tese sobre celpebras

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  • 8/12/2019 Tese Sobre Celpebras

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULINSTITUTO DE LETRAS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRASREA DE CONCENTRAO: AQUISIO DE LINGUAGEM

    Avaliao de proficincia oral em lngua estrangeira:descrio dos nveis de candidatos falantes de espanhol no

    exame Celpe-Bras

    JULIANA ROQUELE SCHOFFEN

    Dissertao apresentada Banca Examinadoracomo exigncia parcial para a obteno dograu de Mestre em Letras

    Orientadora: Profa. Dra. MARGARETE SCHLATTER

    Porto Alegre, outubro de 2003.

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    AGRADECIMENTOS

    Aos meus pais, Roque e Jurandira, e ao meu irmo Jlio, por todo o incentivo e por

    serem sempre, em suas vidas, exemplos de trabalho e retido.

    Ao Alexandre, pelo carinho dispensado durante a elaborao desta dissertao, e por ter

    me ensinado que no devemos desistir dos nossos objetivos, no importa o quanto

    demoremos para alcan-los.

    Professora Dra. Margarete Schlatter, por todas as oportunidades de desenvolvimento

    e crescimento profissional e pessoal, e pelo brilhante exemplo de profissional e de ser

    humano.

    Ao Programa de Portugus para Estrangeiros da UFRGS, pelas possibilidades de

    aprendizado e de formao.

    Aos colegas professores do Programa de Portugus para Estrangeiros, pelos

    ensinamentos, pelas trocas de experincias e pelo auxlio nas horas necessrias.

    A todos os meus amigos que, de uma forma ou outra, tornaram mais ameno o caminho

    de construo desta dissertao.

    Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pela qualificada formao oferecida.

    comisso tcnica do exame Celpe-Bras, pela oportunidade de participar das

    aplicaes e das correes do exame, e por ter me disponibilizado os dados analisadosneste trabalho.

    Capes, pela concesso da bolsa de mestrado.

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    RESUMO

    Avaliar proficincia oral em uma lngua estrangeira um processo que requer

    um criterioso treinamento dos avaliadores e grades de avaliao precisas o suficiente

    para abarcar as caractersticas da proficincia dos candidatos. O processo de avaliao

    oral pode tornar-se mais complexo quando se trata de avaliar lnguas prximas, como o

    portugus e o espanhol, pois a semelhana entre as lnguas traz particularidades que

    podem no estar previstas na grade de avaliao. O exame de proficincia em Portugus

    para Estrangeiros Celpe-Bras, desenvolvido pelo Ministrio da Educao do Brasil,

    testa a capacidade do candidato de compreender e de produzir a lngua de forma

    adequada em situaes reais de comunicao. Para tanto, a grade de avaliao do exame

    expressa em descritores de desempenho do candidato. Esses descritores, no entanto,

    nem sempre contemplam toda a variao no desempenho dos candidatos e, por serem

    ainda bastante amplos, dificultam a determinao do nvel de proficincia,

    principalmente quando os candidatos so falantes de lnguas prximas ao portugus.

    Este trabalho tem como objetivo fazer uma descrio detalhada do desempenho de

    candidatos falantes de espanhol no exame Celpe-Bras, apontando as caractersticas da

    sua proficincia. O corpus para essa anlise constitudo de doze entrevistas de

    candidatos falantes de espanhol, dos quais quatro obtiveram Certificado Avanado,quatro Certificado Intermedirio e quatro no receberam certificao. A partir da anlise

    dos dados, foram selecionadas categorias relevantes para a avaliao dos candidatos e,

    de acordo com a adequao ou inadequao apresentadas nessas categorias, pudemos

    descrever o desempenho dos candidatos em cada um dos nveis de certificao e

    explicitar melhor qual a diferena entre um nvel de certificao e outro. Os resultados

    deste trabalho pretendem contribuir para que os avaliadores possam se basear em

    descries mais detalhadas de desempenho para avaliar a proficincia oral de falantes deespanhol, aperfeioando assim o processo de avaliao.

