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    AulaMICRO × MACRO1O b j e t i v o s

    Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

    1   Reconhecer e aplicar os conceitos de média, densidade e

    concentração relacionando-os a valores de grandezas ma-croscópicas.

    2   Identificar escalas de tempo, comprimento e energia asso-ciadas a alguns sistemas físicos.

    3   Identificar grandezas e variáveis intensivas e extensivas.

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    MetaApresentar as escalas de tempo, comprimento e energia de diver-sos processos físicos, bem como as diferenças entre fenômenosmicro e macroscópicos.

    Pré-requisitosEsta aula requer que você esteja familiarizado com os conceitosde Teoria Cinética dos Gases apresentados na Aula 7 desta dis-ciplina e com as equações de Boyle e Gay-Lussac (ou Charles)apresentadas na Aula 8 de Física 2A.

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    INTRODUÇÃO

    No final do século XIX, a Termodinâmica já podia ser con-

    siderada como uma teoria bem estabelecida. Através dela, ocomportamento térmico de vários sistemas pôde ser compreen-dido no nível macroscópico, levando a um grande desenvolvi-mento tecnológico. A possibilidade de construção de máquinastérmicas e motores foi fundamental para o que hoje conhecemoscomo Revolução Industrial.

      

      

    Curiosidade

    A Revolução Industrial consistiu em um conjunto de mudan-

    ças tecnológicas com profundo impacto no processo produ-tivo em nível econômico e social. Iniciada na Inglaterra emmeados do século XVIII, expandiu-se pelo mundo a partir doséculo XIX. A Física desenvolvida nessa época teve um papelfundamental no desenvolvimento de novas tecnologias. Es-pecificamente, a Termodinâmica permitiu que fossem cons-truídas máquinas térmicas mais eficientes para uso direto noprocesso industrial, como os teares, ou para a expansão dosmeios de transporte, como o motor a vapor e o motor a com-bustão interna.

    Um dos principais ingredientes da formulação matemáticada Termodinâmica são as variáveis de estado que, como o nomeindica, descrevem o estado macroscópico do sistema. Algunsexemplos são: energia ( E ), entropia (S ), volume (V ), pressão( p) e temperatura (T ). O arcabouço da Termodinâmica é umconjunto de leis a serem obedecidas pelas variáveis de estado.Normalmente, parte-se de alguma relação empírica entre algu-mas variáveis de estado, e relações entre outras variáveis podemser obtidas com o uso das leis da Temodinâmica. Nessa aborda-

    gem sempre lidamos com a descrição macroscópica.O que falta na Termodinâmica é uma forma de encontrar

    relações entre variáveis de estado a partir de princípios funda-mentais da escala microscópica. O objetivo da Física Estatística(FE) é complementar a Termodinâmica, obtendo a descrição ma-croscópica de um sistema físico formado por um número muitogrande de partículas, a partir do conhecimento estatístico no ní-vel microscópico.

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    Historicamente, pode-se considerar a formulação do Teo-rema  H  por Boltzmann em 1872 como o marco inicial da FE.Nesse teorema Boltzmann mostra que, enquanto um sistema re-laxa para o equilíbrio, é possível definir-se uma função, a função H , que nunca aumenta com o passar do tempo. A partir dessafunção, Boltzmann propôs uma definição de entropia ligada aograu de desordem do sistema e compatibilizou o princípio doaumento da entropia, existente na Termodinâmica, com a visãoestatística de um sistema físico. Em poucas palavras, Boltzmannmostrou que um sistema que evolui no tempo, com energia cons-tante, encontra seu equilíbrio na configuração mais desordenada,que é também a mais provável.

    Nessa época a Mecânica Quântica ainda não havia sido for-

    mulada, e todo o desenvolvimento inicial da FE foi feito atravésda descrição clássica do movimento das partículas. Assim, ha-via uma série de resultados que conflitavam com observaçõesexperimentais, especialmente com relação ao comportamento abaixas temperaturas.

    Foi exatamente na tentativa de descrever a radiação térmicapor Planck, em 1901, que surgiu a ideia de que a energia daradiação eletromagnética emitida pelos átomos nas paredes deuma cavidade deveria ser quantizada, e não contínua. O modeloproposto por Planck é considerado como o início da Mecânica

    Quântica. À medida que a descrição quântica passou a ser usada,a excelente concordância entre as previsões da FE e as observa-ções experimentais consagrou a teoria.

    Figura 1.1: Boltzmann

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    Curiosidade

    A questão fundamental perseguida por Boltzmann era comosistemas macroscópicos podiam apresentar irreversibilidade

    se as leis que regem o mundo microscópico são reversíveis.A resposta veio ao estudar as colisões aleatórias entre mo-léculas de um gás. Ao longo da formulação do problema,Boltzmann definiu a função   H  =

      P( u) ln P( u)d u, em ter-

    mos da probabilidade P( u) de encontrar uma molécula comvelocidade entre  u e   u + d u. O processo em questão, a ter-malização do gás de moléculas, está embutido na forma fun-cional de P( u); essa função muda à medida que o gás atingeo equilíbrio termodinâmico através de colisões entre as mo-léculas. É possível mostrar-se que essa função  H  nunca au-

    menta. A partir dela a entropia para N  moléculas foi definidacomo S  = − N κ  H , sendo κ  uma constante, mais tarde deno-minada constante de Boltzmann. A teoria de Boltzmann foimuito atacada na época, levando o cientista a um profundoestado de depressão que culminou com seu suicídio em 1906.

    Inicialmente criada para o estudo de sistemas físicos, a abran-gência de sua formulação estendeu a aplicabilidade da FE a ou-tras áreas, como biologia e economia, no final do século XX.Em poucas palavras, a FE fornece um mecanismo sistemáticopara o cálculo das probabilidades de ocorrência de configura-

    ções microscópicas, como veremos na Aula 6. Nesse cálculo osingredientes principais são a energia e a temperatura. A FE com-bina o princí pio de minimização da energia da Mecânica coma maximização da entropia, princípio proveniente da Termodi-nâmica através da Segunda Lei. O estado de equilíbrio de umdeterminado sistema é definido por esses dois processos de ex-tremização, sendo a minimização de energia dominante a baixastemperaturas, e a maximização da entropia, a altas temperaturas.

    A TEORIA CINÉTICA

    A primeira tentativa de descrição microscópica de um sis-tema macroscópico foi feita através da Teoria Cinética dos Ga-ses. Nessa abordagem o movimento das moléculas do gás é des-crito pelas leis da Mecânica Clássica, e considera-se que elascaminham e colidem entre si e com as paredes do reservatóriode forma aleatória. Na Aula 7 de Física 2A você viu a determi-nação cinética da pressão de um gás ideal e a sua relação com

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    a lei de Boyle. Praticamente todas as ideias que serão trabalha-das nas próximas aulas estão presentes no modelo cinético dogás ideal. Em primeiro lugar, temos um sistema que contém umnúmero elevadíssimo de partículas. Neste caso, o sistema é umgás de baixa densidade, contido num recipiente macroscópicode volume V .

    !Para o melhor entendimento desses conceitos, é importanteque você refaça os Exercícios 2, 3 e 4 da Aula 7 de Física2A.

    Num volume macroscópico, o número de moléculas do gás, N , é da ordem do número de Avogadro ( N a), ou seja, N  ∼ 1023.Qualquer tentativa de entender o comportamento desse sistemaatravés do conhecimento da posição e da velocidade de cadamolécula será infrutífera. Mesmo se conseguíssemos ter acessoa esses dados, a qualquer instante de tempo, eles seriam inú-teis para responder às perguntas que geralmente são feitas sobreum sistema como esse, basicamente: quais são seus valores depressão, densidade e temperatura.

    Através de hipóteses simplificadoras sobre o comportamentomicroscópico das moléculas, a teoria cinética possibilita relaci-onar a pressão  p, que é uma grandeza macroscópica, com as ve-locidades moleculares  ui, i = 1,2, . . . N , através do valor médio,u2, do quadrado da velocidade como:

     p ≡ 13ρu2 ,   (1.1)

    sendo

    u2

    ≡  1

     N 

     N 

    ∑i=1 u2i   (1.2)

    e   ρ   a densidade volumétrica. Finalmente, a conexão com atemperatura (outra grandeza macroscópica) pode ser feita a par-tir de observações empíricas, tais como a lei de Boyle ( pV   =constante), ou a lei de Gay-Lussac ou Charles (V /T  = constante).Com esse procedimento começamos com uma visão microscó-pica, dada pelos valores de 6 N  variáveis (valores de  u x,  u y,  u z,

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     x,  y e  z de cada molécula), e chegamos à macroscópica, com 3variáveis:   p, V   e  T . O processo envolveu o cálculo de valoresmédios para descrever o conjunto de moléculas.

    Exercicio 1.1

    Atende ao Objetivo 1

    Os conceitos de média e densidade podem ser usados emqualquer sistema, não apenas os formados por átomos e molé-culas. Veja esta foto, que mostra vários grãos de arroz espalha-dos sobre uma folha de papel. Como você faria para estimar onúmero de grãos nessa foto usando o conceito de densidade?

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    Resposta ComentadaUma inspeção visual mostra que a densidade de grãos é razoa-velmente homogênea, portanto, podemos contar quantos grãosestão num pequeno quadrado, e depois calcular a área total.Como definir o tamanho do quadrado? Ele deve ser grande osuficiente para ter um número razoável de grãos, mas não muitogrande, porque queremos exatamente evitar ter de contar mui-tos grãos. Se o quadrado for muito pequeno, o número de grãosnele dependerá muito de onde está colocado, o que levaria a umadispersão enorme no valor médio do número de grãos na dadaárea. Para vermos o efeito dessa escolha, vamos considerar qua-drados com 2 cm de lado (linha preta) e com 1 cm de lado (linhaclara). Vamos posicionar cada quadrado em 5 pontos distintose contar quantos grãos estão dentro de cada um. Imediatamente

    notamos a primeira dificuldade: como lidar com grãos que estãoparcialmente dentro do quadrado. Vamos estimar as frações degrão nas bordas dos quadrados.

