-cas mais remotas, como o que está justo e con-sidera, ainda, absoluto (AZEVEDO, 1976, p.9-10).

que é fonte de todos os valores e os deriva-dos ou mediatos que com o passar do tempotornam-se necessários ser positivados, dentrode uma determinada sociedade e\ou civiliza-ção( REALE, 2003, pág, 314).

Segundo Nunes, a corrente do Jusnatura-lismo foi fundada no pressuposto de que existeuma lei natural eterna e imutável, entendendoque há uma ordem preexistente de origem di-vina decorrente da natureza ou do estado soci-al do ser humano (NUNES, 2008, p. 53).

Acrescenta-se que alguns pensadores clás-sicos acreditavam existir um Direito Naturalpermanente e eternamente válido, independen-temente de legislação, de convenção ou qual-quer outro expediente imaginado pelo homem.

Nesse sentido, a partir das citações acimadescritas e analisando as correntes filosóficasque tratam da vida do homem em sociedade,entende-se que todo direito nasce com o nasci-mento de uma sociedade ou comunidade, por-tanto, primeiramente, nasce o direito consue-tudinário, posteriormente vem à necessidadede normatização desse direito ou dever e, porúltimo, vem a norma para deixar tal direito oudever positivado. Assim, conclui-se que o di-

1 AZEVEDO, Plauto Faraco de. op. cit, pág. 9-10.2 GOUVEIA, A. Grassano F. Direito Natural e Direito Positivo;

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reito e o dever vêem da necessidade de organi-zação. Neste sentido, pode-se afirmar que o di-reito positivo não existiria caso os direitos con-suetudinários não passassem a existir.

Como já foi dito anteriormente, sabe-se queo Direito Positivo vem das normas que sãopositivadas, ou seja, é um conjunto de normasjurídicas. Ele trata dos direitos objetivos, dosdireitos subjetivos e dos deveres subjetivos.Ora, no caso do ordenamento jurídico brasilei-ro, atualmente, é claro que os exploradores decavernas seriam inocentados, porque as víti-mas estavam em estado de necessidade (um di-reito subjetivo), agiram em legitima defesa (di-reito subjetivo) e utilizaram-se, também, doexercício regular de direito (direito subjetivo).

O porquê dessas afirmações? Veja-se, o es-tado de necessidade está explícito quando sepensa que caso o ser humano não se alimente,irá morrer. Eles não tinham outra opção, ou sealimentariam de carne humana ou morreriamde inanição (debilidade causada pela fome). Nocaso da legítima defesa, pode ser constatada nomomento em que eles perceberam que só have-ria uma forma de se alimentar, que seria com aingestão de carne humana. A partir daí, cadaum pensou que poderia ser morto e servir dealimento para os demais, assim trabalharampara a prevenção da manutenção da própriavida. No caso do exercício regular de direito,está no fato de eles exercitarem o direito demanter-se vivos. Todos não têm direito à vida,desde a concepção intra-uterina? Gozar do bemmaior que temos, que é a vida. Manter-se vivonão é um exercício regular do direito? Há algu-ma dúvida acerca do assunto?

Tão grande é a similaridade do caso com onosso ordenamento, que a maioria das exclu-dentes de ilicitude desse artigo cabem para aabsolvição dos exploradores de caverna pro-cessados. Segue abaixo o texto que evidênciatal comparação:

Desde que se soube que os exploradorestinham levado consigo apenas escassasprovisões e se ficou também sabendo quenão havia substância animal ou vegetal

na caverna que lhes permitissem subsistir,temeu-se que eles morressem de inani-ção antes que o acesso até o ponto emque se achavam se tornasse possível.(AZEVEDO, 1976, p.6)

Importante observar que os desafortunadosjá estavam presos há 20 (vinte) dias e foraminformados que o resgate provavelmente sóchegaria ao interior da caverna decorrido, apro-ximadamente, 10 (dez) dias mais. Que opçãoeles teriam?

Para firmarmos o entendimento, é bom lem-brar que no Brasil não é permitida a Eutanásia,que é a concessão para que o indivíduo prati-que um ato contra a própria vida. Se ele optarnão terá direito a praticá-la (eutanásia), pelomenos no Direito Positivo. Então, se eles fize-ram de tudo para permanecerem vivos, utiliza-ram os direitos subjetivos que o nosso ordena-mento jurídico concede a concess a Eutan casocom o nosso ordenamento que todas as exclu-dentes deste artigo cabem no caso dos explora-dores de caverna.

Os operadores do Direito, cuja corrente fi-losófica era a positivista, não analisaram o casocomo deveriam, pois se eles dizem que seguemo que está escrito, porque não absolveram osdenunciados? Devo lembrar que estamos ana-lisando o caso de acordo com ordenamento ju-rídico brasileiro.

Tendo em vista que o Ministério Públicodenunciou os quatro sobreviventes, sob a ale-gação de terem praticado o crime de privar avida de outrem, por que não denunciou tam-bém os responsáveis pela operação de resgatepela morte dos 10 (dez) trabalhadores? Não te-riam eles ciência que a operação era perigosa,que os trabalhadores corriam risco de perder avida durante os desmoronamentos? Será quenão praticaram o crime culposo contra a vidadaqueles trabalhadores, por imperícia e impru-dência? Por fim, com a condenação dos acusa-dos à morte, qual foi o sentido de colocar vári-as vidas em risco? Seria somente para que 15(quinze) pessoas passassem da vida para a mor-te? Uma das ideias do Direito Positivo e do

3 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. Forense, 40 Ed. Rio de Janeiro, 2008.4 NUNES, Rizzato, Manual de Introdução ao Estudo do Direito. Saraiva. São Paulo, 2008.

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Direito Consuetudinário existente em váriospaíses, não seria preservar a vida, desde as épo-cas mais remotas? A nossa Constituição Fede-ral (1988), no seu Art. 5º, preceitua, acerca dosDireitos e Deveres Individuais e Coletivos, que“Todos são iguais perante a lei... garantindo-sea inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,à igualdade, à segurança e à propriedade”. Nestecaso, a vida humana é um objeto de direito as-segurado e integra-se de elementos materiais,podendo ser físicos ou psíquicos e; imateriais,podendo este ser considerado como os elemen-tos espirituais. Isto significa dizer que o direitoà vida é tanto a garantia da existência, quanto odireito de integridade física e moral etc. Portodo o exposto, entendemos que esses direitosforam utilizados pelos exploradores sobrevi-ventes.

É um ato contraditório o modo como ospositivistas lidam

com os ordenamentos jurídicos, já que pri-mam para cumprir o que determina o Estado,por meio do Direito Positivo. Porque esse di-reito ou dever que foi normatizado tem seusprincípios, por esta razão é que existem as LeisInjustas, a Eqüidade. Há de salientar que osoperadores do Direito, identificados como po-sitivistas nessa obra, defenderam que os réusdeveriam ser absolvidos ou ter uma atenuaçãoda pena, porém, não se manifestaram, formal-mente, no julgamento para a absolvição dosacusados. Mostramos abaixo o trecho que dis-põe, claramente, quando o presidente diz quecabe o pedido de clemência para mitigar os ri-gores da lei.

O Presidente Truepenny, C. J:

Parece-me que, decidindo este extraordi-nário caso, o júri e o juiz de primeira ins-tância seguiram um caminho que era nãosomente correto e sábio mas, além disto,o único que lhes restava aberto e, face dosdispositivos legais [...]. Este dispositivolegal não permite nenhuma exceção apli-cável à espécie, embora a nossa simpatianos incline a ter em consideração a trági-ca situação em que esses homens foramenvolvidos

Em caso desta natureza o princípio da cle-mência executiva parece admiravelmenteapropriado para mitigar [...] razão porqueproponho aos meus colegas que sigamoso exemplo do júri e do juiz [...] (1976, p.8).

A vida é um direito superior a qualquernorma. No entanto, no caso dos exploradoresde cavernas, houve a retirada da vida de umindivíduo para manter a vida de outros, ou seja,foi sacrificada a vida de 01(um) explorador ede 10 (dez) trabalhadores para, a princípio, sal-var a vida de 5 (cinco) seres humanos. Uma dasmortes foi praticada pelos réus. Embora consi-derado como crime, o ato foi praticado paraassegurar a vida das vítimas aprisionadas. Ten-do-se como base de tal afirmação o fato deantes da morte do explorador Whetmore, acomunicação com os aprisionados que questio-naram sobre a possibilidade do uso de alimenta-ção por carne humana e, seguidamente, a solici-tação de opinião sobre ter que matar um dospresos da caverna para servir de alimento paraos demais. O momento da confirmação do desu-so das normas escritas se dá quando:

Whetmore, falando em seu próprio nomee em representação dos demais, indagouse eles seriam capazes de sobreviver dacarne de um deles. O presidente da co-missão respondeu, a contragosto, em sen-tido afirmativo. Whetmore inquiriu seseria aconselhável que tirassem a sortepara determinar qual dentre eles deveriaser sacrificado. Nenhum dos médicos seatreveu a enfrentar a questão. Whetmorequis saber então se havia um juiz ou ou-tra autoridade governamental que se dis-pusesse a responder à pergunta. Nenhu-ma das pessoas integrantes da comissãode salvamento mostrou-se disposta a as-sumir o papel de conselheiro neste assun-to. Whetmore insistiu se algum sacerdo-te poderia responder àquela interrogação,mas não se encontrou nenhum que qui-sesse fazê-lo (AZEVEDO, 1976, p.7).

As autoridades se omitiram de opinar acer-ca do assunto. Houve então a prevalência doDireito Natural. As autoridades concederamtacitamente aos exploradores de cavernas a

5 AZEVEDO, Plauto Faraco de. O caso dos Exploradores de Cavernas (p. 6). Fabris. Porto Alegre, 1976.

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possibilidade de criar suas próprias normas, deacordo com as suas necessidades, para tentarsobreviver.

Sendo assim, as normas jurídicas devemestar de acordo com os princípios do direitonatural, que desde a formação das sociedadesestão conforme as necessidades do ser huma-no, pois as normas nascem para garantir os di-reitos fundamentais dos indivíduos.

No caso dos exploradores de caverna, ana-lisando as normas jurídicas brasileiras, os ho-mens necessitavam de alimentação para man-terem-se vivos, então os mesmos estavam emum estado de necessidade para salvar-se de pe-rigo atual, que não tiveram como evitar, porcausa do desmoronamento.

Tão grande é a similaridade do caso com onosso ordenamento, que a maioria das exclu-dentes de ilicitudes desse artigo cabem paraabsolvição dos exploradores de caverna pro-cessados. Segue abaixo o texto que evidenciatal comparação:

Dito isto, falaremos um pouco das NormasJurídicas a luz das doutrinas. Dispõem NA-DER (2002, p. 83) que:

Ao dispor sobre fatos e consagrar valo-res, as normas jurídicas são o ponto cul-minante do processo de elaboração doDireito e o ponto de partida operacionalda Dogmática Jurídica, cuja função é a desistematizar e descrever a ordem jurídicavigente. Conhecer o Direito é conheceras normas jurídicas em seu encadeamen-to lógico e sistemático. As normas ou re-gras jurídicas estão para o Direito de umpovo, assim como as células para um or-ganismo vivo.

Assim sendo, as Normas Jurídicas vem parasatisfazer os interesses de um povo, para orde-nar às suas condutas, já que para uma vida har-moniosa em sociedade é necessário dar direi-tos e cobrar deveres. Neste caso, as normas sãocriadas para dar, de alguma forma, para a soci-edade a satisfação de estarem amparadas nashoras de infortúnios. No Brasil, os ordenamen-tos estão escritos, porém, há países que as nor-mas não são positivadas. No território brasi-

leiro, as leis nascem com as necessidades dopovo. Assim, podemos dizer que tudo que estánormatizado é ou foi decorrente de algum fato.Através da obra de Nader (2002) podemos cons-tatar que a norma se dá com a lei e esta ocorrepor conseqüência dos hábitos constatados pelaLei Física. Se não fosse assim, qual seria o mo-tivo para serem criadas normas? Há vários au-tores que defendem que elas só têm eficáciaquando, realmente, são efetivadas, para as nor-mas serem executadas há que existir os fatos.No caso dos exploradores de caverna o fato éque gerou as normas, criadas por eles. Pode-mos visualizar a necessidade da criação dessasnormas nos seguintes parágrafos:

[...] Pediram [...] que lhes informassemquanto tempo seria necessário para libe-rá-los. Os engenheiros responsáveis pelaoperação de salvamento responderam queprecisavam de pelo menos dez dias, à con-dição que não ocorressem novos desliza-mentos. Os exploradores perguntaramentão se havia algum médico no acampa-mento, tendo sido postos em comunica-ção com a comissão deste, à qual descre-veram sua condição e as rações de quedispunham, solicitando uma opinião acer-ca da probabilidade de subsistirem semalimento por mais dez dias. O presidenteda comissão respondeu-lhes que haviaescassa possibilidade de sobrevivência portal lapso de tempo [...] Whetmore, falan-do em seu próprio nome e em representa-ção dos demais, indagou se eles seriamcapazes de sobreviver por mais dez diasse se alimentassem da carne de um deles.O presidente da comissão respondeu, acontragosto, em sentido afirmativo. Whet-more inquiriu se seria aconselhável quetirassem a sorte para determinar qual den-tre eles deveria ser sacrificado. Nenhumdos médicos se atreveu a enfrentar a ques-tão (AZEVEDO, 1976, p.6-7).

No caso dos exploradores de cavernas, asnormas positivadas não estavam, perfeitamen-te, adequadas ao caso. Mas o que levou a con-denação dos sobreviventes? Neste sentido, anorma estabelecida por eles, dentro do estadode necessidade, não foi crime. Em análise às

6 AZEVEDO, Plauto Faraco de. O caso dos Exploradores de Cavernas (pág. 8 ). Fabris. Porto Alegre, 1976.

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nossas normas entende-se que a condenação dosexploradores foi uma aberração, já que não foiobservado um princípio. Nossas normas estãobaseadas em princípios e caso ocorra uma situ-ação em que não tenha uma norma que possaenquadrar os casos dentro delas, há que obser-var os referidos princípios. Tomamos uma notade Rizzatto Nunes (2008, p.182), acerca do as-sunto:

Nenhuma interpretação será bem feita sefor desprezado um princípio. É que ele,como estrela máxima do universo ético-jurídico, vai sempre influir no conteúdo ealcance de todas as normas.Os princípios situam-se no ponto mais altode qualquer sistema jurídico, de formagenérica e abstrata [...].

Os operadores do Direito, naquele momen-to, deixaram de observar vários princípios,dentre eles podemos citar: o direito à vida, àliberdade etc. Ainda pode-se citar, o fato delespoderem analisar o caso utilizando Eqüidade,para corrigir a deficiência da lei, já que ela nãocontemplava o caso perfeitamente.

Ressalte-se que os presos, os exploradoresde cavernas, solicitaram das autoridades que semanifestassem, conforme descrito acima, so-bre a possibilidade deles tirarem a sorte, maselas se omitiram acerca do assunto. Por estarazão, as vítimas tiveram que utilizar os princí-pios naturais de sobrevivência, que prevaleceno instinto humano para a sua própria sobrevi-vência.

Acerca da Relação Jurídica, os explorado-res de cavernas passaram a concretizá-la nomomento em que se fez necessário estabelecero modo de como iriam sobreviver, a saber:

Das declarações dos acusados, aceitapelo júri, evidencia-se que Whetmore foio primeiro a propor que buscassem alimen-to na carne de um deles, sem o que a so-brevivência seria impossível. Foi tambémWhetmore quem primeiro propôs a for-ma de tirar. a sorte, chamando a atençãodos acusados para um par de dados que

casualmente trazia consigo. Os acusadosinicialmente hesitarem adotar um com-portamento tão desatinado, mas, após odiálogo acima relatado, concordaram como plano proposto. E depois de muita dis-cussão com respeito aos problemas mate-máticos que o caso suscitava chegaram porfim a um acordo sobre o método a serempregado para a solução do problema:os dados. (AZEVEDO, 1976, p.7)

Infere-se do texto a existência da relaçãojurídica envolvendo sujeito ativo e sujeito pas-sivo, com exigência de ação ou comportamen-tos das partes envolvidas. Eles estabeleceramuma norma para a própria sobrevivência, em-bora a ideia sobre o contrato que as partes esta-beleceram tenha sido terrível e odioso. Veja-mos o entendimento de Nunes a respeito deRelação Jurídica (2008, p. 153):

[...] a relação se dá entre pessoas, vincu-ladas por, pelo menos, um objeto protegi-do. Assim podemos definir a relação jurí-dica como o vínculo que une duas ou maispessoas, cuja relação se estabelece por fatojurídico, cuja amplitude relacional é regu-lada por normas jurídicas, que operam epermitem uma série de efeitos jurídicos.Dessa definição podemos, então, desta-car os elementos que serão a seguir exa-minados: os sujeitos da relação: pessoafísica, pessoa jurídica e os “entes desper-sonalizados”; sujeito ativo e o sujeitopassivo; o vínculo que une os sujeitos: osfatos jurídicos; o objeto protegido: direi-tos reais, pessoais e da personalidade.

Segundo Miguel Reale (1976), quando umarelação de homem para homem se subsumi aomodelo normativo instaurado pelo legislador,essa realidade concreta é reconhecida comosendo relação jurídica.

A partir das argumentações citadas acima,pode-se dizer que o acordo e/ou contrato esta-belecidos pelos exploradores de cavernas foiuma relação jurídica

Os critérios de justiça utilizados para o jul-gamento dos acusados na obra o “Caso dosExploradores de Caverna”, dentro das normas

7 AZEVEDO, Plauto Faraco de. op. cit, pág. 7.8 NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. Forense. Rio de Janeiro, 2002.

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jurídicas do brasileiras, não satisfaz os requisi-tos básicos para a concessão de direitos. Nocaso da sentença estabelecida pelo júri, é res-peitável a condição do voto de todos, já queeles não têm o conhecimento profundo acercadas normas jurídicas, do critério de justiça etambém não tem a mesma noção dos princípi-os das normas jurídicas, em comparação com asabedoria dos Operadores do Direito. No casodo julgamento de 2ª instância, percebeu-se quealguns Juízes, embora tenham entendido que ojulgamento necessitava de um olhar especial porparte deles, não tiveram coragem de fazer umjulgamento de forma justa, pelo simples fato deentenderem que devem somente seguir o queestá escrito no ordenamento jurídico, confor-me descrito nas seguintes passagens:

O presidenteTruepenny:

[...] o juiz de primeira instância decidiuque os réus eram culpados do assassina-to de Roger Whetmore [...] dissolvido ojúri, seus membros enviaram uma petiçãoconjunta ao chefe do Poder Executivopedindo que a sentença fosse comutadaem prisão de seis meses. O juiz de primei-ra instância endereçou uma petição simi-lar à mesma autoridade, parece-me que,decidindo este extraordinário caso, o júrie o juiz de primeira instância seguiramum caminho que era não somente corre-to e sábio mas, além disto, o único quelhes restava aberto em face dos dispositi-vos legais. O texto da nossa lei é bemconhecido: “quem quer que intencional-mente prive a outrem da vida será punidocom a morte”. N.C.S.A (n.s) § 12-A”. Estetexto da lei não permite nenhuma exce-ção aplicável à espécie, embora a nossasimpatia nos incline a ter em considera-ção a trágica situação em que esses ho-mens foram envolvidos....proponho aosmeus colegas que sigamos o exemplo dojúri e do juiz...É atualmente improvávelque o chefe do Poder Executivo denegueestas solicitações...Penso que, podemos,portanto, presumir que alguma forma declemência será concedida aos acusados.Se isto for feito, será realizada a justiça[...]. (AZEVEDO, 1976. Pág. 8)

O Juiz Keen,

No cumprimento dos meus deveres comojuiz não me incumbe dirigir instruções aochefe do Poder Executivo, bem como to-mar em consideração o que ele possa ounão fazer, a fim de chegar à minha própriadecisão que deverá ser inteiramente guia-da pela lei desta Commonwealth [...]. Asegunda questão que desejo deixar delado diz respeito a decidir se o que esteshomens fizeram foi “justo” ou “injusto”,“mau” ou “bom”. Esta é outra questãoirrelevante ao cumprimento de minhafunção, pois, como juiz, jurei aplicar nãominhas concepções de moralidade, mas odireito deste pais [...]. Para dizê-lo clara-mente, meus colegas não apreciam o fatode exigir a lei escrita a condenação dosacusados. Também a mim isto não causaprazer, mas, à diferença de meus colegas,eu respeito as obrigações de um cargo querequer que se deixem as predileções pes-soais de lado, ao interpretar e aplicar a leideste país [...]. (AZEVEDO, 1976. p. 16-17).

É deficiente para a nossa sociedade o enten-dimento dos operadores do Direito, que se ca-racterizam como “positivistas”, já que o nossoDireito Positivo tem por base os princípios demoralidade, proporcionalidade, dentre outros.Mas o que dizem os doutrinadores acerca deJustiça?

O Jurisconsulto Ulpiano formulou o con-ceito de “Justiça”, com base nas concepçõesde Platão e Aristóteles, da seguinte forma: Jus-titia est constans et perpertua voluntas jus suumcuique tribuendi. Em nossa língua o conceitofoi traduzido nos seguintes termos: “Justiça é aconstante e firme vontade de dar a cada um oque é seu”. Sobre este assunto NADER expli-ca que:

A presente definição, além de retratar ajustiça como virtude humana, apresentaa idéia nuclear desse valor: dar a cada umo que é seu. Esta colocação, que engana-damente alguns consideram ultrapassa-da em face da justiça social, é verdadeirae definitiva; válida para todas as épocas e

9 AZEVEDO, Plauto Faraco de. O caso dos Exploradores de Cavernas (PP. 6-7 ). Fabris. Porto Alegre, 1976

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lugares, por ser uma definição apenas denatureza formal, que não define o con-teúdo do seu de cada pessoa... o que deveser atribuído a cada um. A palavra justo.vinculada à justiça, revela aquilo que estáconforme, que está adequado... que serefere às riquezas e ao mínimo ético ne-cessário ao bem-estar da coletividade.Justiça é síntese dos valores éticos. Ondese pratica justiça, respeita-se a vida, a li-berdade, a igualdade de oportunidade.Praticar justiça é praticar o bem nas rela-ções sociais. Grifo nosso (2002, p. 105-106).

Segundo Miguel Reale, justiça é uma pro-porção genérica e abstrata é, em última análise,uma expressão ética do princípio deigualdade.(REALE, 2003, p. 123).

Estudando os conceitos e argumentos des-ses doutrinadores, como também de algunsoutros, entendemos que os princípios de justi-ça não foram atendidos, no julgamento dos acu-sados, conforme os princípios das legislaçõesbrasileiras. Cabe lembrar que na obra fica bemclaro acerca da possibilidade de conceder justi-ça, de forma justa, a determinados casos que alei apresente deficiên­cia e/ou lacunas. Mos-tramos abaixo para uma melhor compreensão:

Foster:

Quaisquer que sejam os objetivos volta-dos, pelos vários ramos do nosso direito,mostram-nos a reflexão que todos elesestão voltados no sentido de facilitar ede melhorar a coexistência dos homens ede regular com a justiça e eqüidade as re-lações resultantes de sua vida em comum[...]. (AZEVEDO, 1976. p. 9) Grifo nosso.

Tatting:

É claro que, refletindo, me dou conta deque estou lidando com um problema quenunca mais ocorrerá, pois é improvávelque outro grupo de homens seja levado acometer novamente a terrível ação queora julgamos. (AZEVEDO, 1976. p.15).

Baseando-se nas argumentações desses juí-zes fica claro que na época já existia a eqüida-

de, a qual poderia ter sido utilizada pelos ope-radores do Direito, no momento do julgamen-to, pois um extraordinário caso como o dos ex-ploradores de cavernas merecia a aplicação dajustiça, por meio da eqüidade, pelas razões queos próprios julgadores explanaram.

3 CONCLUSÃO

Com certeza, melhor seria que os JuízesPositivistas, a exemplo dos Princípios das Nor-mas brasileiras, analisassem os casos de acor-do com os citados princípios do nosso país.Pois, assim, se evitaria indesejáveis confusõese condenações inadequadas das pessoas que sãosupostamente criminosas.

No presente estudo, entendemos que a ques-tão da absolvição dos acusados deveria ocorrerindependentemente de estar ou não previsto nalegislação, devido ao estado de necessidade queestavam os envolvidos. Acrescentamos que,para reconhecimento do estado de necessidadeexculpante, é irrelevante estar ou não contem-plado no Código Penal. Isto porque, ainda quenão se possa deduzir no ordenamento jurídicoo estado de necessidade, que exclui da culpa,ainda assim poderá ser admitido como causasupra legal de exclusão da culpa fundamentadopela inexigibilidade de conduta diversa. Pen-samos que, no caso dos exploradores de caver-nas sobreviventes, poderia ser adotada a teoriada culpabilidade normativa, pois não haveriaculpabilidade caso a situação exigisse dos agen-tes uma conduta diferente daquela praticada.

BIBLIOGRAFIA

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FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORESINDÍGENAS KRIKATI: relato de uma experiência

Ana Cláudia se Sousa1

Aparecida de Lara Lopes Dias2

Ilma Maria da Silva Oliveira3

Kleber Alberto Lopes de Sousa4

Rita Maria Gonçalves de Oliveira5

1 Especialista em Educação Especial, graduada em Pedagogia e Professora da FEST.2 Especialista em Educação Infantil e nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental, Licenciada em Letras e Professora

da FEST.3 Mestranda em Ciências da Educação, especialista em Supervisão Escolar, graduada em Pedagogia e Professora da

FEST e da UEMA.4 Mestrando em Ciências da Educação, especialista em Gestão de Instituições de Ensino Superior, especialista em

Comercio Exterior, com ênfase em micro e pequenas empresas, graduado em Ciências Econômicas e Professor daFEST.

5 Mestra em Ciências da Educação, especialista em Supervisão Escolar, graduada em Pedagogia e Professora daFEST e da UFMA.

RESUMO

O trabalho apresenta um relato de experiência do projeto de Formação Continuada de ProfessoresIndígenas Krikati, realizado na Aldeia São José, município de Montes Altos-MA, pela Faculdadede Educação Santa Terezinha - FEST, contemplando vinte e três professores indígenas. A maiordificuldade encontrada foi o fato de que apenas três professores dominavam a língua escritamaterna e a ausência de planejamento sistematizado. Concluímos que a escola específica ediferenciada deve ser vista como resultado de uma luta, na qual se busca o respeito às diversidadesetnoculturais e da pessoa humana.

Palavras-chave: Formação Continuada. Educação Indígena. Interculturalidade.

ABSTRACT

This work presents an explanation about the experience of a group of teachers, from Faculdade deEducação Santa Terezinha (FEST), on working up the indigenous Krikati’s teachers on continuingeducation, in the Aldeia São José (St. Joseph village), Montes Altos-MA, in order to work withtheir twenty-three indigenous teachers. During the work we observed that only three nativeteachers dominated the original written language. We conclude that the specific and differentiatedschool must be the result of a struggle, which aims the respect to the ethnocultural diversity andthe human being dignity.

Keywords: Continuing Education. Indigenous Education. Intercultural.

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1 INTRODUÇÃO

Historicamente, no Brasil, a educação paraos povos indígenas tem sido instrumento deaculturação. Durante cinco séculos estão pre-sentes os descasos e omissões das políticas pú-blicas.

As mudanças na relação entre o Estado e associedades indígenas são recentes. A mobiliza-ção e a participação do movimento indígena apartir dos anos 70 asseguraram através da Cons-tituição Federal de 1988 a normatização dosdireitos dos índios, entre outros, uma educaçãoespecífica, bilíngue, multicultural, diferencia-da e processos próprios de aprendizagem.

Mesmo reconhecendo o avanço, embora tar-dio, preconizado na legislação, não se pode ne-gar a distância entre o legal e o real. Porém,comparando com outros períodos históricos,no atual momento, questões relevantes ao ín-dio estão ganhando força, como: respeito à di-versidade cultural, aos costumes e crenças, va-lorização da língua materna, interculturalidade,formação de professores indígenas, ensino bi-língue, específico e diferenciado. Tudo isso vemreforçar que diante de uma história marcadapor extermínio, desvalorização da cultura enegação aos direitos indígenas, está se

construindo uma nova concepção do que éser índio e a necessidade de uma escola especí-fica.

Nesse aspecto, podemos analisar que, se háum avanço na formulação nacional da políticade educação indígena, há também inúmeras difi-culdades na sua implementação, no âmbito esta-dual e municipal, esferas responsáveis pela efeti-vação da educação escolar indígena, pelaformação inicial e continuada de professores in-dígenas a serem protagonistas desse processo.

No que tange a Unidade Regional de Edu-cação em Imperatriz (UREI), órgão de repre-sentação da Secretaria Estadual de Educaçãona região tocantina, também não é diferente,pois mesmo reconhecendo as iniciativas que jáexistem na esfera estadual para uma educaçãoescolar diferenciada, percebemos os entravesna viabilização dessa formação. Uma delas é amorosidade do Estado em efetivar o corpo do-cente indígena através de concursos, com salá-

rios dignos e condições de trabalho, bem comoa regularização das instituições de ensino quepossam elaborar currículos próprios, incluin-do nestes lingüística, valores, crenças, costu-mes, tradições e festas.

Segundo a LDB 9394/96, Art. 79 em con-sonância com a Constituição Federal de 1988(CF, 88), o Estado deve “Manter programas deformação de pessoal especializado, destinado àeducação escolar nas comunidades indígenas”.A partir da legislação, a formação de professo-res indígenas deveria acontecer em suas comu-nidades. Ao contrário, em nossa regional asformações se dão na cidade, tendo o índio maisuma vez, apesar de estar respaldado pela Lei,de se adequar às condições do não índio, poiseste justifica que a estrutura nas aldeias nãopermite que aconteça a formação. Essas deci-sões arbitrárias, sem consulta aos principaisinteressados – índios – trazem vários proble-mas não só aos professores, mas a toda comu-nidade.

O mesmo artigo da lei supracitada preconi-za que se faz necessário “desenvolver currícu-los e programas específicos, neles incluindo osconteúdos culturais correspondentes às respec-tivas comunidades”. Nesse aspecto, lastimosa-mente poucas são as ações prescritas na pro-posta curricular - aqui estamos nos referindoao povo krikati - que identificam o currículoespecífico e diferenciado.

O Referencial Curricular Nacional para aEducação Indígena (RCNEI) ressalta que a es-cola indígena deve ser específica e diferencia-da “concebida e planejada como reflexo dasaspirações particulares de cada povo indígenae com autonomia em relação a determinadosaspectos que regem o funcionamento e orienta-ção da escola não-indígena” (RCNEI, 1998,p.25). Assim comunga desse pensamento Ba-niwa quando afirma que:

Todo projeto escolar só será indígena sefor pensado, planejado, construído emantido pela vontade livre e conscienteda comunidade. [...] a escola deve se cons-tituir a partir de seus interesses e possibi-litar sua participação em todos os momen-tos da definição da proposta curricular,do seu funcionamento, da escolha dos

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professores que vão lecionar, do projetopedagógico que vai ser desenvolvido, en-fim, da política educacional que será ado-tada (RCNEI, 1998, p.25).

O que se constata é que após 22 anos dapromulgação da Constituição Federal do Bra-sil, a educação indígena, a partir dos princípiosque a diferencia da educação do não-índio, con-tinua sendo mais objeto de discurso do que deação, muito embora reconhecendo os avançosem vários estados brasileiros, ainda não pode-mos dizer que a escola, com todas suas necessi-dades, como pensa Baniwa (RCNEI, 1998) sejapensada pelo índio. O exemplo mais claro sãoos materiais didáticos utilizados nas escolasindígenas, pois são os mesmos utilizados nasescolas do não-índio, mesmo que a LDB 9394/96 assegure o direito dos professores índios em“elaborar e publicar sistematicamente materi-al didático específico e diferenciado” (Art. 79).

Produzir materiais didáticos na comunida-de indígena, a partir de suas línguas e culturasnão é algo simples e fácil, pois requer: disponi-bilidade, saberes dos professores, domínio dalíngua materna escrita, recursos materiais, re-cursos financeiros e acompanhamento pedagó-gico sistemático. Acreditamos que esse acom-panhamento deva acontecer através daformação continuada estas contribuam no for-talecimento da autonomia de uma práticapara que os professores despertem atitudes deinvestigação, e pedagógica condizente aos prin-cípios de uma escola indígena.

No entanto, o processo de autonomia se tor-na um tanto questionável, pois comumenteencontra-se nas reservas indígenas a existênciade escola marcada pelos moldes do não-índio,desde sua estrutura física até o calendário esco-lar. Isso não significa dizer que os professoresaceitem com passividade essa situação, pois fazparte de suas lutas uma escola diferenciada. Paratanto, além da formação inicial, buscam a for-mação continuada como instrumento de eman-cipação, que é oferecida pelo Estado de formasistemática e contínua, ocorrendo esporadica-mente, como na formação inicial, em espaçosque não contemplam a realidade dos indíge-nas, com programas únicos de várias etnias,

não respeitando as especificidades e necessida-des de cada povo.

A iniciativa do Estado em promover a for-mação inicial ainda não permite, pelo menosna condição desta Unidade Regional de Educa-ção de Imperatriz, transformar aquilo que évalorizado pelos indígenas, como riqueza cul-tural, em conteúdos e materiais pedagógicos.Daí a importância da formação continuada,mesmo que seja mediada, a princípio, por es-pecialistas não-índios, para que gradativamen-te os professores indígenas sejam protagonistasdo processo de formação.

Diante dessa problemática apresentada,visando contribuir com o povo Kikrati, nósprofessores da Faculdade de Educação SantaTerezinha (FEST), ciente de sua responsabili-dade social, se propôs a desenvolver por umperíodo de três anos a formação continuada aosvinte e três professores indígenas.

Mediante os desafios a que nos propomos,tínhamos a clareza das dificuldades que seriamvivenciadas, por se tratar de cultura específicae ao mesmo tempo desconhecida por nós. To-davia, sabíamos da importância do trabalho,tanto para os professores indígenas quanto paranós, equipe de formação da FEST.

Na implementação do projeto, tivemoscomo princípio a participação e decisão dosprofessores indígenas em todas as etapas da for-mação, tais como:

w Seleção de temáticas;w Cronograma de atividades;w Tempo de trabalho (uma vez por mês com-

preendendo dois dias);w Registros individuais e coletivos (equipe

de formação e professores indígenas);w Oficina de materiais didáticos alternati-

vos;w Avaliação ao final de cada encontro;w Seminário de encerramento do projeto.

O trabalho se encontra organizado em por-tfólio e apresenta o seguinte caminho percorri-do pela equipe de formação e pelos professoresindígenas Krikati: elaboração do projeto de for-mação continuada; apresentação ao povo Kri-

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kati; assinatura do convênio entre a FEST eAssociação de Pais e Mestres Indígena Krika-ti; o que é educar na vivência indígena; estudossobre os níveis de planejamento e avaliação;confecção de materiais pedagógicos; projetodidático de alfabetização da língua escrita ma-terna e seminário temático.

2 O QUE SABEMOS DO POVO KRIKATI?

Pertencente a nação Timbira, o povo Kri-kati vive hoje em três aldeias: São José, Raiz eRecanto dos Cocais. As mesmas estão localiza-das nos municípios maranhenses de MontesAltos, Sítio Novo, Amarante do Maranhão eLajeado Novo, a sudoeste do Estado do Mara-nhão, em uma área de 144.775 hectares.

A reserva indígena Krikati foi homologadaem 2004, embora, tenha sido declarada em 08de julho de 1992 Terra Indígena, pela PortariaMinisterial nº. 328, após décadas de luta peladefinição e demarcação da terra. Segundo da-dos da FUNASA (2005), a população é de 682habitantes, distribuídos nessas três aldeias jácitadas.

Pertencentes ao grupo Macro Jê se autode-nominam Krikatijê, “aqueles da aldeia gran-de”. Denominação esta que lhes é aplicada tam-bém pelos demais povos Timbira. Seusvizinhos imediatos, os Pukopjê, a eles se refe-rem usando o designativo Põcatêgê que signifi-ca “os que dominam a chapada” (BARATA,1993).

Apesar do contato com os não-índios, opovo Krikati luta pela preservação dos seusvalores étnico-culturais. Sempre organizadossegundo as suas formas tradicionais: com umcacique por comunidade; um conselho, forma-do pelos mais idosos e pajés. Todos com osmesmos objetivos: manter o equilíbrio e orga-nizar o povo Krikati na conservação dos costu-mes e de sua cultura. Este modo de organiza-ção acima descrito não é reconhecido e não temvalor no mundo dos não-índios, pelo fato deque não é uma organização juridicamente cons-tituída com registro em cartório e documenta-ção escrita. Daí a necessidade da constituiçãolegal do Conselho Indígena Pëp’ Cahyc Krika-

ti - CIPK e a Associação de Pais e Mestres Indí-gena Krikati, órgãos atuantes na luta desse povoem ter seus direitos reconhecidos.

Os Krikati são monogâmicos. É o maridoque vai viver na casa da família da mulher. Noentanto, essa união só será estável quando nas-cer o primeiro filho. Nessa cultura, no que serefere a partos ou doenças, tanto os homenscomo as mulheres resguardam-se, seja tanto nocomer quanto nos trabalhos de roças e fazeresdomésticos. Mas o homem tem alguns privilé-gios, muitos dos casados, assim como os soltei-ros, tem ampla liberdade sexual.

