agravo de instrumento n. 2014.024566-9

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Agravo de Instrumento n. 2014.024566-9, de Porto Belo Agravante : Minisrio Público do Estado de Santa Catarina Promotora : Dra. Lenice Born da Silva (Promotora) Agravados : Auto Fossa Palotina Ltda. ME e outros Relatora : Desa. Cláudia Lambert de Faria DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA contra a decisão proferida pelo Jzo da 2ª Vara da comarca de Porto Belo que, nos autos da Ação Civil Pública n. 139.13.001744-0, ajuizada em face da AUTO FOSSA PALOTINALTDA. ME. E OUTROS, ora agravados, manteveo indeferimento o pedido liminar, que visavaa proibição das atividades das empresas ou qualquer outra forma de intervenção no meioambiente, com exceção de medidas necessárias paraevitarmaiores danos (fl.82). Pugna pela concessão do efeito suspensivo ativo e, ao final, pelo provimento do recurso, com a reforma da decisão recorrida. Éo relatório. O recurso é tempestivo, considerando que o agravante possui o benefício do prazoem dobro nos termos do art. 188 do CPC, e foiinstruído com os documentos indispensáveis, relacionados no art. 525, inc. I, do CPC,estando o recorrente dispensado do recolhimento do preparo, de acordo com o§1º do art. 511 do mesmodiploma legal. Resta averiguar seestão presentes os requisitos do art. 273, do CPC, para que se possa conceder a antecipação dos efeitos da tutela recursal. Insurge-se o agravante contra a decisão de primeirograu que manteveo indeferimento o pedido liminar, que visavaaproibição das atividades das empresas ou qualquer outra forma de intervenção no meioambiente, com exceção de medidas necessárias paraevitarmaiores danos. Da análise dos autos, observa-se que, desde o icio do ano de 2004, já havia notícia de que um dos agravados, no casooSr. Gentil Fonseca, teria instalado irregularmente e de forma clandestina uma unidade de tratamento de esgoto, conforme demonstram os documentos de fls. 165/171. No ano de 2007, foilavrado Termo Circunstanciado de Ocorrência Ambiental em face da Auto FossaLitoral Ltda, de propriedade do Sr. Gentil, onde restou constatado que os agravados permaneciam descartando dejetos no meio ambiente sem o adequado tratamento, sendo que os recorridos foram, inclusive,

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Page 1: Agravo de Instrumento N. 2014.024566-9

Agravo de Instrumento n. 2014.024566-9, de Porto BeloAgravante : Ministério Público do Estado de Santa CatarinaPromotora : Dra. Lenice Born da Silva (Promotora)Agravados : Auto Fossa Palotina Ltda. ME e outrosRelatora : Desa. Cláudia Lambert de Faria

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo MINISTÉRIOPÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA contra a decisão proferida pelo Juízoda 2ª Vara da comarca de Porto Belo que, nos autos da Ação Civil Pública n.139.13.001744-0, ajuizada em face da AUTO FOSSA PALOTINA LTDA. ME. EOUTROS, ora agravados, manteve o indeferimento o pedido liminar, que visava aproibição das atividades das empresas ou qualquer outra forma de intervenção nomeio ambiente, com exceção de medidas necessárias para evitar maiores danos(fl.82).

Pugna pela concessão do efeito suspensivo ativo e, ao final, peloprovimento do recurso, com a reforma da decisão recorrida.

É o relatório.O recurso é tempestivo, considerando que o agravante possui o

benefício do prazo em dobro nos termos do art. 188 do CPC, e foi instruído com osdocumentos indispensáveis, relacionados no art. 525, inc. I, do CPC, estando orecorrente dispensado do recolhimento do preparo, de acordo com o § 1º do art. 511do mesmo diploma legal.

Resta averiguar se estão presentes os requisitos do art. 273, do CPC,para que se possa conceder a antecipação dos efeitos da tutela recursal.

Insurge-se o agravante contra a decisão de primeiro grau que manteve oindeferimento o pedido liminar, que visava a proibição das atividades das empresasou qualquer outra forma de intervenção no meio ambiente, com exceção de medidasnecessárias para evitar maiores danos.

Da análise dos autos, observa-se que, desde o início do ano de 2004, jáhavia notícia de que um dos agravados, no caso o Sr. Gentil Fonseca, teria instaladoirregularmente e de forma clandestina uma unidade de tratamento de esgoto,conforme demonstram os documentos de fls. 165/171.

No ano de 2007, foi lavrado Termo Circunstanciado de OcorrênciaAmbiental em face da Auto Fossa Litoral Ltda, de propriedade do Sr. Gentil, onderestou constatado que os agravados permaneciam descartando dejetos no meioambiente sem o adequado tratamento, sendo que os recorridos foram, inclusive,

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enquadrados no tipo penal prescrito no art. 60, da Lei n. 9.605/98 e no art. 15, incisoII, da mesma lei (fls. 245/253).

Por fim, recentemente, em dezembro de 2013, a Fundação do MeioAmbiente – Fatma autuou a empresa agravada por estar, mais uma vez,descartando resíduos de forma ilegal e clandestina, acarretando danos ao meioambiente (fl. 396).