    Comecemos com os quadrados menores, em branco. Cha-mando de ni o número de grãos no i-ésimo quadrado, temos:

    n1 = 9   n2 = 11   n3 = 9   n4 = 12   n5 = 12.

    Calculamos o valor médio:

    n = 15

    5

    ∑i=1

    ni = 10,6

    e o desvio quadrático médio:

    σ  =

     15

    5

    ∑i=1

    (ni −n)2 = 1,4.

    Chamando de  a a área dos quadrados brancos, calculamos

    a densidade superficial média de grãos, definida como ρ ≡n/a. Nesse caso, ficamos com ρ = 10,6 grãos/cm2. A áreatotal da foto é 103,8 cm2, portanto, a estimativa do número totalde grãos é 914.

    Repetimos o procedimento usando os quadrados maiores,com a = 4 cm2. Neste caso encontramos:

    n1 = 33   n2 = 32   n3 = 34   n4 = 36   n5 = 37 .

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    Outras quantidades calculadas são: n = 34,4, σ  = 1,85 eρ = 8,6 grãos/ cm2. Nesse caso, o número total de gãos nafoto é estimado em 893.

    ESCALAS DE TEMPO,  COMPRIMENTO EENERGIA

    A conexão entre os mundos micro e macroscópico só é pos-sível porque as escalas de tempo e distância características dasduas descrições são muito diferentes. Qualquer medição ou ob-servação macroscópica demora um tempo extremamente longoem comparação aos tempos típicos de variações microscópicas.Podemos fazer algumas estimativas tomando como exemplo um

    recipiente macroscópico contendo um mol de hélio à tempera-tura ambiente e pressão atmosférica. Começamos por calcular ovolume ocupado por 1 mol de gás. Usamos a equação de estadodo gás ideal, pV  = nRT , com os dados n = 1, nas CNTP, ou seja,T  = 300 K,  p = 105 Pa (≈ 1 atm). Assim, obtemos:

    V    =  nRT 

     p  =

     1 ×8,314J/(mol.K)×300K105 Pa

    =   24,9

    ×10−3m3 = 24,9

    Com esse resultado, calculamos o volume médio ocupadopor cada molécula ou átomo, no caso dos gases monoatômicos:

    v   ≡   V  N a

    =  24,9×10−3 m36,03 ×1023 átomos   (1.3)

    =   4,13 ×10−26   m3

    átomo = 41,3

      nm3

    átomo.

    Usamos o nanômetro (1nm = 10−9 m) para escrever a respostapor se tratar de uma unidade de comprimento mais adequada àescala atômica. Nessa escala, o angstrom (1 ˚ A = 10−10 m)  tam-bém é muito usado. Supondo uma forma cúbica, esse valor dev corresponde a um cubo de 3,45 nm de lado. Um átomo temdimensões lineares da ordem de angstrom, ou 10−1 nm, e assimvemos que há muito espaço vazio no gás.

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    Essa estimativa é a mesma para qualquer gás de átomos oumoléculas nas mesmas pressão e temperatura, valendo tambémpara o ar, por exemplo. Não percebemos esses vazios nos ga-ses porque eles se dão numa escala de comprimento muito me-nor que a nossa. Nossa percepção macroscópica é a de um gásde densidade homogênea igual à densidade média com relaçãoàs variações microscópicas. Embora tenhamos usado o termomicroscópico em oposição a macroscópico, um sistema com di-mensões da ordem de um micrômetro (1  µ m = 10−6 m) é bas-tante grande. Uma partícula sólida com volume igual a 1µ m3

    tem cerca de 1011 átomos. Assim, continuamos a usar o termomicroscópico apenas por tradição, pois o mais correto é referir-se à escala atômica ou nanoscópica.

    Exercicio 1.2

    Atende aos Objetivos 1 e 2

    A condutividade dos metais pode ser explicada por um mo-delo que considera um sólido metálico como um recipiente con-tendo um gás formado pelos elétrons dos orbitais incompletosmais externos de cada átomo. Estime a concentração desse gásde elétrons no lítio, um metal com um elétron de condução por

    átomo, massa molar  m =  6,94 g e densidade  ρ  = 535 kg/m3

    .Compare com a concentração de átomos de hélio nas condiçõesambientes.

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    Para o hélio, temos uma massa molar de 4 g, portanto ρHe ≈1,7 × 10−1 kg/m3. No caso do argônio, com massa molar de40 g, ρAr ≈ 1,7 kg/m3. Como estamos fazendo uma estimativa,podemos usar ρ

     ≈1 kg/m3. Esse é um número interessante de

    se guardar. Veja que a água tem densidade 103 kg/m3. Podemosconsiderar então esse um valor típico para líquidos. Assim, adensidade de um gás é tipicamente mil vezes menor que a deum líquido.

    Considerando condições ambientes, temos

    u2 = 3 pρ

      = 3 ×105 Pa

    1 kg/m3  = 30 ×104 (m/s)2 .   (1.6)

    Embora não seja igual à velocidade média,  u2 em geral di-fere desse valor por um fator da ordem da unidade, sendo, por-tanto, uma ótima estimativa para a velocidade média.

    Com essa aproximação, o valor médio das velocidades mo-leculares é

    u ≈ 

    u2 = 5,4×102 m/s = 1944 km/h .   (1.7)

    Assim, vemos que na escala atômica tudo é muito pequenoe rápido, em comparação com nossos padrões macroscópicos.

    Agora vamos verificar as escalas de energia envolvidas. Aunidade de energia mais adequada para esse fim é o elétron-volt(eV), a energia de um elétron num potencial de um volt. A rela-ção com a unidade de energia no sistema SI, o Joule, é:

    1 eV = 1,60×10−19J ou 1 J = 6,24 ×1018 eV .   (1.8)

    Começaremos calculando a energia cinética de um objetomacroscópico, uma bola de tênis. A velocidade da bola num

    saque é aproximadamente 60 m/s, e sua massa é cerca de 56 g.Portanto, sua energia cinética é:

     E bola   =  1

    2mu2 =

     12

    56 ×10−3 kg (60 m/s)2 (1.9)

    =   100,8 J = 6,30 ×1020 eV .

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    O átomo de hélio no gás tem uma velocidade altíssima, muitomaior que a da bola de tênis, mas sua massa é muito pequena. Amassa de um átomo é essencialmente a do núcleo, que no casodo hélio equivale, com uma boa aproximação, à massa de doisprótons e dois nêutrons. Assim, a energia cinética de um átomode hélio no gás é:

     E He   =  1

    2mu2 =

     12

    4× (1,67×10−27 kg)(5,4×102 m/s)2

    =   97,4×10−23 J = 6,07 ×10−3 eV = 6,07 meV .

    Veremos mais adiante (Aula 6) que a energia de agitaçãotérmica pode ser estimada pelo produto κ T , sendo κ  a constantede Boltzmann. Para temperatura ambiente, E T 

     ≡κ T 

     ≈0,025

    eV.

    !Revise a relação entre a energia cinética média e tempera-tura, equação (7.17), Aula 7 de Física 2A.

    Comparando com os valores de energia calculados, vemos

    que  E T    E bola e  E T    E He. Isso significa que o efeito da tem-peratura é irrelevante para o movimento da bola de tênis, masnão para o comportamento dos átomos de hélio no gás. Ou seja,o movimento do centro de massa da bola é determinístico, po-dendo ser perfeitamente descrito pelas leis da Mecânica Clás-sica, o mesmo não ocorrendo com o átomo de hélio.

    O  LIMITE TERMODINÂMICO

    Nas próximas aulas, veremos que a boa definição das gran-dezas macroscópicas depende do elevadíssimo número de partí-culas no sistema. Sempre que formos calcular valores macros-cópicos, devemos impor o limite  N  → ∞. Esse limite deve sertomado mantendo todas as densidades, ou valores específicos,constantes. Por exemplo, num gás, ao fazer  N  → ∞, o volumedeve aumentar de tal forma a manter  N /V , ou V / N , constante.A esse limite chamamos de  limite termodinâmico.

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    GRANDEZAS E VARIÁVEIS EXTENSIVASE INTENSIVAS

    Diretamente associadas ao limite termodinâmico estão asgrandezas intensivas e extensivas. Uma grandeza é intensivaquando seu valor não se altera quando  V   ou  N  muda de valor,sendo mantidas as densidades ou concentrações. Por exemplo,considere  N  moléculas de um gás, à temperatura  T , confinadasnum recipiente isolado de volume V . A pressão do gás pode serobtida pela equação de estado do gás. Suponha que diminui-mos o volume passando para  V /2. Se  N  for variado de formaa manter a mesma concentração anterior, ou seja, se retiramosmetade das moléculas, a temperatura e a pressão do gás ficaminalteradas.

    Por outro lado, as grandezas extensivas são proporcionais aV   ou   N , de tal forma que quando são divididas por essas va-riáveis, o resultado é independente delas. Por exemplo, volumee energia são grandezas extensivas, significando que  v ≡ V / N num sistema em equilíbrio não depende de  N . Também,  ε  ≡ E / N  não depende de  N . Assim, valores específicos ou densi-dades de grandezas extensivas são ideais para caracterizar sis-temas macroscópicos. Nem toda grandeza pode ser classificadacomo intensiva ou extensiva, mas tanto a termodinâmica quanto

    a Física Estatística só consideram grandezas com essas proprie-dades.