Considerado um povo festeiro, o povo Kri-kati faz festas todo ano, muitas delas se esten-dem por vários meses como a festa do ceveiro.Esta depende de cada família, a mesma só co-loca o filho ou a filha para participar se tivercondição econômica. Nesta são necessáriosmuitos alimentos, pois durante a festa terá aparticipação de toda a comunidade local e dosconvidados. Para tanto, a família coloca roça,pesca e caça. Além de alimentos, também sãonecessários miçangas e tecidos para as indu-mentárias.

A corrida de tora é um dos ritos praticadospor esta etnia, principalmente nas festas. OsKrikati correm quando estão alegres e tambémquando termina o período de luto. O que dife-rencia é a espécie da árvore da qual se tira atora para a corrida, sendo que para o luto a toraé do caule da árvore denominada barriguda(Chorisia glaziovii), enquanto que para as demaisfestividades é do caule da árvore do buriti(Mauritia flexuosa L. f.) que se tira a tora. Seutamanho representa a significância da pessoa acada um da comunidade. Na corrida de reveza-mento da tora, assim como em outras ativida-des culturais, a comunidade divide-se em doisgrupos: cyj cati ji, “o povo do lado alto” e harù’cati ji, “o povo do lado baixo”. Estes se organi-zam através do nome pessoal, faixa de idade,livre escolha, entre outras.

Para este povo, o artesanato é uma das prin-cipais fontes de renda. Cada família tem pelomenos um artesão. Habilidosos na técnica dotrançado com fibras vegetais, sementes e frutosconfeccionam pacará, colorares, pulseiras, bol-sas, entre outros artefatos; tanto para o uso como

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para ser comercializado. No entanto, devido àescassez do material natural, cada vez mais elesadentram a mata a procura de matéria primapara o artesanato.

Na reserva Krikati existem três escolas:Centro Educacional Indigena Krikati, na Al-deia São José; Escola Indígena Muzuhu, naAldeia Recanto dos Cocais e Escola IndígenaCujaca, na Aldeia Raiz. Sendo que apenas naAldeia São José se oferece o ensino médio.

Para nós Krikati e as lideranças sempresonhamos com o melhor para os nossosfilhos e netos, para ter uma boa educaçãosem sair da aldeia, para não perder asnossas raízes e a convivência com os maisvelhos, considerados por nós como bibli-oteca viva. Desta forma poderíamos pas-sar a sabedoria em relação à língua, oscostumes, as crenças, cantos e valores tra-dicionais (Profª Miracema Ropcwyj Kri-kati).

Diante da luta do povo indígena Krikati,por uma educação que venha atender suas ex-pectativas, preservar sua cultura e concretizaruma escola com currículo específico, acredita-mos que os professores se deram conta que oconhecimento é um instrumento para essa rea-lização, prova disso é o número de professoresque estão buscando sua formação. Dos vinte etrês professores, parte está cursando Magisté-rio Intercultural Indígena, parte em Licencia-tura Étnico Cultural e outros Licenciatura emPedagogia na FEST.

A língua é a identidade de um povo. Para osKrikati esta se fortalece, pois no cotidiano alíngua falada é a materna, sendo a língua portu-guesa usada para se comunicar com o não-ín-dio. Embora todos falem a língua materna, noensino escolar inicia-se a alfabetização na lín-gua portuguesa, este processo dificulta tanto aalfabetização como a revitalização da línguaescrita materna. A descontinuidade linguísticaé atribuída ao fato de que dos vinte e três pro-fessores atualmente em atividade nas aldeias,apenas três dominam a língua escrita materna.

Por outro lado, a visão da necessidade deconstrução de uma escola para o índio, partedo pressuposto de que o ensino na língua ma-

terna seja o caminho de desenvolvimento daalfabetização específica e diferenciada, comopreconiza o PNE (2005, p. 15):

Reconhecendo que a escola diferenciadanão se realiza sem a efetiva participaçãoda comunidade e sem que à sua frenteestejam professores indígenas preferen-cialmente falantes da língua materna dosalunos da escoa e pertencentes à mesmaetnia, determina que os professores te-nham uma formação específica para edu-cação intercultural e bilíngue.

Na saúde, o povo Kikrati também conquis-tou algumas melhorias, como: “um posto desaúde (FUNASA) no qual eles mesmos tomamconta evitando que outras instituições não in-dígenas assumam e desempenhem funções querequerem não só preparação técnica, mas prin-cipalmente conhecimentos culturais específi-cos (EKOS, p.48)”. No entanto, o atendimentoa comunidade se dá de forma precária, pois nãohá médicos permanentes, faltando entre outros,medicamentos e ambulância.

3 FORMAÇÃO CONTINUADA KRIKA-TI: RELATO DE EXPERIÊNCIA

A iniciativa em desenvolver um projeto deformação continuada nasceu pela aproximaçãode três professores da Faculdade de EducaçãoSanta Terezinha (FEST). Dos três, uma profes-sora já vinha desenvolvendo um projeto ambi-ental na criação de ema, envolvendo os índiosidosos Krikati da Aldeia São José. Outro traziana sua história de vida uma convivência comesta etnia. Outras professoras foram aos pou-cos se envolvendo e se comprometendo com oobjetivo inicial do projeto, contribuindo de for-ma significativa para realização do mesmo.Contudo foi a convivência na própria aldeia quepossibilitou a equipe formadora um novo olharaos problemas enfrentados por este povo. Navisão dessa equipe formadora, a formação con-tinuada de professores foi destacada como prio-ridade, pois embora seja oferecida pelo Estado,a mesma se dá na cidade e de forma esporádica,contrariando o texto na LDB 9394/96.

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Acreditamos que para o fortalecimento daeducação indígena, a formação continuadadeva acontecer na própria aldeia, pois nesta, aintegração da comunidade é valorizada, os ido-sos participam das decisões, a reflexão da im-portância da cultura é aflorada, os recursosnaturais são utilizados como recursos pedagó-gicos e a coletividade prevalece sobre o indivi-dualismo. A partir desses pressupostos a esco-la diferenciada vai se construindo efortalecendo um currículo que venha atenderas necessidades específicas de cada povo indí-gena. Ao contrário, quando acontece na cida-de, surgem várias situações conflituosas que vãodesde a separação familiar até a adaptação am-biental. Estes provocam problemas emocionaise físicos que afetam a concentração e conse-quentemente a aprendizagem.

Partindo dessas constatações, no ano 2007,o Departamento do Curso de Pedagogia e oNúcleo de Prática Pedagógica da FEST, apre-sentaram a proposta da formação continuadaàs lideranças: Lourenço Milhomem Krikati(Chefe de Posto da FUNAI) e Silvia CristinaPuxcuyj Krikati (Professora Diretora do Cen-tro Educacional Indigena Krikati), intermedi-ados pela então Diretoria Regional de Educa-ção de Imperatriz, hoje Unidade Regional deEducação de Imperatriz (UREI), representadapor Gildete Mesquita (então, Coordenadora daEducação Indígena na UREI), assim como osrepresentantes da FEST: Kleber Alberto Lo-pes da Sousa (Vice Diretor), Aparecida de LaraLopes Dias (Coordenadora da Oficina Peda-gógica), Ilma Maria de Oliveira Silva (Coor-denadora do Núcleo de Prática Pedagógica) eConceição de Maria Botelho Martins (Coor-denadora do Curso de Pedagogia).

O Projeto de Formação Continuada de Pro-fessores Indígenas krikati foi elaborado e apre-sentado à comunidade na Aldeia São José. Apartir das observações feitas pela comunidade,o projeto foi reelaborado levando em conside-ração todas as contribuições pertinentes. Paratanto, após consenso, e em comum acordo, em2007 firmou-se o convênio entre a Faculdadede Educação Santa Terezinha (FEST), entãorepresentado por sua Diretora Geral, RozaMaria Soares da Silva, e a Associação de Pais e

Mestres Indígena Krikati, representada por seupresidente, Edilson Cryh cryh Krikati, atual-mente acadêmico no curso de Ciências Econô-micas na FEST.

4 EDUCAR: visão Krikati

Para dar início ao trabalho de formação,buscamos primeiramente compreender comoocorre o processo de educar na visão indígenado Povo Krikati. Para isso propomos uma ati-vidade escrita, com os professores indígenas,com o seguinte questionamento: O que é edu-car? Segundo os professores:

“Educar vem de pai para os filhos na con-vivência de um povo. É muito importantevocê se reconhecer, sua origem, a cultura,a língua, para não perde a sua identidade.(Pedro E’ croc Krikati)

‘’Educação na natureza é a base de todafonte de origem como rio, serra, pedra,árvores, pássaros, sol e o céu. Na nature-za que vem a transformação de cada pro-cesso de mudança. Como o ser humanoquando nasce e cresce se torna mais inte-ligente, com cada aprendizagem de acor-do com sua vivência e convivência nanatureza. Educar é a melhor qualidadede acordo com a natureza porque é mãede toda a espécie”. (Wagner C. Krikati)

“A educação dos idosos é muito impor-tante, porque ele tenta mostrar a realida-de para os jovens de hoje. Tem muitaspessoas que falam que os idosos não sa-bem nada, não entendem das coisas. Sóque eles estão muito enganados com osidosos, porque através deles nós somoseducados e orientados como se respeitaos amigos e os colegas e outras pessoas.Quando os pais dão conselho a pessoavá pensar que ele está mentindo e não dáatenção. Eu sempre respeitei os idosos eaté eu falo pro meus alunos pra respeitaroutras pessoas”. (Márcia Cohmxi CwyjKrikat)

“O educador tem que ensinar os seus alu-nos a participar de todas as festas que vaiacontecer na aldeia. Nós que somos edu-

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cadores temos que valorizar os cantos,danças, pinturas e comidas típicas. Eaprender respeitar a nossa cultura e valo-rizar o nosso costume de sermos índios”.(Flor de Lis Ca’hixyh da S. Krikati)

“Educar na escola hoje é um grande de-safio, porque a responsabilidade fica qua-se toda com o professor. É impossível umprofessor indígena não trabalhar sua ima-gem, postura. Educar uma criança é se-guir, é dar rumo a uma vida. Educar é pre-servar a cultura viva, manter ela. Preservaré por em prática o que foi colhido juntocom a nossa comunidade. Educar não ésó escrever e ler e sim ter conhecimentoem geral. Como valorizar o seu passado etentar manter viva a cultura sabendo daglobalização chegando a aldeia?” ( SilviaCristina Puxcuyj Krikati)

Compreendemos então, que educar na vi-são dos professores indígenas Krikati vai alémda educação escolar, pois esta não está limitadaa um espaço específico e nem ao núcleo famili-ar, acontece no cotidiano e é responsabilidadede todos para o fortalecimento dos saberes cul-turais. A educação indígena é livre, prazerosadesenvolve-se através da imitação, neste aspec-to o idoso é reconhecido na transmissão de va-lores às novas gerações através da oralidade.Neste sentido, educar é viver o prático, o empí-rico, buscando suprir suas necessidades imedi-atas, para os Krikati, a aprendizagem é signifi-cativa.

Ao contrário da educação indígena, a edu-cação escolar não-indígena é sistematizada, apartir de objetivos a serem atingidos em umdeterminado espaço e tempo. Contudo, estaorganização não pensada pelo índio, mas parao índio, é a mesma que se busca implementarna escola indígena. Dai a dificuldade de com-preender a estrutura e funcionamento da edu-cação escolar indígena aos moldes da escola donão-índio.

A escola entrou na comunidade indígenacomo um corpo estranho, que ninguémconhecia. Quem a estava colocando sabiao que queria, mas os índios não sabiam,hoje os índios ainda não sabem para que

serve a escola. É esse o problema. A esco-la entra na comunidade e se apossa dela,tornando-se dona da comunidade, e nãoa comunidade dona da escola. (HENRI-QUES et al.,2007, p. 10)

Diante desta constatação, a reflexão que fa-zemos é de que a maior dificuldade seja o senti-do atribuído à escola pela comunidade indíge-na. Esta como é apresentada não correspondeaos anseios dos índios, embora a reconheçacomo um instrumento necessário para sua au-tonomia e autodeterminação. Isto não significadizer que não exista conflito entre a especifici-dade da educação indígena e os parâmetros daeducação do não-índio.

5 PLANEJAMENTO ESCOLAR: uma refle-xão inicial

O ato de planejar é uma necessidade, poisplanejamos as coisas mais simples. Como dizVasconcelos (2002, p.15) “nas coisas mínimasdo dia-a-dia, como tomar um banho ou dar umtelefonema, estão presentes atos de planejamen-to”. Porém, o planejamento compreendidodessa forma, não acontece de forma racional,partindo da necessidade imediata, diferente-mente do planejamento escolar que defendeponto de vista, faz escolhas, toma decisões emrelação ao que ensinar, por que ensinar, paraquem ensinar e qual a importância dos conhe-cimentos.

Nas comunidades tradicionais, como as in-dígenas, se vive do presente e também do pas-sado, mas nunca do futuro. O ato de planejarnão tem sentido, pois seu dia-a-dia não é plane-jado, e sim vivido. O que justifica o planeja-mento escolar constituir-se um obstáculo, poisao mesmo tempo em que não o vê como algoprático, os professores se inquietam pela ne-cessidade de sistematizar suas atividades peda-gógicas, como é percebido na fala da professo-ra Katiana Crù cre da S. Krikati.

“Muitas vezes, depois que termino a aulafico pensando que poderia ter levado umarco de flecha pra falar pro meus alunospequenos o que é uma reta. Sei que seria

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importante, mas não sei muito bem comofazer”.

Compreendendo a necessidade apresenta-da pela professora e demais professores de comosistematizar as atividades pedagógicas, desen-volvemos um estudo sobre os níveis de plane-jamento, partindo dos saberes vivenciados poreles, como: organização de roçado, festas, brin-cadeiras, etc. A partir desses conhecimentosprévios foi possível utilizar textos sobre plane-jamento baseado em autores como: Menegolla(2003 ) e Vasconcelos ( 2002).

Contudo, sabedor que é no fazer prático queos indígenas manifestam os seus saberes, utili-zamos de um contexto de uma festa, a do ga-vião, para que eles percebessem as etapas deum planejamento. Neste aspecto, foi pergunta-do qual a primeira ação que fizeram quandopensaram em realizar a festa. A resposta foi: -uma reunião no pátio, lá os homens apresenta-vam a vontade e a condição de cada famíliapara realização da festa. E ainda, decidiamquando iriam realizar a festa, quem colocariaas roças, quais os alimentos que seriam adqui-ridos na cidade, quem se responsabilizaria pe-las indumentárias e quem seriam os convida-dos, entre outras necessidades. Enquanto osprofessores descreviam, uma mediadora daequipe formadora organizava as ações, dessemodo, tornou-se possível que os professorespercebessem que o planejamento, embora nãosistematizado, tinha sido contemplado na reu-nião no pátio.

Na continuidade deste trabalho, os profes-sores indígenas Krikati foram abstraindo gra-dativamente que os componentes do plano deaula também se faziam presentes nas ativida-des diárias. As falas demonstram a importân-cia do registro escrito para organizar o planeja-mento.

“O planejamento é importante porquecoloco meus pensamentos escritos”. (Re-nato Gavião)

“A minha visão voltou-se para realidadeda minha comunidade”.(Pedro E’croc Krikati)

Ao término do projeto percebemos haveruma maior preocupação com a sistematizaçãodas atividades a serem desenvolvidas em salade aula, embora não tendo ainda clareza do sig-nificado das palavras: objetivo, metodologia,avaliação, dão sentido as mesmas vivenciando-as na sua prática pedagógica.

6 AVALIAÇÃO KRIKATI: processo cultu-ral espontânea

A avaliação escolar compreendida comoelemento do planejamento tem como objetivomediar a prática educativa por meio de um fa-zer pedagógico, voltada ao tipo de homem esociedade que se quer formar.

Assim como o planejamento, a avaliaçãoescolar indígena deve ser compreendida a par-tir de um contexto mais amplo. Para tanto, bus-camos dentro de acontecimentos culturais, ele-mentos para análise. Na cultura indígenaKrikati a avaliação é feita por aquele que acu-mulou conhecimento no decorrer dos anos:idosos, caciques, pajés e lideranças. Esta vematrelada a critérios como: habilidade, supera-ção e esforço físico. Para exemplificar, temos acorrida de revezamento de tora, já citada, sen-do nela perceptível a presença da competição,embora não seja seu principal objetivo. A pre-miação também existe para quem chega pri-meiro, e se manifesta através de aclamação, ri-sos e comentários na língua materna. Mas asvitórias não são acumulativas, pois cada corri-da é única.

Ao nosso olhar a punição também existe,embora não tenha a mesma conotação para osíndios, pois em outra corrida de tora, presenci-amos ao final, um idoso aguardando os corre-dores. Os que chegaram por último faziam filaenquanto aguardavam chicotadas dadas peloidoso, com finos galhos de mato. Ao buscar-mos o significado daquele procedimento, com-preendemos que as chicotadas tinham para osindígenas corredores caráter de incentivo, paraum melhor desempenho na próxima corrida.

Embora nessa cultura a avaliação seja ine-rente a toda e qualquer atividade, no processoescolar é incorporada aos princípios classifica-tórios da avaliação escolar do não-índio.

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Nas discussões, em relação a como avaliar,o que nos chamou a atenção foi o conflito vivi-do pelos professores Krikati. Estes, ao mesmotempo em que trabalham os métodos avaliati-vos do não-índio, se questionam quanto ao pro-cesso avaliativo que ocorre de forma espontâ-nea na sua cultura. Partindo destas constataçõesnos remetemos ao que diz Baniwa (1998), quea escola só será escola indígena quando for pen-sada e gerida pelo índio.

A partir dos estudos sobre avaliação esco-lar, no qual era possibilitado fazer relações comos elementos da cultura indígena, foi possívelperceber a construção de conceitos, como rela-ta o professor Wagner Crowahryh Krikati:

Numa atividade coletiva de roça foi en-tregue para alguns jovens sementes paraplantar. Passou dias e depois os idososviram que nos buracos nasceram váriassementes e em outros não. Uma nasceuem cima da outra.

Partindo desse exemplo, os professores per-ceberam que os idosos estavam avaliando osjovens sobre a prática do roçado, concluindoque os conhecimentos não estavam sendo pas-sados às novas gerações.

Remetendo ao processo avaliativo escolar,refletiram ainda sobre a necessidade de ter cla-reza quanto aos conteúdos, objetivos e proce-dimentos da avaliação.

Foi possível também perceber que os pro-fessores Krikati compreenderam na prática aimportância de uma avaliação realizada en-quanto processo de crescimento e aperfeiçoa-mento, pois ao final, quando solicitados a seauto avaliarem foram de uma honestidade con-sigo mesmo que pouco se observa no não-ín-dio. Conforme se constata de alguns transcritosà seguir:

“Embora com respeito a nossa cultura, àsvezes nós (professores) deixa de vir aosencontros por outros motivos que não acultura. Por um lado nós (professores) nossentimos tristes pela ausência dos outros,por outro lado, contentes porque estamosaqui. Eu também tenho falhado, isso meentristece a mim mesmo. E nós estamos

aqui pra continuar. Como educador te-mos que ser exemplo pra nossos alunos.”(Wagner Crowahr½h Krikati)

“Muito bom vocês vir aqui pra acordar agente. Falhei em muitos encontros. Te-mos que colocar em nossa cabeça quesomos referência. Temos que aprender praensinar. Infelizmente não estamos cum-prindo” (José Cohxyj Krikati)

“A FEST fez um calendário muito impor-tante, procurando não atrapalhar o nossotrabalho. Reconheço o esforço de vocêsque vêm de lá até correndo perigo, masquando chega aqui não encontra em nósa alegria esperada” (André S. CirqueiraGuajajara)

“Certamente que nesse momento é aoportunidade que eu esperava pra colo-car meus argumentos, colocar as dúvidas.Queria agradecer a FEST. No meu en-tendimento e sentimento não tenho pon-tos negativos, mas, o calendário deve con-tinuar acontecendo os encontros. Vocêstêm muito interesse e vontade de nosajudar. Por isso, quero dizer que nós nãosomos fraco, mas temos que reunir e con-versar sobre os imprevistos (carro que ato-la no inverno). Esse projeto serve pra nósmesmos. Queremos que vocês mostremoutros caminhos também. Outras estra-tégias. Nunca perdi nenhum encontro,pois quero ser alguém no futuro. Nós que-remos que nós professores indígenas te-mos que colocar o pé na parede pra conti-nuar, porque até agora não aconteceu oque ta acontecendo com a produção dolivro. Mosar e Raimundinho têm que nosanimar também. Esse é o caminho certopra gente produzir o que nós queremosmesmo.” (Augusto)

“As vezes fico muito triste pelas nossasfalhas como professor. Vocês vêm de lon-ge e nós não valorizamos. Tenho muitasdificuldades com a língua portuguesa evocês ajudam a gente a entender, estãoabrindo nossa mente. Andando pelo Bra-sil vejo os outros povos indígenas apre-sentando suas produções e nós não con-seguimos ainda. Enquanto a gente viver,não pode ficar parada. É muito bom a for-

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mação continuada. Agradeço a FEST queta ajudando o professor a melhorar, a dáuma aula de qualidade. Às vezes vocês fa-lam palavras que eu não entendo ainda.Agradeço pela vontade e paciência de vo-cês.” (Flor de Lis Ca’hixyh da S. Krikati)

“Aprendo cada vez mais com vocês. Quan-do passei no seletivo pra professora tivecríticas em sala de aula, trocava as letrasmaiúsculas com as minúsculas. Com vo-cês to aprendendo. Tô tendo compromis-so comigo mesmo por isso. Sei a nossalíngua, mas pra escrever tenho muita difi-culdade.” (Katiana Crù crê da S.Krikati)

“É nossa vez de renovar nosso calendá-rio. Vocês tão acrescentando nosso conhe-cimento. Tô aqui aprendendo com vocêse isso é muito bom pra nós todos. Falhei,não porque quero, mas, por imprevistos,por necessidade. Hoje estamos estudan-do nossa língua materna. Antes era ape-nas o Português, nossa visão era sair daaldeia, agora vocês tão alertando nós praficar, fortalecendo nossa visão. Hoje va-lorizamos o que é nosso” (Marineusa PryjKrikati)

7 MATERIAL DIDÁTICO: contextualiza-ção das práticas pedagógicas indígenas

O material didático constituiu-se parte in-tegrante do planejamento escolar como elemen-to enriquecedor do fazer pedagógico e facilita-dor da aprendizagem. Na educação escolarindígena “os materiais tem sua importânciadidático pedagógica por apoiarem os currícu-los das escolas indígenas, mas, sobretudo, cons-tituem-se importantes processos de construçãode conhecimento e pesquisa pelos próprios pro-fessores indígenas em formação” (RFPI, 2005,p.59).

No percurso da formação continuada, tor-nou-se comum ouvirmos lamentos, por partedos professores Krikati sobre a falta de umacompanhamento pedagógico que satisfizessesua prática como docente, bem como materiaisdidáticos específicos e diferenciados para o seucontexto escolar. Neste aspecto, retornamos aquestão da ausência de um currículo próprio e

específico. Os conhecimentos trabalhados nasescolas indígenas são baseados unicamente nosconteúdos dos não-índios, e isso os leva a utili-zar no processo de ensino e de aprendizagemelementos que não lhe são próprios. Em decor-rência, percebemos uma apatia tanto por partede quem ensina como daquele que aprende.

Para mudar essa prática urge a necessidadede desenvolver formas próprias de aprendiza-gem, saber como apreender conhecimentos dosseus antepassados e produzir materiais peda-gógicos que sirvam como instrumentos de re-flexão e contextualização das práticas pedagó-gica, “os materiais apoiam a renovaçãocurricular da educação intercultural e bilíngueincentivando a construção e a pesquisa não sóde novos conteúdos culturais, antes ausentesno currículo” (RFPI, 1988), mas permite tam-bém que o professor reflita sobre a sua própriaprática e construa no coletivo, a escola autôno-ma e de qualidade.

Na ausência de materiais didáticos produ-zidos pelos próprios professores indígenascomo textos e livros, na formação continuadaKrikati, propomos a construção de materiaisdidáticos alternativos, valorizando recursosnaturais da própria aldeia como: sementes, fo-lhas, fibras, assim como desenhos da fauna e daflora produzidos pelos professores, idosos ecrianças (estes presentes em todas as atividadespráticas da formação). Também utilizamos ró-tulos de produtos industrializados por eles con-sumidos no dia a dia, assim como outros, ma-teriais foram contemplados nas técnicas.

No decorrer das oficinas de confecção dosmateriais didáticos, os quais deveriam ser pro-duzidos na língua materna e portuguesa, surgiuo primeiro entrave, pois apenas três professo-res dos vinte e três envolvidos dominavam alíngua escrita materna. Desta problemática, ospróprios professores manifestaram a necessi-dade do domínio da língua escrita materna.Diante dessa situação, foi proposto pela equipeformadora um projeto de alfabetização, ondeos professores bilíngues seriam os mediadoresdo processo.

O projeto de Alfabetização de ProfessoresIndígena Krikati da língua escrita materna estáem desenvolvimento, acontecendo uma vez por

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semana, na Aldeia São José, acompanhado pelaequipe formadora.

8 SEMINÁRIO: Abordagem do processo en-sino aprendizagem

O projeto de Formação Continuada de Pro-fessores Indígenas Krikati teve sua culminân-cia em dezembro de 2010, através de um semi-nário temático organizado pelos própriosprofessores indígenas, com a temática: Abor-dagens do processo de ensino e de aprendiza-gem.

Na ocasião, os professores indígenas Kri-kati apresentaram as abordagens baseados nostextos da Mizukami (1986), resignificando aescola indígena ideal a partir da real.

“Vocês estão nos valorizando insistindopara o resgate de nossa cultura para umaprática específica e diferenciada” (Mari-neusa Pryj Krikati) “Somos guerreiros e educadores do fu-turo. Guerreiros pela luta da causa indí-gena. E o educador tem muita responsa-bilidade nisto” (José Cohxyj Krikati)

Embora passados três anos, foi na culmi-nância que tivemos a confirmação da dimen-são do trabalho desenvolvido; toda a comuni-dade foi envolvida no seminário demonstrandoo fortalecimento de sua cultura, presente nascomidas típicas, indumentárias, corrida detora, pinturas, participação dos cantores, dosidosos e das crianças, entre outros.

Em todo caminho percorrido percebemosos anseios do povo Krikati, representado pelosseus professores, de que a escola específica ediferenciada não pode ser vista como uma uto-pia ou sonho visionário, mas uma certeza, re-sultado de uma luta, na qual se busca o respeitoàs diversidades etnoculturais e da pessoa hu-mana.

9 CONSIDERAÇÕES

Sempre que fazemos leituras, seja de arti-gos, livros, resultados de pesquisas, nos depa-ramos com uma infinidade de citações, de au-

tores que já falaram aquilo que vivenciamos naprática, os quais são citados como fundamen-tais para que o trabalho seja aceito como cien-tífico. Isso implica dizer a importância da fun-damentação teórica, o respeito a quem já se pôsa pesquisar e buscar respostas a um determina-do problema.

Concordamos com toda exigência da ciên-cia para a produção científica. Porém, durantetodo período o qual foi realizado o trabalho,não nos furtamos de pesquisar, dialogar, estu-dar e principalmente analisar os trabalhos járealizados junto ao povo Krikati. No entanto,para o registro dessa experiência, não achamosnecessário citar, no corpo do relatório, todosos autores que contribuíram para o nosso co-nhecimento, porém estes constam nas referên-cias.

Procuramos durante todo processo dar ên-fase à experiência e aquilo que estávamos vi-vendo, como momento único e irrepetível. In-terrogações e questionamentos da própriaexperiência oportunizaram-nos a refletir sobreos significados da vida cotidiana do povo Kri-kati, desnaturalizando situações que pareciamantes ser tão naturais.

Nesse sentido, participamos de momentosrelevantes ao povo Krikati, como por exem-plo: luto e seus rituais; festas em diversas situ-ações e significâncias; casamento na cultura;nascimento de uma criança, entre muitos ou-tros. Durante as noites percebíamos constan-tes movimentos dos jovens que se encontravampara conversar, namorar, brincar, algo que nãose via, de forma tão intensa, durante o dia. Vi-venciamos também, nas madrugadas, as canto-rias dos idosos ao redor das fogueiras, as con-versas informais dos jovens sobre suasexpectativas de vida, o que pensam da escola eda cultura para as novas gerações. Contudo, issosó foi possível porque dormíamos na Aldeia,pois os encontros de formação aconteciam nodecorrer de dois dias seguidos na semana, umavez por mês. Esses momentos, portanto, pro-porcionaram à equipe formadora novas apren-dizagens, bem como possibilidades de diálogoe respeito à diversidade cultural tão rica de sig-nificados.

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Tratando da Formação Continuada de Pro-fessores Indígenas Krikati, concluímos que ain-da existem dificuldades em incluir os aspectosculturais específicos no currículo escolar, mui-to embora, alguns elementos estejam prescri-tos na proposta curricular. Outro entrave é onão domínio da língua materna escrita, assimcomo a compreensão da língua portuguesa, pelamaioria dos professores. No que se refere aoúltimo entrave, vem sendo desenvolvido umprojeto de alfabetização da língua materna es-crita para professores indígenas Krikati.

Neste sentido, urge a necessidade da efeti-vação de políticas públicas que venham forta-lecer a autonomia desses professores indígenas,através de sua formação inicial e continuadapara que se tornem protagonistas da constru-ção de uma escola indígena diferenciada, espe-cífica, bilíngue e intercultural.

A Faculdade de Educação Santa Terezinha(FEST), como instituição de ensino superior,entende que faz parte do seu papel contribuircom ações para o desenvolvimento social. Nes-te aspecto, acreditamos ter contribuído signifi-cativamente na formação continuada dos pro-fessores indígenas Krikati.

REFERÊNCIAS

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APROXIMAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA

Maria Zélia Bezerra Vale1

Veríssima Dilma Nunes Clímaco2

1 Maria Zélia Bezerra Vale - Especialista em Metodologia do Ensino e Pesquisa em Ciências Naturais:Física, Biologia e Química – FIA; Especialização em Administração e Supervisão Escolar – FIA;Aperfeiçoamento em Matemática – Pró-Ciências – UFMA; e-mail: [email protected]

2 Veríssima Dilma Nunes Clímaco – Pedagoga; Especialista em Formação de Formadores em EJA-UNB; Especialista em Metodologia do Ensino Superior – UEMA; Mestrado em Ciência da Educa-ção – UA; e-mail: [email protected]

RESUMO

O projeto Aproximação entre Teoria e Prática se caracteriza como uma ação interdisciplinardesenvolvida nas disciplinas de Fundamentos Teóricos Metodológicos oferecidas no IV períododo Curso de Pedagogia do turno noturno na Faculdade de Educação Santa Terezinha. Objetivandoaproximar teoria e prática a partir de atividades interdisciplinares e da elaboração, confecção euso dos recursos didáticos, dando ênfase no processo de desenvolvimento cognitivo, explorandomúltiplas competências, integrando-os como auxiliares no processo de aprendizagem.

Palavras-chave: Interdisciplinaridade. Recursos. Teoria. Prática. Aprendizagem.

ABSTRACT

The project Approximation between Theory and Practice characterized as one interdisciplinaryaction courses in Fundamentals of Theory and Method offered on Period IV the Faculty ofEducation of the night shift in the School of Education Santa Terezinha. With the aim to approachtheory and practice from interdisciplinary activities and development, manufacture and use ofthe didactic, getting dipper on the process of cognitive development, exploring multiplecompetencies, integrating them as auxiliary process of learning.

Key-words: Interdisciplinary. Resources. Theory. Practice. Learning.

1 INTRODUÇÃO

O saber favorece a integração social do in-divíduo mesmo antes de frequentar a escola.Ele vivencia variadas situações de aprendiza-gem no seu cotidiário, manuseando, juntando,brincando e em contato com a natureza estabe-lece relação com diferentes paisagens e ambi-entes naturais. Mesmo com tantas possibilida-des externas é na escola que o saber deve ser

aprimorado e sistematizado. O educador emsua prática pedagógica deve oportunizar situa-ções problemas em que os (as) educandos(as)pensem, raciocinem e relacionem o saber cons-truído na escola com as vivências diárias. En-tretanto, a prática pedagógica do educador éresultado de sua formação inicial.

Neste contexto, o curso de pedagogia vemcontribuindo para que o(a) acadêmico(a) ad-quira visão de unidade, aproximando a teoria

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da prática, pois são crescentes os desafios en-frentados nos diversos momentos de contatocom as escolas, agora não mais como alunos.Nesta nova fase, o volume de informações, osconflitos e situações diferenciadas exigem es-tratégias mais eficientes como aproximar teo-ria e prática a partir de atividades interdiscipli-nares e da elaboração, confecção e uso dosrecursos didáticos, dando ênfase no processode desenvolvimento cognitivo, explorandomúltiplas competências, integrando-os comoauxiliares no processo de aprendizagem.

Acreditando que a teoria se torna estéril senão for viabilizada na prática, as disciplinas defundamentos de: Matemática, Ciências, Histó-ria e Geografia, junto ao Núcleo de PráticaPedagógica/Oficina Pedagógica, promovemmomentos de fundamentação teórica e ofici-nas de confecção de recursos didáticos alterna-tivos, utilizando materiais como: rótulos deprodutos industrializados, caixas, revistas depropagandas, entre outras. Nestes momentosem atividades interdisciplinares, espera-se queo(a) acadêmico(a) da FEST, não apenas con-feccione os recursos, mas também contextuali-ze os saberes, avalie os limites e possibilida-des, no que diz respeito à criatividade e odomínio de conteúdos das disciplinas, contex-tualizando os recursos confeccionados; assimcomo na elaboração da ficha técnica, sendo estacompreendida como planejamento, adequan-do o conhecimento à faixa etária, bem comoaos objetivos propostos de aprendizagem. Paratanto o presente estudo foi iniciado em 2010.2na turma do IV período noturno do Curso dePedagogia da Faculdade de Educação SantaTerezinha – FEST.

O projeto foi desenvolvido o projeto comestudo dos Parâmetros Curriculares Nacionais(PCN´s) em grupo, sendo que a turma de 32acadêmicos(as) foi dividida em quatro grupose cada um ficou responsável pelo estudo de umdos PCNs e elaboração de um painel ilustrati-vo para ser socializado em sala sendo disponi-bilizado as aulas da semana destas disciplinaspara estudo e confecção dos murais. Usou-se aOficina Pedagógica para a realização de pales-tra com a Prof.ª Iolanda sobre Planejamento deCurso. No laboratório de informática, foi feita

a criação de um Fórum Virtual para troca deopiniões e postagem de produções dos alunos apartir da leitura interdisciplinar do Livro: Pe-dagogia de Projetos como alternativa para oensino-aprendizagem e acesso ao sitewww.portaldoprofessor.mec.gov.br (sobre es-paço de aula; recursos educacionais, estratégi-as pedagógicas) e posteriormente a elaboraçãode um relatório sobre o assunto pesquisado nosite.

Na Oficina Pedagógica vivenciou-se Pales-tra sobre “Plano de aula “com AparecidaD’Laras para elaboração do plano de aula,confecção de recursos didáticos, partindo dolevantamento dos temas abordados em sala deaula.Também foi realizada leitura do Livro:Saber cuidar: ética do humano – compaixãopela terra apresentação em power point ( qua-tro slides) da idéia central dos capítulos I, II V,VI, VII, VIII, IX, X , sorteou-se na turma asequipes que ficaram responsáveis por cada ca-pítulo). A avaliação procedeu da seguinte for-ma: apresentação dos slides, fundamentaçãoteórica, capacidade de síntese.

2 A INTERDISCIPLINARIDADE COMOABORDAGEM DE APRENDIZAGEM

A interdisciplinaridade é o viés que tornareal a realização de projetos didáticos com umolhar holístico. Através dela pode-se trabalhartemas que não pertencem a uma disciplina es-pecífica, mas que envolvem duas ou maisdelas, e abre novas possibilidades de aprendi-zagem, porque nela se evita a compartimenta-lização do conhecimento.

A noção mais conhecida de interdiscipli-naridade é a de interação entre duas oumais disciplinas para superar a fragmen-tação, a compartimentalização de conhe-cimentos, implicando uma troca entreespecialistas de vários campos do conhe-cimento na discussão de um assunto, naresolução de um problema, tendo em vis-ta uma compreensão melhor da realida-de. (LIBÂNEO, 2002, p. 31)

Sob este olhar a interdisciplinaridade ofe-rece uma roupagem nova á didática, apresen-

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tando uma linha de trabalho integradora porque ela envolve a contextualização do conhe-cimento e uma relação fundamental entre osujeito que aprende e o objeto a ser aprendido,evocando fatos da vida pessoal, social e cultu-ral, principalmente o trabalho e a cidadaniaestabelecendo relações entre os novos conteú-dos e os conhecimentos já construídos, obten-do aprendizagens mais significativas, conferin-do, criticando, sugerindo adequações, novasrelações e organizações, abrindo janelas para amediação em uma realidade promovendo odesencadeamento de novas ações.