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    ABSTRACT

    Assessing oral proficiency in a foreign language is a complicated process that

    requires criterion-based training for the rater, and accurate rating scales to account forthe candidates proficiency characteristics. The oral assessment process is further

    complicated when assessing similar languages such as Portuguese and Spanish, as the

    similarity between them highlights singularities that may not have been anticipated in

    the assessment scale. The Portuguese for Foreigners Proficiency Exam, Celpe-Bras,

    developed by Brazils Ministry of Public Instruction, tests the candidates capacity to

    comprehend and produce proper language in communicative situations. To achieve this,

    the exams rating scale is expressed in descriptors of the candidates performance.Occasionally however, the descriptors are insufficiently detailed enough to cover the

    variation in candidates performance, and this can make the determination of the

    proficiency level difficult. This is particularly evident when the candidates are speakers

    of languages similar to Portuguese. The aim of this paper is to give a detailed

    description of Spanish speaker candidates performance in the Celpe-Bras exam,

    highlighting the characteristics of their proficiency. The data for this paper was obtained

    from the results of twelve Spanish speaker candidate interviews, comprising of four

    Advanced Certificate passes, four Intermediate Certificate passes, and four non

    certifications. After performing data analysis, categories that appeared to be relevant for

    the candidates evaluation were selected. By assessing the adequacy or inadequacy

    presented in these categories, it was then possible to differentiate each certification

    level, and describe the candidates performance in that level. The results of this paper

    are intended to provide further detailed performance descriptors for the raters when

    assessing Spanish speakers oral proficiency, thus improving the assessment process.

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    SUMRIO

    1- INTRODUO ............................................................................................................7

    2- BREVE HISTRICO DA AVALIAO DE PROFICINCIA EM LNGUAESTRANGEIRA ...............................................................................................................9

    2.1- O perodo pr-cientfico .............................................................................................9

    2.2- As teorias estruturalistas ..........................................................................................10

    2.3- Competncia Lingstica e Competncia Comunicativa .........................................11

    2.4- A proficincia comunicativa ....................................................................................13

    2.5- Os testes comunicativos ...........................................................................................14

    2.6- A busca por testes de desempenho...........................................................................152.7- Testes de proficincia oral .......................................................................................19

    2.8- Escalas de avaliao de desempenho .......................................................................23

    3- O EXAME CELPE-BRAS..........................................................................................25

    3.1- Origens .....................................................................................................................25

    3.2- Formato do exame....................................................................................................27

    3.3- Proximidade entre as lnguas portuguesa e espanhola .............................................30

    4- METODOLOGIA .......................................................................................................334.1- Percurso da pesquisa ................................................................................................33

    4.2- Objetivos ..................................................................................................................34

    4.3- A entrevista oral do exame Celpe-Bras....................................................................34

    4.4- Perfil da amostra selecionada...................................................................................34

    4.5- Transcries .............................................................................................................35

    4.6- A grade de avaliao do exame................................................................................36

    4.7- Categorias selecionadas para a anlise.....................................................................41

    5- DESCRIO DOS NVEIS DE PROFICINCIA ....................................................59

    5.1- Certificado Avanado...............................................................................................59

    5.2- Certificado Intermedirio .........................................................................................67

    5.3- Sem Certificao ......................................................................................................77

    6- CONSIDERAES FINAIS......................................................................................86

    7- REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS........................................................................96

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    QUADROS E TABELAS

    Tabela 1 ....................................................................................................... 63

    Tabela 2 ....................................................................................................... 64

    Tabela 3 ....................................................................................................... 65

    Tabela 4 ....................................................................................................... 71

    Tabela 5 ....................................................................................................... 72

    Tabela 6 ....................................................................................................... 73

    Tabela 7 ....................................................................................................... 80

    Tabela 8 ....................................................................................................... 81Tabela 9 ....................................................................................................... 83

    Quadro 1 ...................................................................................................... 66

    Quadro 2 ...................................................................................................... 74

    Quadro 3 ...................................................................................................... 83

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    nvel de certificao atribudo aos candidatos. A partir da adequao ou inadequao

    dos candidatos nessas categorias, pudemos estabelecer quais as que parecem ser mais

    definidoras da diferena entre os nveis de certificao. Elaboramos, ainda, uma grade

    descritiva da proficincia dos candidatos em cada um dos nveis certificados pelo

    exame, de acordo com as categorias selecionadas para a anlise.

    Este trabalho visa a promover um conhecimento maior das caractersticas da

    proficincia em portugus dos falantes de espanhol. Por serem lnguas muito

    semelhantes, a avaliao da proficincia oral torna-se complexa e requer muito cuidado,

    j que esses falantes, mesmo no sendo proficientes, apresentam caractersticas muito

    particulares, que candidatos falantes de outras lnguas no apresentariam, como uma

    muito boa compreenso, por exemplo. Fazendo uma descrio mais detalhada da

    proficincia dos falantes de espanhol e propondo uma grade descritiva do desempenho

    dos falantes para cada um dos nveis, acreditamos estar contribuindo para que o

    avaliador tenha mais subsdios no momento da avaliao desses candidatos.