    Exercicio 1.4

    Atende ao Objetivo 3

    Dê um exemplo de uma grandeza não extensiva.

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    Resposta ComentadaPreço é frequentemente uma grandeza não extensiva. Veja porexemplo o preço do m3 de água cobrado pela companhia Águasde Niterói. Dependendo do consumo mensal, o preço do m3 é:

    de 0 a 15 m3 - 1,28 R$/m3;

    de 16 a 30 m3 - 3,21 R$/m3;

    de 31 a 45 m3 - 3,98 R$/m3.

    Assim, se um morador consome 20 m3 num mês, ele paga, deacordo com a tarifa progressiva:15 m3 a 1,28 R$/m3

    →R$ 19,20;

    5 m3 a 3,21 R$/m3 → R$ 16,05;Total = R$ 35,25 → 1,76 R$/m3.Um outro morador, que consume 40 m3, paga:15 m3 a 1,28 R$/m3 → R$ 19,20;15 m3 a 3,21 R$/m3 → R$ 48,15;5 m3 a 3,98 R$/m3 → R$ 39,80;Total = R$ 107,15 → 2,68 R$/m3.Ou seja, o valor do preço médio por m3 depende de quanto foiconsumido.

    Os textos de Termodinâmica em geral usam a letra  X  para asvariáveis que representam grandezas extensivas. Para toda variá-vel extensiva há uma intensiva, que chamaremos de Y , definidade tal forma que o trabalho realizado sobre o sistema seja dadopor  d W  = −Y dX . Por exemplo, se X  = V , Y  = − p, levando ad W  =  pdV .

    Exercicio 1.5

    Atende ao Objetivo 3

    Qual das quantidades abaixo é extensiva? Explique como obtevesua resposta.(a) O preço de N  folhas de papel A4.(b) A energia eletrostática de uma esfera de raio  R, dada por

     E  =  ρ2

    5ε 0

     34π 

    2/3V 5/3 ,

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    onde  ε 0 é a permissividade elétrica do vácuo,  V  é o volume daesfera e ρ  a densidade de carga.(c) A energia cinética total de um gás monoatômico com N  mo-léculas.

    Resposta Comentada

    (a) Esta é uma situação semelhante à do custo do m3

    de águaexaminada no Exercício 4. Se compramos 10 folhas certamentepagaremos mais por folha do se comprarmos um pacote com500. Se comprarmos uma caixa com 10 resmas, o preço por fo-lha será menor ainda. Assim, não é uma quantidade extensiva.(b) Nesse caso, é mais conveniente calcular a energia por uni-dade de volume. Temos:

    ε  = E 

    V =  ρ2

    5ε 0

     34π 

    2/3V 2/3 .

    Como ε  depende do volume, E  não é uma grandeza extensiva.(c) A energia cinética do gás é

     E  = 32

     N κ T  ,

    assim, E / N  não depende de  N , sendo E  extensiva.

    Exercicio 1.6

    Atende ao Objetivo 3

    Muitas vezes desprezamos efeitos de superfície, ou consi-deramos corpos com propriedades superficiais específicas quefacilitam nossos cálculos. Explique por que podemos fazer issoem sistemas macroscópicos.

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            1

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    Resposta ComentadaA questão toda é a razão q entre a área e o volume do corpo.

    Vamos considerar uma partícula esférica de raio   r . Nesse

    caso:q =

     4π r 2

    43π r 

    3 =

     3r   .

    A figura a seguir mostra o gráfico de  q em função de  r . Vejaque para partículas muito pequenas não podemos desprezar osefeitos de superfície.

        q    =     á    r    e    a     /    v    o     l    u    m    e

    R(u.a.)

    1

    0.1

    0.01

    1E-3

    0 200 400 600 800 1000

    CONCLUSÃO

    Podemos classificar fenômenos físicos em termos de suas es-calas de comprimento, tempo e energia como macro ou micros-cópicos. Aos macroscópicos, que são os observados por nós atémesmo sem o uso de equipamentos de medida, estão associadoscomprimentos grandes, variações lentas e energias altas, muitomaiores que a energia térmica. A observação desses fenômenos

    leva naturalmente à definição de variáveis macroscópicas, taiscomo pressão, temperatura e densidade, que representam médiasde grandezas microscópicas envolvendo um número gigantescode partículas, tipicamente da ordem do número de Avogrado. Aescala microscópica, ou escala atômica, envolve grandezas apro-priadas para descrever movimentos muito rápidos de átomos emoléculas que ocorrem com energias comparáveis com a ener-gia térmica. A influência da energia térmica na escala atômica

    C E D E R J   23

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    Física Estatística e Matéria Condensada |   Micro × macro

    acaba afetando as grandezas macroscópicas através do processoestatístico de promediação.

    A Termodinâmica é o ramo da física que trata dos efeitos

    térmicos no nível macroscópico, sem prover um mecanismo derelacionar as variáveis macroscópicas com as microscópicas.

    A Física Estatística é o ramo da Física que estabelece a liga-ção entre as escalas atômica e macroscópica.

    Exercicio 1.7

    Atende aos Objetivos 1 e 2

    Se todas as moléculas de água em 1 g de água fossem distri-buídas uniformemente sobre a superfície da Terra, qual a densi-dade superficial de moléculas? Considere a Terra esférica comraio de 6,4×103 km.

    Resposta ComentadaPrecisamos calcular o número  N  de moléculas em um grama ea área  A da superfície da Terra. A molécula de água tem doishidrogênios e um oxigênio, portanto tem uma massa molar de18 g. Um mol tem, portanto, 1/18 de grama, ou seja,

     N  =  6,03 ×1023 molécula/mol18 g/mol

      = 3,35×1022 moléculas/g .

    A área da superfície da Terra é

     A = 4π (6,4 km)2 = 515 km2 .

    24   C E D E R J

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        A    U    L    A

            1

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    Espalhando as moléculas uniformemente, teríamos a concentra-ção:

    φ s =

     N 

     A   =

      3,35×

    1022moléculas

    515 km2

    =   6,50×1019 moléculas/km2=   6,50×109 moléculas/cm2 .

    O termo densidade usado isoladamente normalmente refere-se adensidade de massa. Nesse caso, temos:

    ρs = φ sm = 6,50 ×109 moléculas/cm2

    3,35 ×1022 moléculas/g   = 1,94 ×10−13 g/cm2 .

    ResumoA principal ideia desta aula é a que podemos entender o com-portamento de um sistema usando diferentes níveis de descri-ção. A passagem do nível mais detalhado para o menos deta-lhado se dá através da definição de grandezas médias. Esse éum procedimento comum a diversas áreas. Por exemplo, aspesquisas de opinião tentam entender como a população secomporta de uma forma média. O nível microscópico nestecaso é aquele em que as opiniões individuais são coletadas.

    Na Física Estatística vamos examinar o comportamento deátomos e moléculas e através de médias entender como umvolume macroscópico se comporta.Algumas grandezas podem ser utilizadas em qualquer nívelde descrição. Por exemplo, podemos nos referir à velocidadede uma molécula no gás ou à velocidade de um avião. Ou-tras são específicas de um determinado nível. Por exemplo,a pressão é definida a partir de uma média de variáveis mi-croscópicas, portanto, sua definição só tem sentido no nívelmacroscópico. Todas as variáveis usadas na Termodinâmica

    referem-se a grandezas definidas no nível macroscópico e sãosempre o resultado de algum processo de promediação. Al-gumas vezes essa distinção será feita através do símbolo  x,que indica o valor médio de  x. Outras vezes, o próprio con-texto indicará se a grandeza é micro ou macroscópica.

    C E D E R J   25

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    Física Estatística e Matéria Condensada |   Micro × macro

    A Termodinâmica trabalha sempre a partir de algum conhe-cimento empírico no nível macroscópico. Esse ponto de par-tida pode ser, por exemplo, como varia o volume de um gás

    se a sua temperatura for alterada. Através de um conjuntode leis e de relações matemáticas, as relações entre outrasgrandezas pode ser obtida. O que não existe na Termodinâ-mica é uma forma sistemática de se passar do conhecimentomicroscópico para o macroscópico. A Teoria Cinética dosGases foi a primeira tentativa de se estabelecer essa passa-gem. A Física Estatística é a teoria que finalmente foi capazde relacionar essas duas descrições. Com ela partiremos doconhecimento da física de átomos e moléculas e chegaremosa relações macroscópicas compatíveis com as leis da Termo-

    dinâmica.Um ponto importante na formulação da Termodinâmica e,consequentemente, da Física Estatística é a existência degrandezas intensivas e extensivas. As grandezas extensivassão proporcionais ao tamanho do sistema, que pode ser de-finido em termos de volume, área, comprimento ou númerode partículas. Alguns exemplos de grandezas extensivas são:energia, volume, entropia e magnetização. As grandezas in-tensivas, por outro lado, são independentes do tamanho dosistema. Exemplos frequentes são: temperatura, pressão ecampo magnético. Nem toda grandeza pode ser classificadacomo intensiva ou extensiva, mas a Termodinâmica só lidacom esses tipos de grandezas.

    INFORMAÇÃO SOBRE A PRÓXIMA AULANa próxima aula, você vai aprender conceitos fundamentais parao tratamento estatístico de sistemas físicos, aplicados a um sis-tema binário.

    LEITURA CO MPLEMENTARS. R. A. Salinas,  Introdução à Física Estatística, primeira edi-ção, São Paulo, EDUSP.