O trabalho interdisciplinar se faz condiçãosine qua nom para acontecer a aproximação en-tre Teoria e Prática, devido o mesmo possibili-tar a contextualização do conhecimento, sen-do, portanto, uma forma globalizadora deestudar temas transversais às disciplinas. Eletraz uma forma nova de aprendizagem, umnovo

jeito de aprender. Nele o conhecimento estáligado a uma cognição prática, que passa pelacompreensão e se materializa no desejo detransformação da realidade. Na academia oseducadores(as) que trabalham com as discipli-nas Fundamentos Teóricos Metodológicos de:Matemática, Ciências, História e Geografia,seguem o principio de que é necessário ofere-cer aos (as) acadêmicos (as) possibilidades quelhes motivem buscar alternativas de aprendi-zagem significativas, assim como, usar dessessaberes em sua prática de sala de aula. Paratanto, fez-se parceria entre Núcleo de Prática/Oficina Pedagógica para realização de oficinasde planejamento e confecção de recursos didá-ticos com materiais alternativos, na tentativade melhorar a formação desses acadêmicos(as)e exploração das capacidades criativas.

Acredita-se que a utilização de recursos di-dáticos diversificados podem contribuir signi-ficativamente para melhoria na aprendizagem.O ensino não pode ser pautado só em transmis-sões verbais, por meio de aulas expositivas eexplicações orais, na medida em que esse enfo-que pedagógico conduz os acadêmicos a deixa-rem de lado o raciocínio lógico, ensinando-os aadaptarem-se às exigências da escola que re-produz a sociedade, porque não é possível

aprender renunciando o pensar. Recursos di-dáticos como jogos, materiais manipuláveis emídias tecnológicas permitem a elaboração doconhecimento mediante a realização de ativi-dades dinâmicas nas quais os acadêmicos sãoincentivados a pensar, analisar, agindo sobre oobjeto de seu aprendizado. Aprender de formainterdisciplinar segundo Fazenda (2001, p.11)pode ter a conotação do poema de Maria Elisa“Perceber-se interdisciplinar”:

É sentir-se componente de um todo. Ésaber-se filho das estrelas, Parte do uni-verso e um universo à parte...

É juntar esforços na construção do mun-do, Desintegrando-se no outro, para, comele, Reintegrar-se no novo...

É ter consciência de que a natureza o ge-rou; De que é fruto dela, jamais seu se-nhor...

É saber que a humanidade terrena surgiude uma evolução, E que, talvez, não sejaela única no espaço sideral...

É saber que a liberdade está em afirmar-se, integrando-se, Que o crescer históricoconsiste em ser retratado, Nunca eterna-mente impedido...

É reconhecer no “universo”, “unidade nadiversidade” E estar consciente de que oevoluir é lei geral...

É saber que, etimologicamente, “mundris”é pureza, E (quem sabe?) encontrar a pazinterior...

Pois, “Quando a mente é perturbada, pro-duz-se a multiplicidade das coisas; quan-do a mente é aquietada, a multiplicidadedas coisas desaparece”.

Desta forma, defende-se a necessidade des-te olhar holístico no fazer pedagógico, em quea atividade interdisciplinar oferece tanto aoeducador como ao educando o sentimento dese tornarem seres interdisciplinares que nas-cem na prática proveniente de suas vivências esão aprimorados com a teoria, sanando a difi-

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culdade em relacionar a prática vivida com ateoria estudada. Nela conforme Delizoicov etal (2002, p. 122):

O aluno é na verdade o sujeito de suaaprendizagem: é quem realiza a ação, enão alguém que sofre ou recebe uma ação.A aprendizagem é resultado de ações deum sujeito, não é resultado de qualqueração: ela só se constrói em uma interaçãoentre esse sujeito e o meio circundante,natural e social.

Essa nova modelagem da educação revela aeducação sóciointeracionista defendida porVygotsky e Freire, e distancia-se dos modelostradicionais, priorizando-se formas alternati-vas de interação entre educador-educando naconstrução de novos saberes.

2 O MANUSEIO DE RECURSOS DIDÁTI-COS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGI-COS NA PRÁTICA INTERDISCIPLI-NAR

As mudanças sociais exigem que sejam in-corporados na educação em geral recursos didá-ticos pedagógicos e tecnológicos, pois a dinâmi-ca da sociedade estabelece a necessidade depráticas inovadoras para desenvolver a critici-dade do acadêmico sobre a realidade social emque vive e na qual deve participar e intervir.

A universidade tem sentido a necessidadede inovar para evitar

o risco de auto-marginalizar-se. A respos-ta ao desafio da inovação se evidenciaem alterações curriculares, em projetospolíticos-pedagógicos, em planos de car-reira, na utilização de estratégias de pes-quisa ação, nos serviços à comunidade,na capacitação docente pelos cursos depós-graduação, no aumento de publica-ções e periódicos sobre pesquisa e traba-lhos teórico-práticos, nos investimentosem recursos informáticos e na sociedaderede. (ENRICONE (Org), 2002, p. 51)

Diante do exposto percebe-se que a práticapedagógica deve apresentar uma nova formade trabalhar buscando recursos didáticos peda-

gógicos alternativos e tecnológicos mais inte-ressantes, que promovam a reflexão e partici-pação do aluno. Para tanto é preciso usar estra-tégias na condução das atividades acadêmicas,ou seja, a utilização adequada dos recursos e aintencionalidade planejada, que garantirão oêxito no processo de aprendizagem. As estraté-gias podem ser viabilizadas por meio das tec-nologias presentes no cotidiano dos educado-res e educandos, possibilitando romper comlimitações e oferecer a democratização do aces-so à informação e construção de novos saberes.Sua inserção acena para novas oportunidadesde repensar e inovar a prática. È salutar discu-tir a importância dos recursos didáticos peda-gógicos e tecnológicos como estratégias para aaprendizagem dos educandos e formação doseducadores.

Como não concordar? A escola não podeignorar o que se passa no mundo. Ora asnovas tecnologias da informação e dacomunicação (TIC ou NTIC) transfor-mam espetacularmente não só nossasmaneiras de comunicar, mas também detrabalhar, de decidir, de pensar. (PHER-RENOUD, 2000, p. 125)

Não há como resguardar-se das inovações,pois quando se busca avançar, e incluir-se, e aconfecção de recursos didáticos pedagógicosbem como o manuseio de recursos tecnológi-cos devem ser constantes na prática pedagógi-ca para que aconteça essa inclusão. Segundoesta pesquisa não é suficiente para o educador eo educando conhecer os recursos disponíveisno mercado prontos para o consumo, é indis-pensável que o mesmo tenha habilidades e com-petências para manuseá-los. Portanto, aproxi-mar teoria e prática na confecção e uso dosrecursos didáticos, dando ênfase no processode desenvolvimento cognitivo, explorandomúltiplas competências, integrando-os comoauxiliar no processo de ensino aprendizagem éobjeto permanente de estudos e reflexões dasdisciplinas de fundamentos teóricos metodo-lógicos. É neste contexto, que professores eacadêmicos do IV período de Pedagogia destainstituição, vem explorando as diversas possi-bilidades de interdisciplinaridade para cons-

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truir uma compreensão maior e mais eficaz daspráticas pedagógicas, e promover transposiçõesdidáticas calcadas em conhecimentos teóricose sustentadas por práticas inovadoras e moti-vacionais.

Nesta tentativa de aproximação, o estudodos documentos legais que balizam a educaçãobrasileira, foi explorado de forma prioritária,bem como, o estudo de teóricos que defendemo uso de recursos didáticos nas práticas de salade aula. Buscou-se reafirmar que o uso de jogosdidáticos e outros recursos funcionam comomotivadores de aprendizagem e, mantém ele-mentos do cotidiano das crianças em situaçõesdidáticas, evitando assim, a dicotomia entreambiente de aprendizagem e brincadeiras esti-mulantes.

Repensando a docência sob este olhar,confeccionar recursos didáticos alternativossignifica possibilitar aos pedagogos (as) em for-mação, o desenvolvimento de habilidades cri-ativas e visão critica de educação participativae autônoma.

Outra ação docente significativa é saberidentificar os momentos didáticos em que pos-sa usar os recursos nas aprendizagens. Isto éfundamental para a aquisição de aprendizagenssignificativas, como suportes para transposi-ções didáticas que possibilite aos aprendizesum desenvolvimento cognitivo adequado aomomento biológico, que seja dinâmico e desa-fiador, explorando suas múltiplas competênci-as, e que estimule diversas inteligências na aqui-sição de saberes.

Em sua teoria cognitivista Ausubel apudMoreira (1982) afirma que podem incidir doistipos de aprendizagens: a mecânica e a signifi-cativa. A aprendizagem mecânica acontecequando as novas informações conseguem pou-ca ou nenhuma interação com conceitos rele-vantes já existentes na estrutura cognitiva, ouseja, não há interação entre a nova informaçãoe aquela já armazenada, ficando a nova infor-mação solta na estrutura cognitiva, sendo exi-gido do aprendiz apenas a internalização semnenhum significado. Já a aprendizagem dita sig-nificativa é quando uma nova informação, con-ceitos, ideia, adquirem significados para oaprendiz por meio de ligação a aspectos rele-

vantes já existentes na estrutura cognitiva, comdeterminado grau de clareza e estabilidade.

Na aprendizagem significativa, os aspectosrelevantes (conceitos, idéias) da estrutura cog-nitiva que servem de ancoradouro para a novainformação estão constantemente se modifican-do. Nesse tipo de aprendizagem há uma intera-ção entre o novo conhecimento e o já existente,e à medida que o conhecimento prévio servede base para atribuição de significados à novainformação, ele também se modifica, ou seja,vão adquirindo novos significados, se tornan-do mais diferenciados e elaborados, neste con-texto novos campos vão se formando e intera-gindo entre si modificando o conceitopré-existente. O processo é dinâmico, com oconhecimento sendo construído e a estruturacognitiva se reestruturando durante a aprendi-zagem significativa.

Segundo Lorenzato (2006), as atuais deman-das educativas requerem um ensino voltadopara a promoção do desenvolvimento da auto-nomia intelectual, criatividade e capacidade dereflexão crítica pelo educando. Para tanto, aintrodução de novos recursos baseados na con-cepção de que o educando deve ser o centro doprocesso de ensinar e aprender, reconhecendo,identificando e considerando seus conhecimen-tos prévios é fundamental para que ele possarealizar-se como cidadão em uma sociedade emconstante mudança. Entendem-se como recur-sos didáticos todo material utilizado como au-xílio na aprendizagem de conteúdos. Ampliara compreensão de recursos didáticos como ob-jetos físicos, utilizados com maior ou menorfreqüência em todas as disciplinas, áreas de es-tudo ou atividades, sejam quais forem às técni-cas ou métodos empregados, visando auxiliaro educando a realizar aprendizagem mais efici-entemente, constitui-se num meio para facili-tar, incentivar ou possibilitar o processo deaprendizagem. O bom aproveitamento dos re-cursos didáticos condiciona-se a alguns fatorestais como: experiência do educador; técnicasde emprego; oportunidade de ser apresentado;uso limitado, seleção, adaptação e confecção.Uma observação a ser considerada é a relaçãoentre recurso didático e conteúdo. Alguns con-teúdos não aceitam uso de qualquer recurso ou

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qualquer recurso pode ser usado em todo con-teúdo. Ao educador como mediador da açãopedagógica cabe a escolha e adequação dos re-cursos aos momentos da transposição didáticaa que se propõe.

No entanto, a aprendizagem não decorre domaterial e das atividades propostas ao educan-do, mas sim, das relações que ele estabelece nonível de pensamento entre significados e con-ceitos. Assim o material representa apenas umaestratégia para promover a reflexão sobre al-guns aspectos de um determinado conceito quese quer desenvolver.

3 O PAPEL DO EDUCADOR NO PROCES-SO DE APRENDIZAGEM EM UMAABORDAGEM INTERDISCIPLINAR

Uma constante preocupação em relação aodesenvolvimento de atividades em sala de aulaé a interação entre os educandos, bem como ainteração dos mesmos com o educador. Assimo trabalho em grupo deve ser considerado comofator fundamental nas relações entre as intera-ções sociais e o desenvolvimento cognitivo,através de apropriação do conteúdo e das rela-ções que se estabelece ao longo do processo.Conforme Vygotsky (1989) a prática docenteinterdisciplinar exige do educador e do edu-cando novas competências e habilidades. Por-tanto, no cotidiário acadêmico, há que se des-pir das relações verticais tão visíveis naspráticas pedagógicas acadêmicas e trabalhar nahorizontalidade, desenvolvendo a parceria en-tre educador-saberes-educando a partir dialo-gicidade, como possibilidade de escuta, parti-lha, construção e reconstrução de saberes, numespaço que não há preponderância de um sabermais sobre um saber menos, mas uma comu-nhão de saberes, que num movimento de cir-cularidade se completam e reedescobrem comoum autor da história que se faz e refaz. É umanova postura para o educador e o educando.

Aumenta-se a responsabilidade do pro-fessor que, pois além do conhecimentode sua disciplina deve ser facilitador daaprendizagem dos estudantes e organi-

zador das atividades na sala de aula. (EN-RICONE (Org), 2001, p. 51)

Trabalhar de forma interdisciplinar propor-ciona ao educador e educando se perceberemno processo, de desenvolverem sua autoria eperceberem-se como seres participantes, inclu-ídos nas vivências pedagógicas e pessoais. Sãomúltiplas as oportunidades de crescimento pes-soal, cognitivo, emocional e profissional que aatividade interdisciplinar oferece. Portanto, elarequer dos incluídos no processo coragem eaceitação do novo, em especial do educadorque se propõe a vivenciá-la.

atitude interdisciplinar requer uma mu-dança conceitual no pensamento e naprática docente, pois seus alunos não con-seguirão pensar interdisciplinarmente seo professor lhes oferecer um saber frag-mentado e descontextualizado. (LIBÂ-NEO, 2002, p, 34).

O educador que adota a interdisciplinari-dade em sua prática pedagógica, precisa sabertrabalhar a inclusão de si mesmo e dos demaiseducadores e educandos no processo de desen-volvimento das ações planejadas. É um exercí-cio de escuta, acolhimento, reflexão sobre suaprática, auto-conhecimento, valorização dooutro, oportunidade para a revelação de inteli-gências escondidas dos educandos, e outras inú-meras ações briófilas que podem acontecerneste movimento interdisciplinar.

É interessante perceber que na atividadeinterdisciplinar, não se sente a necessidade deaplicação de provas para notar-se a aprendiza-gem, ela se revela nitidamente no processo es-colar pedagógico e o mais importante incorpo-ra a relação teoria e prática nas vivências decada um.

4 CONCLUSÃO

A interação promovida pela prática peda-gógica interdisciplinar provoca um aumentode aprendizagem devido às trocas de pontos devista e da elaboração verbal, assim como, in-centiva os acadêmicos na busca de diferentes

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interpretações da situação, o que favorece umengajamento cada vez maior na estrutura daatividade. Outro aspecto importante das ativi-dades interdisciplinares é promover o desen-volvimento da linguagem que ajuda a organi-zação e a estruturação do pensamento,auxiliando o acadêmico em sua reflexão quan-do elabora explicações ou ainda, permitindo areconceitualização de suas construções cogni-tivas. Nesse trabalho, partiu-se do pressupostode que habilidades na área das ciências, histó-ria e geografia bem como matemática, desen-volvem-se juntas conforme os acadêmicos es-crevem, lêem e discutem sobre as diversasidéias exploradas. De outra forma, pode-se di-zer que o desenvolvimento da comunicaçãoauxilia o estabelecimento de conexões entre asdiversas formas de representação, tais como,gráficas, físicas, pictóricas e verbais.

Com esta visão, enfatizou-se o desenvolvi-mento de atividades em grupo nos estudos dosPCN´s, na confecção de painéis ilustrados, quemotivou a adequação da linguagem, tendo nasimagens a leitura do que norteia estes docu-mentos. No Fórum virtual, a interação e expo-sição das opiniões, síntese do estudo, postadona rede mundial, mobilizou os acadêmicos namelhoria das produções e nos comentários so-bre o conteúdo estudado. Na elaboração de pla-no de aula, os acadêmicos encontraram difi-culdades para atender as necessidades dos itensfundamentais ao plano de aula, visto que amaioria admite utilizarem as sugestões dos li-vros, sem considerarem as necessidades de aten-derem as sequencias didáticas.

A grande mobilização ocorreu em torno daconfecção de recursos com material alternati-vo, pois os participantes não entendiam a im-portância do recurso ser previamente planeja-do, ligando-o ao conteúdo e ao objetivo deaprendizagem. Ao construir este planejamen-to, os mesmos dimensionaram a importânciadas ações de análise e seleção dos recursos, omomento de uso e a finalidade. Foi de sumaimportância essa vivência para acadêmicos eprofessores.

Desta forma, a partir deste projeto didáticointerdisciplinar visualizou-se a docência comopossibilidade de mediação do conhecimento,

construção e reconstrução de saberes dos aca-dêmicos, quando se escuta dos mesmos que oestudo interdisciplinar possibilitou-lhes a liber-dade de construção do aprendizado, promoven-do o despertar da criatividade a partir da escutada opinião do outro nos trabalhos em grupo,onde não foi cansativo o processo de aprender,sentindo-se o empenho de todos e vivencian-do-se o aprender a aprender.

REFERÊNCIAS

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DELIZOICOV, Demétrio (Org). Ensino deciência: fundamentos e métodos. São Paulo:Cortez, 2002.

ENRICONE, Délcia (Org). Ser professor. 2 ed.Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. (Org.).Práticas Interdisciplinares na Escola. 8. ed. SãoPaulo: Cortez, 2001.

LIBÂNEO, José Carlos. Adeus professor, adeusprofessora? Novas exigências educacionais eprofissão docente. 6 ed. São Paulo: Cortez,2002.

LORENZATO, S. org. O laboratório de ensinoda Matemática na formação de professores.Campinas-SP: Autores Associados, 2006.

MOREIRA, M. A.; MASINI, E. F. S.Aprendizagem significativa: a teoria de DavidAusubel. São Paulo: Moraes, 1982.

PHERRENOUD, Philippe. Novas competênciaspara ensinar. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,2000.

VYGOTSKY, L.S – Pensamento e Linguagem.São Paulo: Martins Fontes,1989.

ZUNINO, D. L. A matemática na escola: Aquie agora. Porto Alegre: Artes médicas,1995.

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PRÁTICA DE ENSINO DA LEITURA NOPRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Lyvia Mayra Ferreira de Melo1

RESUMO

Este trabalho centra-se nas práticas de leitura dos professores de primeiro ano do EnsinoFundamental. Para fundamentá-lo pesquisou-se Lemle, Carvalho, Cunha, Martins e outros. Tevecomo métodos o quanti-qualitativo e o dialético. Realizou-se pesquisa bibliográfica para melhorentendimento do ensino da leitura. Buscou-se como objetivo principal a reflexão sobre a práticade leitura do professor de primeiro ano do Ensino Fundamental, vendo o que poderia melhorarpara ensinar ao aluno uma leitura pautada no letramento, sentido e compreensão.

Palavras-chave: Prática. Ensino. Leitura. Criança. Professor.

ABSTRACT

This work focuses on an reading practices of the teachers from first ages of Elementary School.For substantiating, it was searched Lemle, Carvalho, Cunha, Martins and others. It was as methodsthe qualitative and quantities and dialectical method. It was realize a bibliographic research tobetter understands the reading´s teacher. It was attempted as main goal the reflexion about readingpractice of the teacher of the first ages of Elementary School, seeing as it teaches, what couldimprove to teach the student a reading based on literacy, meaning and understanding.

Keywords: Practice. Teach. Reading. Child. Teacher.

1 Especializanda em Metodologia do Ensino Superior pelo Instituto Norte e Nordeste de EducaçãoSuperior e Pós-Graduação (Inespo); Graduada em Letras com habilitação em Português e Inglês pelaUniversidade Estadual do Maranhão (UEMA), Graduanda do 7.° Período de Pedagogia da Univer-sidade Federal do Maranhão (UFMA).

1 INTRODUÇÃO

O ensino da leitura está caminhando para asua consolidação através das praticas de letra-mento, em perspectivas contextualizadas. Per-passou desde as práticas mais tradicionais e re-duzidas aos membros da Igreja Católica até osdias atuais, onde o tradicionalismo pelo menoscomeça a dividir espaços com as práticas maisrenovadas.

Pensar as práticas de leitura no primeiro

ano do Ensino Fundamental pode mostrar aspossibilidades de ensino da mesma, mesmo semgrandes recursos. Trabalhar a necessidade de oprofessor refletir a sua prática, escolher bem oseu material é essencial, pois dele dependerágrande parte do seu ensino, princi­palmente nafalta de outros recursos. Há certa falta de refle-xão no que as crianças da Educação Infantil edo Primeiro Ano do Ensino Fundamental fa-zem. Músicas Infantis demoram a ser aprendi-das, por vezes as crianças não respondem com

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sentido ao que lhes é perguntado.Foi-se em busca da investigação do proble-

ma: Quais as práticas melhorariam o ensinoda leitura, fazendo com que ela fosse não me-ramente uma decodificação de símbolos gráfi-cos, mas sim algo que abrisse realmente a mentee o imaginário das crianças de primeiro ano doEnsino Fundamental, visando desde essas sé-ries, o sentido e não somente a decodificação?E foi em resposta a este questionamento quesurgiu este artigo.

2 LEITURA

O que é ler? O que seria essa atividade tãofundamental na vida dos estudantes? SegundoFerreira (2007, p. 512):

1. É percorrer com a vista (o que está es-crito), proferindo ou não as palavras, masconhecendo-as (e interpretando-as). 2.Ver e estudar (coisa escrita). 3. Decifrar einter­pretar o sentido de. 4. Perceber (si-nais, mensagens). 5. Adivinhar. 6. Captarsignos ou sinais registrados em (um su-porte para recuperar as informações porele decodificadas).

Tudo isso está etimologicamente definin-do o ato de ler e já começa a explicitar, qualseu significado. É sim passar a vista, mas tam-bém conhecer e interpretar a palavra, não bas-ta só identificar, decodificar para se concreti-zar a leitura. É visível que quase todos ossignificados dados pelo dicionário estão nonível do sentido, exemplo disso são: o signifi-cado 1, que fala do conhecimento das pala-vras, da interpretação, o significado de núme-ro 3, de decifrar e interpretar o sentido, comotambém é no 4, perceber (sinais e mensagem).Esta de fato é uma leitura bem sucedida e de-fendida por diversos autores.

Em Cagliari (1996, p. 148) encontramosque a “leitura é algo tão importante que superaa escrita e é descrita como herança maior quequalquer diploma”. Claro que o autor tambémconcorda que afim de que a leitura funcione,deve haver a decodificação, porém, depois vemo entendimento da linguagem encontrada, a

decodificação de todas as implicações que otexto tem, então o indivíduo reflete e extrai oseu conhecimento, a sua opinião acerca do queleu. Somente dessa forma a leitura não estaráfadada ao fracasso segundo o autor.

Já para Freire (apud MARTINS, 2007,p.10) a “leitura de mundo precede a leitura dapalavra e a leitura desta precede a leitura da-quele”. Então presume-se que a criança co-nheça um pouco do assunto antes de chegar àescola, basta percebermos que a maioria delas,ao ver slogans como o da Coca-Cola já reco-nhecem do que se trata, caracterizando umaforma de ler.

Pensar este tema é algo complexo: é deco-dificar sinais, é entender mensagem, interpre-tar, compreender, ou seja, não é simples, mastão importante e significante, que muda e trans-forma a vida dos indivíduos que a dominam.

3 PRÁTICAS DE LEITURA NO PRIMEI-RO ANO DO ENSINO FUNDAMENTALSEGUNDO ALGUNS AUTORES

O 1º ano do Ensino Fundamental é a sérieem que mais se castiga com relação à leitura,pois é a que se denominava antes por Alfabeti-zação, a famosa série em que a letra “b” mais aletra “a” formam a silaba “ba”, da soletração,das cópias do quadro, das associações quantoao conhecimento. É bastante polêmica no sen-tido de promover os professores a bons alfabe-tizadores caso tenham ensinado seu alunos adecodificarem letras, ou maus alfabetizadorescaso o nível da turma quanto à leitura seja con-siderado fraco.

E o que realmente funciona? Quais as me-lhores práticas? O que devo fazer para que oindivíduo que eu ensino a ler seja promovidoda minha sala lendo? Como lidar com o altonúmero de alunos que enfrentam as escolas deum modo geral? São dos questionamentos dosanteriormente denominados alfabetizadores. Epode-se questionar mais: A eficiência do ensi-no da leitura está na questão dos métodos?

Existem amparos para os professores alfa-betizadores, conforme já foi mencionado ante-riormente, tem-se como importante ferramen-ta os Parâmetros Curriculares Nacionais

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(PCN´s), o qual em parte não é nem lembradopelos professores, muito menos consultado. Eleserve de ponto referencial para o ensino dessahabilidade. Não há nele um tópico restrito aoprimeiro ano, mas está tudo incluído nos obje-tivos, normas e valores esperados para o ciclono qual se encontra.

O que os professores de primeiro ano doEnsino Fundamental poderiam fazer para queas crianças pudessem ser bem sucedidas no pro-cesso de aquisição da leitura? Que perguntas,questiona­mentos e suscitações poderiam serfeitas para que o momento da leitura do livroparadidático não se torne somente entreteni-mento para as crianças? São questões que nor-teariam pesquisadores da prática de ensino daleitura.

Falta às crianças muitas vezes o domínioafetivo, cognitivo e de ação, ao ler, seja estaleitura qual for, pois fazem isso tão mecanica-mente, não refletindoe então não mudam ne-nhum habito seu, ou seja, o ato da leitura nãopropicia reflexão. Entende-se ler não somentea decodificação de letras e textos, mas leiturade modo geral: a corporal, de mundo, imagens,ações, atos, assim por diante. Claro que as cri-anças do primeiro ano da Educação Fundamen-tal não serão capazes de realizar isso com per-feição e destreza, por isso a importância doprofessor para que as orientem corretamente.

O aprender e o ensinar a ler são atos encara-dos como difíceis. Levando em conta este fatoé que o ensino deve ser feito com responsabili-dade, sistemática e conscientemente. Medidascomo esta, evitam problemas de dificuldadespara a construção de sentido, leitura desviada,problemas na escrita, bem como na interpreta-ção, também na ruptura entre leitura e imagi-nação.

Para evitar transtornos, necessário é que aleitura seja ensinada de forma sistêmica, assimsupõe-se a utilização de métodos. Estes servempara a reflexão sobre variáveis que intervêmno ler, são elas: estrutura cognitiva, conheci-mentos do idioma, as estruturas afetivas, mate-rial para ler, contexto, texto, onde todas deve-rão ser devidamente observadas, tanto peloprofessor quanto pelo leitor, com a finalidadede sucesso no delicado processo de aprendiza-

gem, porém, não devem ser limitadas a eles.Figueiredo (1996) em seu livro intitulado,

“Um desafio a alfabetização: os bebês podem edevem ler”, conclui que é possível ler cedo,não só é possível como as crianças devem ini-ciar este processo de aprendizagem o quantoantes .Então o primeiro ano da Educação Fun-damental pode terminar lendo, como se tudonão passasse de uma brincadeira, sem forçá-las, sem prejudicá-las.

Glenn Doman em seus estudos fez grandesdescobertas, e estas acabaram até influencian-do estudos como o de Figueiredo. Doman co-loca que:

Não só descobriu que era possível ensi-nar a ler bem, mesmo a criança com lesãocerebral, como também constatou quequalquer criança pode aprender a ler an-tes dos cinco anos de vida. Mais ainda,que as crianças de pouca idade adoramaprender a ler, e mais tarde tendem a lermelhor e mais rapidamente que as quenão começam cedo (DOMAN, 1975, apudFIGUEIREDO, 1996, p. 2).

Baseado nos estudos de Glenn, Figueiredodesenvolveu um excelente trabalho com seusfilhos, ensinando-os a ler e escrever e assimatravés da aquisição da leitura desde muitocedo, tiveram um bom desenvolvimento inte-lectual. Todos os filhos de Eliane entraram paraa faculdade. Trabalhos como esse provam quehá possibilidades de pautado na leitura formarindivíduos bem preparados para a vida, comintelecto bem desenvolvido.

Ainda segundo Figueiredo (1996) é possí-vel recorrer a estratégias e procedimentos quefavorecem o desenvolvimento da leitura de umindivíduo desde bem cedo, e ao mesmo tempo,permitir o domínio de vasta gama de conheci-mentos pelas crianças.

Este processo não é simples, pois não é ofato de existirem letras que caracteriza a leitu-ra, principalmente para as crianças. De início,elas nem mesmo conseguem ler sinais gráficosde pontuação, confundem números, letras e si-nais. Há certa dificuldade em saber que quanti-dade correta de letras são necessárias para ha-ver ou caracterizar uma palavra.

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As relações de códigos escritos para as cri-anças são complicadas, a associação que fazementre desenho e palavra são errôneas, passampelo ensaio-erro, ensaio-erro até que consigamacertar as associações e de fato realizarem aleitura. Têm que aprender a não só reconhecerletras, mas saber nomeá-las, o que caracterizauma dificuldade. O outro obstáculo é ter a no-ção espacial da palavra.

Do ponto de vista de Ferreiro e Teberosky(1985), o problema da aprendizagem da leituraestá se resumindo a uma questão de métodos,põe-se a culpa nestes. Assim as autorasorga­nizam os métodos em dois tipos que con-sideram fundamentais: os sintéticos e os analí-ticos. Métodos ajudam, mas devem ser associ-ados a estratégias espontâneas do professor paraque essa leitura deixe de ser menos mecânica.Vale ressaltar que cada turma é uma turma eserá necessário, de acordo com o andamento,adaptações a fim de obter resultados satisfató-rios.

No intuito de entender os métodos é neces-sário conhecê-los. O tradicional trata-se do quese utiliza das cartilhas de bê-a-ba, ou tambémdos métodos sintéticos, isso porque passa pelaapren­dizagem das letras à produção de sila-bas, depois palavras, até chegarem às frases. Émuito criticado por visar unicamente a leituraoral e formar leitores que não têm capacidadede encontrar os sentidos nos textos. Os analíti-cos tratam da aprendizagem passando do todopara as partes, mas também não primar pelosentido. Têm ainda os que utilizam a misturadestes dois.

Eles servem para refletirmos sobre as vari-áveis que interferem na aprendizagem da leitu-ra, são elas: estrutura cognitiva, os conhecimen-tos sobre o idioma, estruturas afetivas, materialpara ler, contexto, todas devem ser devidamenteobservadas, tanto pelo professor quanto peloleitor, com a finalidade de obtenção de sucessono delicado processo de aprendizagem.

Em concordância com Cagliari (1996, p.168) quando diz que “uma criança pode come-çar a ler ouvindo histórias, aprendendo a deci-frar os sons das letras em diversos contextos, ese pôr a ler pequenos textos de cujo conteúdo jáconhece, como canções, provér­bios, adivinha-

ções” e, ainda, agora não mais nas palavras doautor, o seu nome, onde pode reconhecer le-tras, começando pela primeira.

Temos que ter cuidado para que os alunosnão se frustrem por falta de material de leiturae sempre fornecer esse subsídio de forma pra-zerosa, como brincadeira, na informalidade.

Tendo em vista a informalidade proposta,fundamental é, fornecer gravuras bem agradá-veis e chamativas. Cunha (2004), deixa claroem sua obra ser importantes que os livros se-jam de gravuras e de preferência colocados den-tre os brinquedos, caracterizando um objeto deprazer para a criança.

Não é tarefa simples, muitos pedagogos,professores de séries iniciais evitam essa sériepor ser uma grande responsabilidade ensinar aleitura, por ser onde esta é mais cobrada. Deve-se ter cuidado com a pronúncia das palavras,pronunciá-las claramente, pois inicialmente háuma confusão quanto a posição espacial daspalavras, entre as formas de algumas letras.Podemos ver isso na obra de Lemle (2005, p.8):

As letras, para quem ainda não se alfabe-tizou, são risquinhos pretos na páginabranca. O aprendiz precisa ser capaz deentender que cada um daqueles risqui-nhos vale como símbolo de um som dafala. Assim sendo, o aprendiz deve poderdiscriminar as formas das letras. As letrasdo nosso alfabeto tem formas bem seme-lhantes, e por isso a capacidade de distin-gui-las exige refinamento na percepção.

É fácil perceber que para a autora a leiturapassa por todo um processo que vai desde oreconhecimento das letras até a decodificaçãoda palavra, envolve a percepção. As letras paraquem não as conhece não fazem o menor senti-do, por isso que ao tentarem, inicialmente, es-crever, reproduzem o que para estas caracteri-zar-se-iam como elas, representando-as comriscos, rabis­cos, bolinhas, sendo esta a simbo-logia do entendimento delas de letra.

A fim de que as crianças aprendam a ler aspalavras, estas precisam entender o sentido dotermo palavra. Porém, não ficaria interessante,não é o que se quer mostrar com esse trabalho,uma leitura que começa das letras e vai lenta-

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mente, tradicionalmente caminhando para che-gar ao texto. Fica bem mais proveitoso e inte-ressante no mesmo período em que o professortrabalha as le­tras, ele ir contando histórias emostrando que são aquelas letras em conjuntoque fazem sentido e passam uma mensagem.

Nessa perspectiva o aluno aprende muitomais, à medida que ele se envolve com umahistória bem contada e pode ser sutilmentequestionado, relacionando aquilo que está sen-do contado com algo do mundo real.

Na fase ainda do primeiro ano, tudo deveser associado a imagens, isso deve ir sendo re-tirado aos poucos, pelo fato de o ser que estáem processo de aprendizagem da leitura aindanão ser, muitas vezes, capaz de abstrair a partirdo sentido somente da palavra. Lemle (2005)nos mostra em sua obra, haver algumas coisascom que o professor deve ter cuidado, porexemplo: com a falta de capacidade de identi-ficar as fronteiras das palavras, a organizaçãoda página, por esse fato, desde bem cedo paraessa adaptação, se possível, o aluno deve serlevado do contato com o livro para o textocomo um todo, com fins que a aprendizagemocorra de forma mais natural possível.

Entra, então, em ação a questão das capaci-dades e saberes básicos para o ensino da leitu-ra, e onde há mais subsídios para se aprenderestes saberes é na escola,. Lemle nos dá umaidéia atra­vés de textos do seu livro “Guia teó-rico do alfabetizador”:

Os cinco conhecimentos básicos para aleitura e escrita que acabamos de identifi-car podem ser atingidos espontaneamen-te pelas crianças. Mas podem, também,serem estimulados a eclodir para que oalfabetizando esteja preparado para o ar-ranque.As crianças que fazem a pré-escola rece-bem esse preparo. A familiaridade compapel e lápis, massinhas e brinquedos deencaixe, quebra cabeças, canções, narrati-vas, jogos ajudam a preparar a criança paraos saberes e as tarefas envolvidas na alfa-betização (LEMLE, 2005, p.13).

O interessante, e até mesmo o diferencialde Lemle é que ela sabe que escolas particula-res e públicas não estão em pé de igualdade,

então dá dicas de como desenvolver essas capa-cidades visando à modificação da situação. Su-gestões ao profissional de escola pública ensi-nando a melhorar a prática com metodologiadiferente e poucos recursos.

Quando o problema é, por exemplo, a ideiade símbolo, sugere que o professor leve objetosda sua casa que representem símbolos, coisasda vida real para exemplificar. Se o problemafor discriminação das letras, ajuda a elaboraçãode atividades que trabalhem as formas, comocírculos, traços, cruzes. Quando o problema éa discriminação dos sons da fala, a sugestão écriar listas de palavras que começam com omesmo som, de palavras que rimam. Para per-ceber o significado da unidade palavra é só falaro nome dos objetos que estão à vista. Por fim,um modo de exercitar a dificuldade de enten-der a organização da página é brincar de ler,deixando o leitor se sentir o contador da histó-ria.

Carvalho (2007) diz que “o primeiro conta-to com a leitura é quando se deixa a criançaexplorar o material, deixar ter um contato”. Éaté mesmo uma forma do professor mostrar aoalfabeti­zando a organização da página, umamaneira do aluno desenvolver, por que não di-zer, a afetividade pela leitura, seus sentidos, deforma despretensiosa, tranquila, sem pressão erepressão.

A leitura feita pela professora, tem funda-mental importância nessa época, porque vaiinfluenciar, e bastante, no prazer que esta vaisentir por essa habilidade prevista até mesmono Parâmetros Curriculares Nacionais, à me-dida em que as crianças se encantam e vão elasmesmas em busca desse conhecimento, dessaprática. É nesse momento em que há a leituraem voz alta que o professor pode suscitar refle-xões aos alunos e ao nível deles, vai se traba-lhando os sentidos, não só as formas.

É aconselhável mostrar a leitura não comouma coisa distante, mas sim algo do dia-a-dia,bem presente, e que é necessária para a vidacontemporânea. Uma boa parte das pessoas seinteressa bem mais por aquilo que tem um sig-nificado real, concreto. Nesse ponto, Carvalho(2007, p. 18) sugere “que a turma dê um pas-seio pela escola e olhem tudo que lá esteja escri-

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to e em diferentes lugares tentando adivinhar”.O mundo é feito de palavras, já dizia Freire

(1992, p. 19) que a “leitura de mundo precedea leitura da palavra”, e mesmo a criança nãoencontrando letras em seu mundo, mesmo as-sim ela poderá ler. A autora em questão sugereainda que “o aluno entre em contato com di-versos materiais identificando neles as letras eos números”.

