1517-4522-soc-17-40-00176

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    Sociologias, Porto Alegre, ano 17, no40, set/dez 2015, p. 176-211

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    http://dx.doi.org/10.1590/15174522-017004005

    DOSSI

    Discriminao e Racismo na Unio Europeia:diagnstico de uma ameaa negligenciadae da investigao cientfica correspondente

    LUDGER PRIES*

    NATALIA BEKASSOW**

    *Ruhr-Universitt Bochum (Alemanha)**

    Ruhr-Universitt Bochum (Alemanha)

    Resumo

    Manifestaes semanais do controverso movimento PEGIDA (Europeus Pa-triotas contra a Islamizao do Ocidente) estavam ganhando popularidade emdiversas cidades alems entre o final de 2014 e o final do ms de janeiro de 2015.Os assassinatos ocorridos na sede da revista satrica Charlie Hebdo e no supermer-cado Hyper Cacher durante a segunda semana de janeiro revelaram a realidadedo antissemitismo e provocaram surtos de islamofobia em muitos pases europeus.Discriminao e racismo so, evidentemente, questes importantes na Europa.Mas que significado tm esses eventos? Quo disseminadas so a discriminaoe o racismo na Europa? Este artigo descreve, inicialmente, os antecedentes hist-ricos e o desenvolvimento de um marco formal Europeu para no discriminao,em seus aspectos institucionais e jurdicos. Em seguida, apresenta e discute asprincipais fontes de dados oficiais e cientficas para o estudo da discriminao naUnio Europeia. Depois, aborda a situao atual do racismo e da discriminao na

    EU, com base nos estudos mais recentes e abrangentes sobre o tema. Finalmente,so esboadas algumas tendncias e desafios para novas pesquisas na rea.

    Palavras-chave: Discriminao. Racismo. Europa. Polticas de no-discriminao.

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    Discrimination and Racism in the European Union:diagnostic of a neglected challenge andthe corresponding scientific research***

    Abstract

    Weekly demonstrations of the controversial PEGIDA movement (PatrioticEuropeans Against the Islamization of the Occident) were gaining in popularity

    in different German cities during end of 2014 until end of January 2015. Deathsat the offices of satirical magazine Charlie Hebdo and the murdering at HyperCacher, a Jewish supermarket, during the second week of January 2015 revea-led the reality of Antisemitism and led to higher levels of Islamophobia in manyEuropean countries. Obviously discrimination and racism are important issues inEurope. But what do these events stand for? How extended are discrimination andracism in Europe? In this article, first the historical background and developmentof the European formal non-discrimination framework in its legal and institutionalaspects is described. Then the most important official and scientific data sourcesfor studying discrimination in the EU are presented and discussed. After that the

    current situation of racism and discrimination in the EU is presented based on themost recent and comprehensive related studies. Finally, some trends and challen-ges for further research will be outlined.

    Key words: Discrimination. Racism. Europe. Anti-discrimination policies

    esde o final de 2014, manifestaes semanais do con-troverso movimento PEGIDA1(Europeus Patriotas con-

    tra a Islamizao do Ocidente) ganhavam popularidadeem diversas cidades, especialmente em Dresden, commais de dez mil participantes at o final de janeiro de

    2015. As cidades do lado ocidental da Alemanha contavam com menosde mil participantes nas manifestaes do PEGIDA e sempre com umD

    1 Sigla do alemo Patriotische Europer Gegen die Islamisierung des Abendlandes. N.T.***

    Traduo: Luna Tradues e Comunicao. Reviso Tcnica: Karl Monsma

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    nmero muito maior de pessoas protestando contra esse. Mas, sem dvi-da, o referido movimento levou o tema do racismo, da islamofobia e doantissemitismo ao centro dos debates pblicos. Ningum poderia esperartal ressonncia, quando cerca de 350 pessoas se reuniram para participarda chamada !caminhada do entardecer", em 20 de outubro de 2014, emDresden. O mais inquietante que, ao contrrio do #Hooligans contraSalafis$ (#HoGeSa$), outra srie de manifestaes islamofbicas no incio

    deste ano, o PEGIDA logrou tornar-se atrativo no s para as atividadesda ultradireita, como tambm para os cidados e as cidads comuns %chamados !cidados preocupados".

    A maioria dos polticos mais importantes da Alemanha foi conver-gente em sua reao: o Ministro da Imigrao, Aydan zoguz, condenouos protestos Pegida; o Ministro da Justia, Heiko Maas (SPD), os chamoude #hipcritas$ e falou sobre a #repulsiva canibalizao$ das memrias dasvtimas do Charlie Hebdo. O Primeiro Ministro bvaro, Horst Seehofer(CSU) clamou inclusive pela suspenso das manifestaes. Mas, tambm,muitos polticos (de todos os partidos) argumentaram que os participantesdas manifestaes PEGIDA eram, na maioria, apenas #cidados comunsdo seio da sociedade$ e que era importante escutar atentamente suaspreocupaes. Mesmo o vice-chanceler e presidente do partido SocialDemocrata, Sigmar Gabriel, compareceu manifestao de 23 de janeirode 2015, para falar com os seguidores do Pegida2.

    Os disparos na sede da revista satrica Charlie Hebdo e os assassi-natos no Hypercacher, um supermercado de produtos kosher, durante asegunda semana de janeiro de 2015, tiveram por primeiro efeito justa-mente agregar argumentos retrica islamofbica do PEGIDA. Segundo

    2 http://www.spiegel.de/politik/deutschland/pegida-sigmar-gabriel-diskutiert-

    in-dresden-mit-anhaengern-a-1014783.html.

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    o movimento, !o ocidente" (uma construo social de alguns grupos so-ciais do !ocidente") caracterizado por valores cristos, e !o Isl" (assimcomo, para muitos seguidores do Pegida, os !os judeus") est ameaan-do a coeso social das sociedades do !ocidente" ao pedir demais aos!cidados comuns".

    No entanto, o relatrio anual sobre imigrao do DepartamentoFederal de Imigrao e Refugiados, apresentado em 21 de janeiro de

    2015 pelo Ministro do Interior, Thomas de Maizire, contradiz essas!preocupaes dos cidados comuns" (que em geral so, na verdade,inquietaes daqueles que se escondem sob o papel de porta-vozes do!povo"). A imigrao para a Alemanha predominantemente europeia.Em 2013, 58% de todos os imigrantes que ingressaram no pas vinhade pases da Europa. O principal pas de origem # desde 1996 # aPolnia. Em 2013, ocorreu um crescimento significativo do nmero deimigrantes vindos da Romnia e da Bulgria (tendncia evidente e con-tinuada desde o ingresso desses pases na Unio Europeia, em 2007),bem como da Crocia, Espanha e Itlia (BAMF, 2015:245). A proporode muulmanos em Dresden, o foco do movimento PEGIDA, inferiora um por cento da populao; para o estado da Saxnia, onde se loca-liza Dresden, ainda menor, 0,1 por cento. Na Alemanha, vivem hojecerca de duzentas mil pessoas de confisso judaica, e cerca de cem milso consideradas membros da comunidade judaica3.

    As manifestaes PEGIDA na Alemanha, os ataques terroristas e an-tissemitas em Paris, mas tambm a fora dos partidos nacionalistas de ex-trema direita, antissemitas e anti-isl, em muitos pases europeus (ustria,

    3 Com relao aos muulmanos, ver http://www.spiegel.de/politik/deutschland/pegida-die--thesen-im-faktencheck-a-1008098.html e http://zentralrat.de/2597_main.php; para a Alema-nha, ver http://de.wikipedia.org/wiki/Religionen_in_Deutschland, com relao aos judeus, verBAMF 2015: 113; http://www.amadeu-antonio-stiftung.de/aktuelles/antisemitismus-in-deuts-chland-ein-lagebild-2015/and http://www.zentralratdjuden.de/de/topic/5.mitglieder.html

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    Dinamarca, Frana, Grcia, Itlia, Holanda, Noruega, Sucia, Sua), bemcomo em muitos dos pases da Europa oriental que recentemente ingres-saram na Unio Europeia (UE) (como Bulgria, Hungria, Polnia e Rom-nia) representam graves ameaas UE e sua promessa de ser uma !reade liberdade, segurana e justia"4. Embora a Unio Europeia disponhade um marco jurdico e institucional altamente desenvolvido contra o ra-cismo, a realidade social parece diferir das promessas. Em vrios pases da

    UE, persistem antigas tradies racistas (como contra os ciganos, ou roma,na Bulgria, Hungria, Romnia e muitos outros pases da UE); alguns pa-ses experimentaram ondas de racismo violento de extrema direita (comoas ocorridas em Solingen ou Mlln, na Alemanha, durante os anos 1990,ou na Grcia, durante a ltima dcada).