    26   C E D E R J

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    AulaDESCRIÇÃO ESTATÍSTICA DE UM SISTEMAFÍSICO:   CASO DISCRETO2O b j e t i v o s

    Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

    1   Identificar macro e microestados de sistemas físicos.

    2   Calcular a multiplicidade de macroestados em alguns sis-temas físicos.

    3   Reconhecer e aplicar os conceitos de média e desviopadrão.

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        A    U    L    A

            2

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    INTRODUÇÃO

    Como vimos na aula anterior, nossas observações macroscó-

    picas correspondem a médias de grandezas microscópicas. Con-tinuamos nessa linha de pensamento, examinando um sistemafísico com uma abordagem probabilística.

    Nossa concepção de sistema físico daqui para frente será aseguinte: um conjunto contendo um número muito grande departículas, que têm uma dinâmica microscópica envolvendo va-riações muito rápidas. As observações macroscópicas desse sis-tema, obtidas através de medidas experimentais, detectam umcomportamento médio das variações microscópicas. Queremosser capazes de:

    •  a partir da medida experimental macroscópica, entender oque está se passando no nível microscópico;

    •  a partir do conhecimento detalhado no nível microscó-pico, prever qual será o resultado de determinada medidaexperimental.

    Em resumo, queremos uma maneira sistemática de conectaras descrições micro e macroscópica de um sistema físico. O

    ponto de partida para essa conexão será a energia. Pressupomosque a energia total do sistema possa ser calculada para qualquerconfiguração microscópica do mesmo. A partir de postulados eleis físicas, poderemos calcular a probabilidade de ocorrência decada configuração microscópica, e assim relacionar os valoresmedidos com os detalhes no nível atômico.

    Para formalizar os conceitos necessários à ligação entre asdescrições micro e macroscópica, usaremos um sistema muitosimples, formado por partículas binárias independentes e distin-guíveis, na forma de um sistema paramagnético uniaxial.

    SISTEMA MODELO:  PARAMAGNETOUNIAXIAL

    Um dos sistemas mais simples para um estudo estatístico éo formado por átomos paramagnéticos cujos momentos magné-ticos estejam sempre ao longo de um eixo, com orientação po-sitiva ou negativa. Esta é uma “caricatura” que descreve com

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso discreto

    boa aproximação o comportamento magnético de uma série demateriais. A observação macroscópica será uma medida do mo-mento magnético total do sistema, ou de sua energia, por issovamos entender como essas grandezas estão relacionadas comvariáveis microscópicas do sistema.

    Usaremos o termo macroestado para designar um estado ob-servável macroscopicamente, por exemplo, pela medida da ener-gia.

    Nosso sistema é sólido, os átomos não têm movimento detranslação e, embora sejam idênticos, são distinguíveis pelassuas posições. O momento magnético de cada partícula estásempre paralelo a um eixo, sendo a orientação ao longo deledefinida pela variável s, que pode ter os valores +1 ou

    −1.

    Figura 2.1: Possíveis orientações do momento magnético numsistema paramagnético uniaxial, com relação à orientação docampo magnético aplicado,   B.

    Suponha que o sistema contenha N  átomos. Temos aqui umtotal de 2 N  configurações distintas, dependendo das escolhas dovalor de s para cada átomo. Essas configurações serão chamadasde microestados daqui para a frente.

    Se os átomos têm momentos magnéticos unitários, o mo-mento magnético total de um dado microestado é dado por

     M  = N 

    ∑i=1

    si = ( N + − N −) ,   (2.1)

    sendo   N +( N −) o número de átomos com   s = +1(s = −1) nomicroestado. A presença de um campo magnético externo,   B,define a direção do eixo de alinhamento dos momentos mag-néticos. De acordo com nossa definição de  s, teremos  s = +1quando o momento for paralelo ao campo, e  s = −1 quando forantiparalelo. A energia de um dado microestado pode ser escrita

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        A    U    L    A

            2

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    como:

     E  = − BM  = − B( N + − N −) = − B(2 N + − N ) .   (2.2)

    Na última igualdade, usamos  N  = N + + N −. A última ex-pressão para a energia mostra que ela fica definida pelo valor de N + apenas se valores de  N  e  B são especificados. A Figura 2.2mostra alguns dos possíveis microestados para um sistema com N  = 7 e  N + = 3. Todos eles levam ao mesmo valor de energia esão idênticos para uma observação macroscópica.

    Figura 2.2: Exemplos de possíveis microestados do paramag-neto uniaxial. Nesse caso, N  = 7, N + = 3, N − = 4 e  M  = −1.

    Chamamos de   multiplicidade  ao número de microestadospertencendo a um dado macroestado, ou seja, ao número deconfigurações microscópicas que são idênticas do ponto de vistamacroscópico. Esse número em geral depende do número to-tal de partículas no sistema e do valor de energia escolhido, e

    será representado pela função  g( E , N ). No caso do sistema pa-ramagnético uniaxial, podemos também escrever   g( N +, N )  oug( M , N ), já que   E ,   N +   e   M  podem ser usados para definir omacroestado. Em alguns poucos casos, é possível calcular exa-tamente o valor de g; este é um deles. Observe que esse sistemaé idêntico ao descrito na Aula 25 de Introdução à Probabilidade,se associamos o estado s = +1 a cara, e s = −1 a coroa.  M  nadamais é do que o excesso de caras numa sequência de  N   jogadasda moeda.

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso discreto

    Nesse caso, para calcular a multiplicidade, basta calcular dequantas maneiras diferentes podemos escolher N + objetos, entreum total de N . A resposta é dada pela combinação C  N , N + ou seja

    g( N +, N ) = C  N , N + =  N !

     N +!( N − N +)! .   (2.3)

    Já que podemos usar apenas N + e  N  para identificar um ma-croestado, vamos simplificar a notação, usando   n  no lugar de N + daqui para a frente. Sejam   p e  q as probabilidades de cadamomento magnético ter orientação positiva ou negativa, respec-tivamente, na presença do campo externo, sendo  p + q = 1. Vol-tando ao exemplo da moeda,   p e  q  seriam as probabilidades dese tirar cara ou coroa em uma jogada de moeda. De acordo coma expressão (2.2), o menor valor de energia (o mais negativo)corresponde ao macroestado com todos os momentos magné-ticos paralelos ao campo externo, ou seja, todos com  s = +1.Queremos considerar também a possibilidade de ter momentosantiparalelos (s  = −1) e saber qual a chance de se obter ummacroestado com momentos antiparalelos também. Como cadamomento magnético é independente do outro, a probabilidadede ocorrência de um dado microestado com  n momentos positi-vos é  pnq N −n. Essa probabilidade é a mesma para qualquer umdos g(n, N ) microestados. Assim, a probabilidade de um sistema

    com N  momentos magnéticos ter n positivos (quaisquer uns) é

    P N (n) =  N !

    n!( N − n)! pnq N −n = g(n, N ) pnq N −n.   (2.4)

    A expressão (2.4) define o que chamamos  distribuição bino-mial.

    Para muitos problemas descritos pela distribuição binomial,

    é mais significativo o número que dá a diferença entre as quanti-dades de cada tipo, que definimos como  M . Podemos reescrever(2.4) em termos de M  como

    P N ( M ) =  N !

     N + M 2

    !

     N − M 2

    ! p

     N + M 2   q

     N − M 2   ,   (2.5)

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        A    U    L    A

            2

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    sendo

     N + ≡ n =  N + M 2   e   N − ≡ N − n = N − M 

    2  .   (2.6)

    Exercicio 2.1

    Atende aos Objetivos 1 e 2

    Encontre os macroestados e suas multiplicidades para umparamagneto uniaxial com N  = 4.

    Resposta ComentadaTemos um total de 2 N  = 24 = 16 microestados.   n varia entre 0e 4, ou  M  entre −4 e 4, levando a 5 macroestados. Podemosusar a equação (2.3) para calcular as multiplicidades. A tabela aseguir mostra os 24 = 16 microestados do sistema, classificando-os de acordo com os rótulos de macroestado   n  ou   M .   J   e   jsão índices arbitrários que identificam os macro e microestados,respectivamente.

    C E D E R J   33

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        A    U    L    A

            2

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    A condição de normalização pode ser escrita como

     N 

    ∑n=0

    P N (n) = ( p + q) N  = 1 .   (2.8)

    Temos também que

     N 

    ∑n=0

    g(n, N ) = 2 N  .   (2.9)

    O valor esperado, ou valor médio, relaciona-se com o valormedido através de uma experiência. Vamos usar nossa intuiçãoprimeiro para calcular o valor esperado no caso da distribuição

    binomial. Para isso vamos pensar que nossa experiência é jogara moeda e anotar se o resultado foi cara ou coroa. Se sabemosque   p é a probabilidade de se obter cara em uma jogada, é ra-zoável esperar que depois de  N  jogadas o número de caras seja pN . Vejamos agora como obter formalmente esse resultado.

    O valor esperado para  n na distribuição binomial pode serfacilmente calculado usando-se as expressões (2.8) e (2.4). Pordefinição de valor esperado, temos que:

    n = N 

    ∑n=0

    nP N (n) .   (2.10)

    Agora, note as seguintes igualdades:

    dd p

     N 

    ∑n=0

    P N (n) =  dd p

     N 

    ∑n=0

    g(n, N ) pnq N −n

    = N 

    ∑n=0

    g(n, N )npn−1q N −n

    =  1

     p

     N 

    ∑n=0

    g(n, N )npnq N −n = 1 p

     N 

    ∑n=0

    nP N (n)

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso discreto

    Fazemos então

    n = N 

    ∑n=0

    nP N (n) =  p dd p

     N 

    ∑n=0

    P N (n) =  p dd p

    ( p + q) N  = pN 

    (2.11)

    onde usamos ( p + q) N −1 = 1, já que  p + q = 1.