De forma natural, tudo deve levar a crian-ça à leitura, ela deve ansiar por isso. Como umjogo, deve ser estimulada sempre. De váriasmaneiras pode ir sendo exercitada de maneirasutil, na organização dos nomes da turma emum quadro esquemático segundo sugere Car-valho (2007), podem perceber esse mundo daescrita em casa, trazendo de casa o que pude-rem ler.

O Livro Guia Prático do Alfabetizador, dátotal importância e subsidia o momento da lei-tura a qual deve ser prazerosa, ter seu lugar, asposturas corretas, como a formação das rodasde leitura, o adequado tom de voz e clareza daprofessora, transmitir leveza a esse momento,mas que já devem ser introduzidos questiona-mentos, esperando que levem ao aluno a pen-sar neste caso, algo de diferente do habitual jádeve ser chamado para sua atenção, emboraainda no primeiro ano do Ensino Fundamen-tal.

Várias técnicas vão sendo ensinadas no de-correr do Guia, a autora transmite como levarao aluno a por a mão na massa, a criança deveser estimulada a usar a fantasia, deixá-la fluir,questionar a professora quanto a alguns aspec-tos, a história pode até ganhar novos persona-gens. Vale também, e é muito bom diversificaros gêneros dos textos e histórias para que osespectadores se acostumem com todos os tiposde histórias, vejam que há várias formas de seescrever sobre algo. Carvalho (2007, p. 28) jus-tifica estas ideias dizendo que assim “os alunosficarão preparados para saber o que podem es-perar de determinada leitura: é o primeiro pas-so para a formação de leitores críticos”.

Na escola e até mesmo em casa, é quaseobvio que não acontecerá somente leitura dehistorinhas realizada pela professora. É neces-sário que também aconteça esta de maneira di-

dática, mais lenta, pausada, mostrando as pala-vras, suas formas e letras. É hora de fazê-losperceber todos os tamanhos e formas.

A obra nas perspectivas de uma leitura quedá espaço a aprendizagem da compreensão einterpretação do que foi lido, diferencia-se dasdemais quando indica além de atividades, ououtras formas como: memorizar frases paraserem questionadas pela professora quanto aseus aspectos, conseguir identificar em textospalavras repetidas e se questionar quanto aoporque se repetem, conseguirem identificar emum texto palavras indicadas, também ensinajogos buscando assim a seriedade envolvida nodecorrer desse processo.

Existem relações na língua que por maisque se trate do sentido, que seja ensinado aoaluno a criticidade, e este é o foco deste traba-lho, não podem ser deixadas de lado, sendo aíonde entram as atividades com os jogos a fazeresse dever de ensinar com sutileza e leveza, naesperança que ao alfabetizando seja agradávelir para a escola aprender a ler, assim, estaráaprendendo sem nem sentir que está:

Em geral é o significado que se impõe aoouvinte, na comunicação da vida cotidia-na. No entanto para aprender a ler e es-crever, é preciso estar atento também paraa forma, para os aspectos sonoros daspalavras, visto que na escrita os sons éque são representados por letras (CAR-VALHO, 2007, p. 30).

Figueiredo (1996) brincou com seus bebêscom as palavras papai e mamãe, sempre as reti-rando antes que perdessem o interesse pelaspalavras, pois aquilo era um jogo. Claro que elatodos os dias mostrava separadamente a pala-vra mamãe rapidamente antes que a filha per-desse o interesse, até que ela o perdeu por essapalavra, indicando que já tinha se cansado, poistinha a assimilado. Posteriormente fez o mes-mo com a palavra papai, até repetir-se a mesmaresposta da filha. Podendo então finalmentefazer o joguinho, através da forma, perguntan-do entre as palavras mamãe.

Assim também é viável realizar essa ativi-dade trabalhando a forma das palavras, a capa-cidade de reconhecimento delas através de suas

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estruturas e da noção espacial através de fichasonde elas estarão escritas, livremente. Mostrartambém frases que mostrem aos alunos a ocor-rência de palavras com mais de um significado,as mais diferentes. Como sugestão Carvalho(2007), sugere adivinhas como:

– A asa do bule tem penas?– O pé da mesa usa meia?– A casa do botão tem telhado?– O que é que o pinto faz para a gentelavar as mãos?R: Pia.

Treinar o som das palavras não precisa serabandonado através do exercício com silabasorais. Não é interessante neste momento com-plicar mais as estruturas da cabeça das criançasmandando-as escrever. Ajuda nesse processo,fazer brincadeira como “Lá vai à barquinhacarregada de..., tente adivinhar a palavra queestou pensando através das sílabas dadas, falara palavra dada omitindo a primeira silaba, des-tacar a ultima sílaba, brincar da forca, ou seja,para cada letra que os alunos errarem uma par-te do bonequinho vai para a forca, até que acriança forme a unidade significativa antes queo boneco se complete na forca ou que este sejaenforcado por causa dos erros. Tais brincadei-ras são sugeridas por Marlene Carvalho (2007),no capítulo “Com a mão na massa”: sugestãode atividades para familiarização com o siste-ma de escrita .

Entrar em contato diretamente com o textoé tarefa complicada, é dificultosa para quemestá aprendendo, sendo alfabetizado. Em diá-logo com a parte II, Metodologias de Alfabeti-zação, do livro Guia Prático do Alfabetizador,qualquer professor poderia concordar com aautora quando diz que “desde as etapas iniciaisda alfabetização, a principal preocupação doleitor deve ser a busca do significado” (CAR-VALHO, 2007, p. 39), mas logo vem a dúvida:Como fazer isso? Os professores diversas ve-zes entram em desespero, pois o ano vai termi-nando e os alunos não dominam a leitura.

A começar, o gosto por ler não é algo que sedesenvolve de uma hora para outra, ou da noi-te para o dia, é necessário um caminho a setrilhar, nestes termos a escola muito contribui

à medida que mais sistematicamente através daEducação Infantil tem propiciado esse contatoinicial, por mínimo que seja, mas que já temajudado no 1.º ano do Ensino Fundamental.

São válidos os métodos que começam damenor unidade da língua e vão até as maiores epodem estar presente no ensino, mas devemapenas estar presentes, auxiliando, pois umaleitura contextualizada, prazerosa, dará muitomais resultados que pedaços de uma colcha deretalhos, onde até fazerem sentido, já se levoumuito tempo, e podem nem ter a mesma eficá-cia.

O Primeiro Ano é muito importante paraas crianças porque é quando elas vão sistemati-zar o processo de aprendizagem da leitura, epara muitos o primeiro contato com a escola.Nesse período então as mesmas vão percebermelhor que a leitura está no mundo da Escrita,e dela terem mais intimidade. O método globalentra em vantagem em relação ao outro, o sila-bado, quando impulsiona mais a criança a con-tinuar aprendendo pela impressão de que vaidominar a leitura mais rápido à medida que jáestá trabalhando textos, sendo para ela um gran-de avanço.

O professor deve esperar que alguns alunosse desesperem se eles não souberem fazer esselidar com o texto uma coisa natural, compassa-da, lendo e mostrando as palavras, mostrandoao aluno o que está na exterioridade como ima-gens que ilustram, perguntando de que ele tra-ta, começando as inferências.

Investigar os gêneros favoritos, utilizarcomo válido todos os elementos que estão e atémesmo os que não constam, mas que já podemser utilizados, dar subsídios para que as crian-ças consigam descobrir o gênero, não podemescapar aos olhos, letras, pontuação, título,imagens, tudo deve ser questionado. Saindoassim da leitura superficial decodificada.

Depois de feita a leitura inicial, o reconheci-mento, é hora de decompor o texto em frases,objetivando que o alfabetizando entenda queaquele texto é formado por unidades menores,partindo também do todo para as partes. Quan-do os indivíduos aprendem a fala eles convivemcom um contexto exposto a todos os diálogos,ele vai escutando, observando e logo dispara afalar, por que não pode ser assim com a leitura.

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Nesta de decomposição do texto, Carvalho(2007, p. 43-44) sugere as seguintes ativida-des:

a) Escrever as frases em tiras de papel oucartolina. Pedir ao aluno que arrume naordem em que aparece no texto;b) Alterar a ordem das frases e levar aturma a verificar o que acontece;c) Dizer uma frase em voz alta e pedir aoaluno que encontre a tira correspondente;d) Esconder uma das tiras e pedir ao alu-no que descubra a frase que está faltando;e) Deixar os alunos trabalharem em gru-po com as tiras, criando suas próprias ati-vidades ou “tomando a leitura” uns dosoutros.

São indicados exercícios de análises das fra-ses, substituindo o sujeito, o verbo, acrescen-tando uma palavra que o modifique, alterar aordem das palavras. E assim brincar com elasentendê-las. Outro método interessante podeser trabalhar com palavras que possuem sila-bas em comum, ressaltando-as.

Depois da frase, é chegada a hora da pala-vra. A maior sugestão fica em partir de pala-vras, cuja ligação tenha a ver com o cotidianoda criança e que possuam formas diferentes.Por fim, a decomposição da palavra em síla-bas, formando outras unidades significativas,encerrando assim a aprendizagem da leituraque parte do texto até voltar à sílaba.

O PCN também trata a leitura basicamentenesta mesma expectativa deste capítulo, con-forme vimos no tópico anterior, através dosobjetivos, valores e habilidades esperadas parao primeiro ciclo do Ensino Fundamental.

4 O MATERIAL UTILIZADO NO ENSINODA LEITURA

Diversos autores já falaram do tema destetópico em suas obras, pois este possui especialimportância no dia-a-dia do ensino da leitura.Um trabalho conjunto do professor com o ma-terial é o fundamental, e este não precisa sersomente o livro. Cabe, muitas vezes, ao pro-fessor levar texto melhores em caso do seu li-

vro didático não fornecer este subsídio à medi-da que sem material não dificulta o processo.

O material é o instrumento que vai forne-cer ideias ao professor, o único recurso comque alguns profissionais contam que fornecesubsídios para leitura, principalmente os edu-cadores de escola pública, por isso se o livrodidático contemplar os melhores aspectos aju-dará bastante na alfabetização das crianças.Sabendo disso surge o questionamento: Quaisas características deveria ter? Como deve ser omaterial para propiciar não só alfabetização,mas uma leitura com sentido, crítica? Evitan-do assim o que diz o PCN (BRASIL,1998, p.56) “Os materiais feitos exclusivamente paraensinar a ler não são bons para aprender a ler:têm servido apenas para ensinar a decodificar,contribuindo para que o aluno construa umavisão empobrecida da leitura”.

É interessante que ele contemple os maisdiversos tipos de textos e que estes sejam bemaproveitados pelo professor. Cartas, poesias,poemas, e-mails, bilhetes, matérias de jornais,discursos políticos, textos somente de imagens,histórias em quadrinhos, contos, parlendas,todos os gêneros possíveis para colocar o alunoem contato com vasta gama deles possibilitan-do-os conhecê-los, assim bons leitores podemse tornar bons escritores e ainda cidadãos críti-cos, informados, os quais sabem qual seu gêne-ro favorito.

Os livros de imagem possibilitam ao alunotambém imaginar e criar a sua própria história,incentivando assim a criatividade. Quadrinhosdão à leitura um caráter mais rápido, dinâmicoe na maioria das vezes divertido, nele podendoser inseridas lições de moral, abordagens sobreos mais diversos conteúdos. Estamos no tem-po da versatilidade.

O Material deve ainda ser chamativo, en-volver jogos porque a criança de primeiro anode Ensino Fundamental ainda aprende brincan-do. Numa perspectiva bem mais interessante omaterial contemplaria também situações reaiso que envolveria muito mais e incentiva aosalunos a participarem com vontade. Frases quegerassem discussão por parte das crianças, de-vendo então pertencer a temas da idade delas.

Cagliari aborda a questão do material didá-

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tico quando diz ser a escola pública pobre nãosó na fachada, mas também em seu funciona-mento:

Os alunos pobre tem pouco contato coma leitura e a escrita antes de entrarem paraa escola. Necessitam, portanto, de livrose material escrito bem impressos. Masjustamente eles quem recebem o piormaterial: cópias de péssima qualidade deatividades mimeografadas em tipos gráfi-cos inadequados para as primeiras liçõesde escrita e leitura quando não feitas noverso de um papel já utilizado (CAGLI-ARI, 1996, p. 13).

Isso só vem confirmar que sem um materialadequado fica quase que inviável a alfabetiza-ção de crianças. As de escola pública são muitasvezes as que mais sofrem por não ter esse auxí-lio importantíssimo, não contando com os re-cursos a maior parte das vezes, nem mesmo comum lápis ou folhas para escrever. A Educaçãoacaba por funcionar de qualquer jeito.

Mesmo sendo as condições do livro favorá-veis ao desenvolvimento da leitura, espera-seque o professor não se prenda somente a ele, esempre que possível levar outros materiais, ou-tros textos além dos lá contemplados. O proces-so aqui abordado não é fácil e para tanto precisaser dinâmico, interativo e criativo, afinal mate-rial didático não é só o livro adotado pela esco-la. Inovar devolve o ânimo aos alunos.

O professor pode ainda contar como mate-rial de apoio o livro paradidático, cujo conteú-do desperta a curiosidade dos alunos para iremem busca de novas histórias. Agora então coma tecnologia mais ao alcance já é possível usaraté mesmo a internet como recurso no trato daleitura, tal atividade é interessante à medidaque dá movimento às histórias e possibilita aoaluno fazer uma viagem completa. Vários sãoos recursos que podem ser utilizados e devemsempre que possível, serem aproveitados.

Os textos abordados pelo material serãoimportantes quanto a darem abertura para queo professor elabore seus questionamentos e osrepassem para a turma a fim de desde o come-ço dar sentido à leitura, tratem de não transfor-mar essa atividade em algo com o fim em si

mesma.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ensino da leitura deve ser encarado comseriedade, não só como algo que se vai compar-tilhando série pós série. Deve ser pensado nãosomente na perspectiva da alfabetização, ouseja, da reprodução dos símbolos gráficos e sim,na perspectiva do letramento, o que significadizer que a mesma deve ser trabalhada a partirde significados, de sentido, da contextualiza-ção e da compreensão.

Hoje existem muitos recursos para se traba-lhar a leitura com as crianças, desde os mais sim-ples aos mais complexos e sofisticados. A partirmesmo de brincadeiras pode-se ensinar a ler.Claro que nas salas de aula surgirão casos à par-te, cabendo ao professor comprometido e leitor,procurar em autores ou mesmo na sabedoria deprofessoras mais experientes, outros meios dese ensinar, nunca deixando de procurar encon-trar novos métodos, técnicas e de ser criativo.

Para maior reflexão acerca do tema, suge-re-se leituras de livros que falam de uma pers-pectiva do letramento e alfabetização linguísti-ca tais como: Cagliari, “Alfabetização eLinguística, Guia Prático do Alfabetizador deCarvalho e Guia Teórico do Alfabetizador deLemle”. Obras que ensinam, dão dicas demétodos, jogos, e atividades que também exer-citam a compreensão, o sentido e o olhar críti-co do leitor. Fazem também o professor refle-tir no ensino da leitura.

Assim, foram apresentadas algumas formasde se trabalhar este tema, como uma sugestão,procurando dar mais fontes de pesquisa aosprofessores que atuam nesta área e convidan-do-os a uma reflexão sobre o seu ensino.

REFERÊNCIAIS

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais deLíngua Portuguesa do Ensino Fundamental. 134p. 1998. Disponível em: <HTTP://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livros02.pdf.Acesso em: 2 de Março de 2011.

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CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização eLínguística. 9. ed. São Paulo: Editora ScipioneLTd., 1996.

CARVALHO, Marlene. Guia Prático doAlfabetizador. 5. ed. São Paulo: Ática, 2007.CUNHA, Nylse Helena Silva. Brinquedo,linguagem e alfabetização. Ed. Vozes.Petrópolis, 2004.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.Dicionário Aurélio de Língua Portuguesa. SãoPaulo: Positivo, 2007.

FIGUEIREDO, Eliane Leão. Um Desafio àAlfabetização: os bebês

podem e devem ler. 3 Ed. São Paulo: Pioneira,1996.

FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler.São Paulo: Cortez, 1992.

LEMLE, Mirian. Guia Teórico doAlfabetizador. 16 Ed. São Paulo: Ática, 2005.

MARTINS, Maria Helena. O que é Leitura.19 Ed. São Paulo:Brasiliense, 2007.

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REMEXENDO UM BAÚ PEDAGÓGICO: CONTOS DACAROCHINHA, VELHOS COSTUMES, OUTROS OLHARES,

NOVAS HISTÓRIAS...

Maria Tereza Bom-Fim Pereira1

1 Doutora em Educação Brasileira (núcleo: Desenvolvimento, Linguagem e Educação da criança) pela Universi-dade Federal do Ceará – UFC. Mestre em Educação pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/SP. Éautora da obra: O livro-de-imagem: um (pre)texto para contar histórias, considerada Altamente Recomendável (nacategoria Teórico) pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil em 2001. É professora adjunta III doCentro de Ciências Sócias, Saúde e Tecnologia – UFMA. Imperatriz - MA.

2 Em 1996 – Destaque do Ano do Grupo Balaio/Autor Revelação; Em 1998 – Troféu COELCE/ V FestivalNordestino de Teatro em Guaramiranga, Circo Tupiniquim; Destaque do Ano do Grupo Balaio/EspetáculoInfantil. Circo Tupiniquim. E ainda foi Destaque do Ano do Grupo Balaio/Cenário. Circo Tupiniquim, CarlosCésar e Mauro Soh.

3 Formado em Comunicação Social e Arte Dramática pela Universidade Federal do Ceará –UFC

RESUMO

O presente artigo faz uma incursão pelo texto: Detestinha, o bicho que detesta ler. O propósito maioré chamar a atenção do leitor para as inúmeras possibilidades de leitura que o texto oferece.Reflexões que contornam o percurso intertextual para ir além do conteúdo. É a intertextualidadesurgindo no/do cruzamento de textos que se apresentam sob diversas formas de linguagem. Ler,no plano da expressão.

Palavras-chave: Leitura. Texto literário. Intertextualidade. Formação do leitor. Dialogismo.

ABSTRACT

The present article takes an incursion through the text: “Detestinha”, the beast that did not likereading. The major purpose is to draw the attention of the reader to the number of readingpossibilities that the text offers. Reflections that surround the intertextual course upon to gobeyond the content. It’s the Intertextuality emerging in/from intersection of texts which presentthemselves in different language forms. Read the plan of the expression.

Key words: Reading. Literary text. Intertextuality. Reader’s development. Dialogism.

1 INTRODUÇÃO

Antes de adentrar o essencial deste estudo,convém apresentar uma síntese ou pelo menosuma possível leitura do texto-objeto: Detesti-nha – o bicho que detesta ler 2. O autor, DemitriTúlio3 remexe o baú dos clássicos contos defada e mistura a boneca falante - Emília, deMonteiro Lobato à Branca de Neve, Chapeuzi-nho Vermelho, Gata Borralheira, Pinóquio e a

outros personagens, velhos conhecidos.Esse premiado texto teatral tem um tom de

fábula das histórias infantis e o potencial paracativar plateias de todas as idades. Detestinhapode ser comparado a uma traça gigante quecome livros. Quando ele acorda de seu sonosecular liberta-se de um baú do arco-da-velha epersonagens como Chapeuzinho Vermelho eBranca de Neve mergulham num desvario. Éque os Contos de Fada começam a desaparecer

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e Detestinha em sua fúria devoradora de livrosresolve “se meter também nas tramas das his-tórias”.

Por incrível que pareça, Detestinha é umvilão cativante: engraçado, espirituoso, inteli-gente etc., e assim consegue a simpatia de to-dos. Detestinha rejeita a mesmice, a aceitaçãopassiva, ingênua etc. É possível que a atitudede Detestinha sirva de alerta aos leitores que seaventurarem a fazer uma visita aos contos tra-dicionais, para que tenham uma chance de, re-lendo-os, alterá-los literalmente.

“HOJE TEM ESPETÁCULO?TEM SIM, SENHOR!”

Um palhaço que é, além de jornaleiro, con-tador de histórias entra em cena passando pelaplateia afoito, ligeiro, trazendo nas mãos ummonte de jornais, ele anuncia: “Extra! Extra!Saiba como dona Baratinha ficou viúva na hora docasamento e nunca mais saiu do caritó”. “Descu-bra como a Gata Borralheira transformou-se numaprincesa chata e dondoca”. “Quem roeu a roupa doRei de Roma? Teria sido Nero, o imperador? Ra-nulfo, o rato roedor ou o porquiinho Rabicó?”

E continua, animando e envolvendo a pla-teia: “Ou foi esse menino que tem nariz de pepi-no?” É assim que a história vai se desenrolan-do... Por meio da ironia, do deboche, o autorvai transgredindo a ordem, a harmonia silenci-osa e ingênua. Em Detestinha, o bicho que detestaler, Demitri Túlio faz uma referência à gula deEmília, a boneca falante que usou de astúciapara inventar o livro comestível com váriossabores para agradar aos diversos leitores. EmReforma da Natureza de Monteiro Lobato, naspalavras de Emília: “Seríamos todos assim: unsfamintos barrigudos devoradores de livros”.

Neste artigo, pretendo socializar uma ativi-dade extraclasse3 bastante significativa e prin-cipalmente na releitura do texto teatral – Detes-tinha, o bicho que detesta ler, destacar a presençado intertexto nessa obra de Demitri Túlio.

Detestinha lembra muito os conselhos daavó: Minha vovozinha sempre dizia: “Detesti-nha, quem estuda demais neste país, ou morrepobre, ou vai parar num hospício”. Noutromomento ele reforça: “Bem que minha vovo-

zinha sempre dizia: Detestinha, meu netinho,quando for comer algum clássico nunca comaaqueles que tenham lobos ou anões: a digestãoé sempre complicada!”

E assim, Detestinha vai devorando os li-vros no lanche, no almoço e no jantar. Ele ga-rante: “Em breve não sobrará letra sobre letra,página sobre página, livro sobre livro... Essashistórias bestas, contadas para boi dormir, mi-olo de pote, não existirão mais.”

Entra em cena, saindo da estante de livros,a Chapeuzinho Vermelho cantando a velha can-ção: “Pela estrada a fora eu vou bem sozinha...”Há mais de quatro horas, a menina diz estar nafloresta. Cansada e quase rouca, ela reclama afalta do lobo, do caçador e chora por não reen-contrar a casa da vovó. Quem aparece é Brancade Neve chamando pelos anões. As duas cho-ram enquanto discutem a ausência dos perso-nagens de suas histórias e não percebem queDetestinha se aproxima. Ele diz para a plateia:“As histórias que me fizeram mal. Eis a causada dor de barriga terrível, quase que me aca-bo”... Ele se disfarça de vovozinha e tenta atra-ir a atenção de Chapeuzinho. O diálogo é com-pletamente diferente do original. Vejamos:

Detestinha deita-se numa cama improvi-sada e chama por Chapeuzinho.

— “Quem baate sem ordem minhaa?”— “Vovó... Vovozinha!?”— “Não, é a bruxa do 71!— “É ela mesma. Minha história está vol-

tando ao normal”.A conversa continua, com gestos grossei-

ros e muitos palavrões:— Que fedor horrível é esse? Vovozinha,

faz quantos meses que a senhora não toma ba-nho nem escova os dentes?

— Ah, Chapeuzinho! A minha aposentado-ria não dá pra nada, é uma miséria, uma mixa-ria. Desde a semana passada cortaram a água,um cachorro doido caiu no cacimbão e o cami-nhão do lixo não passa há dois meses. Por issoque tá tudo “pôde”! Uma carniça só...

— Aposentadoria? Cortaram a água? Ca-cimbão e cachorro doido? Caminhão do lixo?Vovó, eu não me lembro disso nessa história,não! O que está acontecendo?

Detestinha cai em si e diz: Não, sim... Não!

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Bem, é um enredo novo, adaptado às condi-ções desse País, né? Mudanças. As coisas mu-dam netinha querida... Mudam...

Outros personagens e obras são lembradosnessa trama: João e Maria; Capitão Gancho; Joãoe o pé de feijão; Pluft, o fantasminha. Emília eVisconde de Sabugosa se misturam às históriasde Ruth Rocha, Rachel de Queiroz e escritoresregionais e locais. Sempre de modo debocha-do, irônico e adaptado às situações atuais.“Como vovó”, Detestinha se mostra indigna-do no que se refere aos descuidos com os ido-sos e a falta de saneamento básico e moradiasprecárias. Problemas presentes em nosso dia adia.

2 O TEXTO LITERÁRIO E SEUS MÚLTI-PLOS SIGNIFICADOS

Creio que falar sobre leitura pode nos con-duzir a diferentes perspectivas e a diversos pon-tos de partida. Convém, pois, enfatizar que umaspecto delineador deste percurso interativo deleitura é o diálogo entre diversos textos de nos-sa cultura, que se instala no interior de cadatexto e engendra o seu sentido, transformando-o em tecido. Desse modo, o dialogismo é ex-plorado como um ponto de interseção entrevários textos distintos, isto é, um cruzamentode vozes oriundas de práticas de linguagem so-cialmente diversificadas. Detestinha, o bicho quedetesta ler exemplifica esse entrelaçamento nasvozes dos personagens.

Os dizeres de Detestinha representam ummergulho ao passado por meio da lembrança,da recordação dos tradicionais e encantadorescontos de fadas. Ao mesmo tempo, um convitea olhar o momento atual, os acontecimentos.Enquanto Detestinha remexe e devora os li-vros de um baú do “arco-da-velha”, relembraas palavras de sua avó: “Devore os livros”. Parademons- trar seu entusiasmo em “devorar” li-vros Detestinha diz: “Para jantar, já reserveium livro saborosíssimo:

“O sítio do periquito banguela. Não, não... “Sí-tio do Pica-pau Amarelo”. Detestinha quer é“devorar” aqueles personagens que, para ele,estão ultrapassados, são demais conservadores.Ele detesta mesmo é o convencional; a aceita-

ção; a acomodação; o (des)igual sem explica-ção convincente; a mesmice; o olha ingênuoetc.

Pode-se ler nesse trecho da fala de Detesti-nha que ele deseja que esses “Contos da Caro-chinha” sejam reescritos por cada leitor, ou seja,atualizados, contextualizados. Detestinha temproblema intestinal e para explicar, ele diz: “Ui!Ui!... Fui comer logo Chapeuzinho e Branca deNeve.”

No palco surge a Chapeuzinho Vermelhocom jeito ingênuo, cantando a velha canção:“Pela estrada afora, eu vou bem sozinha...” E pen-sando em voz: Estou na floresta há mais de quatrohoras e nada de lobo, vovó, caçador... Será que meperdi?” Minutos depois, ela grita assustada: “Osdoces sumiram!” A personagem parece con-con-fusa, pois o contexto, o ambiente é outro, muitodiferente do que ela esperava. Ela diz: “Meulobinho... Meu amorzinho... Estou com saudades...”A postura passiva de Branca de Neve e Chapeu-zinho é explícita. Vê-se aí uma tentativa de elasreen- contrarem a versão anterior dos contos.

Chapeuzinho Vermelho aparece usandouma boina, vermelha, cabelo rastafari, vestin-do um toucão (um moderno bermudão) e, nodesenrolar da história a boina de Cha-peuzi-nho muda de cor. Torna-se amarela, de tantomedo, como em Chapeuzinho Amarelo de ChicoBuarque. Branca de Neve aparece com um novofigurino embora o discurso apresente traços detradicionalismo.

A voz de Detestinha (disfarçada de vovozi-nha) reflete uma situação atual vivida por inú-meros idosos em nosso país. O “monstro” de-monstra visão sensível e crítica em seu diálogocom Chapeuzinho Vermelho: “aqui falta água”;“a aposentadoria é pouco para comprar os remédios,que são tantos”; “o caminhão do lixo não passa”etc. Vejamos outros trechos da fala de Detesti-nha: “ouvi dizer que o número de analfabetos destepaís aumentou e não havia ninguém destruindo oslivros.”

3 LER: UMA AVENTURA QUE RIMACOM PRAZER?

Nessa aventura que tento fazer pelo texto,percebo que, ao desnudar uma obra literária, o

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leitor consegue transcender os limites concei-tuais, de informação, imaginação e sensibilida-de estética. Ele busca sentido e amplia sua vi-são e compreensão do mundo, bem como aautocompreensão. Essencialmente, a voz dospersonagens no teatro, traduz um contexto so-cial, político e econômico de uma dada época,na qual valores e ideologias são transmitidos.Sendo assim, o discurso constitui uma repre-sentação da realidade.

E, nessa perspectiva, o prazer está não so-mente em rir, gargalhar com os personagens,mas também na cumplicidade das situaçõesvividas por eles. O (des)prazer pode estar emdescobrir conflitos, impasses e resoluções exis-tenciais do ser humano. Essa sensação reúnesentimentos diversos: alegrias e tristezas; amore ódio; simpatia e repug- nância, aprovação ereprovação; aceitação e rejeição etc.

Parto da premissa de que ser leitor é sentir-se comprometido com seu estar no mundo ecom a transformação de si, dos outros, das coi-sas. Ser leitor é acreditar que se aprende com omundo quando se compreende o que o faz sercomo é.

Sendo assim, a intertextualidade deixa deser um aproveitamento bem educado, ou sim-ples citação, para tornar-se instrumento da mis-tura; e estende-se a todo o discurso social. En-tretanto, o recurso intertextual nem sempre seapresenta de forma tão radical. Mas, à luz des-se exemplo, podemos conferir à intertextuali-dade, uma vocação crítica, lúdica e explorado-ra. Nunca medíocre.

4 INTERTEXTO & ATUALIDADE

O texto aparece tal como Bakhtin o enten-de, ou seja, tecido polifonicamente por fios di-alógicos de vozes que se completam ou respon-dem umas às outras. Desse modo, afirma-se oprimado do intertextual sobre o textual, namedida em que a intertextualidade não é maisuma dimensão derivada, mas, ao contrário, adimensão primeira de que o texto deriva [cf.BARROS (1994)]. Deve-se observar que a in-tertextualidade na obra de Bakhtin é, antes detudo, a intertextualidade interna das vozes que

falam e polemizam no texto, nele reproduzin-do o diálogo com outros textos.

Detestinha recorre a muitas expressões po-pulares, quando incorpora ao seu discurso avoz da avó: “Chapeuzinho, minha filha, você ésangue do meu sangue; carne de minha carne”.Ela diz também, noutro momento que está com“as vistas curtas”. Entretanto, o que percebe-mos é que ele tem uma visão aguçada, críticaem relação aos problemas pessoais (e sociais)com os quais ele se depara no cotidiano.

No texto que tomo como exemplo vimos arelação intertextual expressa de forma clara namaterialidade lingüística, na qual fios se tecempela recuperação de idéias interrelacionadas.

Sob esse olhar, os pressupostos existenci-ais, perceptivos e cognitivos, nisso implicados,trazem questões como estas: desenvolver prá-ticas de leitura numa perspectiva intertextualpode colaborar para a construção de um leitorcrítico, de olhar plural? Dessa questão, desdo-bram-se outras: que saberes experienciais po-dem ser ativados durante a leitura de textos li-terários? Para responder positivamente a essasquestões e, não só com palavras, mas, tambémcom atos, creio que é necessário vivermos comos olhos abertos, aprendendo com a vida. Es-tarmos sempre prontos para mudanças e novosdesafios, pois a vida é o lugar da educação e ahistória de vida, o terreno no qual se constrói aformação. Por isso, a prática da educação defi-ne o espaço de toda a reflexão teórica.

Na Literatura, a presença do intertexto nospermite como num espelho, olhar e enxergar anós mesmos e reconhecermos nossos arredo-res. É a partir desse reconhecimento que fica-mos mais “donos de nosso próprio nariz”, umaboa maneira de começarmos a tomar posse denossa vida e de nossa história. A Literatura éuma das artes que têm proporcionado isto aohomem: reconhecer-se, compreender-se.

Trabalhar com a promoção da leitura, ine-vitavelmente, passa pela formação do leitor,com uma pedagogia e uma teoria renovadas àluz da (multi/inter) disciplina- ridade e da con-vicção de considerar o homem indivíduo, ci-dadão que precisa sentir-se sujeito históricopara interagir no ato de ler. Isso se faz, nãoapenas com livros, mas com imagens, repre-

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sentações e outras lin- guagens pertinentes àvivência e com o acervo cultural que lhe sus-tenta uma visão de mundo.

Noto em minha trajetória pessoal /profis-sional que, são raros os profissionais que, man-tendo o rigor científico exigido pela academia,logram colocar em prática suas leituras e escre-ver, com sua experiência documentada, umaalternativa para os limi- tados modelos de téc-nicas e receitas fecha-das, com que a escola tem-se enganado. Segundo Yunes:

O rompimento do círculo vicioso – quempensa, não precisa fazer, quem faz nãoprecisa pensar – só pode ocorrer no inves-timento de valorização dos sujeitos, ím-pares, cujo movimento próprio, uma vezdespertado, buscará energia em fontesdiversas e de forma livre, optando a cadavez pelo que lhe parecer mais adequadosegundo as situações que vive. (YUNES,1997, p. 10).

Ao longo desta experiência, empenhei-mepara entender a relação dos saberes de forma-ção e experienciais na atuação dos professores.Parti da ideia de que o tempo é um fator impor-tante na edificação dos saberes que fundamen-tam o trabalho docente. Com base nos estudosde Tardif (2003), compreendo que os saberesque fundamentam o ensino não se reduzem aum “sistema cognitivo”. Trata-se de saberestemporais, adquiridos ao longo da vida pessoale profissional. Nas palavras de Tardif (2003, p.103):

O professor não é somente um “sujeitoepistêmico” que se coloca diante do mun-do numa relação estrita de conhecimen-to, que “processa” informações extraídasdo “objeto” (um contexto, uma situação,pessoas etc.) através de seu sistema cog-nitivo, indo buscar em sua memória, porexemplo, esquemas, procedimentos, repre-sentações a partir dos quais organiza asnovas informações.

5 CONCLUSÃO

Aproximando-me do desfecho deste artigoe, revendo o percurso de leitura do texto Detes-

tinha, o bicho que destesta ler, caberia um questi-onamento: será mesmo que Detestinha detestaler? Como alguém teria tamanha visão críticaacerca do mundo, dos eventos da vida, se nãogostasse de ler? Ele diz: “Estou com uma fomeque seria capaz de comer uma biblioteca inteira emdois minutos”. Detestinha sempre recorre à fra-se: “minha vovozinha sempre dizia”... E os con-selhos da vovozinha eram estes: “Siga o conse-lho de seus professores; Detestinha, meu netinho,quando for comer algum clássico nunca coma aque-les que contenham lobos ou anões, a digestão é sem-pre complicada!”

Posso assegurar que a Literatura contribuiem dois aspectos essenciais: primeiramente, elapossibilita a identificação do professor-leitorcom o texto literário. Em segundo lugar, pormeio de recursos lúdicos e alegóricos, o pro-fessor-leitor descobre-se numa relação intertex-tual, na qual os perso-nagens dialogam entre sie entre perso-nagens de outros livros, inaugu-rando um diálogo rico pela discussão dos valo-res e das formas de viver. São as personagens-vivas soltando a voz:

Faz sentido entender que a vida é umajunção de tudo. Você não pode deixarpassar aquelas coisas do passado que fo-ram boas. Eu acho que você deve juntar opassado com o presente e melhorar essassituações. A gente tem que integrar; nãoé esquecer tudo o que fez, mesmo quetenha sido errado (Ana, 2008).

Desse modo, as professoras demons- trarampredisposição para encarar a ati- vidade de ro-tina com energia, capacidade de renovação ede crítica. Tivemos momentos significativos,nos quais pude ver uma postura aberta das pro-fessoras, no sentido de examinarem as razõesdaquilo que ocorria em sala de aula, indagandoas possibilidades de erro e “ensaiando”, proje-tando alternativas disponíveis, refletindo, en-fim, sobre uma forma de melhorar o que fa-zem. Isso revela a característica de umaaprendizagem reflexiva:

[...] oportunidades como essas, o profes-sor tem de ter para aprender mais e poderlevar esses conhe- cimentos para a sala

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de aula. A gente entende que a leituranão é só a do texto escrito. É como PauloFreire dizia: é a leitura de mundo. (Maria,2008).

Não é possível inserir neste texto tantoscomentários significativos que tivemos após aapresentação do referido espe- táculo. Foi ummomento de reflexão, sócia- lização e forma-ção do professor-leitor as palavras de uma pro-fessora [...] A forma como a gente tem traba-lhado com nossos alunos, a gente já temincentivado esses meninos a não ter a coisa pron-tinha, mas, a eles criarem, a expressarem o co-nhecimento deles, a eles, com o conhecimentoque já trazem de casa, fazerem uma leitura, nãoaquela leitura... (Diana, 2008).

O sentido atribuído à atividade realizadaneste estudo foi promover a internalização deconceitos, ideias e/ou aprendizado no que serefere à leitura, pois, ler significa ultrapassaros limites da compreensão: implica reflexão,confirmação, negação e/ou reelaboração deideias, intenções e propósitos. Não é somentedesvendar os sentidos propostos pelo autor,mas principalmente, ser capaz de trans- formar,produzindo uma significação pró-pria. É o ato

da recriação, enriquecido com particulares his-tórias de leituras e de vida, minuciosamentetecidas no texto, dando-lhe peculiaridade, par-ticularidade, fazendo do leitor, um sujeito par-ticipante e do sujeito, um leitor de olhar plu-ral...