Tais fatos, por si só, já são suficientes para caracterizar o potencial riscoao meio ambiente e a toda coletividade.

Com efeito, existindo indícios de que os agravados estão violando regrade proteção ao meio ambiente, a medida mais correta é, de fato, a suspensão daatividade até sua regularização, porquanto a proteção ao meio ambiente é um direitogarantido pela Constituição Federal, que assim prevê, em seu art. 225, in verbis:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bemde uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao PoderPúblico e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes efuturas gerações.

Nesse sentido, citam-se julgados deste Tribunal de Justiça:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONCESSÃO DELIMINAR - ALEGADO ESGOTAMENTO DO OBJETO DA AÇÃO - INOCORRÊNCIA -PROVA PERICIAL DEFERIDA - AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO PRÉVIA DOPODER PÚBLICO - DESNECESSIDADE - SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA -PRELIMINARES REJEITADAS.Não há falar em esgotamento do objeto da demandaquando o Magistrado defere liminar em ação civil pública determinando aSUSPENSÃO de ATIVIDADE econômica suspeita de causar danos ao meioAMBIENTE, sobretudo quando a medida judicial de urgência apenas objetivou aprevenção do direito material tutelado, qual seja, a preservação de determinadoecossistema até que a instrução da lide conclua se a ATIVIDADE é ou nãocausadora de dano ambiental, dependendo, para tanto, de prova pericial.Consoantea jurisprudência hodierna, pode o Magistrado, diante do caso concreto, desde quepresentes os requisitos legais (fumus boni juris e periculum in mora), e verificandotratar-se o caso de extrema urgência, deferir liminar em ação civil pública tendente aimpedir a ocorrência de dano ambiental, independentemente da oitiva do PoderPúblico.DIREITO AMBIENTAL - EXTRAÇÃO E BENEFICIAMENTO DE GRANITO -ATIVIDADE PRATICADA EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO E AS LICENÇASAMBIENTAIS - ALEGADA ATIVIDADE ECONÔMICA DE RISCO AMBIENTAL AOSISTEMA HÍDRICO NA REGIÃO POR OUTRAS EMPRESAS - PROTEÇÃO AOMEIO AMBIENTE - INTERESSE COLETIVO - EXEGESE DO ART. 225 DA CF -PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO - PRESENÇA DO FUMUS BONI JURIS E DOPERICULUM IN MORA - RECURSO DESPROVIDO. A prevenção de dano ao meioAMBIENTE, com o fim de proteger o interesse coletivo, pois a reparação, casoocorra dano ambiental, afigura-se incerta, onerosa e muitas vezes irreversível,justifica o deferimento de liminar tendente a obstar, ainda que de forma provisória, acontinuidade de ATIVIDADE econômica suspeita de causar dano a um determinadoecossistema. A existência de outras irregularidades porventura verificadas contra o

Gabinete Des. Cláudia Lambert de Faria

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meio AMBIENTE por outras empresas, não afasta a ilicitude e não confere direitos;os abusos e as violações das leis devem ser coibidas e nunca imitadas (nonexemplis sed legibus est judicandum), pois todos são iguais perante a lei paracumpri-la e não para descumpri-la. Com base nos princípios da "precaução" e da"prevenção", as autoridades devem tomar medidas preventivas sempre que existiremmotivos razoáveis de preocupação com a saúde pública e a manutenção doecossistema equilibrado, ensejando, pois, a paralisação imediata de qualquerATIVIDADE econômica tendente a degradar o meio AMBIENTE sadio. (TJSC - AI n.2004.021074-4, de Garopaba. Rel. Des. Rui Fortes, julgado em 15/02/2005 – semgrifo no original).

APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO SEGURANÇA. ENGENHO DE FARINHA.ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA. INTERDIÇÃO DOESTABELECIMENTO ANTE A AUSÊNCIA DA RESPECTIVA LICENÇAAMBIENTAL. VIOLAÇÃO AO ART. 60 DA LEI N. 9.605/1998. ALEGADA INÉRCIADO ÓRGÃO AMBIENTAL NA CONCESSÃO DO REFERIDO LICENCIAMENTO.NÃO COMPROVAÇÃO. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DO ALEGADO DIREITOLÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADA. ORDEM DENEGADA. É sabido que "emtema de controvérsia sobre licenciamento ambiental, a ponderação dos riscos eeventuais prejuízos deve, à luz do princípio da precaução e ante a possibilidade depericulum in mora inverso, ser resolvida em favor do INTERESSE COLETIVO naPROTEÇÃO ao meio AMBIENTE" (AI n. 2009.026444-3, da Capital, rel. Des. NewtonJanke, j. em 15-9-2009).Na hipótese, inviável a manutenção da atividade produtivadesenvolvida pelo impetrante, qual seja, produção de farinha de mandioca, uma vezque potencialmente poluidora, bem como porque até o presente momento não foitrazida aos autos a respectiva licença ambiental, embora concedido prazo paratanto.SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO (TJSC - AC em MS n.2011.056682-5, de Jaguaruna. Rel. Des. Vanderlei Romer, julgado em 28/11/2011– sem grifo no original).