    Podem-se levantar vrias questes: por que o racismo to forteem suas diferentes manifestaes? O que influencia as vrias ondas dediferentes formas de discriminao (do antissemitismo ao anti-islamismo ea crculos viciosos de ambos)? Quo efetiva e eficiente a poltica da UEpara combater o racismo? Quais os principais resultados da pesquisa cien-tfica sobre discriminao e racismo na UE? No h espao, neste artigo,para tratar de todas essas questes. As prximas sees iro concentrar--se em um balano da produo cientfica sobre a extenso, formas etrajetria do racismo na UE: Quais so as principais formas de discrimi-nao e racismo observadas nos estados membros da UE? H tendncias

    evidentes de crescimento ou reduo dos incidentes de discriminao eracismo? O que de fato sabemos sobre a magnitude da discriminao edo racismo na Europa, e que tipo de dados est disponvel? Os concei-tos de discriminao e racismo utilizados pelos estados membros da UEso os mesmos, de modo a permitir a comparao de dados? Existe umaabordagem ou marco especificamente europeu para lidar com questesde discriminao e racismo?

    4

    Ver http://free-group.eu/texts.

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    Assim, sero descritos os antecedentes histricos e os avanos doarcabouo antidiscriminao formal europeu em seus aspectos jurdicos einstitucionais (seo um). Em seguida, as fontes de dados oficiais e cient-ficas mais importantes para o estudo da discriminao na Unio Europeiaso apresentadas e discutidas (seo dois). Depois disso, ser introduzi-da a situao atual do racismo e da discriminao na UE, com base nosestudos mais recentes e abrangentes relacionados ao tema (seo trs).

    Finalmente, sero esboadas algumas tendncias e desafios para futuraspesquisas (seo quatro).

    Antecedentes histricos: da discriminao ao Holocausto

    Quando se trata de discriminao na Europa, h que distinguir umadimenso jurdica e uma social. Em seu sentido original, a palavra latinadiscriminaresignifica separar, diferenciar ou distinguir. Em vrias lnguas,o termo discriminao ! derivado do Latim e usado no sentido de uma

    discriminao social (positiva ou negativa) ! significa negar sistematica-

    mente, a indivduos ou grupos sociais, as mesmas oportunidades confe-

    ridas a outros, em razo de caractersticas adscritas especficas relaciona-

    das queles, como cor da pele, raa, etnicidade, origem nacional, lngua,

    crenas polticas ou religiosas, gnero, orientao sexual, idade, ou alteri-

    dade ou limitao fsica ou mental. Em termos jurdicos, existem diferen-

    tes mecanismos para favorecer ou desfavorecer determinados grupos de

    pessoas. Um nvel bsico de discriminao positiva a cidadania em um

    determinado Estado. A cidadania oferece uma srie de privilgios (como

    o direito de residncia no territrio do estado, acesso ao mercado de

    trabalho e seguridade social bsica, direito de voto e de ser eleito, direi-

    to a propriedade), mas tambm envolve uma srie de obrigaes (como

    educao escolar compulsria, servio militar, obrigao de votar). A dis-

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    criminao positiva tambm se refere ao uso gratuito (ou mediante tarifasreduzidas) de servios pblicos como museus ou servios de transportepara determinados grupos etrios (estudantes ou pessoas aposentadas) oureas especiais para mulheres e crianas em estaes de metr.

    Para os propsitos deste artigo, interessa a discriminao social ne-gativa. Sob a perspectiva sociolgica, a prpria existncia de dispositivosjurdicos de discriminao positiva reflete o fato de que certos grupos

    sociais precisam ser protegidos formalmente de modo especfico, porque,do contrrio, a discriminao social negativa incidente sobre eles seriaainda mais forte. Segundo esta lgica, mulheres e crianas seriam !mar-ginalizadas" no uso dos metrs, se no existisse uma zona especial quelhes permita entrar, porque prevaleceria a regra de dominao #do mais

    forte$. Menores de idade e idosos pensionistas so discriminados positi-

    vamente, com dispensa de taxas em museus ou piscinas pblicas, porque,

    de outro modo, seriam excludos ou discriminados no uso desses servios,

    em razo de seus escassos recursos econmicos.

    Visto de uma perspectiva sociolgica de desigualdade social (Pries,

    2014, captulo 12; ver tambm Lamont/Mizrachi, 2012: 367 e s.), o pro-

    cesso social de discriminao envolve quatro precondies. Primeira,

    o acesso a recursos socialmente escassos e desejados(bens econmicoscomo propriedades, renda ou alimentos saudveis; bens pblicos como

    educao, sade, ar puro; relaes, confiana e redes sociais, reconheci-

    mento e ateno) restringido por certos mecanismos sociais de inclusoe excluso de indivduos e grupos, e esses recursos so desigualmente

    distribudos entre os membros da entidade social em questo (um mbito

    de interao como uma comunidade, uma organizao, uma nao ou

    a !sociedade mundial"). Segunda, h competio, conflitos e lutas sociaisentre indivduos e grupos, com relao aos direitos de uso e distribuiodesses recursos demandados e limitados. Terceira, o mecanismo social de

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    distribuiodo acesso a esses recursos no foi acordado entre os mem-bros da unidade social em questo (como nos jogos, em que todos osparticipantes precisam pactuar as regras desde o incio), mas definidopor um grupo social hegemnico ou dominante. Quarta, essegrupo cen-tral poderoso logra definir a atribuio socialde certos direitos e statusnacompetio por recursos desejados, segundo camadas grupais que noso negociadas ou acordadas entre os grupos envolvidos.

    Com base nessas precondies, discriminao pode ser definida comoa percepo e tratamento sistematicamente distintos e hierarquicamentevalorativos (positiva ou negativamente) de pessoas, com base no em suascaractersticas reais, mas em esteretipos atribudos a um determinado gru-po social formado de estratos como gnero, idade, cor da pele, religio,cultura ou (supostas) limitaes fsicas ou mentais. Assim, racismo poderiaser entendido como uma forma especfica de discriminao baseada emaspectos visveis da distino social (Lentin 2004, pp. 72 e s.; Wei, 2013,pp. 24 e s.), embora o termo raa tenha experimentado uma mudana im-portante em seus fundamentos, que passaram de biolgicos para culturais(sobre esta mudana nas Naes Unidas ver, por ex., Mller, 2014).

    Um bom exemplo do processo de discriminao pode ser encontra-do no estudo !Os estabelecidos e os Outsiders", de Norbert Elias e JohnL. Scottson. Em seu estudo de uma pequena vila de trabalhadores inglesa,eles mostram como famlias estabelecidas unem-se e definem a si mesmas

    como superiores aos recm chegados, concentrados em reas especficasda vila # embora no existam diferenas significativas entre os grupos noque se refere ao nvel ocupacional, estrutura etria, lngua, nacionalidade,etnicidade etc. Os outsidersinternalizam e reproduzem, em certa medi-da, sua posio marginalizada, atribuda simplesmente por mecanismosde relaes de poder, e no por meritocracia ou outros aspectos qualita-tivos que pudessem justificar tal bifurcao no estatuto social designado

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    a cada grupo. Por causa de sua origem judia, Norbert Elias precisou fugirdo regime nazista da Alemanha, o qual, sem dvida, estabeleceu o maisbrutal sistema de discriminao j visto na histria humana.