REFERÊNCIAS

BARROS, Diana Luz Pessoa de. Dialogismo,polifonia e enunciação. In: ________; FIO-RIN, José Luiz (Orgs.) Dialogismo, polifonia,intertextualidade: em torno de Bakhtin. São Pau-lo: EDUSP, 1994.

TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formaçãoprofissional. 3. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2003.

TÚLIO, Demitri. Detestinha, o bicho que detestaler. Ilustrações de OLIVEIRA, Elane Maria.Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2003.

YUNES, Eliana. Da teoria à prática: ler podeser a saída. (Prefácio). In: AMARILHA, Mar-ly. Estão mortas as fadas?: literatura infantil eprática pedagógica. Petrópolis: Vozes, 1997.

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100 ANOS DE PENTECOSTALISMO NO BRASIL

Moab César Carvalho Costa1

RESUMO

Ao completar 100 anos de sua implantação no Brasil, o pentecostalismo apresenta-se como omaior fenômeno religioso do século XX. Em sua trajetória passa por transformações profundas,modificando seu ethos e estabelecendo novas formas de relacionamento com a sociedade. Se antesera sectário e ascético em sua conduta e em sua concepção de valores éticos e morais necessáriosà salvação, hoje, já não é mais o mesmo. Seu ethos é de afirmação do mundo, de conquista nocampo simbólico e de projeção no campo social e político. Neste artigo faremos um pequenoretrospecto histórico enfocando suas principais fases e as instituições que o forjaram.

Palavras Chave: Pentecostalismo. Neopentecostalismo. Campo religioso. História das religiões.Brasil.

ABSTRACT

After completing 100 years of its implementation in Brazil, Pentecostalism is presented as thegreatest religious phenomenon of the twentieth century. In its history goes through profoundchanges, modifying its ethos and establishing new forms of relationship with society. If it wassectarian and ascetic in his conduct and his conception of moral and ethical values necessary forsalvation today is no longer the same. Its ethos is to affirm the world, and symbolic achievementin the field of projection in the social and political. In this article we make a short historicalretrospective focusing on its main phases and the institutions that have forged.

Keywords: Pentecostalism. Neo-Pentecostalism. Religious field,history ofreligions. Brazil.

1 INTRODUÇÃO

O pentecostalismo completa 100 anos noBrasil. De sua implantação para cá muitasmudanças e transformações ocorreram no cam-po religioso brasileiro. Não apenas no campopentecostal, mas em todas as instituições emanifestações religiosos presentes. Mudançasocorridas, principalmente,a partir do fim dahegemo nia católica no Brasil. Segundo San-chis (1997. p.103):

1 Professor do Depto de História e Geografia da UEMA-CESI e mestrando em Ciências da Religião pela PUC-GO

Quando olha para o campo religioso bra-sileiro contemporâneo, um primeiro fatochama a atenção: a trans- formação in-troduzida nele pelo fim da hegemoniaquase monopólio católica.

O pentecostalismo foi Implantado no Bra-sil pela Congregação Cristã (1910) e pela As-sembleia de Deus (1911), frutos do avanço mis-sionário oriundo do movimento holiness nosEstados Unidos no final do século XIX e iníciodo século XX.Cresceu de forma lenta e discre-

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ta até o início dos anos de 1950. A partir deentão inicia um novo processo de ocupação deespaços na sociedade e nos meios de comuni-cação através dos movimentos de cura e liber-tação, atin­gindo as massas desesperançadas eas populações que emigraram para as grandescidades fugindo da seca e da forme no Nordes-te, em busca de melhores oportunidades de vidanas grandes cidades e capitais dos Estados bra-sileiros.

Nos anos de 1970, com a fundação da Igre-ja Universal do Reino de Deus, pelo bispo EdirMacedo, tem-se o inicio de um novo paradig-ma religioso no Brasil, o movimento neopente-costal. Movimento este que tornar-se um dosmaiores fenômenos sócias do século XX. O ne-opentecostalismo provocou mudanças em todoo campo religioso brasileiro, voltado para amassificação da fé e com um ethos de afirmaçãode mundo, transmitido principalmente atravésda Teologia da Prosperidade (MONTES, 1998).

Embora, uma das obras sociológicas pio-neiras sobre o pentecostalismo brasileiro seja ade Beatriz Muniz de Souza: “Aexperiência dasalvação: pentecostais em São Paulo”, publica-da em 1969, outros autores com Paul Freston(1993), Antoniazzi (1994), André Corten(1996), Leonildo Campos (1997), Mendonça(1997), Ricardo Mariano (2005), Paulo Romei-ro (2005) e outros, ganham destaque na Acade-mia e se tornam referencias aos estudos sobreas diversas fases do pentecostalismo no Brasil.

Neste arquivo adotaremos a metáfora utili-zada por Freston sobre as três ondas para a ela-boração de um histórico sobre o pentecostalis-mo brasileiro. Não obstante, utilizaremos osconceitos metodológicos de Bourdieu (2005),as analises de campo religioso de Montes(2008), as reflexões de Romeiro (1996), bemcomo a obra de referencia sobre o neopente-costalismo brasileira publicada por Mariano(2005) e outros autores da academia.

2 A PRIMEIRA ONDA DO PENTECOS-TALISMO NO BRASIL

2.1. Congregação Cristã no Brasil – CC

Fundada pelo missionário italiano Luigi

Francescon em 1910. Nascido na província ita-liana de Udine, em 1866, emigrou para os EUAonde se tornou protestante, tendo sido um dosfundadores da Igreja Presbiteriana Italiana deChicago.

Influenciado pela pregação de WilliamDurham recebeu o batismo no Espírito Santo.Ao se desligar da Igreja Presbiteriana, Frances-con levou consigo a doutrina calvinista da pre-destinação, implantando-a como doutrina bá-sica da CC. Fato que justifica o porquê da CCnão realizar trabalhos de proselitismo fora dostemplos, pois considera que os salvos encon-traram o caminho da igreja e para lá serão leva-dos pelo Espírito Santo.

Discípulo de William Durham, Frances-con fora enviado pelas missões pentecostaisamericanas com objetivo de implantar igrejasna América do Sul. Em 1909, acompanhadodos missionários G. Lombardi e Lucio Mena(ROMEIRO, 2005), viaja para a Argentina, es-tabelecendo-se em Buenos Aires. Em 1910 se-gue viagem para São Paulo, onde iniciou os tra-balhos junto às comunidades italianas.

O avanço da CC acompanhou o deslocamen-to das colônias italianas no sul e sudeste do país.No entanto, “a assimilação cultural dos italia-nos foi rápida, e logo a CC sentiu a necessidadede garantir a sobrevivência por meio da transi-ção para a língua portuguesa” (FRESTON,1993, p. 78). A CC teve um forte crescimentonos estados de São Paulo, Minas Gerais e Para-ná, concentrando seus esforços nessas áreas,embora contassem com igrejas no Rio de Ja-neiro, Goiás e Mato Grosso.

Sobre as razões que impediram ou dificul-taram o avanço da CC para a região Norte, Lé-onard (1981, p. 347) faz as seguintes considera-ções:

Nas regiões do norte, naturalmente, res-sentiram-se da falta de bases italianas eda presença do outro ramo pentecostal, odas Assembléias de Deus. De modo queé sobretudo a região paulista que consti-tui seu apanágio.

O sectarismo da CC fez com que ela fosseultrapassada pela Assembléia de Deus (AD) nosanos iniciais da década de 1940e que seu cres-

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cimento se concentrasse nas cidades interiora-nas, onde o caráter patriarcal se mostrava maispresente.

Apesar da longevidade, a CC, ainda nos diashoje resisti às mudanças e não acompanha astransformações estruturais processadas na so-ciedade brasileira. Talvez a crença na doutrinada predestinação tenha aliviado a pressãosoci-al sobre seus membros, que eleitos por Deus,não precisam assimilar os valores da sociedadeburguesa para demonstrar graça e êxito de suarelação com Deus. As demais instituições pen-tecostais no Brasil adotam o arminianismo.

Mantendo-se extremamente sectária, a CCconserva traços da época de sua fundação. Sãoeles: ausência de clero remunerado; não possu-em pastores, mas, anciãos; as mulheres usamvéu; os cultos são marcados por ‘testemunhos’e não há um planejamento anterior; os pegado-res são escolhidos na hora; rejeitam toda formade propaganda religiosa através da mídia; nãopedem dízimos, existindo apenas uma ofertaanual; desestimulam toda e qualquer literaturaque não seja a Bíblia; a tradição oral é o maiorveículo de divulgação de seu código moral, vistoque a igreja não possui jornais, propaganda enem literatura religiosa; não celebramce­rimônias de casamento e funeral; proíbemque seus membros comprem ‘fiado’; não per-mitem a presença de pessoas portadoras de do-enças contagiosas em seus cultos, e adotam umapostura apolítica.

2.2 A Igreja Evangélica Assembleia de Deus -AD

Todos os caminhos pentecostais passampelos Estados Unidos, não importa de que na-cionalidade o missionário seja. Europeu ou não,ele primeiro passa pela experiência do movi-mento hollines nos EUA para depois se expa-lhar pelo mundo. Foi do circulo de WillianDurham (1873-1912) que os missionários su-écos Daniel Berg e Gunnar Vingren sairam paraimplantar o pentecostalismo no Brasil (CAM-POS, 2005), Daneil Berg e Gunnar Vingren seconheceram em 1909, na cidade de Chicago,onde buscava o batismo com o Espírito Santo.

Diferente de Berg, que era um homem alto

e forte, moldado para o trabaho pesado e compoucos estudos, Vingrem era de pequeno por-te, magro,dedicado aos estudos e de saúde frá-gil. Migrou para os Estados Unidos em junhode 1903, indo morar com um tio Carl Vingrenem Kansas City. Não tardou muito Vingrentransferiu-se para Chicago, onde foi diploma-do em Teologia, pelo Seminário Teológico Su-eco dos Batistas. Depois de formado pastoreoua Primeira Igreja Batista em Menominee, Mi-chigan, de junho de 1909 a fevereiro de 1910(VINGREN, 2000. p. 23-24).

Sem conhecerem o Brasil e sequer a línguaportuguesa, Berg e Vingren teriam recebidouma revelação do Espírito Santo que os orien-tavam a irem ao Pará, onde, segundo ele, “opovo era de um nível social muito simples”(VINGREN, 2000, p. 25).

Embora todos os registros oficiais infor-mem que a escolha do Brasil fora totalmenteirracional e impreganada da presença do sagra-do e de suas manifestações na comunicação desua vontade para a vida dos missionários, Fres-ton (1993, p. 70) registra que havia um pastorbatista sueco em Belém, emigrado dos EstadosUnidos, Erik Nilsson, que desde 1897 fundavaigrejas na região amazônica. É provável quenos relatos que enviou à comunidade batistanos Estados Unidos, Nilsson tenha menciona-do seu trabalho como missionário no Pará.

Ao chegarem ao Brasil (19 de novembro de1910) passaram a morarna casa de um pastormetodista chamado Justos Nelson, com quemGunnar Vingrem já havia se encontrado nosEstados Unidos.No início, frequentavam a igre-ja Batista, e havia uma expectativa que os mis-sionários assumissem definitivamente o pasto-rado da igreja. No entanto, suas ministraçõessobre o batismo com o Espírito Santo desagra-davam parte da liderança local. Como persisti-am em propagar ‘convidados’ a deixa­rem aigreja.

Não era a primeira vez que Vingren pro-movia um avivamento pentecostal em uma igre-ja Batista. Em Menominee, EUA, a igreja queele pastoreava, ao pregar sermões sobre o ba-tismo com o Espírito Santo promoveu grandedivisão entre os membros, provocando um cis-ma na Igreja. Vingren teve que deixar a igreja,

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mudando-se para outra em South Bend, India-na e nela “quase vinte pessoas batizadas com oEspírito Santo”. (VINGREN, 2000. p. 26).

Os missionários suecos não saíram sozi-nhos, levaram consigo dezessete pessoas (setehomens e dez mulheres) e logo fundaram umaigreja com o nome de “Missão de Fé Apostóli-ca”, em 18 de junho de 1911, tendo GunnarVingren como pastor e Berg seu auxiliar. Onome da igreja foi em referência ao movimen-to fundado por William Seymour nos EstadosUnidos, com um jornal, “Apostolic Faith” (FéApostólica). A igreja fundada por eles em Be-lém recebeu o estatuto de pessoa jurídica, em11 de janeiro de 1918, quando foi registradaoficialmente como Assembleia de Deus (VIN-GREN, 2000, p.100). No entanto, seu marcoinicial no Brasil data de 1911, quando o grupose separou da igreja Batista.2

Até os anos de 1930, a AD já estava presen-te em quase todas as regiões do país. Nem sem-pre os trabalhos eram iniciados por missioná-rios ou pastores nacionais. O crescimento veiopelas mãos dos leigos, e esta foi uma caracterís-tica que marcou a AD por mais de 80 anos. Aresistência dos missionários suecos por umaformação teológica, com requisito para consa-gração de pastores, ainda hoje permanece naAD, embora tenha a Convenção Geral das As-sembléias de Deus no Brasil – CGADB, em1978, instituído a obrigatoriedade do Bacharelem Teologia, para a consagração de novos pas-tores, o que na prática não funcionou.

Embora a partir de 1930, comoveremos aseguir, o governo das Igrejas do Norte e Nor-deste passe para as mãos de obreiros nacionais,deve-se destacar a presença efetiva dos missio-nários suecos em todo o país, e a importância

que esta participação teve para manter, apesardas cisões, certa unidade cultural e teológicadas diversas AD’s espalhadas pelo Brasil. A ADconseguiu formar uma grande rede de igrejas econvenções regionais e estaduais, ligadas porlaços fraternais, através de uma convenção deobreiros, a CGADB, criada em 1930.

A importância histórica da Convenção daAD, em 1930, está no fato dela definir a auto-nomia das igrejas estabelecidadas nas regiõesNorte e Nordeste, em relação à Missão Suéca3

no deslocamento dos missionáros suecos paraas regiões Sul e Sudeste, onde os trabalhos eramincipientes; na criação de uma única pública-ção, o jornal Mensageiro da Pazque se tornariao órgão oficial da Assembléia de Deus no Bra-sil; na decisão de realização de convenções na-cionais anuais e na transferência da sede da de-nominação de Belém para o Rio de Janeiro, naépoca capital federal; e definir a condição detrabalho das mulheres na igreja. Após a con-venção de 1930, Daniel Berg retorna com afamília para a Suécia. Vingren permanece noRio de Janeiro até 1932, quando retorna para aSuécia, onde falece em virtudes de doença ad-quiridas no período que ficou no Brasil.

Até o início dos anos de 1950, quando ini-cia o movimento de cura, nas igrejas da segun-da onda, a AD realizou várias convenções eescolas bíblicas, na maioria das vezes, no Nor-te e Nordeste. Nessas convenções foram feitasdeliberações sobre o casamento religioso, o usodo cálice individual na ceia, sobre a esponta-neidade dos sermões, utilização do rádio naevangelização, a não utilização da cruz na fa-chada e no interior das igrejas, a criação da CasaPublicadora da Assembleia de Deus CPAD(1940), a proibição de participar de jogos deloteria, criação de seminários teológicos, o es-tabelecimento da saudação “A paz do Senhor”2 Esse registro do marco inicial da AD no Brasil tem sido

utilizado de modo consciente ou não como um mitode fundação, cujo objetivo é de transparecer uma uni-dade que não existe mais. Fracionada pela grande ci-são da Convenção de Madureira (1988), e compostapor numerosas convenções regionais autônomas e poroutras igrejas independentes da Convenção Geral dasAssembleias de Deus no Brasil – CGADB. Um exem-plo maior é a Igreja Assembleia de Deus Vitória emCristo do Pastor Silas Malafaia que em 2010 se desli-gou da CGADB, mas continua ostentando o nome daAD e preservando sua ligação umbilical com o mitofundador.

3 Apesar da autonomia concedida, os suecos continua-ram com grande influência sobre os rumos da ADbrasileira, principalmente sobre os aspectos ligados àscrenças, costumes, doutrinas e posições teológicas.Mesmo depois da autonomia de 1930, os suecos pre-sidiram a Convenção Geral por 14 mandatos, entre operíodo de 1931 a 1951. Só o missionário SamuelNyström a presidiu por 9 mandatos. Nyström foi oprincipal responsável pelas concepções teológicas ado-tadas pela AD até os dias de hoje.

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e vários outros elementos que foram responsá-veis pela consolidação de um ethos e uma iden-tidade própria da AD no Brasil (CPAD, 2004).

Em 2011 a AD completa 100 anos de suaimplantação no Brasil. Não é mais una, divi-diu-se em vários ministérios, sendo os mais sig-nificativos os ligados a CGADB e à Conven-ção de Madureira.

3 A SEGUNDA ONDA DO PENTECOS-TALISMO BRASILEIRO

As instituições pentecostais que surgem noperíodo que vai do início da década de 50 até ofinal da década de 60, na história do pentecos-talismo brasileiro, são classificadas por Fres-ton (1993) como representantes do pentecosta-lismo da segunda onda; pelo Centro Ecumênicode Documentação e Informação – CEDI(1991), de pentecostalismo autônomo; por Men-donça (1989), de movimentos de cura divina;porBrandão (1980), de pequenas seitas;e por Maria-no (2005),de deuteropentecostalismo.

A segunda onda é responsável pela plurali-zação do campo religioso pentecostal brasilei-ro que até então era dominado exclusivamentepela Congregação Crista e pela Assembleia deDeus. Embora surgissem inúmeros movimen-tos pequenos e sem muita expressão, as insti-tuições que melhor caracterizam esse períodosão a Igreja do Evangelho Quadrangular - IEQ(1951), Igreja Brasil para Cristo – IBC (1955) eIgreja pentecostal Deus é Amor – IPDA (1962),tendo como ênfase o movimento de cura di-vina.

A partir da década de 1950, paralelamenteàs mudanças sociais subjacentes aos processosde urbanização, de modernização compulsó-ria, industrialização e êxodo rural, na conheci-da década do desenvolvimentismo, ocorre ocrescimento acelerado do pentecostalismo noBrasil. Novas instituições religiosas entram emcena, no campo religioso pentecostal brasi-leiro.

O crescimento dessas igrejas passou a inco-modar a Igreja Católica, que até então não viaos “protestantes” como uma ameaça para a suahegemonia. A partir de então foram considera-

dos como inimigos, e colocados na mesma con-dição que os adeptos das religiões afro-brasi-leiras. (MONTES, 2008).

As décadas de 1950 e 1960 promovem noBrasil transformações estruturais na economia,na política e, sobretudo, na mentalidade dopovo brasileiro. Era o período do desenvolvi-mentismo, onde os governos populistas propu-nham acelerar o crescimento do Brasil, desen-volver cinquenta anos em cinco de governo eoutras ações mais audaciosas. O êxodo ruralfoi acelerado neste período. O êxodo rural in-chou as cidades aumentando significativamen-te as mazelas sociais. Os que vinham do campoencontravam um cosmo estranho para si, e parase adaptar aos novos modelos de vida precisa-vam re- significar seus valores e práticas. Nãoencontrando respostas satisfatórias nas açõesdo Estado, milhares de operários, pessoas dasmais baixas classes sociais mergulham no uni-verso das praticas pentecostais, em busca dasmais diversas soluções para a vida. Encontran-do nelas sentido e esperança de respostas paraas suas necessidades, abandonam suas antigascrenças adotando o evangelho pentecostal.

Por outro lado, no novo meio em quepassa a viver, essas igrejas rapidamentereconstituem para esses novos trabalha-dores que chegam aos grandescentrosurbanos os laços solidariedade primáriade seu local de origem, perdidos com oprocesso migratório dando-lhe enfim osentimento de pertencimento que lhe fal-tavam na grande cidade, absorvendo-osnuma comunidade. (MONTES, in Históriada Vida Privada no Brasil. v.4, 2009. p. 84).

Rompendo com o sectarismo do pentecos-talismo clássico, as novas instituições religio-sas ganham contornos bem diferentes não doponto de vista não teológico, pois a teologia emquase nada muda mas com a rítmica dos cul-tos, dos métodos de evangelização de massa,dos padrões morais e com a quebra do paradig-ma pa­triarcal, pois a instituição (IEQ) que inau-gura o novo momento foi fundada por umamulher, que por coincidência histórica, tam-bém foi influenciada por William Durham.

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3.1 Igreja do Evangelho Quadrangular – IEQ

Embora Aimee Semple MacPherson4 te-nha falecido em 1940, seu legado Chegou aoBrasil em 1946, através de Harold Williams,ex-cowboy dos filmes hollywoodianos, que nosprimeiros anos, até que dominasse a língua por-tuguesa e entendesse um pouco do ethos dosbrasileiros, frequentou várias denominações.Em 1952, Williams funda uma pequena igrejano interior do Estado de São Paulo.

Em 1953, Williams inicia um ousado pro-jeto de evangelização, inspirado em Aimee,criando a Cruzada Nacional de Evangelização,que reproduz os trabalhos em tendas de lonautilizados nos Estados Unidos. Embora ousa-do, o projeto não ob­teve êxito e foi abandona-do. Em 1955, estruturou a Igreja do EvangelhoQuadrangular, mantendo-a ligada à igreja mãenorte-americana até a segunda metade da déca-da de 1980.

Freston comenta que até 1988 a presidên-cia da igreja no Brasil era indicada porLos Angeles, e com esse rompimento a

liderança nacional tomou medida comobjetivo de adequar e dinamizar as açõesda igreja criando gráfica e aumentandotiragem de seu jornal e implantando ins-titutos bíblicos para a formação de seuclero (1993, p. 84).

3.2 Igreja Pentecostal o Brasil para Cristo –BPC

Da IEQ saíram muitos líderes que forma-ram seus movimentos próprios, dentre osquais, o mais bem sucedido é a Igreja O BrasilPara Cristo. A Igreja Evangélica

Pentecostal o Brasil para Cristo BPC é umai-greja genuinamente brasileira, fundada em1956, pelo missionário Manoel de Mello. Lí-der carismático, nordestino, operário da cons-trução civil, com passagens pela AD e pelaIEQ,iniciou sua carreira muito cedo, pregavadesde criança e aos 26 anos, ao implantar aBPC, desejava ansiosamente organizar um mo-vimento evangelístico de cura e libertação emtoda a nação brasileira. A BPC quebrou váriosparadigmas religiosos, enfrentou a “censura doregime militar” e por fim notabilizou-se comouma das maiores denominações evangélicas dopaís.

A BPC foi pioneira na política, elegendodeputados estaduais e federais. Alugava espa-ços seculares como cinemas, teatros, ginásios eestádios, para realizar concentrações de mila-gres e curas divinas. Seus trabalhos eram pres-tigiados por autoridades civis e políticos. Fres-ton (1993, p. 88) assinala que aos olhos dosrepresen­tantes do pentecostalismo clássico queviviam encastelados dentro de seus templos,essa relação com o secular era negativa, pois “amentalidade sectária se escandaliza com a mis-tura do sagrado e do profano; esses locais erama síntese da sociedade corrompida e o espaçopúblico era lugar de perigo”.

A BPC notabilizou-se, também, pela utili-zação da mídia. O programa de rádio A Voz doBrasil para Cristo se torna um sucesso e logopassa a ser veiculado internacionalmente pelaRádio Tupi obtendo por vários anos altos índi-ces de audiência. A BPC chegou inclusive a terum programa de TV, que não tendo o êxito de-sejado teve vida curta. Foi o sucesso do Marke-

4 A fundadora da Igreja do Evangelho Pentecostal, Ai-mee Semple MacPherson, canadense e de família me-todista, rompeu com todos os paradigmas de sua épo-ca. Era jovem, bonita e empreendedora. Casou-se porduas vezes e por fim decidiu dedica-se exclusivamen-te a pregação religiosa. Sua trajetória missionária foimarcada pela dor e pela sensação de fracasso, apósmanter contato com o pentecostalismo casa-se aindamuito jovem com o missionário Robert Semple e vi-aja com o marido para uma jornada missionária naChina. Pouco tempo depois o marido falece vitimadopela malária. Após o nascimento de sua filha Aimeeretorna para os Estados Unidos, onde casa-se nova-mente com o empresário Harold MacPherson. Tem-pos depois abandona o segundo casamento para dedi-ca-se a intermináveis viagens pelas EUA divulgando amensagem pentecostal de um Cristo salvador, quebatiza no Espírito Santo, que é médico, pois curatodas as enfermidades, e que é o Rei que um diavoltará para governar sobre todos. Aimee utilizavatendas e promovia grandes ajuntamentos onde a gran-de tônica eram as sessões avivalistas e a cura divina.Inovou na evangelização utilizando a massificandoda evangelização através de programas de rádio. Oefeito foi tão positivo que em 1924 Aimee adquire suaprópria emissora. Construiu em Los Angeles o Tem-plo Ângelus com capacidade para mais de 5000 pes-soas sentados. Aimee pode ser considerada a precur-sora do tele evangelismo norte-americano e mulhermais influente do movimento pentecostal do mundo.(www.ieq.com.br, acessado em 13.02.2011)

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ting religioso e o fato de suas igrejas concentra-rem-se em grandes áreas urbanas permitiu oêxito nas empreitadas politicas.

A importância da BPC para a história dopentecostalismo é marcada pelo seu pioneiris-mo na implantação de uma igreja nacional, semdependência financeira e teológica das institui-ções norte americanas, pelo perfil empreende-dor de seu líder, pela organização do marketingreligioso, pela vinculação com a política e pelofisiologismo que fazia dela, criando as bases doque seria a partir dos anos de 1970 o novo para-digma do pentecostalismo brasileiro, os movi-mentos neopentecostais.

3.3 Igreja Pentecostal Deus é Amor

Embora a atuação da IEQ e da BPC tenhalançado as bases para a implantação do neo-pentecostalismo, quem vai fornecer o viés daspráticas litúrgicas, como as correntes de ora-ção, campanhas, exorcismo e entrevistas comdemônios, oposição fer­renha às religiões deorigem africanas, será a Igreja Pentecostal Deusé Amor – IPDA. Mariano (1999) pede cautelaem relação a esta afirmação, pois considera osectarismo da IPDA e sua irrelevante influên-cia no Estado do Rio de Janeiro, onde surgirama Universal do Reino de Deus – IURD, a In-ternacional da Graça de Deus e a Cristo Vive,de pouca ou nenhuma influência. A IPDA temsua origem e concentração maior no Estado deSão Paulo.

A IPDA foi oficialmente fundada no dia 03de Junho de 1962, pelo Missionário DavidMartins Miranda, paranaense, filho de campo-neses, que migrou com a mãe e os irmãos paraSão Paulo, depois do falecimento do pai. Con-verte-se aos 22 anos, transitando em mais deum ambiente pentecostal. Após receber umarevelação direta de Jesus Cristo, para iniciaruma nova igreja, abandona sua atividade pro-fissional e dedica-se exclusivamente à missãopara qual fora chamado.

Hoje, a IPDA conta com inúmeras emisso-ras de rádio – a televisão fora demonizada pelomissionário David Miranda – possui revistas ejornais, um site oficial, onde as pregações deseu presidente são traduzidas para o inglês, o

francês e o espanhol. Os cultos transmitidospelo rádio concentram maior parte do tempona mensagem do missionário. A mensagem édividida no relato de inúmeros testemunhos decura, libertação e bênçãos recebidas pelosmembros. É o testemunho da cura divina amaior estratégia de atração de novos membros,especialmente aqueles que o missionário cha-ma ‘carinhosamente’ de irmã católica e irmãocatólico. De acordo com o site oficial da insti-tuição a IPDA possui o maior templo evangéli-co do mundo, o Templo da Glória de Deus,sede mundial da igreja, localizado em São Pau-lo, inaugurado em 2004, com capacidade para60.000 pessoas, além de que possuir mais de11 mil igrejas, espalhadas pelo Brasil e em 136países em todo o mundo. (www.ipda.com.br,acessado em 15.02.2011).

Embora a IPDA antecipe vários elementoscaracterísticos das mais que as semelhanças.Basta analisar o regimento interno para perce-ber os aspectos sectários impostos aos mem-bros, e que a rigidez em relação a detalhes mí-nimos na vida dos fiéis contrasta fortementecom o liberalismo e a afirmação de mundo ado-tado pelos neopentecostais.

A segunda onda difere da primeira não ape-nas pelo fato de concentrar suas forças na curadivina, enquanto a primeira focava no falar emlínguas e na ascese sectária, mas, também nofato de implementar estratégias novas na evan-gelização, que já não é mais pessoal, de casa emcasa, como na AD, mas na utilização da mídia,principalmente do rádio (a televisão até os anos70 era financeiramente inacessível), nas gran-des concentrações públicas (estádios, ginásiose praças), na utilização de teatros e cinemas e,em algumas instituições, como na IEQ, nomenor rigor dos usos e costumes da santidadepentecostal.

Em relação à terceira onda, a distinção émuito maior, não apenas em estratégias de pro-selitismo, mas nas doutrinas, crenças, ritos,organização e objetivos. E é sobre ela que va-mos tratar no próximo capítulo.

4 O NEOPENTECOSTALISMO

As igrejas que Freston (1993) classifica de

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terceira onda, Mariano (2005) denomina de ne-opentecostais. Suas principais representantessão a Igreja Universal do Reino de Deus –IURD (1977), Igreja Internacional da Graçade Deus (1980), Renascer em Cristo (1986),Cristo Vive (1986), Comunidade EvangélicaSara nossa Terra (1976), Igreja Nacional doSenhor Jesus Cristo (1994). Com exceção daIgreja Nacional do Senhor Jesus Cristo, funda-da pela Apostola Valnice Milhomens, advindada Igreja Batista Brasileira, as demais são de-fecções das igrejas da segunda onda.

Antes de qualquer coisa, é preciso determi-nar o que significa o termo neopentecostalis-mo. Embora haja consenso entre a maioria dosestudiosos brasileiros sobre o significado dotermo neopentecostalismo e a utilização doprefixo neo, Mariano faz as seguintes observa-ções:

O prefixo neo mostra-se apropriado paradesigná-la tanto por remeter à sua for-mação recente como ao caráter inovadordo neopentecostalismo. Embora recenteentre nós, o termo neopentecostal foi cu-nhado há vários anos nos EUA. Lá, nadécada de 70, ele designou as dissidênci-as pentecostais das igrejas protestantes,movimento que posteriormente foi no-meado de carismáticos. Como deixou hámuito de ser empregado nas tipologiasnorte-americanas, não confunde nem atra-palha nossa tarefa de classificação. (MA-RIANO, 1999, p. 33).

No Brasil, o surgimento das igrejas neopen-tecostais acontece na década de 70. Para Mari-ano (2005) nem todas as igrejas surgidas nesseperíodo podem ser consideradas neopente-costais.As cisões oriundas do processo de re-novação do protestantismo histórico não seencaixam no perfil do tipo ideal do neopente-costalismo, e mesmo aquelas surgidas das de-fecções do pentecostalismo clássico, principal-mente da AD, mantêm-se doutrinariamentemais próximas de sua matriz do que as quesaí­ram do deuteropentecostalismo.

Na origem do movimento neopentecostal,encontra-se a Igreja Nova Vida, fundada pelomissionário canadense Robert McAlister, em1960, na cidade do Rio de Janeiro. Voltada ini-

cialmente para a classe média, utilizou larga-mente a mídia. Primeiro o rádio, depois a tele-visão, com ênfase na cura divina e mordomiacristã.

É da Igreja Nova Vida que saem os princi-pais líderes do neopentecostalismo no Brasil:Edir Macedo, fundador da Igreja Universal doReino de Deus – IURD; R. R. Soares, da IgrejaInternacional da Graça de Deus e Miguel Ân-gelo, do ministério Cristo Vive

4.1 Igreja Universal do Reino de Deus – IURD

De todas as igrejas neopetencostais, nenhu-ma delas se compara à IURD. Em apenas 30anos De todas as igrejas tor­nou-se um dos mai-ores impérios religiosos do Brasil. Rompe to-talmente com os padrões que lembram o pen-tecostalismo clássico. Sua presença na grandemídia é marcada por incidentes, sendo o maisfamoso o chute na santa (MONTES, 1998) eescândalos relacionados à forma de arrecada-ção e utilização dos recursos ofertados por seusmembros e simpatizantes.

Depois que adquiriu a Rede Record de Rá-dio e Televisão, em 1989, a IURD passou atravar uma luta diária com a Rede Globo deTelevisão. Não obstante, apesar dos escânda-los e difamações, cresce assustadoramente emtodo país, principalmente nas maiores cidades,avançando em outros países. Seu público sãopessoas de classe baixa. Não faz discrimina-ção, recebe o mendigo e o drogado, consideraque seu papel é o de restaurar a dignidade hu-mana, que passa a ser reorganizada e resignifi-cada através da ação terapêutica da igreja.

Seu grande líder carismático é o Bispo EdirBezerra Macedo. Nascido em 1945, na cidadefluminense do Rio das Flores, filho de famíliapobre. O pai alagoano e a mãe mineira. Porduas vezes freqüentou uma universidade sem,porém concluir nenhum dos cursos de mate-mática e estatística, respectivamente. Por 15anos trabalhou na Loteria do Rio de Janeiro -Loterj, iniciando como servente até chegar àfunção agente administrativo.

Antes de converter-se ao protestantismo em1963, aos 18 anos de idade, num culto realiza-do em uma sala da Associação Brasileira deImprensa – ABI, no Rio de Janeiro, Edir Ma-

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cedo transitava entre a Igreja Católica e os ter-reiros de Umbanda. Permanece por 12 anoscomo membro da Igreja Nova Vida, sem exer-cer função pastoral. Em 1975, junto com Fidé-lis Coutinho, Romildo Ribeiro Soares, SamuelCoutinho e Roberto Lopes desligam-se da NovaVida e funda a Igreja Cruzada do Caminho Eter-no.

Na IURD encontramos todos os traços dosneopentecostais: do ponto de vista das práticase crenças temos a pregação forte contra as reli-giões de origem afro – embora esteja presenteem todas as pentecostais tanto da primeira comoda segunda onda – o que a IURD faz é umaexacerbação, invocando as entidades,espetaculari­zando os exorcismos, entrevistan-do os demônios e atribuindo a eles, como for-mas redutoras de complexidades, a culpa portodas as mazelas sociais: miséria e fome, doen-ças e privações de qualquer natureza. O Diaboé totalmente necessário e responsável, inclusi-ve daquelas ações que poderiam ser resolvidascom o anteparo do Es­tado, através de politi-cas públicas.

Do ponto de vista da liturgia, emprega ri-tos de natureza mágico-religiosa, campanhas ecorrentes de oração para todas as necessida-des: o vale de sal, a fogueira santa de Israel, oóleo ungido, a água do Rio Jordão, a rosa ungi-da, a oração dos 70 pastores, lenços, fitas eobjetos que devem ser levados para casa com ofim de expulsar os encostos etc. Sobre esta pers-pectiva Ari Pedro Oro (In REVISTA USP, SãoPaulo, n. 68, p. 321, dezembro/fevereiro2005-2006) faz o seguinte comentário:

Uma importante característica dessa igre-ja, que em certo sentido constitui ummarco na história das religiões no Brasil,é o fato de ela construir seu sistema dou-trinário e ritualístico mediante a apropri-ação e reelaboração de elementos sim-bólicos tomados de outras igrejas ereligiões.

Outro aspecto a destacar é a pregação enfá-tica da Teologia da Prosperidade. Nenhum tra-balho ou atividade da IURD acontece sem queseja feita uma ou mais oferta. Nela a centrali-dade do dinheiro está diretamente ligada à pro-

porcionalidade das bênçãos a serem recebidas,quanto maior a oferta, quanto maior o sacrifí-cio financeiro, maior será a prosperidade ma-terial do fiel.

Rádio e Televisão, possui várias retransmis-soras no Brasil, além de uma gráfica própria.Diferente do tele-evangelismo norte-america-no, que prende as pessoas em casa, o uso da tele-visão pelas igrejas brasileiras tem objetivos ins-titucionais, ou seja, atrair para dentro de seustemplos o maior número possível de pessoas,tanto que boa parte dos programas traz váriosdepoimentos e imagens de pessoas que afirmamterem sido curadas de varias do­enças, dentreelas o câncer e a AIDS, quando participavam decampanhas e correntes nos templos da igreja.

Para enfrentar as inúmeras dificuldades ebarreiras pelas quais a IURD passa, o bispoMacedo planejou o ingresso da igreja nas ativi-dades político-partidárias elegendo deputadosestaduais, federais e senadores. Durante as cam-panhas presidenciais e para governo de Estadoassume posição política e pressiona a igreja aseguir sua orientação de voto.

Embora a maioria absoluta dos membrosda IURD seja composta dos segmentos maispobres da população, ela investe alto nos tem-plos. Suasluxuosos, confortáveis e modernos.Seu último empreendimento, ainda em cons-trução, no bairro do Braz, em São Paulo, é oGrande Templo de Salomão, obra faraônica,que reproduz o templo construído por Salo-mão durante seu reinado. As pedras dos reves-timentos foram importadas de Israel, confor-me anuncia o site oficial5 da construção dotemplo:

Parte das pedras que irão revestir o Templode Salomão já chegou ao Brasil. Fabricadas napedreira de Hebron, em Israel, os três tipos depedra estão armazenados em um galpão, nobairro do Brás. O processo de extração das pe-dras foi acompanhado de perto pela equipe daEngiurd, que registrou o momento em que elasforam cortadas por retroescavadeiras, serradasem placas e acopladas em containeres para saí-

5 O site http://www.otemplodesalomao.com/live.htmltraz um link onde se pode acompanhar, através decâmaras, em tempo real, a construção do templo.