    Exercicio 2.2

    Atende aos Objetivos 1 e 2

    Um problema relacionado com o do sistema paramagnéticouniaxial é o do caminho aleatório em uma dimensão. Nesse pro-

    blema, uma partícula caminha ao longo de uma reta, dando pas-sos para a direita ou a esquerda, aleatoriamente. Cada passo éindependente do anterior, e todos os passos têm o mesmo tama-nho, . Seja  p a probabilidade de a partícula dar um passo paraa direita.(a) Se a partícula dá 10 passos, qual a probabilidade de que estejaa uma distância d  = 8 do ponto de partida? Suponha  p = 0,5.(b) Qual o valor esperado para  d , se a partícula dá 10 passos e p = 0,5? E se  p = 0,3?

    Resposta ComentadaA distância da partícula até a origem é dada pela diferença en-tre o deslocamento total para a direita e o deslocamento paraa esquerda. Assim, basta interpretar N +  e  N −  como o númerode passos para a direita e para a esquerda, respectivamente.   M passa a ser o número líquido de passos para a direita. Se M  > 0,a partícula terminou à direita depois dos  N  passos; se  M  <  0,terminou à esquerda. Como a distância está dada em unidadesde ,  d  =  8 significa que temos  M  = 8. Como o número total

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        A    U    L    A

            2

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    de passos é  N  = 10, usando a definição de  n  em termos de M  e N , equação (2.6), temos n = 9.(a) Usamos a equação (2.5) com  N  = 10, n = 9 e  p = q = 0,5:

    P10(9) =  10!9!1!

    12

    912

    1= 10

    12

    10=

      101024

     = 9,8×10−3

    (b) O valor esperado para d  é d  =  M . Da relação entre n  e M , temos que M  = 2n − N , portanto:

     M  = (2n− N ) = (2 N p− N ) = N (2 p−1) ⇒ d  = N (2 p−1) .

    Se  p = 0,5, d  = 0. Claro, a partícula dá passos para a direitae para a esquerda com igual probabilidade, e em média termina

    no ponto inicial.Se   p = 0,3, d  = 10(2 × 0,3 − 1) = −4. Aqui a probabili-dade de ir para a direita é menor, em média a partícula terminaà esquerda da origem.

    CÁLCULO DA VARIÂNCIA

    Outra grandeza importante para caracterizar o resultado deum experimento é a variância, σ 2. Essa quantidade é calculada

    considerando-se o quão diferentes do valor esperado são os va-lores individuais num conjunto de medidas. Por exemplo, vamosconsiderar de novo a jogada de moeda. Uma experiência vai ser jogar  N  =  10 vezes a moeda. Imagine que realizamos essa ex-periência 6 vezes, e anotamos os valores de  n (número de caras)numa tabela. O valor esperado de  n para a experiência, supondouma moeda equilibrada, é n = 10×0,5 = 5. Assim, temos:

    C E D E R J   37

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        A    U    L    A

            2

            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    ras. Usamos um procedimento análogo ao adotado para o cál-culo de n, desta vez para a variância, definida como  σ 2 =(n − n)2. Em geral, trabalhamos com o desvio quadráticomédio σ .

    Primeiro notamos o seguinte:

    σ 2 = (n −n)2   =   n2 −2nn + n2=   n2−2nn + n2=   n2−2n2 + n2=   n2−n2 .   (2.12)

    Esta forma é mais adequada para cálculos analíticos. Come-

    çamos por calcular n2

    :

    n2   = N 

    ∑n=0

    n2P N (n) =

     p

     dd p

    2   N ∑

    n=0P N (n)

    =

     p

     dd p

    2( p + q) N  =  pN + ( pN )2 − p2 N  .

    Finalmente,

    σ 2 = n2−n2 =  pN − p2 N    =   pN − p(1 −q) N =   N pq.   (2.13)

    Assim, para dados valores de  p e q, quanto maior o valor de N , maior a dispersão entre os valores observados para  n. Esseresultado parece paradoxal: quanto maior o número de repeti-ções, maior a dispersão do valores encontrados. A questão é quea grandeza realmente importante é o valor relativo da dispersão.

    Suponha fixo o valor da variância para uma dada grandezaadimensional que está sendo medida, por exemplo, o númerode palitos de fósforo numa caixa. Seja esse valor  σ 2 = 16, ouσ  = 4. Se estivermos tratando de caixas com 20 palitos em mé-dia, essa flutuação é bastante grande; significa que podemos en-contrar caixas com 24 e 16 palitos. Se a mesma variância apare-cer em caixas de 200 palitos em média, não será tão importante.

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso discreto

    O desvio relativo da distribuição binomial é dado por

    σ 

     N  =

    √  N pq

     N   = (qp)1/2 N −1/2 ,   (2.14)

    ou seja,σ / N  diminui com√ 

     N  quando N  aumenta. Logo, quantomaior o valor de N , menor será a flutuação relativa, menor seráa chance de se obter um valor muito diferente do esperado comoresultado de uma medida. Dizemos que o valor médio ou es-perado ficará mais bem definido quanto maior for o valor de N . Veremos mais tarde que este será o papel do limite termodi-nâmico na Física Estatística: fazer com que grandezas macros-cópicas provenientes de médias sobre grandezas microscópicassejam bem definidas.

    Usando a expressão (2.5), podemos calcular  P N ( M ) para di-ferentes valores de  N  e   p. A Figura 2.3 mostra o comporta-mento de  P N ( M ) para  N  =  20 e 40, para dois casos: simétrico( p =  q  =  0,5) e assimétrico ( p =  0,9 e   q =  0,1). Em ambosos casos,  P N ( M ) terá seu valor máximo quando  n = n = N p,ou  M  = 2n− N  = N (2 p − 1). No caso simétrico, esse pontoaparece para M  = 0, e no assimétrico, para M  = 0,8 N .

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            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    M   M

    M

    M

    P (M)40

    P (M)20

    Figura 2.3:   P N ( M ) para diferentes valores de  N . Na linha su-perior   N  = 40, e na inferior,   N  = 20. Na coluna da esquerda p = q = 0,5, a distribuição é simétrica com relação ao ponto demáximo, que ocorre para  M  =  M  = 0. Na coluna da direitaum dos resultados é bem mais provável,  p = 0,9 e q = 0,1, le-vando a uma distribuição assimétrica, cujo máximo ocorre para M  =  0,8 N . Note que, para  N  = 40, embora  M  esteja definidoentre −40 e 40, a distribuição é bem concentrada em torno de M  = 0.

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso discreto

    Exercicio 2.3

    Atende ao Objetivo 3

    Calcule a dispersão relativa para as distribuições mostradas naFigura 2.3.

    Resposta ComentadaA dispersão relativa é dada por  σ / N  =

      pq/ N . Temos, assim:

     N    =   40   p = q = 12 → σ 

     N =

     12

    12

    140

     = 0,08

     N    =   40   p =  9

    10   q =  1

    10 → σ 

     N  =  910 110 140  = 0,05

     N    =   20   p = q = 12 → σ 

     N  =

     12

    12

    120

     = 0,1

     N    =   20   p =  910

      q =  110

     → σ  N 

     =

      910

    110

    120

     = 0,07

    Exercicio 2.4

    Atende ao Objetivo 3

    Considere um gás com   N  moléculas contido num volume  V 0.Considere um certo subvolume   v, como esquematizado na fi-gura.(a) Calcule a probabilidade de que exatamente  n  moléculas es-tejam em v, não interessando quais sejam.(b) Calcule a dispersão relativa  R  = σ 2/n2 e explique o com-portamento de R quando v V 0 e  v ≈ V 0.

    42   C E D E R J

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            2

            1

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        D    U    L    O    1

    Resposta Comentada(a) Considerando que as moléculas do gás estejam uniforme-mente distribuídas em V 0, a fração de moléculas em v é dada porv/V 0. Supondo que V 0 seja macroscópico (senão este problemanão tem sentido...), a probabilidade  p de que cada molécula, in-dividualmente, esteja no subvolume v é dada por essa fração, ouseja,  p = v/V 0. A probabilidade de que n  moléculas específicas

    estejam em  v  é  pn

    . Como podemos escolher quaisquer n  molé-culas, a probabilidade pedida é dada pela distribuição binomial:

    P N (n) =  N !

    n!( N − n)!

     v

    V 0

    nV 0 − v

    V 0

     N −n.

    (b) O número médio n em v é

    n = N p =  NvV 0

    .

    C E D E R J   43

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso discreto

    A dispersão relativa R = σ 2/n2 em v pode ser então calcu-lada como

     R =

      N pq

    ( pN )2  =

     N p(1

    − p)

    ( pN )2   =

     1

    − p

     pN    =

     V 0

    −v

     Nv   .

    Se v V 0, R  será um número muito grande. Isso significa que,se tomamos um subvolume desse tamanho e realizamos váriasmedidas do número de moléculas dentro dele, os valores en-contrados serão bastante diferentes entre si. Numa situação ex-trema, se  v V 0/ N , que é o volume médio por molécula, po-demos ter até mesmo n = 0 em alguma medição. Por outrolado, se   v → V 0,   R ≈ 0, os valores dessa medida serão muitosemelhantes entre si, ou seja, n será bem definido.

    CONCLUSÃO

    Podemos usar distribuições de probabilidades para descre-ver sistemas físicos do ponto de vista estatístico. As principaisgrandezas nesse contexto são o valor esperado, ou valor médio,e a variância. O valor esperado, como indica o nome, é o quese espera obter como resultado de uma experiência, quando amesma for repetida um número infinito de vezes. Sendo assim,realizando a experiência uma vez, ou um número finito de vezes,

    certamente obteremos valores diferentes do esperado. A variân-cia é a grandeza que nos permite quantificar essa dispersão devalores obtidos, com relação ao valor esperado. Quanto maioro número de repetições da experiência, menor será a dispersãorelativa, fazendo com que o valor esperado seja uma grandezabem definida para a quantidade que está sendo medida.