    J em 1933, o ano em que o regime nazista assumiu o poder, foi pro-mulgada a Lei de Revogao das Naturalizaes e Negativa de CidadaniaAlem, a qual declarava que: as naturalizaes concedidas entre 9 de no-vembro de 1918 e 30 de janeiro de 1933 podem ser revogadas se a natu-ralizao for considerada indesejvel (Gktrk et al. 2011: 155). Essa lei jdenunciava o carter ditatorial e desumano do regime nazista, ao transformara cidadania, de um direito individual a uma deciso estatal por convenincia.Alm disso, ela j definia o rumo da poltica nazista de discriminao: Do-ravante, sero passveis de revogao da naturalizao: a. os judeus orientais,a menos que tenham lutado no front alemo durante a guerra mundial ouse tenham mostrado particularmente teis aos interesses alemes; b. Pessoasresponsveis por crimes ou delitos graves, ou que tenham praticado outros

    atos prejudiciais ao Estado e ao Povo (Volk) (ibid: 155).De modo simblico, exatamente um ano aps tomar o poder na

    Alemanha, em 30 de janeiro de 1934, o regime nazista promulgou a Leide Reconstruo do Impriode 1934, introduzindo a noo de cidadaniacomum alem, a qual, segundo a ideologia nazista, constituiria o apogeudo processo milenar de formao do !Reich Alemo" desde Carlos Mag-no. Contudo, essa ideia de uma cidadania alem generalizada j havia

    sido rompida pela Lei de Revogao das Naturalizaes e Negativa de Ci-dadania Alemde 1933. E apenas um ano mais tarde (com a Lei do Ci-dado Imperial, de 15 de novembro de 1935), a categoria de !cidadaniaalem" enquanto pertencente ao estado alemo como residente ou comonatural do pas (Staatsangehrigkeit) foi substituda por um conceito deser !cidado na Alemanha" com diferentes condies e direitos. Duranteos anos seguintes, essa diferenciao utilitarista, racial e poltica da cida-dania conduziu s categorias resumidas na Tabela 1.

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    Tabela 1. Categorias de cidadania durante o regime nazista na Alemanha

    Categoria Definio Direitos/ obrigaes

    Reichsbrger(!cidado do Reich")

    !de sangue alemo ou relacio-nado, disposto a, e capaz deservir ao povo e ao Imprio

    Alemo".

    Os nicos com direitos e obri-gaes polticas oficialmenteplenos (embora ainda bastantelimitados)

    Staatsangehriger(pessoa nacional)

    !pertencentes unidade deproteo do Imprio Alemo"(Schutzverband des Deutschen

    Reiches) e, portanto, submeti-dos a esta; !cidados comuns!

    Comparados com os cidadosdo Reich, direitos e proteoformais ainda mais limitados

    Staatsangehrige aufWiderruf (cidadosat revogao)

    O regime nazista poderia con-ceder o status de #cidado atrevogao! para grupos especi-ais; o status poderia ser revoga-do em um prazo de dez anos,por exemplo, quando o proces-so de #germazinao! no resul-tasse efetivo.

    Comparados aos cidados doReich: submetidos a discrimina-o social e a desvantagens deordem judicial

    Schutzangehrige(pertencentes areade proteo)

    Pessoas no-alems poderiamtornar-se !Schutzangehrige! me-diante resolues gerais (#allge-meine Anordnung") ou em casosindividuais

    Em princpio, sem direitos; ostatus jurdico especfico e osdireitos nunca foram definidos

    Judeus e Roma

    Pessoa com !sangue estrangeiro"(!artfremdem Blut"); Judeu: umapessoa que descende de pelomenos trs avs judeus; Judeumiscigenado (!Mischling"): des-cendente de pelo menos um

    ou dois avs judeus (avs queprofessam a crena judaica soconsiderados judeus)

    Sem direitos polticos e prote-o legal; discriminados social,econmica e politicamente; porex. casamentos com alemes equaisquer outras relaes fami-liares inter-raciais so proibidas;

    poderiam ser colocados sob!custdia protetiva" ou seremdeportados para campos deconcentrao a qualquer mo-mento.

    Fonte: Elaborao prpria com base em Mnch, 2007, pp. 61-73; Gosewinkel, 2001, pp. 369-420 eGosewinkel, 2008, pp. 1-20

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    No havia uma noo estabelecida sobre o que seria ou deveria sera nao germnica ou a cidadania germnica. Quando o regime nazistasimulava !realizar" o Imprio Germnico como Nao, no havia qualquer

    discurso pblico, acordo ou entendimento civil, mas simplesmente a defi-

    nio racista, presunosa e totalitarista de categorias de pertencimento ao

    partido e ao regime nazistas5. A criao dessas categorias de pertencimen-

    to foi um processo de improvisao, pragmtico, oportunista, desumano e

    violento imposto #de cima$: aqueles de !sangue alemo" que no estavamdispostos (p.ex. comunistas e anarquistas) ou no eram capazes (p.ex. pes-

    soas com deficincias) de !servir ao povo alemo e ao Imprio" foram exclu-

    dos da categoria de !cidados do Reich". Na medida em que essas pessoas

    podiam ser exploradas pelo projeto nazista, elas eram !cidads comuns" ou

    !cidads at revogao" que detinham alguns direitos bsicos. Estrangeiros,

    prisioneiros de guerra e trabalhadores forados foram declarados !perten-

    centes rea de proteo" (do Imprio Germnico) e s tinham !o direito

    ao trabalho". Mais tarde, judeus, roma, homossexuais, pessoas com defici-

    ncias mentais e outras foram declaradas !indignas da vida". Em resumo,

    para definir direitos de cidadania, o regime nazista no seguiu estritamente

    ou de modo dogmtico o princpio ius sanguinis, mas aproximadamente algica de um ius mentis civilis(direito do patriotismo correto)6.

    Esta breve referncia lgica da discriminao oficial pelo Estado,

    que conduziu ao assassinato de milhes de judeus, ativistas polticos

    de esquerda, homossexuais, pessoas com deficincias e delinquentescomuns na Alemanha e nos pases ocupados, necessria ao menos

    por duas razes. Primeiro, o Holocausto, mostra que a discriminao

    5 Para a interseo entre raa e gnero durante o regime nazista ver, por exemplo, Bock, 1984.6 Para mais detalhes sobre esse ponto ver, por exemplo, Pries, 2013b, onde a Tabela 1 e respec-tiva informao foram publicadas originalmente; para uma anlise da diferena entre normase polticas de juree de factono regime nazista, especialmente sobre o apoio ao antissemitismonos processos jurdicos, ver, por ex. Jahr, 2011, pp. 284 e seguintes.

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    sistemtica pode resultar no assassinato de uma grande proporo dapopulao alvo da discriminao. Segundo, quase todas as iniciativascontra a discriminao formuladas aps a II Guerra Mundial pelos or-ganismos internacionais como as Naes Unidas e, especialmente, porEstados europeus referem-se explicitamente experincia histrica doregime nazista e do Holocausto.

    Desenvolvimento de um marco legalde no discriminao na Europa

    Aps os feitos abominveis da II Guerra Mundial, dez pases da Eu-ropa ocidental (Blgica, Dinamarca, Frana, Irlanda, Itlia, Luxemburgo,Holanda, Noruega, Sucia e Reino Unido) fundaram, em 1949, o Con-selho da Europa (Council of Europe- CoE) com o objetivo de promovero estado de direito, a democracia, a liberdade, os direitos humanos eo desenvolvimento social7. O Conselho da Europa adotou a ConvenoEuropeia de Direitos Humanos(European Convention on Human Rights-ECHR) !que foi o primeiro tratado moderno de direitos humanos baseadona Declarao Universal dos Direitos Humanos das Naes Unidas"8.

    Em 2014, o Conselho da Europa inclua 47 estados europeus, abran-gendo uma populao de 820 milhes de pessoas protegidas contra adiscriminao no que concerne ao exerccio de qualquer direito assegu-

    7 Ver http://www.echr.coe.int/Documents/Convention_ENG.pdf, Prembulo.8 FRA, 2010: 12; a Declarao Universal dos Direitos Humanosfoi proclamada pela AssembleiaGeral das Naes Unidas em 1948. Seu artigo 7 estabelece: !Todos so iguais perante a lei etm direito, sem qualquer discriminao, a igual proteo da lei. Todos tm direito a proteoigual contra qualquer discriminao que viole a presente Declarao e contra qualquer incita-mento a tal discriminao". Ver http://www.un.org/en/documents/udhr/ e http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Introduction.aspx.

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    rado pelos tratados firmados pelo conselho9

    . A Corte Europeia de DireitosHumanosfoi instituda em 1959, com base no artigo 19 da ECHR, e con-fere a qualquer indivduo, organizao no governamental ou grupo deindivduos, bem como a um ou mais dos estados membros a possibilidadede ingressar com uma representao contra qualquer estado membro doConselho da Europa. Embora a jurisdio da Corte abarcasse apenas osdireitos fundamentais expressos na ECHR, mais tarde estendeu-se proi-

    bio da discriminao no tratamento substantivo de todas as pessoas: !Oartigo 14. da ECHR probe a discriminao apenas na medida em que amesma esteja ligada ao exerccio de um outro direito reconhecido pelaConveno, enquanto que o Protocolo n 12 ECHR confere discrimi-nao um carcter autnomo" (FRA, 2010, p. 19). No contexto de racis-mo e discriminao, destaca-se a Comisso Europeia contra o Racismo ea Intolerncia(European Commission on Racism and Intolerance- ECRI)vinculada ao CoE10. Esta comisso rene dados e monitora a situao emtodos os 47 estados membros. Este fato importante porque seu trabalhoabarca muitos pases que no so membros da EU, como ser discutidoadiante. No entanto, no h um informe comparativo ou outro relatriosemelhante integrado sobre a situao do racismo na rea do Conselho daEuropa. A comisso (ECRI) publica declaraes e recomendaes quandoa situao em um dos estados membros do Conselho da Europa crticacom relao situao dos direitos humanos e do racismo11.