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rem do porto de Ashod em direção ao porto deSantos. (http://otemplodesalomao.com/blog/pedras_de_israel_ja_chegaram_no_brasil-12.html. Acessado em 02.01.2001)

A direção da IURD sabe criar condiçõespara atrair o grande público. Com a construçãodo templo com pedras trazidas de Israel e osimbolismo que o liga à Terra Santa, o temploserá um local de peregrinação, pois as pessoaspoderão tocar nas ‘pedras sagradas’ da terra poronde Jesus passou. Estima-se que a IURD pos-sua mais de 8 milhões de membros no Brasil eno mundo.

4.2 Igreja Internacional da Graça de Deus –IIGD

Outra igrejacujo líder saiu da Nova Vida é aIgreja Internacional da Graça de Deus – IIGD,embora ela seja uma cisão da IURD, provoca-da por lutas internas pela primazia entre R. R.Soares e Edir Macedo. Venceu Edir Macedo, eSoares não saiu de mãos abanando.Soares foirecompensado pelo serviço prestado na IURDe com os valores de sua ‘rescisão’ fundou a Igre-ja Internacional da Graça de Deus, em 1980,na cidade do Rio de Janeiro.

Com perfil muito próximo ao da IURD, aInternacional da Graça vem expandindo seusdomínios em todo o Brasil. Possui canal de TVe rádio, editora própria (Graça Editora). Soa-res veicula seus programas em várias emisso-ras atraindo para si um público composto emsua maioria de mulheres, pessoas idosas, debaixa renda e de baixa escolaridade. Sua men-sagem apoia-se na cura divina e os programasde TV trazem inúmeros testemunhos demila­gres e curas, de exorcismoe da teologia daprosperidade. Apesar de ser liberal nos usos ecostumes de santidade pentecostal, não conse-gue atrair muitos jovens. Quem de fato tem umtrabalho voltado para os jovens é a IgrejaApostólica Renascer em Cristo.

4.3 Igreja Apostólica Renascer em Cristo

Com pouco mais de 20 anos de existência aigreja fundada pelo casal Estevam e Sônia Her-nandes, em 1986, já contabiliza 800 igrejas es-

palhadas pelo Brasil, América Latina e Esta-dos Unidos6.

Os líderes da Igreja Apostólica Renascerem Cristo se diferem dos demais líderestanto do neopentecostalismo como os daprimeira e segunda onda do pentecosta-lismo. São de classe média alta,portado­res de curso superior e atividadeprofissional estável. Ele, ex-gerente deMarketing da Xerox do Brasil. Ela, nutri-cionista e ex- proprietária da butique LaBelle FEMME (MARIANO. 2005. p. 101).

A Renascer em Cristo exerce grande influ-encia e atração sobre o público jovem. Em con-sequência, consegue trazer para seus templos,jovens pertencentes a igrejas mais rígidas e sec-tárias. Responsável pela popularização da mú-sica gospel no Brasil possui programação diver-sificada, inclusive transformando seus templos,que logo após os cultos, viram danceterias evan-gélicas, com luzes e fumaça. Também possu-em casas noturnas voltadas para evangélicos,nelas não são servidas bebidas alcoólicas, nemcigarros.

A Renascer em Cristo desenvolve anual-mente inúmeros eventos como as gravações doRenascer Praise, ministério de louvor da igrejaque já lançou 13 CD’s e 7 DVD’s, com desta-que para o álbum gravado em Israel, onde setornou o primeiro grupo musical a fazer umespetáculo em uma arena a céu aberto em Jeru-salém. Nas últimas edições gravadas no está-dio municipal do Pacaembu, em São Paulo, aplateia superou 60 mil pessoas, e contou comuma mega estrutura de som, palco e luz e umimenso coral de 12 mil vozes (http://www.igospel.com.br, acessado em 03.01.2011).

A Renascer é quem promove a “Marchapara Jesus”, evento anual que ocorre em SãoPaulo, reunindo milhares de pes­soas e em vá-rias cidades brasileiras.

A Renascer em Cristo possui igrejas quefuncionam 24 horas, chegando a realizar até 18

6 Dados fornecidos pelo site oficial da Igreja ApostólicaRenascer em Cristo: http://www.igospel.com.br/2009/principal/pg_igrejarenascer.html, acessado em03.01.2011.

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cultos por dia, no templo do centro de São Pau-lo. As contribuições de dízimos e ofertas sãofeitas através de carnês. Existem atividadesvoltadas exclusivamente para o público femi-nino, estas coordenadas pela Bispa Sônia, e ati-vidades que estimulam os relacionamentosamorosos entre os jovens da igreja. É um en-contro especial onde os fiéis solteiros, buscamsua cara-metade. Estes encontros reúne maisde 3 mil pessoas, aos sábados, sob a liderançado Apostolo Estevam Hernandes (ROMEIRO,2005).

Semelhantemente à IURD eà IIGD,a Re-nascer investe pesadamente na mídia, possuin-do rádios e emissoras de TV, uma produtora, aeditora Renascer e um jornal impresso com cir-culação mensal, o Gospel News,além de livrari-as Point Gospel, em cada um de seus templos.

As semelhanças com a IURD não se limi-tam à estrutura de mídia, mas também em es-cândalos e denúncias sobre envolvimentos ilí-citos. Nos últimos anos tem sido um prato cheiopara a grande mídia, principalmente depois doseventos de 2007, que redundaram na prisão docasal, nos Estados Unidos7.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Depois de 100 anos da implantação do pen-tecostalismo no Brasil, o campo religioso pen-tecostal sofreu alterações significativas. Noprimeiro momento caracterizado pela ascesesectária, num segundo pelos movimentos decura divina, e no atual pela centralidade no di-nheiro. É o dinheiro o grande elemento catali-sador da espiritualidade neopentecostal (RO-MEIRO, 2005).

Com o desenvolvimento do pentecostalis-mo o campo religioso brasileiro torna-se com-plexo, plural, conflitivo, poroso e marcado porforte trânsito religioso e extremamente abertoa novas concepções e pensamentos religioso e,em constantes transformações.

Bourdieu (2005) expressa que na pluralida-de de concepções religiosas os atores e institui-ções vivem em eterno conflito pela conquista,manutenção e expansão de seu poder simbóli-co, e que para tanto lançam mão das mais di-

versas estratégias para a conquista da hegemo-nia no campo religioso. Ele assim se expressa:Remontando a Bourdieu (2005, p. 57).

Em função de sua posição na estruturada distribuição do capital de autoridadepropriamente religiosa, as diferentes ins-tâncias religiosas, indivíduos ou institui-ções, podem lançar mão do capital religiosona concorrência pelo monopólio da ges-tão dos bens de salvação e do exercíciolegítimo do poder religioso enquanto po-der de modificar em bases douradoras asrepresentações e as práticas dos leigos,inculcando-lhes um habitus religioso, prin-cípio gerador de todos os pensamentos,percepções e ações, segundo as normasde uma representação religiosa do mun-do natural e sobrenatural, ou seja, objeti-vamente ajustados aos princípios de umavisão política do mundo social .

No mundo onde a capacidade de conferirsignificado à existência do homem ‘perde a cen-tralidade’ e a sociedade é cada vez mais focadano indivíduo e regida pelas leis de mercado(MONTES, 1998), a alternativa por parte dasinstituições religiosas para a atração, conquistae fidelização de membros torna-se altamentediversificadas, ou seja, na luta pela conquistado mercado simbólico pode-se dizer que valetudo.

Uma coisa é certa com a chegada do neo-pentecostalismo todos os segmentos religiososdo Brasil sofreram mudanças e o que se perce-be é que as igrejas protestantes e pentecostaisclássicas e stão adotando elementos do neopen-tecostalismo em suas crenças e práticas, e o quetudo indica, o futuro será neopentecostal. Oque não se pode prever é o tipo de neopente-costalismo que vai prevalecer. Mas, não seránecessário aguardar mais 100 anos para essamudança, ela já está ocorrendo e logo sabere-mos como ela é.

REFERÊNCIAS

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_______. As origens norte-americanas do pente-costalismo brasileiro: observações sobre uma re-lação ainda pouco avaliada. Revista USP, SãoPaulo. Nº 67, 2005. p. 100-115.

FRESTON, Paul. Protestantes e política no Bra-sil: da constituição ao impeachment. Campi-nas, 1993, Tese de doutorado em sociologia,IFCH-Unicamp.

MONTES, Maria Lucia. As figuras do sagra-do: entre o público e o privado. In: SCWAR-CZ, Lilia Moritz (Org.) História da vida privadano Brasil. São Paulo: Cia das Letras, 1998. p.63-171. Vol. 4: Contrastes da intimidade con-temporânea

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ROMEIRO, Paulo. Decepcionados com a Graça:esperanças e frustrações no Brasilneopente­costal. São Paulo: Mundo Cristão,2005.

SANCHIS, Pierre. O campo religioso contem-porâneo no Brasil, in: ORO. Ari Pedro e STEIL.Carlos Alberto (Orgs). Globalização e Religião.Petrópolis: VOZES, 1997.

VINGREN, Ivar. O diário de um pioneiro. 5.ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2000.

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ÍNDICE DE CRIMINALIDADE NO MUNICÍPIO DEESTREITO - MA, ANTES BARRAGEM E PÓS - BARRAGEMSOB A VISÃO CRIMINOLOGICA COM A COMPARAÇÃO

DE TEORIAS CRIMINAIS*.

Márcia Cavalcante de Aguiar1

RESUMO

Este artigo trata das Mudanças no Controle Social em Estreito – MA, com o aumento dacriminalidade. Tendo como propósito alertar as autoridades e a sociedade, sobre o foco do crimeno município, através do crescimento populacional, motivado pela chegada da Usina Hidrelétrica,O artigo tem em vista fornecer algumas conclusões sobre a criminalidade em Estreito - MA,através do método dedutivo e abordagem qualitativa. Método de pesquisa bibliográfico de campocom coleta de dados, através de entrevistas. Chegando a conclusão que faltam investimentos emsegurança pública e orientação comunitária.

Palavras-Chave: Criminologia. Controle Social. Criminalidade. Crescimento Populacional.

ABSTRACT

This article deals with the Social Change in Control in Straits -MA, with the increase incrime. With the intent to alert the authorities and society, the focus on crime in the city, bypopulation growth, driven by the arrival of the Power Plant, the article aims to providesome conclusions about the crime Strait - Ma, on the deductive method is, qualitativeap­proach. Method of literature search field with data collection through interviews.Reaching theconclusion that lack of investment in public safety and community orientation.

Key-words: Criminology. Social Control. Criminality. Population Growth.

1 Bacharelada em Direito pela Faculdade de Educação Santa Terezinha (FEST), Imperatriz – MA. Pós Graduada LatoSensu em Processo Civil, através da Rede de Ensino Luiz Flavio Gomes (REDE LFG – UNIDERP) e PósGraduanda em Sucessão e Família e Direito Constitucional, também pela Rede de Ensino Luiz Flavio Gomes(REDE LFG – UNIDERP).

1 INTRODUÇÃO

Todos os dias a mídia divulga acontecimen-tos criminosos no município de Estreito-MA,estas notícias causam inseguranças aos cida-dãos, onde os mesmos têm a falsa segurança daPolicia em seu exercício de função institucio-nal, pois nota-se que o cidadão não conta maiscom a proteção, “Segurança Pública”. Pois os

próprios policiais afirmam cumpri o métododa legalidade, não possuindo modernidade.

Além das divulgações de aumento de cri-mes tanto no Conselho Tutelar como nasDele­gacias e Fórum do município, observou-se que a comunidade afirma, ao contrário dasautoridades que os “bandidos” são os mesmos,só diversificaram o modo de agir depois da che-gada da hidrelétrica, pois houve o aumento da

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população, vivendo os habitantes em uma in-segurança indubitável.

O método para a aplicação efetiva do crimena visão de Beccaria (2006,p 240) revela que:

Ainda que não possam as leis castigar aintenção, não deixa de ser verdadeiro queuma ação que seja o princípio de um cri-me e que atesta a vontade de cometermereça ser castigada, porem com um cas-tigo mais brando do que o que deveria seaplicar se o crime tivesse se efetivado.Tal castigo é necessário, pois é importan-te prevenir até as tentativas iniciais doscrimes. Contudo como pode existir uminterregno entre a tentativa do crime esua execução, é justo reserva uma penamaior para o crime realizado para deixar,ao que apenas começou o crime, motivosque o impeçam de acabá-lo.

Para Beccaria (2006, p. 267), se as leis fos-sem mais severas, seria difícil o homem quequisesse executar algum crime o levasse maisadiante, seriam difíceis pela diversidade de pe-nas que seriam expostas, fatos esses que hodi-ernamente o Estado tem tido a falta deinte­resse em prepará-las.

2 DAS TEORIAS CRITICAS Á ANALISEDOS CRIMES EM ESTREITO-MA

A Teoria do Labelling Approach nos traz va-rias explicações é com ela que os estudos nosfenômenos delitivos em si deixam de ser cen-trados, e passam a focar a atenção nas açõessociais, é a partir dessa corrente que se começaa organização da sociedade capitalista.

O indivíduo com a etiqueta, criminoso, éuma criação do sistema de repressão penal, aocontrário do que pensa o senso comum, elesnão são simples seres malvados, que andavamlivres sobre a terra até que o Direito os desco-briu e que, desde então, tenta, por meio daspenas, neutralizá-los.

Para o saudoso mestre (LOMBROSO apudSHECAIRA, 2008, p.104-105):

Os criminosos não são produtos de des-cobertas, mas sim entes inventados pelalógica distorcida do sistema penal vigen-

te. Criminoso é aquele a quem, por suaconduta e algo mais, a sociedade conse-guiu atribuir com sucesso o rótulo de cri-minoso. Pode ter havido a conduta con-trária ao Direito penal, mas é apenas comesse “algo mais” que seu praticante setornará efetivamente criminoso. Em ge-ral, esse algo mais é composto por umaespécie de índice de marginalização dosujeito: quanto maior o índice de margi-nalização, maior a probabilidade de eleser dito criminoso.

A Teoria do Labelling mostrou que o tipohabitual de criminoso, seria o pobre e o mise-rável, revela muito pouco sobre a estrutura domal e baseia-se muito, mas, sobre as ideologiasdiscriminatórias e desigualitárias de nossa so-ciedade.

Fazendo essa análise, buscamos focalizar noestudo da criminologia radical investigado porShecaira (2008, p.179), em cotejo com as trans-formações que atualmente vêm ocorrendo nomundo, mais precisamente na cidade de Estreito– MA:

Devido às várias formas de interpretaçõesque se verificam quanto a esse novo fe-nômeno social e político, é certo que nos-sa abordagem se dará baseada em con-ceitos pessoais extraídos de toda fontede informação possível de ser coletada e,logicamente, sempre sabendo que mesmoos livros teóricos e até meros artigos in-formativos têm uma conotação de classee estão, obviamente, transmitindo a for-ma de pensar do autor.

No entendimento da professora criminalis-ta Caldeira (2000, p.63), “essa função do positi-vismo, de levar a um estudo do criminoso, nadamais era do que um desvio de atenções”. Cum-prindo uma função política, o positivismo, comodoutrina, apenas encobria a verdadeira e maiorcausa de delinqüência na sociedade capitalista,que é a injustiça social ocasionada por essa soci-edade dividida em classes.

E nesse contexto que estão todas as ramifi-cações do positivismo criminológico, todas asteorias e correntes, tanto as de cunho estrita-mente biológico como as de cunho social, por-que nenhuma se interes­sava em questionar a

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lei e direcionaram suas atenções para o crimi-noso, ou como um ser anormal ou como al-guém que precise de uma ressocialização, masnunca como um fruto do próprio desajuste dasociedade. Nunca vendo a lei como um produ-to de uma ideologia dominante na sociedade.

Nunca é demais ressaltar que qualquer vi-são numa sociedade dividida em classes seráuma visão de classe, seja da classe explorada,seja da classe dominante, e o investigador cri-minológico não escapa dessa regra.

O objeto real mais geral do sistema de Jus-tiça criminal (além da aparência ideológica eda consciência honesta de seus agentes) é amoralização da classe trabalhadora, através daincultacão de uma legalidade de base: o apren-dizado das regras de propriedade, a disciplinano trabalho produtivo, a estabilidade no em-prego, na família, etc.

A criminologia radical, baseada na doutri-na marxista, age criticando todo o ordenamen-to da sociedade capitalista, fazendo uma análi-se do ponto de vista da classe trabalhadora,criticando a própria lei, por ser este instrumentoda classe dominante e trazendo subsídios im-portantes para uma nova política criminal. Nãohá mais dúvidas quanto o aumento do índicede criminalidade que se estabeleceu na cidadede Estreito – MA, após a construção da barra-gem.

Acerca do exposto, Cirino (1981, p.230):

A criminologia radical não se propõe aanalisar o crime em si, como resultado decircunstâncias próprias, mas sim, criticaro ordenamento e buscar respostas parauma criminalidade tão crescente, de ní-veis altíssimos. Realmente o que maisinteressa é essa epidemia de criminalida-de e não um simples fato considerado emsi mesmo. A criminologia tradicional nes-se sentido Já nos deu grandes contribui-ções, como a vitimologia e a criminologiapositiva sociológica, além de estudos naárea da psiquiatria, esta que também seconfronta com a anti-psiquiatria que trásrazões socais para distúrbios psíquicos atéentão ignorados.

No momento, discutimos e nos posiciona-mos no sentido de buscar reformas jurídicas,

econômicas e sociais capazes de corrigir grada-tivamente todas as de­sigualdades.

[...] A “Criminologia Radical” entendeque não há neutralidade na realidade,contribuição essa que nos faz ver todo oprocesso de estigmatizacão da populaçãomarginalizada e que se estende à classetrabalhadora, como alvo preferencial dosistema punitivo, e que visa criar um te-mor da criminalização e da prisão paramanter a estabilidade da produção e daordem social. Por tudo isso e por toda avisão de classe que a “Criminologia Ra-dical” trouxe [...], ela não pode ser consi-derada ineficaz e continua sendo o únicomeio em que a classe inferior, no capita-lismo, se posiciona de forma crítica dianteda situação humilhante em que se encon-tra. As periferias proliferam ladeadas pelamarginalidade, aumento de consumo deálcool e a criminalidade. (SANTOS, 1981,p. 68)

Até três anos atrás no município de Estrei-to não se via mendigos nas ruas. Um passeio narodoviária local indica a alteração dessa reali-dade. Noticia dada por moradores que vivemem estreito desde sua fundação.

O aumento da criminalidade nos dias atu-ais tem tidos proporções verda­deiramente alar-mantes, provocando relevante interesse pelaCriminologia, que era a bem dizer uma ciênciacircunscrita ao domínio dos especialistas.

Principalmente depois da II Guerra Mun-dial, com maior explosão da violência, ora naforma primária de eliminação brutal, ora comrequintes de perversidade friamente manifes-tados, a preocupação com o crime tornou-seum estado de espírito generalizado, porque to-dos estão inquietos, para não dizer amedronta-do. Não é um problema apenas dos grandescentros urbanos, pois também há violência ecrime nas zonas rurais e menos populosas.

Conforme chega o progresso ocorrem àsalterações nas estruturas sócio-econômicas decada sociedade, sociedade esta que se destinaao consumo e ao dinheiro como um padrãosocial aceito. Caminhamos no sentido de umasociedade desregrada e com profundo despre-zo pela vida humana e pelos valores antes cre-

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ditados, como educação, respeito, o trabalho,caridade, religião, este fenômeno introduz osjovens no mundo da delinqüência e do desvio;vez que de uma maneira geral, os jovens co-muns aprendem cedo pensar em si em termosde futuro. Como sucede em outras pessoas, elesquerem ser alguém, porém esta busca desre-grada pelo ter pode atropelar fases vitais para ocrescimento e que se mostram indispensável àformação do indivíduo ainda em desenvolvi-mento.

O direito à vida é o mais elementar e abso-luto dos direitos, implica em viver com digni-dade, um valor fundamental de todo ser huma-no em qualquer idade; sendo que a dignidade éa base para o respeito próprio, adquirido atra-vés de desenvolvimento saudável que ocorrerásendo respeitado todas as fases da infância eadolescência para chegar-se a uma vida adultasaudável, no âmbito psicológico e moral; essadignidade será preservada no momento em quea família assumir seu real papel na educação epreservação de seus filhos, dando-lhes basesconcretas em que se espelhem, oferecendoamor, respeito, mas também mostrando o cer-to e o errado, cumprindo adequadamente asfunções de pais e preparadores para a vida; in-dependente de situação econômica, suprindo anecessidade de um modelo a ser seguido, mo-delo participativo que dá uma idéia de valor aser desenvolvido, base esta que tem uma co-responsabilidade entre família, sociedade eEstado na proteção de nossas crianças e adoles-centes.

Tomemos para uma análise a história de “osmiseráveis”, que foi uma adaptação literáriade Victor Hugo (2005) É uma narração de cará-ter social em que o misticismo, a fantasia e adenúncia das injustiças formam uma tramacomplexa e muito comovente, que mostra a tra-jetória de um menino pobre e que se torna umhomem estigmatizado por ter cometido umdelito, mas que consegue ao seu modo lutarcontra o preconceito. Os miseráveis são os ex-cluídos, os descamisa­dos, os marginalizados.Isso diz respeito ao título da obra, porém o for-te de seu conteúdo é o preconceito e em outromomento o altruísmo do personagem reforma-dor social que ele é. que são os miseráveis,

Chamamos de “Miserável” quem é Rico e nãoajuda aos outros e dizemos que alguém é Mi-serável quando é pobre e se lamenta de viver namiséria sem nada fazer para sair dela. Como-vente Jean Valjean e Javert se confrontam. Nessahora, Javert pergunta a Jean o motivo pelo qualele não o matou sendo que teve oportunidades.Jean simplesmente responde que não tinha di-reito de matá-lo e de que apesar de ter sido per-seguido durante anos não tinha raiva dele. Issodeixou Javert com um peso na consciência efez com que pela primeira vez infringisse a lei eter tido piedade, pois libertou Jean e logo emseguida se matou.

Isso mostra que as leis daquela época erambem rígidas e que toda essa situação pode sercomparada, de certa forma, com os dias atuaisno Brasil em que um pobre ao roubar um potede manteiga é preso, mas um rico ou políticoao roubar ou desviar uma grande quan­ti­dadede dinheiro é no máximo cassado ou se é preso,logo é solto por ter condi­ções de pagar fiançaou conseguir um bom advogado.

Mas na verdade, a pergunta é: O que se pas-sou na cabeça de Javert em querer se matar logodepois que libertou Valjean? Será que ele sofre-ria algo com a justiça? Ou sim­plesmente eravergonha de mostrar o seu fracasso para as pes-soas?

A resposta correta para esta cena é que adignidade dele já não existiria a partir do mo-mento que ele desrespeitasse a lei, não teriamais sentido viver, não teria mais honra, comisso preferiu se matar para não levar consigo ador de ter fracassado. Demonstra o pensamen-to daquela época em que muitas pessoas mor-reram em nome da liberdade e da democracia,reivindicando a república. Nada tão diferentenos dias atuais e especificamente em Estreito-MA, onde a população grita por justiça, onde adignidade da população esta sem as devidasperspectiva de Segurança. Levando alguns atéa morte por falta da tão sonhada Democracia.

Para Lombroso (apud SHECAIRA, 2008,p. 101-102), “Um ex-recluso é, normalmente,um cidadão estigmatizado pelo seu passado,com grandes dificuldades de reinserção. Por suavez, a pena corretiva tem como principal as-pecto a correção da índole, da moral do delin-

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qüente, tornando-o apto ao convívio social. Asinstituições totais levam o indivíduo ao anoni-mato, à despersonaliza­ção do “eu”, Cabe àprisão “guardar” os criminosos para proteger asociedade”. A recuperação dos condenados érequisito fundamental para demarcar para sechegar o mais próximo possível dos ob­jetivosda pena – o sistema penitenciário de Estreitodeve adotar políticas que valorizem o trabalhoprisional, a assistência educacional formal eprofissionalizante, o esporte, o lazer, o contatocom o mundo exterior, além de assegurar osdireitos humanos de cada cidadão e o individu-alizar como ser militante de sua sociedade.

A sociedade de Estreito-MA, vive hodier-namente momentos de desenvolvimentos emvários setores, em especial o econômico, fatoemergente devida à construção da Usina Hi-drelétrica, propiciando o aumento de pessoasde vários lugares, de classes diferentes, algu-mas (ou a maioria) com o intuito de buscarmelhores condições, financeiramente, porémhá outras que nada conseguem, mas perambu-lam pela urbe se envolvendo com delitos e ou-tras com o propósito de praticar vários crimes.Para uma cidade que antes tinha seu índice decriminalidade bem reduzido, comparado aoatual, assusta aos moradores que declaram avisibilidade da mudança no as­pecto crimino-lógico.

A carência estrutural, a falta de mecanis-mos suficientes para extirpar os desviantes, istoé, àqueles que fogem do padrão dito como nor-mal, é o que se vivencia no município. Os jo-vens em sua maioria, não buscam uma condutapadronizada pela sociedade, se envolvem comoutros, surgindo uma cultura própria, gruposformados com o fim de cometer delitos, orapelo gosto da maldade, ora como meio de seobter lucro, como o tráfico de drogas, os queatentam para o patrimônio.

Destarte colaciona-se que há muitos fato-res ou teorias a fim de explicarem o surgimen-to de delitos cometidos, em sua maioria, poradolescentes, jovens que se associam por meiode grupos, com o propósito de praticar atosdesaprovados pela sociedade. É óbvio que acidade de Estreito-MA, possui em sua grandemaio­ria, uma população carente, desprovidas

de oportunidades em sentido educacional, amente da sociedade do município deve ser edu-cada, ademais as condições sócio-econômicascontribuem no mínimo para o surgimento do“delinqüente.”.

Importante ressaltar, que em Estreito-MA,a criminalidade assola o bem estar da socieda-de ficando assim a mercê da sorte e reféns docrime. Para um município que outrora gozavade certa tranqüilidade, e onde o seu patrimônionão era tão cobiçado, atualmente pelo enormefluxo de pessoas pela urbe, o crime tem aumen-tado e os jovens estão cada vez mais praticantesde delitos.

A teoria de Wolfgang e Ferracuti (1967),Teoria da Subcultura Delinqüente baseia-se nateoria de Merton e destina-se à explicação dadelinqüência juvenil:

O bando delinqüente surge como resul-tado da estrutura das classes sociais. Aconduta desses grupos é um produto desoluções coletivas dos problemas de sta-tus, necessidades e frustrações que sofremas classes baixas num mundo de valorese virtudes predominantes da classe mé-dia, como a ambição, a autoconfi­ança, orespeito à prosperidade, oposição à vio-lência, protelação de satisfações imedia-tas. O jovem da classe baixa rejeita osvalores da classe dominante porque nãointegram o seu mundo. A formulação dobando é uma conseqüência natural paraos jovens de classe baixa, que se reúnempor seus sentimentos comuns de hostili-dade. (COHEN, 1955, p.28.)

Trazendo para o século XXI, analisandocom a criminalidade de Estreito a Teoria daSubcultura estudada por Shecaira (2008, p. 250-252), diz que a desigualdade social é uma dascausas da delinqüência; “as sociedades maisdesiguais, não as mais pobres, são as mais cri-minógenas. O delito é uma forma de reaçãofrente à injustiça e a marginalização política eeconômica”.

Percebe-se através de grupos como as gan-gues, associações formadas por jovens, com suaspróprias ideologias ou cultura, como o termosubcultura, uma cultura dentro de outra cultu-ra, e no mu­nicípio em caso, não é diferente há

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gru­pos formados para praticar atos crimino-sos, demarcam áreas de atuação, como é o casodas conhecidas “boca de fumo”, intimidam osmoradores, transgridem as normas jurídicas,demonstrando que o Poder Público é ineficaze sem resposta.

2.1 Do embasamento sob o foco da crimina-lidade em Estreito-MA, tendo como baseentrevistas in loco, com autoridades com-petentes

Em visita ao Décimo-Segundo Batalhão,conversamos com o tenente-coronel Arquime-des Silva Brito, o mesmo nos relatou que foipromovido há pouco tempo, porém segundo oque já pode vivenciar sobre a criminalidadeem Estreito, diz tratar-se de um assunto bas-tante polêmico e que ainda precisar ser bemdisciplinado.

Disse-nos que não saberia precisar ao certoo índice de criminalidade antes e pós barra-gem, porém nos garantiu empiricamente que oaumento do crime se alastrou sim, com a che-gada da hidrelétrica, posto com a influência danecessidade financeira, surgindo às aglomera-ções.

Foi-lhe perguntado de que forma o crime éabordado pela Policia no Município de Estrei-to? Quais os métodos são utilizados? Existemprincipais diferenças em cada abordagem?

Acredito que o Delegado aborda o crimede forma investi­gativa/repressiva e nós Poli-ciais Militares abordamos de forma preventi-va e ou repressiva, quanto às diferenças de cadaabordagem, elas são auto explicativas.

Com o seu conhecimento existem al­gumas ca-racterísticas do crime em Estreito?

Ø Para a existência do crime é necessárioque haja um agente cau­sador, a ação ou omis-são humana, sendo esta típica, descrita em leicomo sendo infração penal. Como também sóhaverá crime, se o fato for antijurídico, punívele culpável.

Em uma visão criminológica, para o senhor,quem é considerado criminoso no município deEstreito?

Ø Existem vários tipos de criminosos, nomunicípio tais como:

a. Criminosos impetuosos; são aqueles quecometem crimes por impulso emotivo;

b. Criminosos ocasionais; são aqueles quedecorrem da influencia do meio;

c. Criminosos habituais; são os considera-dos profissionais do crime;

d. Criminosos fronteiriços; são os que seenquadram entre a doença mental e os indiví-duos normais;

e. Loucos criminosos; possuem doençamental, possuem alteração qualitativa das fun-ções psíquicas.

Em Estreito já existe um crime tido como prin-cipal?

Ø Diante das nossas análises estatísticas,temos como principal prática na cidade de Es-treito-MA, o tráfico e o consumo de drogas.

Atualmente já se pode definir a explicação parao cometimento de crimes em Estreito?

Ø Hoje podemos definir como fator deter-minante o uso e o tráfico de drogas, pois essaprática é tida como principal motivadora, paracometimentos de muitas outras infrações pe-nais ou crimes propriamente ditos.

Como você adéqua os fatores que levam à ocorrên-cia dos Filtros da Notitia Criminis em Estreito?

Ø Partindo-se do princípio que todo crimemerece investigação, acredita-se que em Estrei-to a notitia criminis, acontece de forma espon-tânea, direta e imediata, estando a autoridadepolicial em pleno exercício de suas atividadesprofissionais.

Tradicionalmente, como os Policiais vêm lidan-do com o problema criminal no Estreito?

Ø Dentro da nossa observação como poli-cia administrativa e não judiciária, diríamosque é feito um controle da criminalidade atra-vés de investigações de denuncias de crimes,autuações em flagrante delito de criminosos etermos circunstanciados de ocorrência (TCO).

Em seu oficio diário quais os delitos que mere-cem atenção em razão da maior ou menor incidên-cia na cidade de Estreito?

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Ø Veja só, quando se trata de crime, acredi-tamos que todos merecem ser tratados comatenção, pois sempre a vítima é uma pessoa equalquer delito, mesmo que seja pouco ofensi-vo, pode dar origem a um crime mais ofensivo,como por exemplo, um homicídio, onde a víti-ma ou o acusado pode pagar com a vida.

Na questão dos direitos humanos cometidos porcriminosos na cidade de Estreito-Ma o que dizer desua violação?

Ø Acredito que as autoridades processan-tes, deveriam tratar com mais rigor e punir deforma exemplar criminoso contumaz.

Policiais são naturalmente interessados na ma-neira que a lei é aplicada? Que medidas e sistemasexistem para assegurar o cumprimento das leis emEstreito-MA?

Ø Procuramos dentro das nossas responsa-bilidades no campo da segurança pública, exe-cutar o policiamento ostensivo na rua em ron-das ostensivas, viaturas caracterizadas, policiaisarmados, fiscalizando e dissuadindo ações deindivíduos nocivos para a sociedade, como pre-coniza a Técnica Policial Militar, praticada emnosso país.

Na 1.ª Vara Criminal da Comarca de Es-treito, conversamos com Juiz Titular Dr. Gil-mar Everton, onde o mesmo nos relatou quesão muitos os crimes depois da chegada da hi-drelétrica, a maioria homicídios e trafico dedrogas.

Porém, segundo o MM. Juiz, mesmo o cri-me tendo aumentado em Estreito com a chega-da da barragem o “Estado” já deixa há muitotempo à região desprovida de instrumentos deapoio voltados para o cumprimento das penasou medidas impostas para se prevenir o crimee se cumprir à lei, estando mergulhado no es-quecimento.

Para a Vossa Excelência, quais são as caracterís-ticas do crime?

Ø Abstraindo-nos do pragmatismo encar-tado pela dogmática penal, penso que o crimese caracteriza por configurar conduta pratica-da por qualquer pessoa que contraria ou lesa,

antes de tudo, o direito ou interesse, seja de ummembro da comunidade considerado particu-larmente, seja interesse da coletividade comoum todo.

Na visão criminológica, para a Vossa Excelên-cia, quem é o criminoso?

Ø Os criminosos são em tese todos nós quan-do, consciente ou inconscientemente, comete-mos condutas típicas e antijurídicas.

Sobre o índice de Criminalidade hoje em Estrei-to, vossa excelência tem dados no sistema de distri-buição do fó­rum de sua comarca?

Ø A resposta a ser obtida no sistema de dis-tribuição do fórum, contudo, percebe-se quehouve um natural aumento da criminalidadenesta comarca de 2009 a 2011.

Atualmente tem como definir a explicação parao cometimento de crimes em Estreito?

Ø Para o cometimento não, mas para o seuaumento sim, basta que levemos em conside-ração que de 2006 para 2009 a população deestreito incorporou no seu contingente popula-cional cerca de mais de 10 mil pessoas das maisdiferentes regiões e classes sociais, além de cen-tenas ou milhares de pessoas que, não conse-guindo emprego, perambulam e permanecemna cidade potencializando o cometimento decrimes.

Vossa Excelência acha que a po­breza e a desor-ganização social são fatores fundamentais para osurgimento de um individuo “delinqüente”?

Ø Penso que estudos estatísticos sobre essaquestão já existem a demonstrar e provar quese tais fatores não são determinantes para omaior ou menor cometimento de crimes, pen-so que, no mínimo, contribuem para sua maiorocorrência.

Tradicionalmente, como o Judiciário vem li-dando com os problemas criminais?

Ø Apenas como fatos do mundo, da vida, aserem identificados os seus atores ou autores,colhidas provas para viabilizar a punição – ovelho modelo de que para todo crime um casti-go, preferencialmente com ergastulamento cau-

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telar, ou seja, a prisão se coloca como pressu-posto da elucidação ou resolução do crime aosolhos e como exigido pela sociedade até hoje.

Vossa Excelência concorda com os Programasde prevenção ao Crime de Orientação Comunitá-ria?

Ø Sim, desde que como mais um mecanis-mo ou elemento estruturante de um, entre tan-tos outros meios e formas de se buscar a pacifi-cação social num interagir que nasça e estejasob o controle e responsabilidade dos que nelainteragem, ou seja, no contexto físico, demo-gráfico ou territorial e cultural da comunida-de.

O Meritíssimo concorda que o alto índice decriminalidade, em nossos dias, deve-se basicamenteàs péssimas condições de vida da maioria dos brasi-leiros? Existiriam então, aspectos negativos e prin-cipalmente positivos para isso?

Ø Certamente que as condições socioeco-nômicas da população em muito contribui parao alto e sempre crescente índice de criminali-dade em nosso país, sendo que um maior de-senvolvimento do país como um todo, isto é,com divisão da renda e redução das desigual-dades sociais, possivelmente contribuiriampara, de algum modo, reduzir a criminalidade.

Hodiernamente vivenciamos vários tipos de cri-me, quais os delitos que vossa excelência acha quemerecem atenção em razão da maior ou menor in-cidência em Estreito?

Ø Os contra o patrimônio e contra os costu-mes ou liberdade ou dignidade sexual.

Qual a sua opinião sobre as violações de direitoshumanos cometidos por criminosos?

Ø São meros reflexos de uma sociedadedoente, onde o estado não consegue preparar eidentificar, no contexto ou interior de sua es-trutura, aqueles que estão mais aptos a exerce-rem atividades que se revestem de poder.

Sobre o cumprimento e às proibições e limi-tações previstas nos instrumentos internacionais,é um dos elementos do trabalho policial eficaz.Talvez o trata­mento do tema fosse menos críticose a polícia tivesse uma visão mais positiva de

direitos humanos e se os instrumentos legais ex-pressassem mais que somente uma série de limi-tações e proibições na ação policial.

Creio que a grande maioria dos nos­sos po-liciais até desconhecem ou ignorem tais nor-mas, o certo é que para termos policiais aptos ecapazes de prevenir e, se necessário, reprimirpara evitar a ocorrência de crimes, faz-se ne-cessário reeducá-los, o problema não esta nes-te ou naquele método, mas sim na falta de inte-resse do estado em prepará-los, o resto é meroacademicismo.