    Para cumprir os objetivos expostos acima, no captulo dois fazemos um estudo

    da histria da avaliao em lngua estrangeira, desde os testes de pontos discretos at os

    testes de desempenho, como o exame Celpe-Bras. Apresentamos tambm a histria da

    avaliao de proficincia oral. Discutimos, ainda, as escalas de avaliao instrumento

    utilizado para avaliar os testes de desempenho. No captulo trs, apresentamos o exame

    Celpe-Bras, mostrando as caractersticas e o formato do exame, e descrevendo tambm

    os desempenhos esperados em cada um dos nveis de certificao concedidos. A seguir,

    fazemos uma discusso das peculiaridades que a proximidade existente entre o

    portugus e o espanhol pode trazer para a avaliao de proficincia entre essas duas

    lnguas. No quarto captulo descrevemos a metodologia utilizada no trabalho,

    apresentamos a amostra de dados analisada, bem como descrevemos como foram

    selecionadas e quais so as categorias utilizadas na anlise. O quinto captulo se destina anlise dos dados e descrio dos nveis de proficincia. tambm neste captulo

    que apresentamos a nossa proposta de grade descritiva do desempenho dos candidatos e

    discutimos quais categorias seriam as provveis responsveis pela diferenciao entre os

    nveis de proficincia. O captulo das consideraes finais retoma algumas discusses

    feitas no decorrer do trabalho, apresenta comentrios acerca das categorias de avaliao

    e prope uma possvel interpretao para os nveis de certificao do exame Celpe-Bras.

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    2- BREVE HISTRICO DA AVALIAO DE PROFICINCIA EM LNGUA

    ESTRANGEIRA

    Segundo Brown (1993), percebamos ou no, ns avaliamos1 todos os dias, em

    virtualmente todos os esforos cognitivos que fazemos. Carroll (1968:46) define teste

    como: um procedimento feito para elicitar determinado comportamento, do qual pode-

    se fazer inferncias sobre certas caractersticas de um indivduo2. Esse conceito , de

    certa maneira, retomado por Brown (1993), quando o autor diz que um teste um

    mtodo de medir a habilidade ou conhecimento de uma pessoa em determinada rea.

    Existem testes para quase todas as reas do conhecimento humano, e esses testes

    podem ser de naturezas bastante diferentes. Quase todos os testes, indiferentemente da

    rea de conhecimento que estejam medindo, usam a linguagem como instrumento de

    avaliao. em uma determinada lngua que so dadas as instrues do teste,

    formuladas as questes, e, na maioria das vezes, tambm as respostas. Mas quando o

    teste em questo um teste de capacidade lingstica, esse uso da linguagem como

    instrumento dificulta a definio do que est sendo testado.

    Testar proficincia em lngua , por isso, uma tarefa complexa. Como vimos, em

    testes de outras reas usa-se a lngua para medir a habilidade do candidato (fsica ou

    geografia, por exemplo). Nesses casos, a lngua o instrumento, no o objeto da

    testagem. J nos testes de lngua, usa-se a prpria lngua para medir a habilidade

    lingstica. A lngua o instrumento e tambm o objeto em si. A seguir, veremos

    como a prtica de avaliao de lnguas passou por transformaes ao longo do tempo.

    2.1- O perodo pr-cientfico

    Antes da dcada de 1950, eram muito raros os estudos na rea de avaliao de

    lngua estrangeira. Como o ensino de lngua em si no era considerado uma disciplinaindependente (fazia parte das chamadas cincias humanas), tambm a avaliao das

    lnguas no era objeto de estudos mais especficos. Spolsky (1995) chama esse perodo

    dos estudos sobre testagem de lngua de perodo pr-cientfico.

    1Neste trabalho as palavras avaliaoe testagemso empregadas como sinnimas.2As tradues das citaes originariamente em ingls so de minha responsabilidade.

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    2.2- As teorias estruturalistas

    Foi a partir da dcada de 50 e das teorias estruturalistas que o ensino de lngua

    passou a ser considerado uma disciplina em si, e muitos estudos comearam a surgir na

    rea de aquisio de linguagem. O estruturalismo foi, assim, a primeira corrente terica

    a se preocupar cientificamente com os estudos da linguagem, e foi tambm a primeira

    escola a pensar cientificamente em testes de lngua e a buscar a definio de

    proficincia.