    Alm do sistema mais amplo, que compreende o Conselho da Eu-ropa, a Conveno Europeia de Direitos Humanos e a Corte Europeia

    9 Para mais detalhes ver http://www.coe.int/web/portal/home , Direitos Humanos.10 Ver http://www.coe.int/t/dghl/monitoring/ecri/default_en.asp e para os informes de monito-ramento de pases (para a Alemanha, por ex., h cinco informes, cobrindo perodos de cincoanos cada) http://www.coe.int/t/dghl/monitoring/ecri/activities/countrybycountry_en.asp.11 Ver, por ex. o relatrio em: http://www.coe.int/t/dghl/monitoring/ecri/activities/Statements_en.asp.

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    de Direitos Humanos, abrangendo 47 estados europeus e incluindo, porexemplo, Turquia e Rssia, a Unio Europeia, enquanto coalizo polticae econmica de 28 estados membros, desenvolveu seu prprio marcoantidiscriminao. Para os propsitos deste artigo, o regime e a poltica deno discriminao da UE so mais importantes do que aquelas do Conse-lho da Europa ! em razo do compromisso e da arquitetura institucional

    mais fortes da EU e dos seus estados membros. Ao longo do tempo, com

    o desenvolvimento da UE de um esforo econmico de estados indepen-dentes para um projeto poltico-econmico de uma unio federativa de

    estados, as questes de direitos humanos e de no discriminao foram

    ganhando importncia crescente. Em 2000, a UE e seus estados membros

    promulgaram a Carta de Direitos Fundamentais da Unio Europeia, a qualrene as regras bsicas de direitos humanos definidas pelos estados mem-

    bros na Conveno Europeia de Direitos Humanos e as promulgadas nas

    declaraes de direitos humanos vinculadas s Naes Unidas. Inicial-

    mente estabelecida como uma declarao de intenes no vinculante, a

    carta tornou-se posteriormente obrigatria:

    Com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, em 2009,a Carta dos Direitos Fundamentais adquiriu fora jurdicavinculativa. Em consequncia, as instituies da UE devemobrigatoriamente cumprir as suas disposies. Os Estados--Membros so obrigados, por conseguinte, a respeitar asdisposies da Carta, mas apenas em sede de transposio

    e aplicao da legislao da UE. [...] O artigo 21. da Cartaestabelece a proibio da discriminao por vrios motivos(FRA, 2010, p.16).

    A Corte de Justia da Unio Europeia foi estabelecida em 1952.

    Com o tratado de Lisboa, em 2009, tornou-se a instituio jurdica inde-

    pendente no mbito da UE, plenamente responsvel por assegurar que a

    legislao da Unio Europeia seja efetivamente observada. A jurisprudn-

    cia da Corte de Justia da UE desempenha um papel relevante ao relacio-

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    nar as normas jurdicas formais europeias com a vida prtica e suas formasde discriminao. Em geral, a legislao e a poltica antidiscriminatriaseuropeias fazem distino entre discriminao direta e indireta:

    pessoas em situaes semelhantes devem receber um trata-mento semelhante e no ser tratadas de forma menos favo-rvel simplesmente devido a uma determinada caractersti-ca protegida que possuam. O no respeito deste princpioconstitui uma discriminao directa. [] Em segundo lu-

    gar, a legislao antidiscriminao estipula que as pessoasem situaes diferentes devem receber um tratamento di-ferenciado na medida em que isso seja necessrio para lhes

    permitir usufruir de determinadas oportunidades na mesmabase que as outras pessoas. Assim, tambm essas carac-tersticas protegidas devem ser tidas em conta quando daexecuo de determinadas prticas ou ao da criao de de-terminadas regras. O no respeito deste princpio constituiuma discriminao indirecta (FRA, 2010, pp.23-24)

    A Unio Europeia adotou diversas diretivas relacionadas no-dis-criminao, as quais deveriam ser transpostas para a legislao nacionalde seus estados membros, de modo a constituir um marco legal vincu-lante relativo antidiscriminao no mbito do bloco e de seus estadosmembros. Em 2000, foram adotadas a Diretiva da Igualdade Racial (Dire-tiva 2000/43/EC) e a Diretiva da Igualdade no Emprego(Diretiva 2000/78/EC). Em 2004, a Diretiva de Gnero no acesso a Bens e Servios (Diretiva200/13/EC) e a Diretiva de Livre Circulao e Residncia de Cidados da

    UE(Diretiva 2004/38/EC)12. Todas essas diretivas contm normas antidis-criminatrias, mas enfatizam diferentes reas de regulamentao comoemprego, acesso previdncia e seguridade social, ou acesso a bens e

    12 Para um panorama do complexo quadro legislativo composto de Tratados, Relatrios deComisses, Diretivas, Documentos de Trabalho, Decises, Recomendaes, Resolues, Con-cluses e Comunicados, ver http://ec.europa.eu/justice/discrimination/law/index_en.htm.

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    servios. Essas diretivas abordam uma ampla gama de possveis formas dediscriminao relacionadas a sexo, orientao sexual, deficincias, idade,raa, origem tnica, origem nacional, crena ou religio, lngua, origem so-cial, nascimento e riqueza, opinio poltica ou outra (FRA, 2010, pp. 97-129). A par dessa rede relativamente densa de dispositivos legais antidiscri-minatrios, existe tambm uma infraestrutura de organismos especficos.

    Alm das j mencionadas Corte Europeia de Direitos Humanos e

    Corte de Justia da UE, h uma agncia de crescente relevncia no campoda no discriminao: a Agncia dos Direitos Fundamentais da UE, a FRA(Fundamental Rights Agency). Estabelecida em 2007, sucedeu o Observa-trio Europeu do Racismo e da Xenofobia, com um mandato mais amplo,conforme definido no artigo 2 da Deciso do Conselho de 2008:

    Os domnios temticos so os seguintes: a) racismo, xeno-fobia e intolerncia a eles associada; b) discriminao combase no sexo, na origem racial ou tnica, na religio ou cren-

    a, na deficincia, na idade ou na orientao sexual e depessoas pertencentes a minorias, e qualquer combinaodestes motivos (discriminao mltipla); c) compensaodas vtimas; d) direitos da criana, incluindo a protecodas crianas; e) asilo, imigrao e integrao de migrantes; f)vistos e controlo de fronteiras; g) Participao dos cidadosno funcionamento democrtico da Unio; h) sociedade dainformao e, em particular, o respeito pela vida privadae a proteco dos dados pessoais; i) acesso a uma justiaeficiente e independente13.

    Desde sua fundao, a FRA continuou e ampliou as atividades demonitoramento e de publicao dos resultados atravs de Relatrios Anu-ais, informes especiais sobre minorias como o povo roma na Europa, ou

    13 http://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/PDF/?uri=CELEX:32008D0203&from=EN,ver tambm http://ec.europa.eu/justice/fundamental-rights/document/index_en.htm, acessa-do em 28.12.20114.

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    sobre aspectos especficos da discriminao. H relatrios desurveysre-presentativas sobre questes como violncia contra as mulheres, discri-minao contra ciganos, antissemitismo na Europa ou discriminao pororientao sexual. A FRA tambm publica informes especficos e estudosqualitativos sobre pases especficos e tem estado cada vez mais inter-conectada com organizaes internacionais e da sociedade civil. Desde2009, a FRA publica os resultados do levantamento sobre Minorias e

    Discriminao na Unio Europeia (EU-MIDIS); a Plataforma dos DireitosFundamentais compreende mais de trezentas organizaes no-governa-mentais que atuam sobre temas de direitos fundamentais14. Afinal, espe-cialmente durante a ltima dcada, a luta contra a discriminao tornou--se uma arena caracterstica da Unio Europeia.

    Discriminao na UE ! o que possvel saber?