    Exercicio 2.5

    Atende aos Objetivos 1 e 2

    Um sólido contém   N  núcleos que não interagem entre si.Cada núcleo pode estar em qualquer um de três estados quânti-cos, rotulados pelo número quântico m, que pode ter os valores0 e ±1. Devido a interações elétricas com campos internos aosólido, núcleos nos estados  m = +1 ou  m = −1 têm a mesmaenergia ε  > 0, enquanto que a energia do estado  m = 0 é zero.Calcule a multiplicidade g( E , N ) do macroestado de energia E .

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    Dica: Escreva a energia como  E  = ( N − N 0)ε , onde N 0 é o nú-mero de núcleos com  m  = 0. Agora você pode usar ( N − N 0) = E /ε .

    Resposta ComentadaComo a energia pode ser escrita em termos de  N  e  N 0, são es-sas as variáveis que rotulam o macroestado, não importando oestado dos núcleos com  m = 0. A primeira contribuição paraa multiplicidade vem de como escolher os núcleos com  m = 0.Dados N  e  N 0, há  C  N , N 0  maneiras de fazer essa escolha. Paracada uma delas temos a liberdade de escolher quais núcleos comm = 0 terão m = +1 ou −1, sem que a energia seja alterada. Porexemplo, considere N  = 5,  N 0 = 3. Uma possibilidade de esco-lha de núcleos com m = 0 é:

    a b c d e

    0 0 0

    Agora, podemos considerar todas as possibilidades para os nú-cleos b e e. Temos assim:

    a b c d e

    0 + 0 0 +0 + 0 0 -

    0 - 0 0 +0 - 0 0 -

    Uma determinada escolha de núcleos com   m =  0 gerou 22 =4 possibilidades para os núcleos com   m = 0. No caso geral,teríamos 2 N − N 0 possibilidades. Assim, a multiplicidade total é

    g( N 0, N ) =  N !

    ( N − N 0)! N 0!2 N − N 0

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    Escrevendo em termos da energia, fica

    g( E , N ) =  N !

     E ε ! N − E ε !2

     E ε 

    ResumoNesta aula, aprendemos as definições de macroestado, micro-estado e multiplicidade, analisando as configurações possí-veis de um sistema binário. Aproveitamos para rever os con-ceitos de probabilidade, distribuição, valor esperado e vari-ância em sistemas discretos, calculando essas grandezas parao sistema binário, analisando o comportamento da variânciarelativa com o número  N  de componentes do sistema. Comisso, verificamos que o limite   N  →  ∞   leva a distribuiçõesmuito centradas em torno do valor esperado.

    INFORMAÇÕES SOBRE A PRÓXIMA AULA

    Na próxima aula, continuaremos com a descrição estatística desistemas físicos, mas considerando sistemas descritos por variá-veis reais obedecendo a uma distribuição contínua. Em parti-cular, veremos como obter a distribuição gaussiana a partir dolimite N → ∞ da distribuição binomial.

    LEITURA CO MPLEMENTAR

    S. R. A. Salinas,  Introdução à Física Estatística, primeira edi-ção, São Paulo, EDUSP, Capítulo 1.

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    MetaApresentar as principais propriedades das distribuições de variá-veis contínuas.

    Pré-requisitoEsta aula requer que você esteja familiarizado com os conceitosbásicos de probabilidade e distribuição binomial apresentadosem Introdução à Probabilidade e Estatística.

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    INTRODUÇÃO

    Na Aula 2, estudamos a distribuição binomial   P N ( M )  que

    dá a probabilidade de se obter um determinado valor de M  em N eventos. O significado de M  depende do contexto, ou seja, da ex-periência considerada. Se a experiência for jogar uma moeda N vezes, M  é a diferença entre o número de caras e coroas obtido.Caso estejamos medindo o momento magnético total de um sis-tema com N  átomos paramagnéticos, M  é o momento magnéticototal, referente à diferença entre o número de momentos atômi-cos com alinhamento paralelo e antiparalelo ao campo magné-tico aplicado. Nos exemplos analisados numericamente nestaaula, os valores de N  foram pequenos, e fez sentido calcular, porexemplo, a probabilidade de encontrar  M  = 2 num sistema com N  = 4.

    Agora imagine que consideramos um sólido paramagnéticoreal, com cerca de 1023 partículas. Não há como detectar expe-rimentalmente variações de uma unidade em  M ; na verdade, atémesmo variações da ordem de 104 serão imperceptíveis. Nessequadro não tem sentido basear a descrição estatística do sistemaem valores discretos para M , sendo mais informativo conhecer aprobabilidade de encontrar M  dentro de um certo intervalo d M .Neste caso, a variável M  passa a ser contínua, um número real.

    Outros sistemas que não são adequadamente descritos pordistribuições discretas são aqueles em que a variável observadaé naturalmente um número real. Um exemplo típico é o gás idealestudado pela Teoria Cinética. Todo o formalismo está baseadono fato de que as moléculas do gás têm velocidades diferentes,variando de acordo com alguma distribuição. O valor da veloci-dade u de uma molécula é representado por um número real. Aocompararmos dois valores de velocidade, temos que necessari-amente decidir primeiro quantas casas decimais serão compa-radas, o que em geral vai envolver a precisão do equipamento

    disponível para medidas. Assim, o intervalo du  fica natural-mente definido. Nesta aula, vamos aprender como formalizar osconceitos estatísticos aprendidos na aula anterior para variáveisdiscretas, considerando agora um sistema descrito por variáveisreais.

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    HISTOGRAMAS

    Antes de passarmos ao formalismo matemático das distri-

    buições contínuas, vale a pena aprender um pouco sobre  histo-gramas. Um histograma é um tipo especial de gráfico, em que afrequência relativa ou o número de ocorrências de valores medi-dos é expressa em função do valor das medidas. Sua construçãoenvolve os seguintes passos:

    1. Obtenção de uma tabela com  N  valores medidos da gran-deza que se quer estudar. Vamos chamar essa grandeza de x. Quanto maior o valor de N , mais significativo será oresultado.

    2. Análise dos dados no que diz respeito aos valores mínimoe máximo de x.

    3. Determinação do tamanho do intervalo ∆ x que será usadopara classificar os dados.

    4. Dividir a variação total de x nos dados obtidos em  n inter-valos de tamanho ∆ x. Em geral, tomamos como extremosvalores xmin e  xmax, tais que todos os dados são incluídos ea escala de leitura para o gráfico é simples.

    5. Contamos quantos dados caem em cada intervalo:   N i é onúmero de dados entre xi e  xi +∆ x.

    6. Opcionalmente podemos dividir a contagem em cada in-tervalo pelo número total de dados, definindo a frequênciarelativa F i = N i/ N . Faremos isso no exemplo a seguir.

    7. Traçamos o gráfico de  F i  em função de ¯ xi, que é o valorcentral de cada intervalo.

    Note que, usando a divisão por N  explicada no item 6, temos a

    normalizaçãon

    ∑i=1

    F i =n

    ∑i=1

     N i

     N   =

      1 N 

    n

    ∑i=1

     N i = 1 .   (3.1)

    Vamos ver um exemplo dessa construção aplicando-a a umconjunto de medidas do período de um pêndulo simples. Su-ponha que um aluno realizou o conjunto de  N  = 100 medidasrelacionadas na Figura 3.1.

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    Figura 3.1: Conjunto de dados resultantes de uma experiênciade medição do período de um pêndulo simples.

    Examinando a  Figura 3.1  diretamente, é difícil obter al-guma informação relevante sobre a experiência. Começamoscalculando o valor médio e o desvio quadrático médio, obtendoτ  = 2,79 s e  σ  = 0,4 s. Vamos agora construir o histogramaseguindo os passos indicados anteriormente. O menor valor de

    período na tabela é  τ min   =   1,7365 s, e o maior  τ max =  3,7085s. Para simplificar, vamos fazer o gráfico entre 1,72 s e 3,72 s,com 10 intervalos de  ∆τ   =   0,2 s. Contamos quantas medidascaem em cada intervalo, e dividimos por 100 cada contagem.Finalmente, obtemos o histograma de frequências mostrado naFigura 3.2.

    Observando o histograma da Figura 3.2, notamos a concen-tração de valores em torno de  τ  = τ . Quando os valores doperíodo se afastam do valor médio, o número de ocorrências caibastante. Esse histograma está bastante assimétrico. Vamos ver

    como sua forma se altera se um número maior de medidas éconsiderado.

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    0.25

    0.20

    0.15

    0.10

    0.05

    0.00

    1.8 2.0 2.2 2.4 2.6 2.8 3.0 3.2 3.4

    τ(s)

            F

    Figura 3.2: Histograma relativo aos dados da Figura 3.1. Aqui N  = 100 e δ τ  = 0,25 s.

    Numa experiência equivalente, foram tomadas   N  = 1.000medidas do período. Em vez de mostrar a tabela, vamos apre-sentar logo os valores resultantes da contagem por intervalos.Nesse caso, os valores mínimo e máximo foram 1,585 s e 3,993s, respectivamente. Assim, construímos o histograma com in-

    tervalos de 0,25 s, indo de 1,55 a 4,05. A Figura 3.1  mostrao resultado da classificação dos dados nesses intervalos.   F   éa frequência relativa, ou seja, o número de dados no intervalocentrado do valor indicado na primeira coluna, dividido por  N .Por exemplo, havia quatro valores entre 1,550 s e 1,800 s, dandoF  = 4/1.000.