Os policiais são naturalmente interessados namaneira que a lei é aplicada. Que medidas e siste-mas existem para assegurar o cumprimento das leisem Es­treito?

Ø Pronto, eis a questão insolúvel entre oque esta, teoricamente concebido legal e nor-mativamente, e aquilo que o estado permite epossibilita se efetivar no plano concreto e realdo mundo da vida, portanto, não preciso res-ponder, Estreito é como a grande maioria dosmunicípios e comarcas desprovidos de instru-mentos ou estruturas de apoio voltadas para ocumprimento das penas ou medidas impostascomo também para se prevenir os crimes e secumprir à lei, senão aqueles tradicionais compouca efetividade no aspecto preventivo.

As entrevistas das autoridades tanto na Po-licia Civil como no Judiciário têm o mesmopensamento, onde esclarece que devem fazerparte de qualquer estratégia de combate contraa criminalidade em Estreito a parceria entrepopulação e autoridades. Logo após a entrevis-ta, o comandante nos relatou que gostaria defazer com que a cidade de Estreito voltasse aoestado “a quo” da antiga cidade pacata onde omesmo ouviu comentários de como era, antesde chegar ao município, já o juiz disse também,antes e depois da entrevista que as autoridadesdeveriam planejar cuidadosamente qual a metaa ser alcançada e identificar o tipo de crimino-sos que estariam coagindo a população, tiran-do o sossego de vitimas indefesas do municí-pio, onde deveriam ser criadas políticaspublicas para o combate contra os crimes, egostaria que sua entrevista ajudasse a popula-ção estreitensse a ter confiança e prudência

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quando coagidas em seu direito garantido pelaConstituição Federal e buscar a paz quando amesma for violada.

3 CONCLUSÃO

Através dos estudos realizados e das pes-quisas em loco, observou-se que a violência nãose justifica como resposta, com a chegada daBarragem, pois na visão criminologica, o con-trole do crime aumentou sim, com a motiva-ção da economia onde gerou a desorganizaçãosocial em Estreito. Sugere-se a necessidade dereformas profundas no controle social.

Porém, é necessário e relevante à aplicaçãode uma política de segurança pública voltadapara a juventude pobre, que é a mais fraca ecarente, e a mais fácil de ser manipulada pelossujeitos criminosos.

Diante do que foi estudado e pes­quisado,foi nítida a observação sobre a política de segu-rança pública, pois a mesma ainda deve com-bater a corrupção nas suas variadas modalida-des: preparo de um salário digno, reformas nosistema policial, fiscalização e combate aomercado ilegal de armas, sobretudo ao contra-bando que é praticado nas nossas fronteiras;não é demais frisar que as indústrias de armasrealizam vendas sem o devido controle, logo,lucram com a criminalidade, programar políti-

cas integradas, como casa/escola/comunida-de, urbanizar as comunidades visando à redu-ção do isolamento. Os Estreitenses gritam porsocorro e clamam pela Segurança Jurídica.

REFERÊNCIAS

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PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO ABIENTAL EM ÁREA COMCARÊNCIA DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO BÁSICO:

O CAFÉ LIBERAL

Ducilene Melo da Silva1

RESUMO

Comunicação da pesquisa sobre práticas ambientais no Café Liberal em Icoaraci (PA) apresentacausas e conseqüências do morar e viver em áreas de baixadas. Os dados de campo mostraram quea urbanização desordenada nos espaços alagados e insalu­bres implica no agravamento dosproblemas ambientais e de saúde pública pelo uso inadequado dos recursos hídricos para o consumohumano. Adotou-se pesquisa docu­mental, observação direta e entrevista estruturada, consultando20 pessoas, com método de análise de conteúdo para compreensão dos sentidos principais dasfalas dos infor­mantes.

Palavras-chave: Educação Ambiental. Recursos Hídricos. Saúde pública.

ABSTRACT

Communication of research  about environmental practices in the Cafe Liberal Icoaraci (PA)present   causes and consequences of living and live in areas of lowlands. Field data showed thatgrowing urbanization in the flooded areas and unhealthy implies the worsening environmentalproblems and public health from improper use of water resour­ces for human consumption. Adopted document research, direct observation and struc­tured interview, referring 20 people,with the method of content analysis to understand the meaning of speech principal informants.

Key-words: Environmental Education. Water Resources. Public health

1 Socióloga; Mestre em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável; Especialista em Edu-cação Ambiental e Conservação de Recursos Hídricos. Atua como professora na graduação e pós-graduação; assessora do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão na Faculdade de Educação SantaTerezinha - FEST. E-mail: [email protected]

2 Áreas constituídas por terras cujas curvas de nível não ultrapassem a cota “4”; e com impossibilidadede implantação de sistema de água potável, esgotos sanitários e de coleta de lixo (RODRIGUES,1995). Ou seja, constata-se a carência e precariedade das condições de vida da população residentenas áreas de baixada.

3 O DAICO surgiu através da Lei 7.682/94 onde o município foi subdividido em 8 Distritos (Belém,Bengui, Entroncamento, Guamá, Icoaraci, Mosqueiro, Outeiro e Sacramenta).

1 INTRODUÇÃO

O adensamento populacional denominadode Café Liberal está localizado numa área debaixada2, no bairro do Parque Guajará, Distri-

to Administrativo de Icoaraci3 no Estado doPará, às adjacências da Rodovia Augusto Mon-tenegro e às proximidades da fábrica de bene-ficiamento de café, designada pelo mesmonome – Café Liberal. Desprovida de asfalto e

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com ruas indefinidas, casas de madeira(pala­fitas em maioria), e outras com parte detijolo e “ornamentos” diversos (lona, zinco)contem­plam a arquitetura de ausência de in-fra-estrutura urbana. Em geral, as residênciassão pequenas e dispõem-se uma ao lado da ou-tra, separadas por cercas, ficando o espaço do-méstico sem privações, expan­dindo-se para oambiente público as ativi­dades como lavarlouças, roupas e asseio pessoal. Não há coletade lixo e o resíduo destina-se a queima no quin-tal e/ou na frente do imóvel, quando não, ficaexposto a céu aberto.

No período de chuva - dezembro a abril -os transeuntes trafegam em estivas em cursosestreitos e na estiagem o espaço de maior di-mensão é dividido entre as crianças no momen-to de lazer. Na comunidade, os serviços de aten-dimento são insuficientes e precários. Emrelação à saúde, no Café Liberal as pessoas têmapenas o atendimento dos agentes comunitáriosdo Programa Família Saudável. Quanto a redede ensino municipal esta dispõe a educação in-fantil e o ensino fundamental às pessoas, reme-tendo a população local a procurar áreas maisdistantes para a complementação escolar.

Em termos de transações comerciais e con-siderando a dimensão geográfica do lugar, queé incipiente, o movimento aglutina-se em tor-no dos pequenos estabelecimentos comerciais– tabernas (frango, verduras) – que servem àpopulação local e adjacências remetendo às ca-racterísticas do mercado informal e dos rega-tões. As pessoas não dispõem de uma rede desupermercado ou de feira livre, tampouco umaassociação comunitária para reduzir os custose melhorar a forma de acesso aos alimentos.

No que se refere ao lazer, a área é desprovi-da de praças, quadras, parques, mas os mora-dores organizam os ínfimos espaços da rua paratrafegarem e descontraírem com as brincadei-ras das crianças – jogo de bola.

Essa segregação social (RIBEIRO, 2002;MARQUES, 1997) caracteriza práticas políti-cas de saneamento em Belém por meio das quaispriorizam-se as melhorias dos equipamentosurbanos destinadas às áreas de imóveis de mai-or valor econômico, em detrimento das drena-gens de igarapés como um recurso de produ-

ção e ampliação do espaço. Outro fator que cor-robora para isso é a combinação do aumentopopulacional com as regras do sistema capita-lista adotado (RODRIGUES, 1996; VANDIJK; FIGUEIREDO, 1997) e estas interfe-rem na velocidade e no tipo de transformaçãoda cidade. Com isso, se esgota a disponibilida-de das terras altas, sobrando as áreas de baixa-das para as pessoas de menor poder aquisitivo.

Neste estudo objetivou-se avaliar as condi-ções em que se encontram essas pessoas atravésda busca de informações acerca do abasteci-mento e do uso da água na área do Café Libe-ral, tendo em vista a necessidade de orienta-ções educativas com a finalidade de preservaçãodos recursos naturais, prevenção de doenças emelhoria de qualidade de vida. Logo, tomou-se as famílias investigadas como “um objeto,cujo estímulo reage através da intenção do su-jeito e de seus atos pela percepção, pelo com-portamento nas relações com espaço-tempo-ral”, tal como preceituam Thinès e Lempereur(1984, p. 833-834). Procurou-se também aten-tar para a posição social dos diferentes atoresda comunidade analisada.

A pesquisa envolveu levantamento docu-mental, observação direta e entrevista semi-diretiva. Para a entrada no campo, seguiu-se asorientações de Alves-Mazzotti e Gewandszna-jder (2001), identificando a hierarquia vigentenas relações sociais do local e, procurando con-quistar a confiança das pessoas participantesdas instituições que foram consultadas, a sa-ber, Secretaria Municipal de CoordenaçãoGeral do Planejamento e Gestão (SEGEP),Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Uni-versidade Federal do Pará (NAEA/UFPA),com a finalidade de identificar e compreendera área selecionada para o estudo.

Os dados tiveram tratamento estatís­tico einterpretativo, com base na análise de conteú-do, conforme indicam Rodrigues e Leopardi(1999). A sistematização quantitativa apoiou-se na estatística descritiva; quanto à análise deconteúdo, escolhida dentre as técnicas possí-veis, optou-se pela análise temática para des-vendar os sentidos principais das falas dos in-formantes. Foram entrevistadas 20 pessoas,entre elas homens e mulheres.

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Nesse universo da pesquisa obser­vou-seque a migração é uma constante na vida da po-pulação. O baixo nível de renda e de escolari-dade, somados ao tipo de família – extensa –,caracterizam o quadro para a busca de melho-ria de vida. Os moradores, em maioria, estãoabaixo da escala de renda mínima. A maior percapita não ultrapassa R$ 80,00 e a menor pro-cura dá conta de garantir a sobrevivência de 08pessoas com R$ 10,00. A desnutrição familiara partir desses dados, não responde ao statusque a urbanização requer. Migrar nessas con-dições significa estabelecer um pacto com amorte em plena época de discussão de desen-volvimento sustentável. Evidências de mudan-ça mesmo no Estado para melhoras econômi-cas, comparada ao local de origem, frustram ocontexto atual.

Nas informações coletadas sobre o contex-to migratório, as respostas confirmam a predo-minância de paraenses do interior do Estado(65%) e de maranhenses (25%) e o restante compouca significância entre, baianos e amapaen-ses (10%).

Os dados sobre o tempo de moradia doshabitantes visitados na área do Café Liberalcorroboram com a época da expansão das ocu-pações urbanas na região, tendo em vista quemuitos estabeleceram-se nesta área a partir dasdécadas de 1960 e 1970, período de intensamigração incentivado pelas políticas de desen-volvimento da região que não garantiram aosindivíduos as moradias e empregos tão almeja-dos, e sim, aumentando os problemas ambien-tais.

No que se refere à educação, a populaçãodo Café Liberal tem acesso nas proximidades auma escola de ensino infantil e fundamental darede municipal. Entretanto, a continuidade dosestudos nas séries do ensino médio é prejudica-da pela distância da escola e deficiência de trans-porte, além da questão da violência e falta derecurso financeiro para o pagamento da passa-gem de ônibus. Desse modo, com a falta deinstrução os indivíduos não conseguem melho-res empregos, corroborando para o inchaço dosetor informal.

Entre as mulheres predomina a atividadenão remunerada (dona de casa). A informali-

dade soma 7 delas, estando as demais comoassalariadas (2) e 1 desempregada. Quanto aoshomens, comparando a situação do sexo femi-nino sobre o trabalho informal, há maior parti-cipação nesse segmento do mercado (11). En-tre os 16 casos encontrados, tendo o homemcomo chefe de família, 3 percebem salários e 2estão sem atividade. Somam-se à questão soci-al, o fato de na educação de adultos, 3 indiví-duos do sexo masculino têm o ensino médioincompleto. Diferente das mulheres que pre-dominam na educação fundamental (14). Asfamílias entrevistadas apresentam, em ambosos sexos, baixo número nas situações de ler omundo com os olhos e não com as letras parainterpretar a realidade em sua volta num ângu-lo maior e isso demanda ação integrada do Es-tado e do Município para romper permeiamtodos os âmbitos do globo terrestre.

O texto está construído em duas partes. Naprimeira, levanta-se a problemática sobre a te-mática em questão, des­revendo o processo deurbanização desordenado e o crescimento de-mográfico em Belém do Pará. Por fim, concluicom as interpretações dadas pelos atores soci-ais, procurando contemplar a prática da educa-ção ambiental numa área com carência de ser-viços de saneamento básico.

2 PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO AMBIEN-TAL EM ÁREA COM CARÊNCIA DOSSERVI­ÇOS DE SANEAMENTO BÁSI-CO: O CAFÉ LIBERAL

O aumento demográfico acirrou o processode urbanização desordenada no município deBelém. A população de baixa renda geralmen-te está concentrada em áreas às margens de iga-rapés e canais, como tam­bém em locais ondehá depósito de lixo e terrenos alagados. Dessaforma, as habita­ções, sem infra-estrutura ur-bana, sem sa­neamento básico (água, esgoto,coleta e acondicionamento de resíduos sólidos)e drenagem se aglomeram nas áreas perifé­ricase de baixadas da cidade (GASPAR, 2001).

Na área do Café Liberal, as mora­dias sãolimitadas a acabamentos rústicos o que contri-bui para a incidência de doen­ças, principal-mente no período de chuva em que as casas, de

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piso com terra batida e com contrapiso de ma-deira, ficam mais úmidas compondo 35% dashabitações; e as demais contemplam a realida-de de po­breza e miséria, mas com material deconstrução de melhor valor totalizando 65%desse contexto social.

A ocupação desordenada do espaço urbanodo Café Liberal induz a expansão para a áreade baixada (alagada) resul­tando em bolsões demisérias e esqueci­mento conforme relatos detécnicos e de moradores que, segundo eles:

A requente mora em casa de alvena­riasem acabamento, contendo 5 cômodoscobertos de telha brasilit, piso de cimento(aguado). Em relação à água e luz nãosão regularizados – poço amazônico – e ainstalação sanitária é inadequada (não háfossa) (Técnica Silva).

Quando começou a invasão era muitofeio. Aqui era um morro. Era tão alto enão tinha quase casa. Não tinha nada. Aía gente enchergava lá em cima, a garagemicoaraciense. Agora não enchergo porqueeles fizeram um muro, e também porqueveio a patrola e aí terminou a parte alta.Agora é tudo baixo (D. Célia).

As falas retratam as diferenças soci­ais nomesmo espaço físico, mostrando ora o passa-do, ora o presente, demonstrando que a cons-trução contrapõe-se às intempéries climáticase de vegetação, com característica de traçoshumildes. Nesse tipo de construção, o tempoignora o presente e o futuro na construção civilde casas compostas em sua maioria de materialargiloso (70%) e as demais de madeiras (30%)representando um certo grau de degradaçãoambiental em um dado lugar na região.

As 20 unidades familiares, que constituemo foco central do estudo, encontram-se com si-tuação domiciliar precária em relação a divi-são do espaço ambiente para congregar toda afamília. Destas, somando os percentuais, 85%apresentam menor número de compartimen-tos, fato que revela a inadequação do espaçodomiciliar para atender as necessidades cotidi-anas das pessoas. Isso implica em falta de pri-vacidade, pois estende para a vida pública osatos domésticos – lavatório, ba­nheiro, cozinha.

Ao estabelecer uma relação entre a reduçãodo número de cômodos e conseqüentementedo tamanho dos domicílios com o avanço ur-bano das áreas centrais para as periféricas, tra-duz-se a dinâmica do espaço físico e da ausên-cia de serviços para sustentar a demandapopulacional em suas necessidades básicas den-tre elas, a moradia de qualidade.

Nesse contexto, a infra-estrutura da área doCafé Liberal não corresponde aos avanços damodernidade quanto ao sistema de esgoto sani-tário. A maior parte da população (65%) lançaseus dejetos em fossa negra de pequena profun-didade de forma inadequada, sem a menor pre-ocupação com o solo, prejudicando o lençolfreático, ou em escavações abertas no fundo dasmoradias. Isso expressa a neces­sidade de edu-cação sanitária, no que diz respeito, a contami-nação de cursos d’água adjacentes, uma vez queo líquido orgânico escoa para os igarapés maispróximos.

Outro risco ambiental e de saúde pública éa localização dos banheiros e fossas que nãorespeitam as normas sanitárias de uma distân-cia de aproximadamente 15 metros da capta-ção do local de água (poço do tipo amazônicoou torneiras comunitárias).

A situação é alarmante quando o banheirofica em solo alagado, próximo ao lixo e mato e,com proteção de restos de material deteriora-do. Esse cenário reforça ainda mais a necessi-dade de técnicos capacitados para atuarem naárea de ocupação e solucionar a questão de es-gotos sanitários por meio da construção de fos-sas sépticas interligadas a tubulações e destina-ção segura.

Como não há coleta seletiva dos re­síduossólidos na parte “baixa” da área do Café Libe-ral, devido à presença de ruas estreitas e indefi-nidas, além de mato corroborando para a ma-nifestação de roedores, moscas e outros insetos,o lixo domiciliar fica exposto a céu aberto e/ou queimado no fundo do quintal.

O abastecimento de água nos do­micílios érealizado pelo Sistema de Abastecimento deÁgua Encanada em Belém (SAAEB). Do totaldos domicílios visitados, 60% usam água depoço amazônico e destes, alguns moradoresutilizam a política abastecer a casa.

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A manutenção do sistema de abastecimen-to de água para os domicílios é custeada atra-vés da cobrança de taxa equivalente a 10m3 deágua, com hidrômetro, cujo valor da taxa deconsumo era R$ 6,15. Porém, a maior partedas ligações domiciliares é realizada de formairregular causando perdas em qualidade e quan-tidade por usar encanação clandestina expostaem valas, em vias de acesso com escavação depequena profundidade que quebra a qualquerdescuido de transeuntes.

A ocupação das áreas pela população debaixa renda e com baixo nível sanitário ocasi-ona diversos problemas como lançamento in-discriminado de esgotos domiciliares, lixo edetritos das residências à margem de represas.Acrescenta-se que, a cada área habitada, é feitoum desmatamento, acarretando lixiviação dosolo em direção aos cursos d’água. Devido aessas condições, pode-se dizer que o crescimen-to gradativo e cumulativo de resíduos lança-dos em águas de mananciais comprometem tan-to o futuro abastecimento de água de Belémquanto as condições de moradia.

Quando chove aqui enche tudo. Aqui nãotem esgoto. Quando chove enche tudoporque não tem esgoto (D. Ma­ria).

A água é nossa pelenga. Aqui é poço pragente ter água (D. Janira).

A ampliação da rede de abastecimento deágua potável destinada aos domicílios do CaféLiberal é uma necessidade para o consumo in-clusive humano. Dessa maneira, a populaçãoque não tem acesso a este serviço recorre aospoços rasos de vizinhos e às tubulações irregu-lares, expostos aos riscos de contrair doençashídricas pela forma de obtenção desse líquidoe pelas precárias condições de higiene dos va-silhames e armazenamento da água. Nesse caso,mudar hábitos, conduta e aplicar políticas pú-blicas requer uma educação ambiental voltadapara cidadãos críticos, participativos e com-prometidos com a gestão de recursos hídricos4

ara atender as necessidades de consumo de água

de boa qualidade. Isso envolve o uso racionalda água através de torneiras adequadas, chu-veiros e pias, assim como, reutilizá-la em ou-tras finalidades (lavar automóveis, regar plan-tas) entre outras.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O inchaço populacional decorrente do pro-cesso de desenvolvimento econômico nosmeados de 1960/70 na região Norte, e em es-pecial no município de Belém, evoluiu espaci-almente desde a colonização. Nesse interim, aspolíticas adotadas pressionaram a evoluçãodemográfica para fora dos limites da 1.ª LéguaPatrimonial, alijando os indivíduos de menorpoder aquisitivo para áreas alagadas, carentesde equipamentos de serviços – policiamento,saúde, escola, transporte urbano e saneamento.

O adensamento dessa população em áreasinsalubres caracteriza a forma como a socieda-de se organiza para produzir sua existência,gerando descompasso na relação entre homeme natureza, através da degradação ambiental eda perda da qualidade de vida dos moradoresurbanos.

As práticas ambientais decorrentes do de-senvolvimento da região fogem da noção dedesenvolvimento sustentável, necessitando depolíticas públicas na gestão de recursos hídri-cos, de saneamento ambiental e de saúde com aparticipação popular nos processos de discus-são e decisão de medidas para garantir não so-mente a manutenção dos recursos naturaiscomo também a qualidade de vida humana.

Nessa perspectiva, emerge a neces­sidadede integrar planos de ação de cidadania como aeducação ambiental nos projetos educacionaisem todos os âmbitos sociais, desde as sériesiniciais de forma dialógica e prática no intentode auxiliar a construção de sujeitos críticos eautônomos.

Essa mudança de comportamento social per-passa também pela disponibilidade de recursosdidáticos, de formação e de informações coe-rentes com a realidade da população para o usoracional e sustentá­vel dos recursos naturais.4 Água como bem econômico passível de utilização com

tal fim.

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Esse é um desafio que exige políticas públi-cas que proporcionem aos cidadãos e cidadãs,por práticas educacionais volta­ das ao meioambiente, uma reorganização na forma de usoe de distribuição de abastecimento de água po-tável nas áreas insalubres, no caso, Café Libe-ral, e na apli­cação de serviços como coleta delixo e esgotamento sanitário sem distinção nesseatendimento vislumbrando a manutenção dosmoradores nesses espaços.

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ÉTICA AMBIENTAL: DO PENSAMENTOANTROPOCÊNTRICO AO ECOCÊNTRICO

Rosyjane Paula Farias Pinto1

RESUMO

Este trabalho propõe uma reflexão sobra à importância da ética nas questões ambientais. A partirde uma revisão teórica e bibliográfica do assunto, problematiza as possibilidades e limites daexpansão e realização prática dessa consciência ecologia, através de uma análise histórica, filosófica,política, econômica e social, do papel da educação para o despertar de uma ética ambiental.Analisa, igualmente, os principais obstáculo e desafios que retardam o avanço dessa consciência,entendendo-a como uma discussão para uma prática efetiva e fecunda da educação ambiental.

Palavras-chave: antropocentrismo, ecocêntrismo, meio-ambiente, educação ambiental, natu­reza

ABSTRACT

This work considers a reflection surplus to the importance of the ethics in the ambient questions.From a theoretical and bibliographical revision of the subject, problematiza the possibilities andlimits of the expansion and practical accomplishment of this conscience ecology, through ahistorical, philosophical analysis, politics, economic and social, of the paper of the education toawake it of ambient ethics. It analyzes, equally, main the obstacle and challenges that delay theadvance of this conscience, under­standing it as an effective practical quarrel for one and fruitfulone of the ambient education.

Palavras – chaves: antropocentrismo, ecocêntrismo, half-envi­ronment, ambient education, na­ture

As ciências do meio ambiente es-tão à procura de uma nova síntesedo saber e de uma nova prescriçãocujo princípio será mais ecológicodo que econômico e mais ético doque científico.

Pierre Dansereau

1 INTRODUÇÃO

O problema ambiental vivido em nossa so-ciedade, assumiu, a partir do século XX umacentralidade e presença marcante na vida coti-

diana à respeito dos impactos ambientais pro-vocados pela ação do homem e sua conseqüên-cias.

Este artigo constitui uma investigação so-bre o papel da ética nas questões ambientais ede como esta pode ser evidenciada no compor-tamento humano através da educação. A esco-lha do tema justifica-se por observarmos queos problemas resultante da degradação ambi-ental vêm se agravando e que as políticas utili-zadas para contê-los não tem dado respostassatisfatórias. O foco da pesquisa não é encon-trar respostas imediatistas para resolver pro-

1 Graduada em História na Universidade Estadual do Maranhão - UEMA, Especialista em História e Geografia doBrasil, Faculdade Integrada do Amparo – FIA. Especialização em Metodologia do Ensino da Geografia Aplicadaao Planejamento Ambiental na Universidade Estadual do Maranhão – UEMA.

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blemas ambientais em loco, mas sim procurarentender a raiz do problema observando comoa ética humana foi conduzida ao egocentrismoe de como a educação pode nos ajudar a incor-porar uma ética ecocêntrica.

A pesquisa é baseada na bibliografia de vá-rios autores nos campos da Ética, Filosofia,Educação Ambiental, Geografia e História,fazendo uma reflexão sobre a história da cons-ciência ecológica.

Para entendermos o tema central fizemosum estudo a respeito do pensamento humanoem relação à Natureza.

Na primeira unidade falamos sobre o queé ética e o que a diferencia da moral. A segun-da e terceira unidade é um levantamento a res-peito do comportamento humano em relaçãoà natureza ao longo da história, de como dei-xamos de nos sentir parte dela para nos tornaro centro. Na quarta unidade mostramos a evo-lução do capitalismo e como ele é fator deter-minante neste contexto. A quinta unidade vainos mostrar uma nova tendência de mudançade comportamento o ecocêntrismo, e por fimvamos nos deter a mostrar qual o papel da edu-cação ambiental e como ela pode nos ajudarcomo educadores a desenvolver nas pessoasuma atitude ética em relação à Natureza.

2 A CONDUTA ÉTICA E MORAL

O mundo pós-moderno tem sido marcadopela palavra ética, palavra essa que cada vezmais passa a ser utilizado e interpretado pelasmais distintas esferas, seja ela política ou eco-nômica, no entanto poucos conseguem real-mente explicá-la e defini-la, já que a ética nas-ce em nós mesmos, responde a um imperativonão obrigatório e está baseado em princípiosdinâmicos, naturais, criativos e harmônicos,podendo variar, dependendo das condições eproblemas a serem trabalhados.

Assim entendemos por ética o estudo dosjuízos de apreciação referentes à conduta hu-mana que a sociedade julga na qual, todos de-vem ter, comportamentos que se espera dooutro.

A palavra ética nos dá uma idéia de normae responsabilidade, ficando evidente que o ho-

mem é responsável por seus atos por ser livre,porem se essas ações estiverem sendo determi-nadas de fora para dentro, não teremos aqui oespaço para a liberdade e nem, contudo paraagirmos com ética. Motta (1984) é contunden-te quando percebe a ética como um conjuntode valores que orientam o comportamento dohomem em relação aos outros homens na soci-edade.

Ética é, para uma grande maioria compara-da à moral, porem analisando cada um dessesconceitos podemos constatar diferenças entreambas, no entanto a moral está subordinada àética.

Moral é um conjunto de regras de compor-tamentos, baseada em leis externas normatiza-das a serem cumpridas, às vezes chega a serrepressiva, autoritária, promove a passividadee a submissão à ordem considerada correta pelasociedade. Dessa forma, todo ser humano é oupode ser moral se cumprir ou deixar de cum-prir as regras estabelecidas na sociedade sem,contudo, estar discordando, apenas cumprin-do.

Ética é o ramo da filosofia dedicada ao es-tudo dos valores morais da conduta humana naqual todos devem ter, comportamento que es-tamos constantemente esperando do outro.Aqui o homem é chamado a uma reflexão ondepermanentemente estará agindo de acordo comsuas próprias análises dentro daquilo que defi-niu como sendo o bem ou o melhor em termosde conduta.

Somos seres em processo, criaturas situa-das em um mundo ao mesmo tempo físico, so-cial, moral e político, estando localizados emuma tradição cultural especifica que supre oestoque de funções sociais, buscando compre-ender o mundo.

Procurando entender o significado da éticaanalisamos as atitudes do homem em relaçãoao meio ambiente, na qual se percebe a imensabusca de superar os limites da humanidade e nasua vontade dominadora sobre a natureza ondea industrialização, a biotecnologia, a engenha-ria genética e outras, são condições voltadas,únicas e exclusivamente para servir ao própriohomem.

A ética, no entanto vem como tentativa de

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se analisar as conseqüências das ações huma-nas, provocando questionar seu papel enquan-to ser responsável no que se refere ao seu pró-prio destino e sobre a qualidade de vida dasfuturas gerações. Ter uma postura ética é sercapaz de ver o outro e de preocupar-se com ele,assim a ética está fundamentada no amor e naemoção.

A partir desse entendimento de ética, pode-mos observar nos dias atuais um desequilíbrioentre os sentimentos, emoções e a racionalida-de. Os valores proclamados (normas, leis) nãocondizem com os valores vividos, como exem-plo podemos citar o discurso “verde”, que en-cobre e “justifica” a exploração dos recursosnaturais. Há uma exclusão do outro em todas asordens: econômica, social, cultural e familiar.

Todos estes problemas são consequência deuma ética antropocêntrica extremamente capi-talista colocando-se como forte obstáculo aoavanço da consciência ética-ecológica, na me-dida em que atua como referência de compor-tamentos individuais e sociais.

Diante das dificuldades de se compreendere viver os valores éticos, faz-se necessário co-nhecer a condição do pensamento humano emrelação à Natureza e em relação ao própriohomem enfatizando o pensamento filosófico eas mudanças ocorridas na história.

2.1 O pensamento dos primeiros filosóficosobre a natureza e o homem

O termo Natureza não é um termo surgidoapenas na modernidade, mas seus termos fo-ram utilizados desde a antiguidade e para com-preender o conceito de natureza existente hojeentre nós, é necessário identificar outras con-cepções.

O termo natureza, aparentemente banal emnossos textos e falas, tem uma longa história deconstrução e reconstrução ao longo dos sécu-los.

Assim podemos observar que os primeirosfilósofos gregos são constantemente chamadosde filósofos da natureza, pois sempre demons-traram preocupação pela natureza e pelos pro-cessos naturais. Viam que a natureza passavapor muitas transformações, pois observavam

algumas substâncias constantemente sendomodificadas por processos naturais.

Os filósofos queriam compreender os fenô-menos da natureza sem necessariamente recor-rer aos mitos, em um período da história que areligião através dos mitos servia como respostapara todas as questões da origem do mundo edo homem.

Através dessas questões a filosofia rompecom a religião e percebe as primeiras manifes-tações do homem no sentido de um pensar ci-entífico, provocando assim o surgimento devárias outras ciências.

No entanto podemos perceber dessa manei-ra que o pensamento filosófico em relação ànatureza vem sendo modificado no decorrerda história humana.

Para essa compreensão citaremos os filóso-fos da natureza da forma que ficaram conheci-dos, como: Tales de Mileto, Heráclito de Éfe-so, Anaxímenes, Empédocles, Anaxógora queacreditam ver ou per­ceber a natureza nas se-guintes cituações:

1 -Tales de Mileto - como sendo a “água”,a fonte de tudo que existia no mundo;

2 -Anaximandro – via a possibilidade doaparecimento do ho­mem por meio datransformação dos animais em homens;

3 -Anaxímenes – tem o ar como ele­mentoprincipal, e que tudo que existe na terraé o processo de condensação do próprioar;

4 -Heráclito de Éfeso – acreditava que nanatureza tudo fluía e por isso tudo estavaem constante movimento, onde nadaduraria para sempre;

5 -Empédocles – a natureza não poderia terum único componentes para justificar anatureza, mas tudo, terra, ar e fogo eramos elementos básicos na natureza;

6 -Anaxágoras – tinha a concepção de que anatureza era composta de partículas mi-núsculas;

7- Demócrito – tudo surgia do átomo.

Mas foi a partir dos filósofos Sócrates, Pla-tão e Aristóteles que o homem perante a socie-dade passou a ser o centro das princi­pais dis-

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cussões, na tentativa de compreender o homem,seu com­portamento, sua moral e sua ética.Conhecidos por sofistas, nome dado ao fato deserem estudados, viviam da arte de ensinar,tam­bém não aceitaram o mito sendo capaz deresponder aos seus questionamentos em rela-ção à natureza, apesar de também não acredita-rem que o homem fosse capaz de desvendartodos os mis­térios que regem a natureza e ouniverso.

Dessa forma os sofistas se dedicaram ao es-tudo do homem como ser ativo na sociedade,discutindo o natural e o que era criado pelaação do homem.

Sócrates (470 a 399 a.C.) se dedicou a ques-tionar e a tentar compreender as ações do ho-mem em relação à moral, assim para ele quemsouber definir o que é o bom, acabará por fazero bem e só aquele que faz o que é certo seráconsiderado um homem de verdade.

Platão (428 a 347 a. C.) via na racionalida-de, como sendo o único passo para a criação deum bom Estado, pois para ele tudo que se man-tinha vivo era na verdade uma cópia imperfei-ta da forma da idéia, assim para ele todos oshomens e animais são imperfeitos, mas ao con-trário dos outros animais o homem é chamadoa agir de forma racional diante de suas atitudese ações.

Diferente de Platão que se preocupou como mundo das idéias e pouco registrou mudan-ças na natureza, Aristóteles (384 a 322 a.C.) aocontrário usou a razão e os sentidos, ou seja,atingir a realidade está em percebermos ou sen-tirmos com os sentimentos sem perder contu-do a característica mais importante do homem,a razão, porém só poderíamos ter razão se elaestivesse acompanhada dos sentimentos.

Podemos perceber que a preocupação coma natureza não atingiu apenas a era contempo-rânea ou pós-modernidade, como muitos a de-nominam, mas que, desde os séculos VII e VIa. C. já se tinha pessoas que buscavam conhe-cer e explicar os fenômenos naturais e discutiro papel do homem com o meio natural, pre-vendo uma série de problemas que seriam ge-rados se a população não tivesse um preocupa-ção maior com a natureza e com tudo à suavolta.

Ao contrário deste período vamos obser-var a partir do século XVI alguns filósofos co-meçando a tomar outra postura em relação anatureza baseada em novas idéias, dando ori-gem ao pensamento antropocêntrico.’’

2.2 Pensamento antropocêntrico

Uma das principais causas de degradaçãoambiental tem sido identificada no fato de vi-vermos sob a égide de uma ética antropocêntri-ca. O homem identifica-se como o centro, o serque domina todos os outro e o seu hábitat. To-das as coisas existem em sua função.

O antropocentrismo é identificado por al-guns estudiosos (WHITE, 1967 apud GRUN,1996) desde o Velho Testamento Deus disseque o homem fosse feito a sua imagem e seme-lhança, e que ele domine sobre os peixes domar, as aves do céu, os ani­mais domésticos,todas as feras e todos os répteis que rastejamsobre a terra (Gênesis 26:26). Calicott (1989,apud GRUN, 1996) considera que a culturacristã, em qualquer de suas manifestações sem-pre considerou a Terra como um mero local depassagem Nas décadas de 60 e 70, o cristianis-mo foi muito criticado pelo seu caráter antie-cológico, na atualidade tenta incorporar os ele-mentos ecológicos nos seus discursos. Apesarda contribuição do cristianismo para o antro-pocentrismo, este tomará outras proporções apartir de Descartes.

Anterior ao período cartesiano, encontra-mos suas bases no humanismo, período de tran-sição entre o mundo medieval e o moderno.Neste período o homem começa a tomar as ré-dias do seu próprio destino rompendo com avelha ordem, principalmente no que diz res-peito à política, a arte, a religião e a filosofia.

Na política há criação dos Estados-naçõese consolidação da burguesia, na religião o ad-vento da Reforma, na literatura floresce os gê-neros biográficos e na pintura predominam oretrato e o auto-retrato.

Os homens querem se eternizar através desuas obras. Na pintura, artistas como Leonar-do Da Vinci utilizam a matemática para repre-sentar o mundo quantitativamente. GRUN(1996), propaga que a arte moderna anunciou

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antecipadamente o nascimento da ciência.(1996).

O homem quer reorganizar e imprimir suamarca no mundo. É também neste período queas relações de mercado são modificadas, passa-se a vender a prazo, agora o homem é o dono dotempo este que antes pertencia a Deus agora émeti­culosamente contabilizado.

2.3 Evoluções da ética antropocêntrica

Na cosmologia da Renascença, desencade-ada nos séculos XV e XVII começamos a veri-ficar uma complexa mudança de pensamentoque se deu em diferentes áreas como a arte,política, religião, filosofia e ciência, assim aidéia de natureza passou por transformaçõesradicais com a mudança do paradigma organís-mico aristotélico para um mecanicista.

As modificações e inovações anunciadas umséculo antes por Da Vinci chegaram agora àciência e à filosofia.

Os quatro, principais pensadores que influ-enciaram na transformação das orientações doagir humano com a natureza foram: Galileu(1546-1642), Francis Bacon (1561-1626), Des-cartes (1596-1650) e Newton (1642-1727).

Galileu vai ser o principal representante darevolução científica, o pivô da transformaçãoparadigmática que vai do organísmico ao me-canicismo. É com Galileu que a ciência mo-derna chega à maturidade.

A idéia é de uma natureza mecânica, comisto o objeto perde suas qualidades. Galileupostulou certas restrições aos cientistas, afir-mando que eles deveriam se restringirem aoestudo das propriedades essenciais matérias,formas, quantidade e movimento, potenci-alizou a utilização da visão através do telescó-pio, a visão tornou-se o órgão do sentido maisprivilegiado para a prática científica. A conse-qüência disso é a perda da sensibilidade estéti-ca dos valores e da ética.