    Embora o marco legal europeu no-discriminatrio descrito nas se-

    es anteriores seja impressionante e ! de uma perspectiva internacio-

    nal comparada ! indito, persistem muitas lacunas. Nesta seo, sero

    abordados apenas alguns aspectos da pesquisa cientfica e da mensura-

    o da discriminao. Deixaremos de lado todos os demais problemas !

    como tradies polticas nacionais divergentes para lidar com diversida-

    de social e discriminao (ver Pries, 2013a, p.ex.) e a complexa, poltica

    e filosoficamente contestada, fronteira entre a proteo a certos grupos

    e a discriminao de outros grupos (demonstrada, por ex., no contexto

    das negociaes da Diretiva Europeia dos Servios - Diretiva 2006/123/

    14 Ver http://fra.europa.eu/en/publications-and-resources/data-and-maps; http://fra.europa.eu/en/cooperation/civil-society/participant-organisations; http://fra.europa.eu/en/project/2011/eu-midis-european-union-minorities-and-discrimination-survey e http://fra.europa.eu/en/

    publications-and-resources/country-datat, consultadas em 28.12.2014.

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    EC - ou da Parceria para Comrcio e Investimento Transatlntico ! TTIP).Assim, a questo orientadora : o que de fato sabemos sobre discrimi-

    nao na Unio Europeia?

    No mesmo ano da criao da FRA, Goodey (2007) discutia os pro-

    blemas metodolgicos para mensurar a violncia racista como um aspecto

    excepcional e relativamente visvel da discriminao. Em primeiro lugar,

    complicado definir violncia racista ! e racismo de um modo geral ! pois

    no existe consenso, seja para uma definio jurdico-formal ou para umconceito sociolgico preciso e amplamente aceito. Goodey prope de-

    finir violncia racista como a violncia em que as vtimas so escolhidas

    no com base em caractersticas individuais, mas sim numa estratificao

    social de grupos minoritrios construdos a partir de aspectos fenotpicos,

    religio, origem nacional ou cultural (ibid: 572). O autor afirma que a

    definio mais ampla de crime racista encontrada na Inglaterra e no

    Pas de Gales, onde "um incidente racista qualquer incidente percebido

    como racista pela vtima ou por qualquer outra pessoa# (ibid: 575). Comrelao aos estados membros da UE, o Reino Unido considerado onico pas com um registro adequado sobre violncia racista, enquantoem outros pases as variveis raciais so levantadas segundo operaciona-lizaes variadas, ou seu registro proibido (para a Frana, ver Wihtol deWenden et al. 2013). Embora, segundo Goodey, no exista na Europauma definio operacional consensual para violncia racista, desde 2008

    vigora uma Deciso Quadro do Conselho da Europa sobre o combate acertas formas e expresses de racismo e xenofobia15.

    Em vista das distintas fontes de dados sobre a violncia racista !que no trabalho de Goodey incluem a Rede Europeia contra o Racismo

    15 Ver: acessado em 28.12.2014.

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    (ENAR), a Comisso Europeia contra o Racismo e a Intolerncia (ECRI), oObservatrio do Racismo e da Xenofobia da UE (EUMC) e sua sucessora,a Agncia dos Direitos Fundamentais (FRA) ! no h dois estados mem-

    bros da UE que produzam dados diretamente comparveis sobre violn-

    cia racista (ibid: 576). Esta afirmao de Goodey, feita em 2007, vlida

    ainda, como se pode observar em informe mais recente da FRA (2012, p.

    32 e s.) e na nota da pgina 35 do mesmo, onde todos os estados mem-

    bros da UE esto ilustrados em uma tabela "Dados oficiais de crimes dedio publicados em 2010, segundo o motivo do preconceito#, cuja notadiz: "os dados no so comparveis entre os estados membros da UE#16.Segundo Goodey (2007), a comparao direta dos dados entre estadosmembros do bloco muito problemtica. Alternativamente, dados de ummesmo pas podem ser comparados ao longo do tempo e as tendnciaspodem ser analisadas, se no houver mudana nos mecanismos de coletade dados ao longo do perodo considerado.

    Aplicando este critrio aos dados e documentos oficiais de justiacriminal publicados pelo EUMC e pela FRA at agora, Goodey (2007,pp. 580 e s.) afirma que apenas sete dos estados membros da UE produ-zem dados confiveis que possibilitam anlise de tendncias. Oito pa-ses apresentaram tendncia ascendente de violncia racista (Dinamarca,Alemanha, Frana, Irlanda, Polnia, Eslovquia, Finlndia, e Inglaterra ePas de Gales, no Reino Unido); trs apresentaram tendncia decrescen-

    te (Repblica Tcheca, ustria e Sucia). No entanto, Goodey afirma queessas mudanas deveriam ser analisadas com cautela, uma vez que pasescom nmeros absolutos baixos, com o caso de Dinamarca e Irlanda,

    16 Ver Makkonen 2006 e 2007. Como investigao pioneira fundamental sobre os mecanismosde coleta de dados dos 15 estados membros da UE, tendncias dos crimes racistas entre 2001e 2003 em alguns dos estados membros da UE entre 2001 e 2003, e a situao geral, verEUMC 2005a e 2005b.

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    podem sugerir mudanas drsticas com base em valores absolutos bastan-te baixos. Outro problema mencionado pelo autor que a qualificaocomo crime racista com frequncia fica limitada a atividades ou gruposproibidos (como na ustria e na Alemanha, onde contam-se apenas asatividades dos grupos oficialmente designados como de extrema direita).

    Nos ltimos anos, foram conduzidos diversos estudos para avaliar aqualidade dos dados e encontrar formas de aprimorar o conhecimento

    sobre discriminao e temas correlatos na UE. Kraler e Reichel (2010)apresentam resultados de um projeto de pesquisa financiado pela Co-misso Europeia. O estudo compila meta-informao a partir de basesde dados estatsticos sobre migrao, integrao e discriminao em 29pases europeus (27 da UE e mais Noruega e Sua). O projeto analisa acomparabilidade das estatsticas europeias relativas discriminao. Umavez que seu relatrio final discute formas gerais de mensurar a discrimi-nao e armadilhas envolvidas nesses processos, ele ser citado de formamais extensa, a seguir:

    possvel mensurar de forma direta a discriminao atravsdo levantamento de incidentes de discriminao denuncia-dos; estatsticas que devem ser levantadas em todos os pa-ses da UE. Contudo, essas queixas so avaliadas com baseem dispositivos legais e determinar casos individuais dife-rente de mensurar a prevalncia de discriminao. Outrosmeios de medir diretamente a discriminao so percep-es da discriminao. Tais estatsticas fornecem apenas umquadro rudimentar da existncia de discriminao, uma vezque as percepes no necessariamente correspondem realidade. Vrios inquritos internacionais contm questes

    sobre experincias de discriminao. O Eurobarmetro 317de 2009, por exemplo, continha questes sobre o quan-to as pessoas consideram disseminados diferentes tiposde discriminao, sobre a percepo pessoal de ter sofri-do discriminao ou assdio e sobre testemunhar inciden-tes de discriminao contra outros. At o presente, o mais

    amplo inqurito de vitimizao abordando a discriminao

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    baseada em origem tnica foi o encomendado pela Agn-cia dos Direitos Fundamentais da UE, denominado Pesquisasobre Minorias e Discriminao na Unio Europeia (Europe-an Union Minorities and Discrimination Survey - EU MIDIS).

    Alm disso, a propenso para discriminar tambm pode sersondada atravs da coleta de informaes sobre determina-das atitudes em relao a imigrantes ou por perguntas diretas

    sobre se e at que ponto as pessoas se consideram racistas(como no Eurobarmetro 47.1, 1999). No entanto, no se

    pode presumir um vnculo direto entre posturas e compor-

    tamento. Experimentos de campo, como testes de discrimi-nao ou de situao, constituem uma boa fonte para men-

    surao direta da discriminao. Nesses testes, normalmente,enviam-se dois CVs para uma oferta de emprego. Os CVs so

    similares, exceto pela origem da pessoa candidata. Conse-quentemente, diferenas nas respostas aos CVs podem ser di-retamente relacionadas discriminao em razo da origemda pessoa. Embora esses testes tenham sido realizados emvrios pases europeus, os dados levantados, normalmenteno esto disponveis para anlise secundria17.