    Os valores de F  na Figura 3.1 podem ser considerados comouma estimativa para a probabilidade de se obter uma medida deperíodo nos intervalos considerados, já que seu valor dá a fraçãode medidas no intervalo. Seguindo essa ideia, a probabilidade dese ter uma medida na região central do histograma entre 2,295se 3,300s é 0,175 + 0,225 + 0,240 = 0,64, ou 64%.

    A forma geral do histograma também depende do valor de∆τ  considerado para a classificação dos dados. Por exemplo, aFigura 3.2 mostra um histograma construído com  ∆τ  = 0,20 ssobre o mesmo conjunto de dados da Figura 3.4. Como o inter-valo considerado na contagem é menor, o número de dados emcada um também será menor, por isso os valores de frequên-

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    cia são todos menores. Com um número finito de dados, sediminuirmos muito o tamanho do intervalo, haverá vários semnenhum dado, vários com um só dado etc.

    Tivemos essa mesma situação ao fazermos a contagem degrãos na Atividade 1 da Aula 1 e ao definirmos o tamanho dosubvolume do gás na Atividade 3 da Aula 2.

    Quando o número de dados for muito grande,  N →∞, pode-remos definir intervalos infinitesimais que conterão um númerosignificativo de dados. Com isso, será possível construir um his-tograma cuja forma será independente do tamanho do intervalo.Nesse limite estaremos partindo para uma descrição contínua.

    τ (s)   F 

    1,6750 0,0041,9250 0,0252,1750 0,0752,4250 0,1752,6750 0,2252,9250 0,2403,1750 0,1483,4250 0,0773,6750 0,0243,9250 0,007

    Tabela 3.1: Valores de frequência relativa para a construção deum histograma referente a um conjunto de  N  =  1.000 medidasde período de um pêndulo simples. As medidas estão classifica-das em intervalos de δ τ  = 0,25s.

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    Figura 3.3: Histograma relativo ao mesmo conjunto de dados daFigura 3.1. Aqui N  = 100 mas com ∆τ  = 0,20 s. Note como aforma geral foi alterada, e em especial os valores de frequência.

    DISTRIBUIÇÕES DE VARIÁVEIS ALEATÓ-RIAS CONTÍNUAS

    Queremos agora tratar de variáveis reais contínuas tais que

    podemos tomar um intervalo infinitesimal d x e definir dP( x) ≡ f ( x)d x como a probabilidade de encontrar o resultado de umadeterminada experiência entre   x  e   x + d x. Essa probabilidadedepende em princípio de x, e também do tamanho de d x. Quantomaior for o intervalo considerado, maior será o valor numéricode   f ( x)d x para um mesmo x. Nesse caso, é mais significativa adefinição de densidade de probabilidade, da seguinte forma:

     f ( x) ≡ dP( x)d x

      ,   (3.2)

    ou seja, a função   f ( x) define a distribuição da variável aleatória x, dá a densidade de probabilidade da mesma.

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            1

        M      Ó

        D    U    L    O    1

    1.6 1.8 2.0 2.2 2.4 2.6 2.8 3.0 3.2 3.4 3.6 3.8 4.0

    0.25

    0.20

    0.15

    0.10

    0.05

    0.00

            F

    τ(s)

    Figura 3.4: Histograma relativo a um conjunto de dados similaraos da tabela 3.1, mas com N  = 1.000 valores, classificados emintervalos ∆τ  = 0,25 s. Sobre o histograma estão indicados o va-lor médio, τ    =  2,79 s, e o desvio quadrático médio σ  = 0,4 sem linha mais grossa. Comparando este gráfico com o da figura3.2, podemos observar que é muito mais simétrico, e apresentamenos flutuações, consequências do aumento do número de me-didas. A região compreendida entre τ −σ  e τ +σ  concentraa maior parte do dados.

    !O termo densidade de probabilidade refere-se ao fato deque na formulação contínua dP é uma probabilidade, sendo,portanto, uma grandeza adimensional, um número. Assim, f ( x)d x também é adimensional, e   f ( x) tem unidade de  x−1.Note que  x pode ser qualquer grandeza, massa, velocidade,

    carga, etc.   f ( x)  é a probabilidade  por  unidade de  x, daí otermo densidade.

    O espaço amostral nesse caso será um volume d -dimensional,dependendo da dimensionalidade de x. Por exemplo, considereos átomos de um gás ideal (não interagente). A posição r  e a ve-locidade  u são variáveis aleatórias contínuas. O espaço amostralpara a posição é o espaço definido pelo recipiente que contémo gás, sendo tridimensional. Para as velocidades, é o espaço

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    definido por |u| ≥ 0, 0 ≤ φ  ≤ 2π , 0 ≤ θ  ≤ π , também tridimen-sional.

    No caso do histograma, ao calcularmos a probabilidade de

    obter o período do pêndulo entre determinados valores, soma-mos as contribuições dos intervalos  ∆τ   correspondentes. Nocaso de uma distribuição contínua, se queremos tratar de um in-tervalo não infinitesimal, por exemplo, se queremos saber qual aprobabilidade de ter x entre os valores a e b, temos

    P(a ≤ x ≤ b) =   b

    a f ( x)d x =

       ba

    dP( x) .   (3.3)

    A densidade de probabilidade,   f ( x), é uma função contínua

    por partes, satisfazendo

     f ( x) ≥ 0 (3.4)

    e    Ω

    dP = Ω

     f ( x) d x = 1 ,   (3.5)

    onde  Ω é o volume do conjunto de todos os valores possíveispara x.

    Um caso particular importante é o da distribuição uniforme.

    Nesse caso, dP( x) = C d x, onde C  é uma constante que pode serobtida por normalização, ou seja, Ω

    dP = C  Ω

    d x = C Ω= 1 ⇒ C  =   1Ω.   (3.6)

    O valor esperado de   x  é definido de forma equivalente a(2.10), substituindo a soma por uma integral:

     x = Ω

     x dP( x) = Ω

     x f ( x)d x   .   (3.7)

    E o valor esperado de uma função g( x) é dado por

    g( x) = Ω

    g( x) f ( x)d x .   (3.8)

    Uma situação comum é a de conhecermos a distribuição parauma determinada variável   x e procurarmos a distribuição paraoutra   y, sendo as duas variáveis relacionadas por uma função

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     y =  g( x). Nesses casos, é conveniente identificar as distribui-ções para x e  y através de subíndices, assim,   f  x seria a distribui-ção para  x e   f  y  a para  y, sendo as duas distribuições em geraldiferentes.

    Vamos ver um exemplo concreto de como calcular a densi-dade de probabilidade de uma variável aleatória contínua. Con-sidere um átomo paramagnético cujo momento magnético   mpode apontar em qualquer direção com igual probabilidade. Va-mos escrever   m  em coordenadas esféricas através de seu mó-dulo m  e direção definida pelos ângulos polar e azimutal θ  e φ ,respectivamente. Vamos calcular a densidade de probabilidade f θ (θ ) de encontrar  m com módulo m, com qualquer valor de  φ ,mas com θ  entre θ  e θ  + dθ .

    O espaço de amostragem nesse caso é a área da esfera de raiom. Queremos calcular a probabilidade dP(θ ) de que  θ   estejaentre θ  e θ  + dθ . Ela é igual à área do anel de raio m e espessuradθ  dividida pela área total da esfera, ou seja,

    dP(θ ) ≡   f θ (θ )dθ  = |2π (m sinθ )m dθ |4π m2   = 12 | sinθ dθ | .   (3.9)

    Tivemos que usar o módulo nesse caso porque, por defini-ção, dP(θ )> 0. Comparando as expressões (3.12) e (3.9), temosque a função distribuição para  θ , ou a densidade de probabili-dade, é

     f θ (θ ) = (1/2)| sinθ | .   (3.10)

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    Exercicio 3.1

    Atende ao Objetivo 2

    Considere o átomo paramagnético anterior, mas usando coorde-nadas cartesianas. Qual a densidade de probabilidade de quea componente z  do momento magnético esteja entre  m z e  m z +dm z?

    Resposta ComentadaTemos que m z = m cosθ , ou cosθ  = m z/m. Logo, temos

    1

    2

     sinθ  dθ  =

      1

    2m

    dm z.   (3.11)

    Assim, podemos reescrever (3.9) em termos de  m z como

    dP(m z) =   f m z (m z)dm z =  12m

    dm z .   (3.12)

    Comparando as expressões (3.12) e (3.2), vemos que a densi-dade de probabilidade para a componente m z é   f m z (m z) = 1/2m,ou seja, os valores de  m z são uniformente distribuídos no inter-valo

    −m

    ≤m z

    ≤m, já que sua distribuição não dependende de

    m z.

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    Exercicio 3.2

    Atende ao Objetivo 2

    Um sistema é constituído por vários osciladores harmônicos uni-dimensionais, cujas posições são dadas por  x  =  A cos(ω t  +α ),onde a constante de fase  α  é uma variável aleatória uniforme-mente distribuída entre 0 e 2π .

    (a) Qual a densidade de probabilidade   f  x( x)  de encontrar umdesses osciladores entre x e x + d x?

    (b) Faça o gráfico de   f  x( x) e interprete fisicamente sua forma.

    Respostas Comentadas(a) Se a constante de fase é uniformemente distribuída, então f α (α ) é uma constante que pode ser obtida por normalização.Como α  está definida entre 0 e 2π , temos

       2π 0

     f α (α )dα  = C    2π 

    0dα  = C 2π  = 1 →   C  =   1

    2π  .   (3.13)

    Logo,   f α (α ) = 1/2π . No intervalo entre 0 e 2π   há doisvalores de α  que geram o mesmo valor de x, portanto, dP( x) =2dP(α ). Como d x = A sin(ω t +α )dα , temos que dα  = d x/( A2− x2)1/2, e finalmente, a densidade de probabilidade desejada é:

    dP( x) =   f  x( x)d x = 2dP[α ( x)] = 2 f α (α )dα ( x)

    =   2  12π 

    d x

    ( A2 − x2)1/2 ⇒   f  x( x) =  1

    π ( A2 − x2)1/2   .