Bacon além do método científico experi-mental contribuiu com suas idéias sobre o pa-pel que a ciência deveria desempenhar na cul-tura e que o homem também deveria ser o senhordo seu destino e de todas as coisas. Tinha seuolhar voltado para o futuro. Segundo Grun

(1996), Bacon defendia a criação de uma novacultura. Isto proporcionou um rompimento como modo de pensar, viver, da relação do homemcom a natureza e com a tradição cultural.

Este período foi de grande avanço na agri-cultura e na indústria. A ciência progredia re-forçando a concepção de Bacon “ciência é po-der”.

Apesar dos avanços em todas as áreas dasciências, havia uma incerteza no ar, fazia-senecessário construir bases epistemológicas se-guras, pois o homem agora era o dono se seudestino. A velha ordem se foi, mas a nova ain-da não havia se estruturado, era preciso legiti-má-la.

O filósofo René Descartes se lançou na ou-sada tarefa de conferir uma nova unidade aomundo, tomando-o como objeto de sua razãocartesiana. É a necessidade de dominar a natu-reza, mas para isso era preciso se situar foradela. Grun (1996) destaca que para ele Descar-tes se preocupava com a unidade, tornando issocaracterístico. Surge a gênese da crise voltadapara as questões ecológicas, pois a natureza tor-na-se passiva e os seres humanos retiram-se danatureza, vendo-a como uma fotografia a serdesvendada, um bem que pode ser a qualquerinstante explorada, atendendo assim suas ne-cessidades e prin­cipalmente seu desejo no acú-mulo de capital.

2.4 O capitalismo e os novos valores

Na história das primeiras civilizações, aNatureza determi­nava a sobrevivência e amobilidade do homem sobre a Terra, po­rémseu desenvolvimento técnico e a construção deinstrumentos de trabalho deixaram o homemnuma situação em que a transformação da na-tureza também se tornou possível. Nesse pro-cesso de evolução do homem de transforma-ção dos seus recursos de sobrevivência ohomem deixou de ser sedentário e passou a vi-ver uma vida nômade, ou seja, sem necessida-de de se deslocar. Porém à medida que as co-munidades se tornaram sedentárias surgiramas noções de propriedade da terra. A partir deentão, o progresso técnico tornou-se cada vezmais freqüente.

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Entre os séculos XVI e meados do séculoXVIII a economia apresentava uma lenta evo-lução tecnológica e a sociedade era marcadapela tradição e pelo caráter rural. Depois, aeconomia ficou marcada pela rápida evoluçãotecnológica e a sociedade por constantes mu-danças, destacando a urbanização.

A 1ª Revolução ocorreu na Inglaterra, paísque mais se destacou nas relações mercantilis-tas no século XVIII. A indústria foi à têxtil, ocombustível foi o carvão, e a grande inovação,a máquina a vapor.

A 2ª Revolução Industrial ocorreu no sécu-lo XIX, e teve novamente a Inglaterra comocentro dessa revolução, no entanto, países comoFrança, Alemanha, Itália, Bélgica, Japão eEUA, também tiveram grande importâncianesse cenário industrial. O combustível já nãoera o carvão, mas o petróleo, a siderurgia sedestacava com a Era das ferrovias. Em umaetapa posterior, no início do século XX, a in-dústria avança com o motor a combustão.

Já a 3ª Revolução foi marcada pela pós Se-gunda Guerra Mundial envolvendo tecnologiade ponta, onde deu destaque para indústrias deeletrônica e de aviação. Esse crescimento in-dustrial faz com que as empresas sintam e vivaa concorrência internacional, dando origem àstransnacionais, que buscam nos países pobres,matéria prima, mão de obra barata e principal-mente mercado consumidor. Começa a fase fi-nanceira do capitalismo, envolvendo a famosaGuerra Fria.

Podemos observar que durante a 1ª e a 2ªRevolução não havia uma preocupação nomeio filosófico e científico com as conseqüên-cias provocadas com o processo industrial emrelação a utilização dos recursos naturais e dadegradação do meio ambiente.

No entanto o período pós Segunda GuerraMundial é marcado por uma inquietação comos impactos destrutivos que o desenvolvimen-to tecnocientífico e urbano industrial dos paí-ses ocidentais industrializados provocaram nomeio ambiente natural e urbano.

Essa degradação é conseqüência do mode-lo de organização político-social e de desen-volvimento econômico na qual estipula priori-dades e define o que a sociedade deve estar

produzindo, ou como produzir, e como a mes-ma estará sendo distribuída a nível social deacordo com as condições econômicas.

Essa realidade demonstra de forma clara osdiferentes interesses dos vários grupos sociais,onde os que detém uma posição privilegiadadecidem os rumos sociais e os impõem ao res-tante da sociedade.

Surge diante dessa realidade o modelo ca-pitalista imposto pela sociedade atual que ex-pressa uma busca de produtividade, competiti-vidade e lucratividade, onde se tem e se viveuma sociedade individualista e extremamentepredatória. O homem passa a viver a égide dadominação, dominação essa que apresentacomo caminho o crescimento econômico ba-seado na extração ilimitada de recursos natu-rais, sem considerar as conseqüências dessasintervenções para o ambiente (GUIMARAES,1995).

Os problemas gerados pelo modelo impos-to à sociedade contemporânea, demonstram deforma clara a falta de interesse de grandes gru-pos capitalistas, da falta de políticas pública ede conscientização de uma grande demanda dapopulação mundial.

A sociedade também está baseada no con-sumismo como reflexo de um processo indus-trial, onde a natureza está sujeita às ações huma-nas para satisfazer as necessidades dessapopulação capitalista, deixando claras as conse-qüências do consumismo sobre o meio ambien-te e principalmente sobre a qualidade de vidasocial,observando o grande desperdício que asociedade consumista provoca em relação ao usode recursos naturais e energéticos, gerando séri-os problemas como por exemplo às relaciona-das à geração e processamento de lixo.

O consumismo é outra característica dasociedade contemporânea que produzimpactos preocupantes sobre o ambientenatural e construído. A sociedade capita-lista industrial criou o mito do consumocomo sinônimo de bem-estar e meta prio-ritária do processo civilizatório. (LIMA,1997, p.201).

Fazendo uma análise cultural e econômicaesse consumo de­senfreado provoca uma pro-

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funda alienação social e exploração de traba-lho, criando irracionalidades como a industriabélica , a proliferação do supérfluo e a absoles-cência planejada. Esse modelo de vida faz sur-gir um tipo de comportamento e de ideologiaque alimenta cada vez mais o processo de degra-dação, tanto nas relações sociais em si, quantodas ralações entre sociedade e natureza.

Assim a falta de investimento em uma edu-cação voltada a oferecer à população uma soci-edade que: respeite e atue seguindo os interes-ses da maioria dos cidadãos; seja capaz departicipar da elaboração de respostas aos pro-blemas vividos pela comunidade; exercite acapacidade de questionar e avaliar a sociedadesócio-ambiental e que busque mudanças decomportamento, valores, e mentalidades con-trárias à vida coletiva, justificam o modelo deci­dadão atual, onde a educação continua sen-do um privilégio e não um direito prioritário,onde a elite cultural importa dos centros in-dustrializados não só conhecimentos técnicos,mas concepções de desenvolvimentos, valorese padrões de comportamento.

Diante desse quadro alarmante e principal-mente preocupante, se faz necessário aqui sediscutir o papel da ética humana no sentido dese analisar o desenvolvimento econômico tãoalmejado por todas as nações do mundo, maspartindo do pressuposto de um desenvolvimen-to baseado em uma ética ecocêntrica, onde sefará necessário à integração de todos os valoresna qual se interagem o contexto homem e natu-reza.

Na necessidade de mudança de comporta-mento a educação tem um papel fundamental.

2.5 Ética ecocêntrica

A partir das definições até aqui apresenta-das para a ética podemos dizer que em todos osnossos relacionamentos seja na família, na es-cola, na política, na economia ou em qualqueroutro sistema social é necessária à aplicação deuma conduta ética sendo que estes valores pre-cisam ser vivenciados. Em relação a Naturezanão é diferente, pelo contrário torna-se aindamais importante e necessário.

Toda sociedade é responsável pela degra-

dação ambiental, atingindo desde as classesmenos favorecidas que acabam agredindo aNatureza por falta de informação, de condiçõessocioeconômica, chegando a não ter noção dasconseqüências de seus atos por serem em suagrande maioria semi-analfabetos, aos grupos depessoas que tem conhecimento e informaçãomas não desenvolveram uma consciência, e sãomovidas apenas pelo desejo de acumular rique-za, não se preocupando com o futuro, impor-tando-se apenas com o agora.

Santos (1999) nos transmite concepçõescomo a de que a natureza engloba o homem,baseando-se em teorias como as de Darwin, deLovelock, ainda nos faz refletir em seu pensa-mento de que o homem faz parte da natureza,mas não é o centro de todas as coisas.

Surge nesse pensamento a ética ecocêntricaque tem como foco único o homem, porém umhomem com um novo olhar para a Natureza.Com este pensamento o ser humano passa arefletir sobre suas atitudes e responsabilidades.Considerando o planeta como sua casa, suamorada. Nasce assim uma ética diferente daética tradicional, a ética ambiental. .

2.6 A ética como compromisso

A ética ambiental pode ser definida como ocomportamento do ser humano em relação àNatureza, cujo objetivo é desenvolver no ho-mem um comprometimento pre­servacionistada vida global, não um compromisso impostopor leis, mas um compromisso pessoal ditadopela ética.

Este homem passa a refletir sobre o seu pa-pel no mundo, fazendo com que tenha consci-ência de suas ações, entendendo não ser o donoda natureza ou o seu centro, mas fazendo partedesta e tendo responsabilidades para com osoutros seres. Percebendo isso, o ser humanopassará a ser mais coerente em relação ao meioe suas ações passam a ser direcionadas à causada preservação da vida.

Dentro desta nova ética temos um compro-misso criado por nós mesmos, dentro de nós.A lei é nossa consciência, não se tratando deobrigação e sim de um envolvimento pessoalmarcado também por ações éticas em que seus

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resultados se da­rão diretamente à preser­vaçãoambiental e na melhoria da qualidade de vida.

A ética ambiental passa a ser o início deuma nova ordem mundial alicerçado em no-vos, onde tem como sua base científica o estu-do da relação homem-natureza, englobandoneste binômio to­das as raças humanas e todosos seres existentes.

A colocação em prática dessa nova formade comportamento ético propiciará uma enor-me satisfação subjetiva e íntima em cada indi-víduo, e conseqüentemente da sociedadehumana de estar contribuindo com responsa-bilidade para a preservação do maior bem queexiste que é a Natureza, nos dando a esperançade podermos prolongar a existência de nossaespécie e das demais espécies do planeta.

2.7 Educação ambiental e mudança social

A crise ambiental mudou os rumos da civi-lização moderna tornando-se um obstáculo nosvariados sistemas sociais: ciência, economia,tecnologia, direito e educação, sendo estes obri-gados a reagir e apresentar propostas dentro desuas especificidades como meio de enfrentar ocenário de instabilidade dos estilos de desen-volvimento. Layargues (2003) em seus estu-dos transparece ter percebido o surgimento depensamentos mais voltados para uma consci-ência ecológica.

A educação não fugiu à regra. Nesse con-texto a Educação Ambiental (EA) correspon-de à reação do sistema educativo frente aosdesafios impostos pela crise ambiental. A par-tir de então se efetuou uma reforma no sistemaeducativo para incorporar a dimensão ambi-ental no âmbito da educação. Essa reformula-ção contudo tem ocorrido de modo transversalao currículo escolar.

Embora as perspectivas da EA sejam decriar novas “habilidades” para uma interven-ção humana ecologicamente prudente, evitan-do ou minimizando a geração de riscos e danosambientais, estando em sintonia com os demaissistemas sociais (ciência, tecnologia, econo-mia, político e direito) a criação dessas habili-dades ainda não configura como a especifici-dade singular da educação.

A EA possui uma contribuição específica aoferecer para o enfrentamento da crise ambi-ental, ela deve ajudar aos indivíduos a muda-rem seus valores, comportamentos, atitudes ehabilidades em relação ao meio em que vivem,no entanto não tem sido o sistema social maisimportante em escala de prioridades. Porém osistema educativo possui as condições idéiaspara sair desse pragmatismo imediatista, qua-lificando-o como um componente social pre-ventivo envolvendo o indivíduo com o conhe-cimento.

Entre os sistemas sociais a educação é oúnico que permite a realização de discussãoaprofundada a respeito das raízes e das causasda crise ambiental vai além do enfrentamentocorretivo, pois, cria habilidades na interaçãohumana com a natureza. Ela permite repensara complexidade da crise civilizacional e da cri-se do conhecimento.

A EA tem papel relevante na conversão devalores, paradigmas, visão de mundo e pers-pectiva da criação de uma ética ecocêntrica eLayargues (2003) acredita nela como forma deimplantar um raciocínio crítico – ecológico -corretivo. Contudo não podemos desconside-rar as especificidades culturais entre países cen-trais e periféricos do sistema capitalista, a rela-ção entre EA e mudança social adquire especialrelevância frente à necessidade de se promovereqüidade e justiça social no que se refere à dis-tribuição dos benefícios e prejuízos do acesso euso dos recursos naturais.

Assim para que a EA possa fornecer a suacontribuição para a reversão da crise é necessá-ria sua atuação para uma mudança cultural esocial.

3 CONCLUSÃO

Este estudo teve a preocupação de abordaro homem como um ser ético, procurando ana-lisar as mudanças do comportamento humanoao longo dos séculos.

Nesse processo observamos que o homemcontemporâneo traz na sua formação de cará-ter, uma ética antropocêntrica que se iniciouna modernidade com o pensamento iluministavindo justificar o atual processo de degrada-

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ção, onde o homem vê a Natureza não comoparte dela, mas como um objeto se aproprian-do dela como um bem a ser explorado.

O grande desafio da educação está justamen-te em procurar incorporar no ser humano umpensar em que essa consciência e visão globalsejam modificadas através de suas ações e de-senvolva com isso uma nova linha de condutaética com a Natureza que, é o que chamamosde ecocêntrismo.

O homem baseado no princípio da ética,passara a ter um sentimento de respeito ao meioter uma postura muito mais reflexiva sobre omeio ambiente.

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MEIO AMBIENTE: UM DIREITO DE TODOS

Marcio Fernando Moreira Miranda1

Márcia da Cruz Girardi2

1 É professor da Faculdade de Imperatriz (FACIMP), da Faculdade de Educação Santa Terezinha (FEST) e daUnidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão (UNISULMA). Especialista em docência Superior Pela Univer-sidade Estadual do Maranhão (UEMA).

2 É professora da Faculdade de Imperatriz (FACIMP), da Faculdade de Educação Santa Terezinha (FEST) e daUnidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão (UNISULMA). Especialista em docência Superior Pela Univer-sidade Estadual do Maranhão (UEMA).

RESUMO

Este presente artigo tem como objetivo apresentar um estudo sobre o meio ambiente na visãojurídica, verificando seus principais pontos dentro do direito ambiental, seus princípios e teoriasobre a sustentabilidade no âmbito da comunidade internacional. O método utilizado neste ensaioé de caráter biográfico. Tendo como resultado um estudo critico acerca da utilização dos recursose das normas de proteção do direito ambiental. Bem como, o impacto causado na humanidade e nanatureza.

Palavras-chave: Meio Ambiente. Conceito. Princípios Ambientais. Direito Ambiental. Direito.

ABSTRACT

This article aims to present a study on the environment in legal view, noting its main pointswithin the environmental law, its principles and theory on sustainability in the framework of theinternational community. the method used in this test is character biographical. taking as a resulta study criticize about the use of resources and the standards of protection of environmental law.as well as, the impact caused in humanity and in nature.

Key-words: Environment. Concept. Environmental Principles. Environmental Law.

1 INTRODUÇÃO

O meio ambiente está sendo gradativamen-te destruído por práticas de desenvolvimen-tismo e exploração desenfreadas a custa de ob-jetivos progressistas e sem qualquer sustenta-bilidade.

Atualmente, já se sabe que os recursos natu-rais são escassos e finitos, que essa prática des-proporcional gera um anacronismo na nature-za e conseqüências climáticas inalteráveis,gerando a perda da qualidade de vida e a degra-dação do meio ambiente.

Ocasiões graves como destruição das flo-restas, degradação das águas por contaminaçãode agrotóxicos, lixo tóxico e poluição do ar edo solo, faz lembra o ritmo da questão ambien-ta e das necessidade de proteção do meio ambi-ente a níveis planetários e provoca uma refle-xão: o meio ambiente é para todos? È um direitode todos?

Como, através do Direito, se pode garantira preservação? Para responder essas perguntasé necessário repensar o modelo jurídico vigen-te, mas repensá-lo dentro do contexto de ou-tros saberes percebendo a sua estrita relação

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com o universo jurídico.Até hoje essa pergunta permanece uma in-

cógnita, um desafio para a humanidade que estásedenta de vontade de progresso, mas sofre asconseqüências de suas decisões.

Mesmo com o progresso demonstrado nasúltimas décadas, mais de um bilhão de pessoasainda vivem em extrema pobreza e tem acessoprecário aos recursos (educação, saúde, infra-estrutura, terra e crédito) de que precisam paraviver com dignidade. A meta fundamental dodesenvolvimento é propiciar oportunidadespara que essas pessoas e as centenas de milhõesque se encontram em condições não muito di-ferentes, possam concretizar seu potencial.

O meio ambiente não pode ser apenas estu-dado do ponto de vista das ciências naturais,deve ser compreendido dento de uma ótica maisrelevante, dentro do universo social, econômi-co e jurídico.

A economia se impõe à revisão de seus prin-cípios básicos revendo as relações entre o ho-mem e a natureza. O direito regula e orienta asrelações, sejam entre os homens ou entre oshomens e a natureza.

A idéia deste artigo é apontar a relação en-tre as estruturas da economia e as agressões quea natureza sofre do ponto de vista jurídico equal o modelo de leis necessárias para impedirque o meio ambiente seja destruído e que pos-sa ser usufruído por todos.

2. CONCEITOS GERAIS

2.1 Conceito de meio ambiente.

O conceito de meio ambiente perpassa pelaformação etimológica da palavra ambies, entis,entre seus significados encontra-se “meio emque vivemos”. Esse conceito deve ser traba-lhado para não gerar interpretações tanto so-mente biológicas e antropológicas, mas tam-bém, jurídicas como se o ordenamento pudesseintegra-se ao sentido lógico da palavra meioambiente, ambiente de todos nós.

Para Aloísio Ely (APUD MILARÉ, 2010)meio ambiente quer dizer: “todo o meio exte-rior ao organismo que afeta o seu integral de-

senvolvimento”. O professor relaciona tudo oque cerca o organismo, a vida natural e o que ointegra ao mundo externo. O completo desen-volvimento se constrói através dos meios físi-cos, sociais e psíquicos, que se completam e secorrelacionam, possibilitando o desenvolvi-mento pleno, do ponto de vista biológico, soci-al e psíquico.

Assim, devemos olhar esse paradigma real:Natureza, Desenvolvimentismo e EquilíbrioEcológico. Para isso, é necessário o estudo jurí-dico do conceito de meio Ambiente.

O meio ambiente é, portanto, a integraçãodo conjunto de elementos naturais, artificiais eculturais que provocam o desenvolvimentoequilibrado da vida em todas as suas formas,como afirma Paula Brügger:

O modo de pensar dominante no mundoatual ajudou a construir um conceito denatureza em que esta deixa de ser umtodo dinâmico, com aspectos múltiplos einterdependentes, para tornar-se apenasum conjunto de recursos, ou instrumen-tos. Essa visão está presente até mesmona chamada educação ambiental, redu-zindo o conceito de meio ambiente àssuas dimensões naturais e técnicas. Massão esses os valores que deveriam norte-ar essa educação? (2010, p.8).

Esse é o novo paradigma tecnológico e eco-nômico que vai exigir uma nova abordagem naordem econômica e social. A ciência econômi-ca necessita de uma nova revisão de seus prin-cípios básicos revisando as relações entre ohomem e a natureza. Integração a novos valo-res de bens naturais até então, não considera-dos economicamente. Procura-se ver a inter-nalizações das externalidades, que formam osnovos custos sociais dos processos produtivosnão incorporados, até hoje, pelas atividadeseconômicas.

2.2 Conceito jurídico de meio ambiente.

O conceito jurídico de meio ambiente énovo, haja vista a própria natureza do direitoambiental, nascido na década de 50 (1950) apósa segunda guerra mundial e principalmente,após a crise mundial do petróleo nos anos 70.

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Assim, o direito como um conjunto de nor-mas coercitivas e preocupado como a preser-vação da humanidade e da natureza, passa a seruma importante ferramenta de interferênciasobre as relações econômicas e sociais.

A partir deste ponto de vista e das legisla-ções sobre meio ambiente, a Constituição Fe-deral de 1988 em seu artigo 225 estabelece que:

Todos têm direito ao meio ambiente eco-logicamente equilibrado, bem de uso co-mum do povo e essencial à sadia qualida-de de vida, impondo-se ao Poder Públicoe à coletividade o dever de defendê-lo epreservá-lo para as presentes e futuras ge-rações.

Portanto, podemos extrair o seguinte con-ceito jurídico de meio ambiente, a ideia de queo equilíbrio ambiental e o bem formam umconjunto de integração, afastando do conceitode meio ambiente o sentido de “coisa”, eis quecoisa é tudo aquilo que possui existência indivi-dual e concreta, que pressupõe separatividade,individualização, idéia diversa da de conjuntode valores ambientais em que o meio ambiente éa interelaçao entre o homem e a natureza, entreo vida e o comprometimento sustentável do de-senvolvimento e do progresso.

Assim, o meio ambiente é entendido pelodireito como um bem jurídico. A natureza jurí-dica do meio ambiente se estruturou como re-lação jurídica na doutrina como interesses di-fusos.

3 O DIREITO E A ECONOMIA: UMA RE-LAÇÃO NECESSÁRIA

A constituição Federal tenta construir umarelação entre o direito e a economia, entre anorma e o progresso econômico. Esse equilí-brio é fundamental para o desenvolvimento dasociedade brasileira e a economia.

Assim, temos uma nova meta: desenvolvera economia sem destruir a natureza e esgotar osrecursos naturais que são tão restritos. Essaconstrução passa pela harmonização do desen-volvimento econômico-social com a preserva-ção da qualidade do meio ambiente e do equilí-brio ecológico. O que necessita do chamado

desenvolvimento sustentável, ou seja, na ex-ploração equilibrada dos recursos naturais, noslimites da satisfação das necessidades e do bem-estar da presente geração, assim como da suaconservação no interesse das gerações futuras.

Ao perceber tal problemática, vemos a ne-cessidade de mudanças na idéia de meio ambi-ente econômico para meio ambiente para to-dos. Apesar do homem reconhecer suasobrigações e direitos sua visão sobre o mundoestá condicionada pelo interesse individual.

O desafio está em provocar uma mudançaprofunda entre o interesse individual, tecnicis-ta e capitalista para o desenvolvimento social,coletivo e equilibrado. Porém, a sociedade nãoé composta de indivíduos centrados no seu ab-soluto, sem correlação com os demais. É com-posta, prioritariamente, pelas relações dessesindivíduos.

O principio 17 da Declaração de Estocol-mo (2002) leva a inferência de que, é dever doestado e das instituições, administrar e contro-lar a utilização dos recursos naturais e ter comofinalidade melhorar a qualidade do meio am-biente para todos.

4 A TUTELA DO MEIO AMBIENTE

4.1 Os instrumentos de proteção e coerção dosdanos ambientais

O Estado tem como meio coercitivo a utili-zação de legislações protecionistas e controla-doras de políticas de desenvolvimento am-biental. Para tanto, é preciso criar ações pre-ventiva do Direito. O Direito Ambiental é re-lativo as regras jurídicas que concernem ànatureza, à poluição e danos aos sítios, monu-mentos e paisagens e aos recursos naturais, casoem que o Direito Ambiental não só se apropriados setores que até então não constituíam obje-to de qualquer ramo do direito nem estavamligados a qualquer disciplina jurídica determi-nada (poluição, degradação, monumentos his-tóricos etc.), mas se apropria, também, dos se-tores já constituídos em corpos jurídicos maisou menos homogêneos.

A indagação sobre o meio ambiente per-passa pela necessidade de proteção e a de de-

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senvolvimento sustentável, onde manifesta pelatutela ambiental a partir do momento de suadegradação passa a ameaçar, não só o bem-es-tar, mas a qualidade da vida humana, se não aprópria sobrevivência do ser humano. Sendonecessário a busca por novas soluções jurídicase ambientais.

5 PRINCÍPIOS AMBIENTAIS

5.1 Principio da democracia econômica esocial

O principio da democracia econômica esocial se sustenta através do equilíbrio entremeio ambiente e economia. Assim, constitui-se de uma imposição obrigatória redireciona-da aos órgãos de domínio político (legislativo eexecutivo) no âmbito de desenvolverem umaatividade econômica e social conjunta, trans-formadora e reformadora das estruturas sócio-econômicas, para que haja uma evolução deuma sociedade democrática. O legislador, aadministração pública e o judiciário terão derespeitar o princípio da democracia econômi-ca e social como princípio obrigatório de inter-pretação para avaliar a conformidade dos atosdo poder público com a Constituição.

Outrora, só é possível sustentar o princi-pio da propriedade privada e o individualismose constitucionalmente forem equilibrados comoutro principio: O da função social da proprieda-de. Assim, alude o artigo 5º, inciso XXII daConstituição Federal: “a propriedade atenderásua função social.”

No âmbito ambiental essa função social estarelacionada como outro principio: o da Susten-tabilidade ambiental.

5.2 Principio da sustentabilidade social

O principio da sustentabilidade social foicriado durante a convenção ambiental de 1992,na cidade do Rio de Janeiro, em detrimento auma nova política ambiental: a da sustentabili-dade e desenvolvimento econômico. Criandoassim, a difícil tarefa de compatibilizar o de-senvolvimento econômico com a proteção do

meio ambiente. Ressalta-se que o uso do meioambiente não é bem do Estado nem bem priva-do, mas sendo bem pertencente a toda a coleti-vidade, e dessa forma não pode sua apropria-ção estar dissociada do interesse social e dobem comum, em que se confronta toda cargavalorativa desses conceitos no contexto liberale que hoje se está a exigir-se-lhes uma redefini-ção, como designando a coletividade ecologi-camente equilibrada.

A sustentabilidade também esta associadaa outro principio: o da preservação ambiental.

5.3 Principio da preservação ambiental

O Princípio da preservação deve ser conce-bido como um quadro orientador de qualquerpolítica moderna do ambiente. Dando-se prio-ridade a medidas que evitem o nascimento deatentados ao meio ambiente. Pois, a preserva-ção ambiental alude a conservação do meioambiente para as gerações de hoje e as futurasque ainda viram. Ensino o Mestre Edis Milaréque:

O meio ambiente preserva-se com políti-cas públicas voltadas para a conscientiza-ção do ser humano e da coletividade.Apreservação nasce da consciência huma-na em querer que os recursos naturaissejam um bem de todos e com tal, preser-va-los (MILARÉ, 2010, p. 35).

Portanto, preservar consiste na construçãodo equilíbrio entre desenvolvimento econômi-co e sustentabilidade social.

5.4 Princípio do Poluidor-Pagador

O principio do Poluidor-Pagador muitasvezes é confundido com a falsa ilusão que pode-se poluir se pagar por isso, isto não é verdade.Quanto mais se poluir , mais se paga por isso.Destaca-se a obrigação, por parte do poluidorem corrigir ou recuperar o ambiente enfren-tando os encargos daí resultantes e proibindo acontinuação da ação poluente. Esse princípiose manifesta na responsabilidade civil objetivado poluidor que obriga que exista uma obriga-ção de indenizar, independente de culpa, sem-pre que o agente tenha causado dano significa-

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tivo ao ambiente em virtude de uma ação peri-gosa. No Brasil este princípio está previsto noinciso VII do artigo 4º da Lei 6.938/81 e noartigo 14, 3º da mesma lei que diz:

aquele que polui tem o dever de repara-loe se não for possível, indenizar ao meioambiente através de pecúnia para quenovas ações de preservação e proteçãopossam ser realizadas em detrimento dacoletividade e do meio ambiente (BRA-SIL, 2010, ONLINE).

5.5 O Princípio da Cooperação

O princípio da cooperação é outro que con-solida essa ideia de que o meio ambiente é umbem de todos, por ele, nenhuma ação ambien-tal está dissociada de outra ação econômica.Para que haja uma solução dos problemas doambiente deve ser refrutada especial ênfase acooperação entre o Estado e a sociedade, atra-vés da participação dos diferentes grupos soci-ais na formulação e execução da política doambiente.

5.6 O valor do principio da preservação para odireito ambiental

Segundo Edis Milaré (2010) o principio dapreservação ambiental está intimamente liga-do ao direito ambiental, pois os objetivos dodireito ambiental são especialmente preventi-vos. Sua vontade está intimamente ligada parao momento anterior à consumação do dano odo risco. Ou seja, em frente da pouca valia dasimples reparação, incerta, e, quando possível,extremamente onerosa, a prevenção é a formamelhor, quando não a única solução. A degra-dação ambiental é, em geral, irreversível.Como reparar o desaparecimento de uma es-pécie? “Muitos danos ambientais são compen-sáveis, mas, sob a ótica da técnica e da ciência,irreparáveis” (MELLO, 2010, p.450-451).

6 A EVOLUÇÃO DAS NORMAS AMBI-ENTAIS

A evolução das normas de direito ambien-tal tem seu período mais marcante a partir da

década de 70, precisamente após a Conferên-cia de Estocolmo de 1972.

Em 1972, foi marcada pela oposição doBrasil e outros países em desenvolvimento, emobstruírem às metas internacionais de controleà poluição. A desculpa dada foi que a pior po-luição era a miséria, sendo necessário o desen-volvimento econômico a qualquer preço.

Isto foi agravado pelas políticas desenvol-vimentista das ditaduras latino-americanas ecom a necessidade de progresso a escalas ilusó-rias.

Em 31 de agosto de 1981, criou-se a pri-meira lei genérica para controlar as leis própri-as já existentes: A Lei 6.938/81.

Vinte anos depois veio a Rio 92, Conferên-cia criada pela O.N.U com objetivo de dimi-nuição da poluição, do desmatamento e da pre-servação do meio ambiente mundial. Foi oprimeiro marco histórico na política da meioambiente para todos.

A mensagem do principio do poluidor-pa-gador, criada na Declaração Oficial da RIO/92, introduziu a teoria do risco-proveito, revi-talizando transformações na teoria da respon-sabilidade no direito brasileiro, tornando-se aprincipal contribuinte para a responsabilizaçãoobjetiva do Estado.

7 A POLÍTICA NACIONAL DO MEIOAMBIENTE - LEI 6.938/81

A Lei 6.938 regulamentou a Política Naci-onal do Meio Ambiente. O artigo 2º da lei dis-ciplina que a Política Nacional tem por meta apreservação, melhoria e recuperação da qualidadeambiental (grifo nosso).

A Lei possibilita assegurar a efetividade doprincípio da prevenção e formaliza a responsa-bilidade objetiva, o primeiro exprime a neces-sidade de se desenvolver, promover e imple-mentar uma ética para se viver formasustentável (machado, 2010). Para o ProfessorPaulo Afonso Leme Machado (2010) é neces-sária a prevenção, responsabilizando o indiví-duo não só quando já ocorreu dano ao meioambiente, mas pelo simples fato de causar peri-go a esta.

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Outro ponto está no artigo 4º desta lei queenfatiza a responsabilidade civil objetiva doestado e das empresas causadoras de agentespoluentes.

A maior razão para a introdução da respon-sabilidade jurídica em causar dano ao meioambiente deu-se em detrimento da ação de gran-des grupos coorporativos nas áreas de florestastropicais, especialmente na Amazônia Brasi-leira e nas florestas Asiáticas.

A Lei 6.938 foi responsável pela criaçãodo artigo 225 da Constituição Federal de 1988.Aceitando a idéia de que o desenvolvimentosócio-econômico está intimamente ligado como equilíbrio entre os recursos ambientais e anecessidade de progresso econômico. Também,foi responsável com a avaliação dos impactosambientais, através de estudos prévios de im-pacto ambiental e relatório de impacto ambi-ental.

Outra inovação foi propiciar o zoneamen-to ambiental (artigo 9º inciso II da Lei 6.938/81), que viabilizou a limitação de atividadesem áreas determinadas pelo poder público. Ozoneamento ambiental permite aos governoslimitar o uso das propriedades, bem como dis-ciplinar a atividade econômica mantendo oequilíbrio ambiental.

Essa imposição deu o direito de proprieda-de ser efetivado em virtude de lei, Para que osprincípios gerais do direito e da própria vonta-de do proprietário, não tenha predominânciaem função do interesse público. A principalimportância da Lei 6.938/81 foi que, nesta vi-são, o ambiente era objeto de proteção, ao pon-to de se sobre sair dos tradicionais bem jurídi-cos, como a propriedade privada. Tornando-seo diploma legal básico para o tratamento jurí-dico do dano ambiental no Brasil.

8 A CRIAÇÃO DA LEI 9.605/98

A Lei 9605/98 foi criada na necessidadede trazer novas inovações ao Direito Ambien-tal Brasileiro, ela desmistificou a figura da pro-priedade privada sem vínculos sociais e abriuas portas para o entendimento da ideia do meioambiente para todos.

O seu artigo 3.º, da lei possibilita que aspessoas jurídicas serão responsabilizadas admi-nistrativamente, civil e penalmente, conformeo disposto nesta lei, e que nos casos em que ainfração seja cometida por decisão de seu re-presentante legal ou contratual, ou de seu ór-gão colegiado, no interesse ou benefício de suaentidade.

No parágrafo único da mesma Lei 9605/1998, estabelece que:

A responsabilidade das pessoas jurídicasnão exclui a das pessoas físicas, autoras,co-autoras ou particípes do mesmo fato.A nova legislação prevê, ainda, a aplica-ção isolada, cumulativa ou alternativa àspessoas jurídicas, das seguintes penas:multa, restritiva de direitos e prestaçãode serviço à comunidade (BRASIL, 1998).

Outra inovação é o aumento do grau daspenas para os infratores que comentem crimesambientais em detrimento da vontade econô-mica individualista.

Alem da desconsideração das pessoas jurí-dicas, vejamos um trecho da Lei 9605/1998,em seu artigo 21: As pessoas morais constitu-em entidades fictícias, desprovidas de vontadeprópria, razão pela qual sobre elas não poderecair qualquer juízo de culpabilidade (2010,www.congressonacional.gov).

Remonta o autor Luiz Vicente Cernicchia-ro (2009) que é necessário deixar que um indi-víduo haja para que aí sim, haja o julgamentode sua ação, enquanto a responsabilidade jurí-dica em uma ação é exercida por uma pessoafísica é esta ultima quem responderá pela ação,para Cernicchiaro, mesmo que uma ação sejapraticada por uma empresa, alguém será o res-ponsável pelas ações destas e embora algunspenalistas achem que não, a responsabilidadepenal só poderá ser atribuída subjetivamente eindividualmente.

Isso significa que a legislação avançou mui-to sobre a política de sustentabilidade e a coer-ção aos crimes ambientais passaram a ser maispesados, sobretudo, para as empresas explora-doras do agronegócio, da extração de madeirase da mineração artesanal.

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8 INEVITABILIDADE DA PARTICIPA-ÇÃO DA SOCIEDADE E DO ESTADONA PREVENÇÃO AOS DANOS AMBI-ENTAIS

A atuação do Estado e da Sociedade em ge-ral é de fundamental importância no combate adegradação ambiental, pois para termos ummeio ambiente equilibrado e de todos é neces-sário essa cooperação.

Ao combate dessas políticas de degradaçãoteremos que agir em três áreas:

8.1 Conscientização, combate aos crimes am-bientais e políticas de desenvolvimentosustentável.

Segundo Fiorrillo (1997), o combate deveter três frentes estatais: O Poder Legislativo,Poder Executivo e o Poder Judiciário.

Essas políticas em conjunto poderão dimi-nuir a degradação junto ao meio ambiente eassegurar sua utilização de forma equilibrada ecom mais racionalidade. Criando um ambien-te propício para a sustentabilidade e uma vidacom mais qualidade social.

9 CONCLUSÃO

A resposta que o meio ambiente tem paraessas degradações é proporcional aos prejuízoscausados a ele. Ao homem se nada for mudadonas políticas ambientais ao redor do mundo,poderemos ter em breve, um colapso global enenhum meio ambiente restará para as futurasgerações.

No Brasil, devido a pressões internacionais(Conferencia de Estocolmo, Rio 92 e outras)veio a minimizar os descasos da legislaçãomátria.

Hoje, há varias legislações ambientais nomundo e no Brasil (lei 9605 de 1998, lei 7347de 1985 e a própria Constituição Federal).

Mas, como até hoje o meio ambiente temsido alvo de degradações?Por que as políticasde preservação são tão de respeitadas?

A resposta está na formação do tripé:Conscientização, combate aos crimes am-

bientais e políticas de desenvolvimento susten-tável. (grifo nosso)

Portanto, não basta apenas esforços do Es-tado, de políticas publicas mais intensificadas,de novas leis mais rígidas, mas sim, de umanova consciência ambiental para as atuais e fu-turas gerações. Para que todos nós possamosdesfrutar da natureza e do desenvolvimentosustentável.

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