    Os problemas de como mensurar a discriminao e de como com-parar os respectivos bancos de dados nacionais na UE so discutidos tam-bm por Wrench (2011). O autor aborda as deficincias nas prticas deregistro de informao nos pases da UE, o problema da comparabilidadedos dados sobre discriminao e o uso de mtodos quantitativos e/ouqualitativos nas pesquisas envolvendo discriminao racial. Wrench (ibid:

    1715) menciona especificamente a pesquisa EU-MIDIS sobre migrantese minorias, que foi concebida para produzir dados comparveis. Os pa-ses da UE dificilmente produzem estatsticas oficiais sobre discriminao,!em razo de sua natureza altamente contestada" tanto internamente,como entre os pases (ibid: 1717). Segundo estudo de 2007, do Conse-

    17 Kraler e Reichel 2010: 62 e s.; para uma anlise detalhada sobre discriminao, ver tambm

    Gchter 2010.

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    lho da Europa, 13 dos 27 pases da UE contam com a informao !na-cionalidade/etnicidade" em suas estatsticas oficiais. Apenas dois estadosmembros # Irlanda e Reino Unido # registram dados sobre !etnicidade"em seus censos. Portanto, afirma Wrench, na maioria dos pases da UE, osdados oficiais pouco contribuem para a identificao dos grupos expos-tos discriminao racial. Wrench descreve a evoluo dos esforos daUE para combater a discriminao, mencionando a Diretiva da Igualdade

    Racial, de 2000, o estabelecimento daAgncia dos Direitos Fundamentais(FRA), em 2007, e a Rede Europeia sobre Xenofobia e Racismo (Racismand Xenophobia European Network -RAXEN), que consiste de 27 PontosFocais Nacionais que fornecem dados nacionais.

    Segundo Wrench (2011: 1718), esses dados coletados pela RAXENpodem ser objetivos, confiveis e at mesmo comparativos (no sentido dedescrever, analisar e comentar similaridades/diferenas entre os estadosmembros), mas dificilmente comparveis, porque no existe um indica-dor comum de discriminao. O autor menciona ainda, em comparaoaos dados da RAXEN baseados em informao (diferente) especfica decada pas, a estratgia da FRA como uma alternativa: produzir dados ge-nunos e comparveis no mbito da Europa, com base na implementaode pesquisas sobre discriminao que utilizam a mesma metodologia emtodos os estados membros. Nessa linha, um estudo do Observatrio Euro-peu do Racismo e da Xenofobia (EUMC) analisou dados do Eurobarme-

    tro e da Pesquisa Social Europeia sobre atitudes da maioria de cada pasem relao s minorias (EUMC 2005)18. A FRA desenvolveu seu projeto

    18 O Eurobarmetro uma amostra representativa de 1.000 pessoas na maioria dos estadosmembros da UE. Inclua duas declaraes relacionadas discriminao (! bom para qual-quer sociedade ser constituda de pessoas de diferentes raas, religies e culturas" e !H umlimite para o nmero de pessoas de outras raas, religies e culturas que uma sociedadepode aceitar") s quais os entrevistados poderiam expressar sua concordncia ou oposio. APesquisa Social Europeia (ESS) envolve amostras representativas de 1.500 a 2.500 pessoas na

    maioria dos estados membros da UE. Trs declaraes relacionadas distncia tnica (Voc se

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    EU-MIDIS, que pesquisa as experincias de migrantes e de minorias comdiscriminao, crimes racistas e policiamento19.

    Segundo Wrench (2011, p. 1719 e s.), a Pesquisa Social Europeia (uti-lizada no relatrio da FRA) inclui um nmero insignificante de migrantes ede pessoas pertencentes a minorias. O autor sugere como fontes alternativasas queixas registradas pelas vtimas (tanto na polcia quanto junto a ONGs),mas admite (assim como muitos outros pesquisadores) que a maior parte

    desses casos no notificada. Apesar de reconhecer a pesquisa EU-MIDIScomo o nico estudo sobre grupos minoritrios que utilizou de forma siste-mtica o mesmo questionrio padro em todos os estados membros da UE,possibilitando, portanto, a comparao entre grupos minoritrios de todosesses pases, Wrench formula uma crtica geral: !Mtodos quantitativos sointrinsecamente menos teis do que os qualitativos quando se trata de cap-tar a realidade a discriminao" (ibid: 1725), em razo da subjetividadeenvolvida na percepo da discriminao e por ser um tema por demaissensvel para um questionrio formal. Assim, segundo Wrench, o desejo decomparabilidade no deve levar a negligenciar a pesquisa social qualitativa,pois esta pode contribuir para a compreenso dos processos de discrimi-nao e racismo. Portanto, em geral, aconselhvel uma combinao demtodos de pesquisa (ibid: 1728).

    importaria se seu chefe fosse um imigrante da mesma raa/ grupo tnico da maioria? Voc seimportaria se um parente prximo casasse com uma pessoa imigrante da mesma raa/origemtnica da maioria? Voc se importaria se seu chefe fosse um imigrante de uma raa/origemtnica diferente da maioria?19 Para a ltima ver: http://fra.europa.eu/en/project/2011/eu-midis-european-union-minori-

    ties-and-discrimination-survey.

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    Situao atual do racismo e da discriminao na UEPara discutir os estudos atuais mais abrangentes sobre racismo na

    UE, deve-se comear com a Pesquisa de Minorias e Discriminao daUnio Europeia (EU-MIDIS), como tambm observou Wrench (2011:1723). Nessa pesquisa, a FRA, atravs de amostragem aleatria e de umquestionrio padronizado, entrevistou 23.500 pessoas de vrias minoriastnicas e diferentes grupos de imigrantes, em todos os estados membros

    da UE (no mximo trs grupos por pas com uma amostra de no mni-mo 500 respondentes para cada grupo), questionando sobre experinciasde discriminao vivenciadas em 2008 (FRA, 2009). Os grupos20foramselecionados com base em dois critrios: constituir o maior grupo mino-ritrio do pas e estar potencialmente vulnervel discriminao21. Con-sequentemente, as comparaes foram feitas entre os estados membrosem relao aos mesmos grupos minoritrios22. Uma pesquisa suplementar

    com a populao majoritria foi conduzida em dez estados membros,envolvendo uma amostra total de 5.068 pessoas, para comparao comos resultados da pesquisa principal. Em vista disso, a EU-MIDIS constitui amais abrangente pesquisa sobre experincias de racismo e discriminaopor parte de minorias em toda a UE (FRA, 2009: 6-27).

    20 Para a lista de todas as minorias selecionadas no mbito dos estados membros, ver Tabela1.5 !EU-MIDIS Sample Sizes" do relatrio EU-MIDIS Main results report (principais resultados)(FRA 2012:27)21 "...a seleo dos grupos para amostragem foi orientada pelos relatrios nacionais anuais so-bre a situao do racismo e da xenofobia em cada estado membro, os quais foram submetidos agncia e seu predecessor, o EUMC, a partir de 2000, por sua rede RAXEN de pontos focaisnacionais (dos quais h um em cada estado membro). Os resultados desta coleta de dadosesto publicados pela agncia em seu relatrio anual, que examina a situao do racismo e daxenofobia nos estados membros da UE " (FRA 2009: 22).22 Para comparaes detalhadas ver relatrios especiais; por ex. FRA 2012a para as experin-cias de roma em sete estados membros.

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    Em toda a Unio Europeia, o mais alto grau de discriminao t-nica na vida cotidiana foi indicado pela populao roma: metade dosrespondentes roma experimentou tratamento discriminatrio pelo menosuma vez ao longo dos doze meses anteriores pesquisa. Outros gruposminoritrios fortemente discriminados foram: os africanos subsaarianos(41%), os norte-africanos (36%) e entrevistados de descendncia turca, daEuropa Central e da Europa Oriental (23%). Com relao a dados especfi-

    cos por pas, os mais elevados graus de discriminao foram identificadosem relao aos roma na Repblica Tcheca (64%), aos africanos em Malta(63%), aos roma na Hungria (62%), aos roma na Polnia (59%) e aos romana Grcia (55%; ibid: 8). Em 2008, os roma, mais do que qualquer grupotnico na EU, sofreram discriminao em todas as esferas da vida cotidia-na. Alm disso, um grau preocupante de vitimizao entre a populaoroma foi destacado pelo Relatrio Resumido da Pesquisa: Minorities asvictims of crime(Minorias como vtimas do crime) (FRA, 2012a)23. Nes-te relatrio, os respondentes foram questionados especificamente sobreterem experimentado algum crime de dio, se poderiam identificar dealguma forma o motivo, o perpetrador etc.