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    (b) O gráfico a seguir mostra a forma de   f  x( x) para A  = 2,0. Osvalores máximos estão em  x ± A, ou seja, é mais provável queencontremos os osciladores nas regiões próximas aos extremos,ou pontos de retorno. Esse resultado é fácil de entender, nessespontos a velocidade é menor, portanto o tempo de permanênciaé maior.

               

       

       

          

        

          

        

               

    DISTRIBUIÇÃO GAUSSIANA

    Sempre estaremos interessados em sistemas com valores de N  elevados, por isso é conveniente verificar o comportamento da

    distribuição binomial quando N   1. À medida que aumenta-mos N , P N (n) tem valores apreciáveis apenas nas vizinhanças deseu máximo, como pode ser visto na Figura 2.3, por isso vamosexaminar essa região. Note que mesmo quando  p = q, a regiãodo máximo é aproximadamente simétrica se os valores de  p e  qnão forem muito diferentes.

    Vamos trabalhar com o log da distribuição, porque estare-mos considerando um regime em que há grandes variações deprobabilidade. Temos assim, a partir da distribuição binomial,equação (2.4),

    ln P N (n) = ln N ! − ln n! − ln( N − n)! + n ln p + ( N − n) ln q .(3.14)

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    Usamos a aproximação de Stirling para o fatorial de um nú-mero muito grande:

    ln N ! = N ln N −

     N +O (ln N ) , N 

    1.   (3.15)

    A obtenção dessa aproximação pode ser vista com detalhesno livro indicado como referência ao fim da aula. A expressãoO (ln N ) significa “termo da ordem de ln N ”, o que quer dizer quea expansão indicada difere de ln N ! por um valor cuja ordem degrandeza é O (ln N ). Seja ñ o valor mais provável de n, ou seja,aquele para o qual P N (n) é máxima. Podemos escrever esse valorcomo ñ = rN , 0 <  r  

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    temos

    ln P N (n) ≈ ln P N (ñ) + ε  dln P N dn n=ñ     0

    +12ε 2

     d2ln P N dn2 n=ñ   

    −   1 N pq

    + · · ·

    (3.21)

    Exponenciando, teremos

    P N (n) = C exp

    −(n − ñ)

    2

    2 N pq

    = C exp

    −(n −n)

    2

    2σ 2

     ,   (3.22)

    onde a expressão (2.13) foi usada na identificação de  σ .

    A constante de normalização, C , pode ser encontrada se im-

    pomos que a soma das probabilidades para todos os valores pos-síveis de n é 1, ou seja,

       +∞−∞

    dn C exp

    −(n −n)

    2

    2σ 2

    = 1 .   (3.23)

    Esta integral e outras similares vão aparecer muitas vezesnas próximas aulas, por isso vale a pena ver como pode ser cal-culada.

    Nosso objetivo é calcular a integral

     I  =   +∞−∞

    du e−u2

    (3.24)

    O ponto de partida é a integral   I   no plano   xy, escrita emcoordenadas polares como

     I  =   2π 

    0dφ 

       ∞0

    e−r 2

    r dr  = 2π 

    −e

    −r 2

    2

    ∞0

    = π  .   (3.25)

    Mas I  também pode ser escrita em coordenadas cartesianas,dando

     I    =   +∞−∞

    d x   +∞−∞

    exp−( x2 + y2)d y

    =

       +∞−∞

    e− x2d x

       +∞−∞

    e− y2d y

    = I 2 .

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        M      Ó

        D    U    L    O    1

    Logo,    +∞−∞

    e−u2du =

    √ π  .   (3.26)

    Obtemos, assim, a expressão final normalizada

    P(n) =  1

    σ √ 

    2π exp

    −(n −n)

    2

    2σ 2

      ,   (3.27)

    ou

    P N (n) =  1√ 2π  N pq

    exp

    −(n − N p)

    2

    2 N pq

     .   (3.28)

    As expressões (3.27) e (3.28) definem o que chamamos dedistribuição gaussiana, também chamada distribuição normal.

    Exercicio 3.3

    Atende ao Objetivo 4

    (a) Mostre que

       +∞−∞

    e−ax2d x =

     π 

    a  .   (3.29)

    (b) Use esse resultado para calcular a constante de normali-zação C  da equação (3.23).

    (c) Mostre que

       ∞0

     x2e−ax2d x =

      π 

    4a

     π 

    a  a > 0 (3.30)

    Dica: observe a igualdaded

    da

       ∞0

    e−ax2d x = −

       ∞0

     x2e−ax2d x .

    C E D E R J   63

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    Respostas Comentadas(a) Partimos da equação (3.26), e fazemos uma troca de variá-veis:

    u = √ ax → du = √ a d x .Com isso, temos

       +∞−∞

    e−ax2d x =

      1√ a

       +∞−∞

    e−u2du =

     π 

    a .

    (b) Basta fazer as identificações:   y  =  x −  x   e   a  = 2σ 2 em(3.23).

    (c) O integrando da equação (3.26) é uma função par, portantopodemos escrever

       ∞0

    e−ax2d x =

     12

     π 

    a.

    Usamos a dica:

    dda

       ∞0

    e−ax2d x =

      dda

    12

     π 

    a

    =

     12

    12

    1a

     π 

    a .

    Exercicio 3.4

    Atende ao Objetivo 4

    Verifique a validade da aproximação gaussiana.

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    Resposta ComentadaA forma gaussiana foi obtida ao truncarmos a expansão de logP N até o termo quadrático; assim, devemos ver os efeitos da trunca-gem na expressão (3.21). Calculamos o primeiro termo que foidesprezado, e que envolve a terceira derivada:

    13!ε 3

     d3ln P N dn3

    n=ñ

    = 16ε 3

      q − p N 2 p2q2

     = 16

    (n − ñ)3   q − p N 2 p2q2

      .   (3.31)

    Para que a aproximação gaussiana seja boa, devemos ter

    12 N pq

    |n − ñ|2   |q − p|6 N 2 p2q2

    |n − ñ|3 ,   (3.32)

    ou seja,|n − ñ|   3 N pq|q − p| ,   (3.33)

    definindo assim a região em torno do máximo onde a aproxima-ção é válida. Para um dado valor de  N , quanto mais próximosforem   p e  q, maior será | p −   q| −1 e mais fácil será satisfazera condição (3.32). Por outro lado, dados  p  e  q, quanto maiorfor  N , mais fácil será satisfazer a condição. Fora do intervalodefinido em (3.33), ou seja, para |n − ñ| ≥ 3 N pq/|q − p|, temosP ∼ exp[−9 N 2 p2q2/(2 N pq|q− p|2)] → 0 para N →∞, portantoa aproximação é boa para N pq 1.

    PROPRIEDADES DA DISTRIBUIÇÃO GAUS-SIANA

    Vamos trabalhar com a forma (3.27). Como partimos da dis-tribuição binomial, tínhamos uma variável adimensional, n é umnúmero, variando de uma unidade. Para que possamos genera-lizar o resultado para qualquer variável real, temos que definir

     x =  n, sendo    um número real com dimensão. Mantendo anotação usada para a densidade de probabilidade, temos:

     f G( x) =  1

    σ √ 

    2π exp

    −( x− x)

    2

    2σ 2

     .   (3.34)

    Aqui o subíndice G  identifica que estamos tratando de umadistribuição específica, a gaussiana. Agora, σ  tem a mesma uni-dade de  e   f G( x) tem unidade de −1.

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    Primeiro vamos examinar sua forma geral em função dosparâmetros  x e σ . A Figura 3.5 mostra gráficos de   f G( x) paradiversos valores de  x  e  σ . O valor de  x  dá a posição domáximo e posiciona a curva como um todo. σ  está relacionadocom sua largura e com a rapidez com que   f G varia quando nosafastamos de seu valor máximo.

               

       

       

            

        

          

        

               

               

               

    Figura 3.5: Gráficos de distribuições gaussianas a partir daexpressão (3.34)

    O valor de   f G( x) no ponto de máximo é dado por   f G( x), evale

     f Gmax =  1

    σ √ 

    2π ⇒   f G( x) =   f Gmax exp

    −( x− x)

    2

    2σ 2

    .   (3.35)

    Vamos ver como σ  está relacionado com a largura da curvacalculando em que pontos ela cai a   f Gmax/e ou a 36,8% de   f Gmax:

     f G( x±) =   f Gmaxe−1 ⇒ −( x± − x)22σ 2 = −1 ⇒ x± =  x±σ √ 2(3.36)

    A Figura 3.6 mostra as regiões compreendidas por  x ±σ  e x ± 2σ . Vemos que a região em torno do máximo, onde estãoos maiores valores de   f G( x), é essencialmente definida pelo pa-râmetro σ .

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    Figura 3.6: Gráficos de distribuições gaussianas com  σ  = 2 e x = 0 mostrando as regiões compreendidas por (a)  x ±σ  e (b) x ±2σ .

    Exercicio 3.5

    Atende ao Objetivo 4

    Calcule a largura total da curva gaussiana em pontos tais queela caia à metade do valor máximo.

    Resposta ComentadaDevemos impor a condição   f G( x±) =   f Gmax/2 que implica

    ( x± − x)22σ 2

      = ln2 ⇒  x± =  x±σ √ 

    2ln2.   (3.37)

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    Física Estatística e Matéria Condensada | Descrição estatística de um sistema físico: caso contínuo

    Vamos agora considerar