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DEMOLITÓRIA - OBRACONSTRUÍDA SEM AUTORIZAÇÃO DO MUNICÍPIO - AUTO DE INFRAÇÃOAMBIENTAL - EDIFICAÇÃO INSERIDA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃOPERMANENTE - IMPOSSIBILIDADE DE REGULARIZAÇÃO - PREPONDERÂNCIADO DIREITO COLETIVO AO MEIO AMBIENTE SADIO E EQUILIBRADO EMDETRIMENTO DO DIREITO À MORADIA.Considerando que restou comprovado nosautos que a construção foi realizada sem a devida autorização do Município, bemcomo que é impossível regularizar tal situação eis que a obra foi erguida em área depreservação permanente, cabível, pois, a demolição."Todos têm direito ao meioAMBIENTE ecologicamente equilibrado. O direito ao meio AMBIENTE equilibrado éde cada um, como pessoa humana, independentemente de sua nacionalidade, raça,sexo, idade, estado de saúde, profissão, renda ou residência. (...) Por isso, o direitoao meio AMBIENTE entra na categoria de INTERESSE difuso, não se esgotandonuma só pessoa, mas se espraiando para uma coletividade indeterminada."(MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 13. ed. São Paulo:Malheiros, 2005. p. 116) É hialino que o meio AMBIENTE, direito de terceira geração,de INTERESSE difuso e COLETIVO, das presentes e futuras gerações, deve estarsobreposto aos interesses individuais, mormente nos casos em que verifica-se

Gabinete Des. Cláudia Lambert de Faria

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flagrante o desrespeito às normas de PROTEÇÃO a natureza. DANO MORALAMBIENTAL - POSSIBILIDADE - REQUISITOS QUE AUTORIZAM A INDENIZAÇÃONÃO VERIFICADOS - DEVER, CONTUDO, DE RECUPERAR A ÁREADEGRADADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO."É admissível a indenizaçãopor dano moral ambiental nos casos em que a ofensa ao meio AMBIENTE acarretasentimentos difusos ou coletivos de dor, perda, sofrimento ou desgosto." (ApelaçãoCível 2000.025366-9, da Capital, rel. Des. Newton Janke, j. 23.09.04). (TJSC - AC n.2009.064540-9, da Capital. Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, julgado em08/01/2010 – sem grifo no original).

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANO AMBIENTAL -EDIFICAÇÃO DE RESIDÊNCIA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE -CABO DE SANTA MARTA PEQUENA (PRAIA DA GALHETA) - ÁREA NONAEDIFICANDI - INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA DO ÓRGÃO DEPROTEÇÃO AMBIENTAL - RECURSO DESPROVIDO."Entre o risco demonstradode agressão ao meio AMBIENTE e os eventuais prejuízos a serem suportados peloparticular, em obediência ao princípio da proporcionalidade, impõe-se seja protegidoo bem maior - o INTERESSE COLETIVO" (AI n. 2002.009857-0, de Joinville).O art.225, § 1°, III, da CF/88, veda qualquer utilização de área que comprometa aintegridade dos atributos que justificam a PROTEÇÃO ambiental. (TJSC - AC n.2007.060848-1, de Laguna. Rel. Des. Rui Fortes, julgado em 27/08/2009).

Dessa forma, diante de presença de indícios de irregularidades por partedos agravados, podendo acarretar, inclusive, danos ambientais irreversíveis, amedida mais acertada a concessão do efeito suspensivo ativo, a fim de proibir osagravados de exercer suas atividades ou qualquer outra forma de intervenção nomeio ambiente, com exceção de medidas necessárias para evitar maiores danos, sobpena de multa diária no valor de R$ 1.000,00, até que haja o pronunciamento doórgão colegiado competente para analisar o mérito do presente recurso.

De qualquer forma, cabe consignar que, nesta fase do agravo deinstrumento, apenas de cognição sumária, a questão é apreciada apenas de formasuperficial, a fim de verificar a existência ou não dos requisitos necessários àconcessão do efeito liminar pleiteado, sem, contudo, esgotar a discussão da matéria,que cabe à Câmara decidir.

Em face do exposto, admito o processamento do agravo na sua formade instrumento e, nos termos do artigo 527, inciso III, do Código de Processo Civil,defiro a concessão do almejado efeito suspensivo ativo, proibindo os agravados deexercer suas atividades ou qualquer outra forma de intervenção no meio ambiente,com exceção de medidas necessárias para evitar maiores danos, sob pena de multadiária no valor de R$ 1.000,00, até o pronunciamento definitivo da Câmaracompetente.

Comunique-se ao MM. Juízo a quo.Cumpra-se o disposto no art. 527, incisos V e VI, do Código de Processo

Civil.Após, à redistribuição nos termos do Ato Regimental n. 41/2000.Publique-se.

Gabinete Des. Cláudia Lambert de Faria

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Intime-se.Florianópolis, 1º de setembro de 2014.

Cláudia Lambert de FariaRELATORA

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