    Alguns dos achados mais surpreendentes foram: 18% de todas aspessoas entrevistadas descendentes de roma ou de africanos subsaarianosindicaram terem sido vtimas de um crime de motivao !racista" pelomenos uma vez nos doze meses anteriores pesquisa, o que constitui o

    dado mais elevado em toda a UE. Os maiores ndices para esses crimesentre os estados membros foram documentados nos casos da populaoroma na Repblica Tcheca e dos somalis na Finlndia (ambos 32%; ver

    23 Para os problemas metodolgicos em geral, ver FRA 2012b; o estudo fornece um apanhadogeral dos mecanismos de coleta de dados oficiais relativos a crimes de dio pelos estadosmembros da UE e publica uma tabela com os dados oficiais disponveis, concluindo que esses

    no so comparveis entre os estados membros.

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    FRA, 2012: 11). Quase um sexto de todos os subsaarianos e roma con-sideraram que linguagem !racista" ou ofensiva sua religio foi utilizadadurante um ataque, uma ameaa ou um assdio grave (ibid: 12). Apenas13% dos respondentes de origem turca e 12% dos roma (esses so osdados mais altos de toda a UE) indicaram que os perpetradores erammembros de gangues racistas ou de extrema-direita. Isso significa que osdemais crimes de motivao racista foram perpetrados aparentemente

    por !cidados comuns" (ibid: 13). Apesar disso, mesmo os crimes qualifi-cados como graves no foram denunciados polcia pela maior parte dasvtimas (ibid: 14).

    A EU-MIDIS, como a primeira e nica pesquisa sobre grupos mino-ritrios que utiliza o mesmo questionrio para toda a UE, de fato propiciaresultados efetivamente comparveis. No entanto, deve-se ter em menteque os resultados devem ser comparados ou entre os mesmos grupos mi-noritrios, se esses estiverem igualmente presentes em vrios pases24, ouentre grupos minoritrios distintos no mbito do mesmo estado membro(FRA 2009: 20). Alm disso, o relatrio recebeu crticas, dizendo que seusresultados devem ser interpretados e utilizados com cautela. Infelizmente,uma pesquisa com esse escopo, por definio, portadora dessa fragili-dade, j que, em razo das diferenas de legislao entre os pases daUE, quase impossvel verificar que, de fato, um incidente se qualifiquecomo crime de dio. Apesar disso, o relatrio ainda utiliza termos como

    !vitimizao" e !vtima de crime" sem o adjetivo !suposta". Os autores ar-gumentam que, ao expressarem-se desse modo, apenas seguem a prticaestabelecida na lngua inglesa para discutir os resultados dos surveys sobrevitimizao criminal (FRA, 2012a: 7). A segunda etapa da EU-MIDIS, comum programa extra !Estratgias de Integrao da Populao Roma" ser

    24

    Para a lista complete de pases e grupos agregados ver: FRA 2009: 27.

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    realizada em 2015 e seus primeiros relatrios sero publicados no segun-do semestre de 201625.

    Em 2013, a Agncia de Direitos Fundamentais (FRA) publicou, pelaprimeira vez na histria, um relatrio sobre antissemitismo nos estadosmembros da UE. Oito pases (Blgica, Frana, Alemanha, Hungria, Itlia,Letnia, Sucia e Reino Unido) participaram do relatrio que conclui:!Dois teros dos respondentes da pesquisa (66%) consideram o antissemi-

    tismo como um problema nos oito estados membros da UE pesquisados,enquanto, em mdia, trs quartos dos respondentes (76%) tambm acre-ditam que a situao agravou-se e que o antissemitismo cresceu no pasonde vivem, ao longo dos ltimos cinco anos" (FRA 2013: 11). O antisse-mitismo na internet foi indicado como o maior problema (ibid.: 18). Umtero de todos os respondentes afirmou ter experimentado pessoalmentevexames antissemitas (ibid.: 44).

    Outra fonte de dados importante sobre a situao atual em termosde discriminao e racismo na Europa (esta no quantitativa, mas quali-tativa) propiciada pela Rede Europeia contra o Racismo (European Ne-twork Against Racism- ENAR), especialmente em seus chamados !Relat-rios Sombra"26. Em 2014, a ENAR publicou um Relatrio Especial sobreracismo e discriminao no emprego na Europa (Lamberts et al., 2014).Sendo a nica rede pan-europeia de ONGs que atuam em conjunto parainvestigar e combater o racismo na Europa, a ENAR publica tambm, anu-

    almente, !Relatrios Sombra" especficos por pas para os estados mem-

    25 Ver http://fra.europa.eu/en/project/2015/eu-midis-ii-european-union-minorities-and-discri-mination-survey.26 Os relatrios sombra da ENAR so produzidos anualmente como uma compilao dos dadoscoletados pelas organizaes no governamentais filiadas rede !para preencher as lacunasdos dados oficiais e acadmicos, oferecer uma alternativa a esses dados, e para oferecer a pers-pectiva das ONGs sobre as realidades do racismo na UE e em seus estados membros" (para

    mais informao acessar: http://www.enar-eu.org/Shadow-Reports-on-racism-in-Europe-203).

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    bros da UE (23 estados membros da UE, mais a Turquia, em 2014)27

    . Em-bora enfatizando a no comparabilidade dos resultados, eles identificamuma tendncia comum para o mercado de trabalho em 2014, na Europa:os imigrantes de pases no integrantes da UE, refugiados e solicitantes deasilo, muulmanos, roma e travellers*, pessoas negras, e especialmente to-das as mulheres pertencentes a um desses grupos (como consequncia damltipla discriminao) so identificados como os grupos mais vulnerveis

    discriminao no emprego (Lamberts et al., 2014: 29).Alm disso, dependendo das motivaes da discriminao, os autoresconcluem que os roma e os travellerstm sido sistematicamente vitimiza-dos em razo de sua etnicidade, e sofrem muito mais discriminao nomercado de trabalho do que outros grupos tnicos. Com relao aos povosroma, as piores condies para entrada no mercado de trabalho foram en-contradas em !Relatrios Sombra" da ustria, Blgica, Bulgria, Crocia,Repblica Tcheca e Finlndia (Lamberts et al., 2014, p. 30). Os muulma-nos so caracterizados como o grupo mais vulnervel discriminao deordem religiosa ou de crena em praticamente todos os estados membros(o que evidenciado nos !Relatrios Sombra" da ustria, Blgica, Bulg-ria, Crocia, Repblica Tcheca, Finlndia, Frana, Alemanha, Grcia, Itlia,Litunia, Luxemburgo, Holanda, Polnia, Espanha, Reino Unido e, mes-mo, Turquia). Mais do que isso, conforme apontam Lamberts et al (2014),a experincia de qualquer mulher muulmana na Alemanha fornece um

    exemplo claro da mais severa discriminao no trabalho, em razo da ml-tipla discriminao: !Uma mulher muulmana, de origem imigrante e que

    27 Leitura adicional: Parkes et al. 2013 (outros Relatrios Sombra especficos de 26 pases estodisponveis); Gauci 2012 (Relatrios Sombra especficos de 27 pases esto disponveis); Gau-ci2011 (Relatrios Sombra especficos de 27 pases esto disponveis)*Um grupo nmade parecido com os roma, encontrado principalmente na Irlanda e no Reino

    Unido [Nota do organizador].

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    cobre a cabea com o hijab [...] uma mulher que incorpora trs grandesbarreiras que impedem seu acesso ao mercado de trabalho! (ibid: 31).

    O Eurobarmetro28, como terceira fonte de dados sobre discrimina-

    o na Europa, visto como um reflexo dos valores, percepes e opinies

    dos cidados. Baseado em uma amostra representativa de 1.000 pessoas

    na maioria dos pases da UE, o Eurobarmetro 2012 fornece dados valiosos

    sobre a discriminao na Europa em geral (European Commission, 2012).

    Alm disso, permite identificar algumas tendncias ao longo de trs anos,2009 a 2012. Especificamente, a discriminao com base na origem tnica

    ainda percebida como a forma mais disseminada de discriminao na

    UE, embora tenha havido uma pequena melhora em comparao com

    2009 (56% dos europeus pensam que um problema, contra os 61% de

    2009). Seguem-se a essa a discriminao baseada nas deficincias (53%)

    e na orientao sexual (46%). A discriminao baseada na religio ainda

    bastante disseminada (39%), e a mudana mais sensvel entre oito motiva-

    es de discriminao percebida na categoria gnero (de 40% em 2009,

    para 31% em 2012; European Commission, 2012, p. 16).

    No entanto, a percepo nacional dos nveis de discriminao difere

    consideravelmente entre os estados membros. Por exemplo, enquanto

    mais de 70% dos cidados e cidads de Frana, Chipre, Sucia, Grcia,

    Holanda, Dinamarca e Hungria acreditam que a discriminao por ori-

    gem tnica comum em seus respectivos pases, apenas 17% dos lituanos

    ou 26% dos poloneses e dos letes pensam o mesmo. A Alemanha, com

    28 O Eurobarmetro uma srie de pesquisas de opinio pblica conduzidas pela ComissoEuropeia nos estados membros desde 1973. Elas abordam os principais temas e reas rela-cionadas cidadania europeia, tais como sade, cultura, meio ambiente etc. (para mais in-formaes, visite: http://ec.europa.eu/public_opinion/index_en.htm). Este artigo fornece um

    panorama do Special Eurobarometer 393, Discrimination in the EU in 2012.

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    seus 51%, fica a meio caminho (European Commission, 2012, p. 29). Amelhoria mais notvel parece estar em Malta (com um aumento de 23%nos respondentes afirmando que discriminao rara ou inexistente emseu pas). Na Alemanha, em 2012, trs por cento a mais (45%) do queem 2009 (42%) responderam que a discriminao por origem tnica erarara ou inexistente (ibid: 29 e s.). Em 2012, a mdia dos respondentes daUE que consideravam a discriminao com base em origem tnica como

    sendo rara ou inexistente foi de 39% e havia melhorado em 4%.Na UE como um todo, a discriminao com base em crenas oureligio com mais frequncia considerada rara ou inexistente (56%) doque comum (39%). A Frana lidera o ranking, com uma maioria de 66%dos entrevistados acreditando que a discriminao baseada em religioou crenas comum; com relao a essa questo, apenas 34% na Ale-manha responderam !comum" (European Commission, 2012, p. 49). O

    relatrio dedica ateno especial ao povo roma: trs quartos de todos os

    entrevistados europeus concordam que os roma como grupo social esto

    sob risco de discriminao (ibid, p. 111). O Eurobarmetro 2012 traz

    uma interessante considerao final que relaciona o grau de percepo

    de discriminao aos tipos de pertencimento social autoatribudos e

    variedade de redes sociais:

    Em geral, a autoidentificao como pertencente a um gru-po minoritrio aumenta a probabilidade de o respondente

    acreditar que a discriminao (inclusive, mas no exclusi-vamente contra esse grupo especfico) seja comum em seupas. Os respondentes que dizem pertencer a uma minoriaso tambm mais tendentes do que a mdia dos europeusa informar que vivenciaram pessoalmente episdios de dis-criminao. O grau de diversidade do crculo social de umrespondente tem uma influncia marcante sobre sua cons-cincia da discriminao, assim como sobre o quo confor-tvel ele ou ela se sente em relao s minorias (EuropeanCommission, 2012, p. 119).

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    interessante observar que a percepo do grau de diversidade naEuropa bastante alta e vem crescendo. Com relao religio, 67% dosentrevistados responderam ter amigos ou conhecidos com outra religioou crena diferente da sua (trs por cento mais alta do que em 2009);62% responderam ter amigos ou conhecidos portadores de deficincias(quatro por cento mais do que em 2009); 59% indicaram ter amigos ouconhecidos de diferentes origens tnicas (dois por cento mais do que

    em 2009). O ndice para amigos ou conhecidos com orientao sexualdiferente (gays, lsbicas ou bissexuais) continua mais baixo, em 41%, eapenas 18% indicaram ter amigos ou conhecidos roma (1% mais do queem 2009). !Outro avano que mais europeus hoje sentem-se tranquiloscom a ideia de que uma pessoa dentre os grupos minoritrios menciona-dos venha a comandar seu pas" (European Commission, 2012, p. 120).

    Concluso: tendncias e desafios para novas pesquisasCom relao a questes de no discriminao, algumas tendncias

    gerais podem ser observadas na UE. Em primeiro lugar, h uma clara ten-dncia em direo a uma melhoria nos requisitos formais de no-discri-minao no mbito da Unio Europeia e de seus estados membros, nosentido de uma ampliao e aprofundamento das normas e definies.Em segundo lugar, iniciativas legais surgidas em uma determinada rea de

    ao poltica e de regulamentao institucional (como emprego ou livrecomrcio de bens e servios) contendo dispositivos mnimos antidiscri-minatrios, entrelaam-se, indiretamente, cada vez mais, por refernciaa outras Diretivas, Comunicaes etc. E tambm, diretamente, ao seremincorporadas a novas iniciativas legislativas especiais # como a Comuni-cao de No-Discriminao e Oportunidades Iguais: um compromisso

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    renovado (SEC/2008/217229

    ) e a relacionada Proposta para uma Diretivado Conselho sobre a implementao do princpio de igual tratamento en-tre pessoas, independentemente de religio ou crena, deficincia, idadeou orientao sexual (SEC/2008/218030e SEC/2008/218131). Em terceirolugar, com base no arcabouo legal, uma arena europeia de atores coleti-vos est fortalecendo-se; um regime de no-discriminao torna-se cadavez mais institucionalizado na Europa por meio de um fortalecimento

    mtuo de meios legais-formais e de redes funcionais de atores, bem comode um complexo jogo de ping-pong entre os mbitos nacional, europeu,internacional e transnacional.

    A histria europeia e, particularmente, o caso da Alemanha ensinaque a discriminao e o racismo no devem ser negligenciados. E, toda-via, a discriminao em todas as esferas da vida e o racismo como umaforma ameaadora daquela uma dura realidade nas vidas de imigran-tes e de minorias tnicas ou religiosas na Europa. Embora os roma cons-tituam a mais numerosa minoria tnica da Europa, isso no os impedede sofrerem discriminao, excluso social e, mesmo, marginalizao, deforma cotidiana, a despeito de a maioria ter a cidadania europeia32. Almdisso, em muitos estados membros, os roma, assim como os africanossubsaarianos, so recorrentemente associadas a atividades criminosas. Noentanto, o EU-MIDIS mostra claramente que ambos os grupos so, antes,vtimas de crimes de motivao racial. De fato, os grupos tnicos mi-

    noritrios tm atrado crescente interesse em estudos abrangentes sobreracismo, discutidos neste artigo, devido ao entendimento entre grupos de

    29 Disponvel em: < http://www.ipex.eu/IPEXL-WEB/dossier/document/SEC20082172FIN.do>30Disponvel em: < http://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/XT/?uri=CELEX:52008SC2180>31Disponvel em: < http://eur-lex.europa.eu/legal-content/ENALL/?uri=CELEX:52008SC2181>32A populao estimada de roma na Europa de 10 a 12 milhes (FRA 2009:107).

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    especialistas, de polticos e do pblico em geral de que a discriminaono deve ser tolerada e, portanto, deve ser criteriosamente estudada.

    Infelizmente, sabe-se ainda muito pouco sobre a verdadeira extensodas prticas discriminatrias na Unio Europeia. Segundo Wrench (2011:1716), no existe um sistema modelo de coleta de dados que permita do-cumentar as manifestaes de discriminao e racismo em qualquer estadomembro da UE com base em definies e indicadores comparveis e con-

    sensuais. Consequentemente, apesar de todos os esforos desenvolvidospelas instituies e organizaes descritas nas sees anteriores, ainda restamuito por fazer nos mbitos governamental, cientfico e de ativistas no--governamentais, para combater a discriminao. A ideia de uma !reade Liberdade, Segurana e Justia" europeia simptica e atrativa, masprecisa ser desenvolvida e posta em prtica. As manifestaes do PEGIDAem Dresden, que portaram fortes elementos discriminatrios e racistas ereuniram mais de dez mil pessoas, duraram apenas cerca de trs meses.Mas, como escreveu o poeta e dramaturgo alemo, Bertolt Brecht, em suapeaA resistvel ascenso de Arturo Ui: !Ainda frtil o ventre em que elefoi gerado". A todavia forte e, em alguns pases, crescente influncia dospartidos nacionalistas de extrema direita, anti-islmicos e antissemitas assimcomo os recentes eventos em diversos pases da Europa demonstram quea discriminao e o racismo seguem sendo um srio desafio # tanto para asociedade civil como para cientistas.

    Ludger Pries Doutor em Cincias Sociais e Professor Catedrtico de Sociolo-gia/Organizao, Migrao, Participao na Ruhr-Universitt Bochum, Alemanha.

    [email protected]

    Natalia Bekassow aluna de mestrado em Cincias Sociais na Ruhr-UniversittBochum, Alemanha e Ajudante de Pesquisa da Ctedra Sociologia/Organizao/

    Migrao, Participao nessa mesma [email protected]

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    Recebido em: 27/03/2015Aceite final em: 21/05/2015