    Nessa poca, as lnguas eram vistas como um inventrio de componentes

    discretos (como gramtica e vocabulrio) e de habilidades (ouvir, falar, ler e escrever)

    (ver Bachman e Cohen, 1998). A aquisio de uma lngua estrangeira se dava, pensava-

    se, atravs da formao de hbitos, e era a automatizao desses hbitos que formava a

    proficincia. Segundo Vollmer (1983), devido grande influncia da teoria lingstica

    do estruturalismo, durante muito tempo os estudos lingsticos aceitaram, sem grande

    discusso, que ser proficiente em uma lngua significava conhecer os seus elementos e

    ter automatizado diferentes formas de coloc-los em uso. Nesse sentido, podemos dizer

    que a escola estruturalista forneceu um dos primeiros arcabouos tericos para a

    definio de proficincia. De acordo com essa viso, aprender uma lngua estrangeira ou

    ser proficiente nessa lngua pressupunha dominar seus elementos (Fries, 1945; Lado,

    1961).

    Assim como a aquisio de lngua estrangeira e o conceito de proficincia foram

    diretamente influenciados pelos estudos estruturalistas, tambm os estudos na rea de

    avaliao de lngua eram, nessa poca, subordinados a essa teoria. Uma vez que a lngua

    era vista como um conjunto de vrios elementos diferentes, os estudos de Lado (1957,

    1961) argumentavam que era possvel medir cada um desses elementos. Conhecimento

    de vocabulrio, pronncia, gramtica, e tambm as habilidades de ler, escrever, ouvir e

    falar eram testadas em separado, e a produo e a compreenso eram vistas comohabilidades distintas.

    Como a proficincia em uma lngua era medida pela testagem dos diversos

    aspectos de maneira independente, cada um desses aspectos era medido de forma

    restrita, isto , na maioria das vezes os testes de lngua baseados nessa teoria no

    apresentavam atividades contextualizadas, ao contrrio, os itens lingsticos eram

    testados independentemente do contexto e da sua relao com os demais.

    Tambm por essa separao entre os nveis lingsticos, e por causa da procurapor testes confiveis e prticos, criou-se a tradio de testes de lngua objetivos, muito

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    confiveis e fceis de serem aplicados e avaliados (pontuados). Esses testes consistem,

    em sua maioria, de atividades em que o candidato no necessita criar uma resposta

    nova, mas apenas classificar como certas ou erradas alternativas j existentes. Nesse

    tipo de teste, so bastante comuns tarefas (na maioria das vezes descontextualizadas) de

    mltipla escolha, preencher lacunas ou de verdadeiro ou falso, que aceitam apenas uma

    resposta correta. Esse mtodo, por sua objetividade de correo e por medir as

    habilidades separadamente, chamado mtodo de pontos discretos.

    Os testes de pontos discretos foram construdos baseados na crena de que a

    lngua podia ser desmembrada em suas partes componentes e cada parte podia ser

    adequadamente testada (Brown, 1993). O mtodo de pontos discretos, por ser

    extremamente prtico e confivel, ainda usado hoje em dia, combinado com tarefas

    mais globais, em muitos testes de proficincia disponveis no mercado, como os exames

    Cambridge, Michigan e Toefl.

    2.3- Competncia Lingstica e Competncia Comunicativa

    Em 1965, Chomsky apresenta o conceito de competncia lingstica, que seria

    baseada em um falante-ouvinte ideal de uma comunidade de fala homognea, que

    domina a sua lngua perfeitamente. A teoria lingstica proposta por Chomsky no est

    preocupada com limitaes da memria, distraes, mudanas de ateno e interesse e

    erros na aplicao do conhecimento da lngua no desempenho real, situaes que ele

    chama de condies gramaticalmente irrelevantes. Segundo o autor, a propriedade

    mais caracterstica do comportamento lingstico que ele inovativo. Todo falante

    nativo de uma lngua tem internalizada uma gramtica gerativa, descrita como um

    sistema de regras que pode ser usado em novas combinaes para formar novas

    sentenas e que permite a integrao semntica das mesmas (Chomsky, 1973:32).

    Essa definio de competncia lingstica proposta por Chomsky encontraoposio quando Hymes prope o termo competncia comunicativa. Segundo Hymes,

    existem regras de uso sem as quais as regras da gramtica seriam inteis (Hymes,

    1972:278). Para ele, as condies de produo das sentenas, bem como o propsito e o

    lugar social que elas expressam so regidos por regras to rgidas e importantes quanto

    as regras da gramtica descritas por Chomsky.

    Segundo Widdowson (1989), a diferena entre Chomsky e Hymes est no fato

    de que a lingstica de Hymes est centrada no uso da linguagem, enquanto a deChomsky no est. Para o autor, a noo de competncia de Chomsky o conhecimento

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    de algo muito mais abstrato que a linguagem: o conhecimento do sistema de regras,

    parmetros e princpios ou configuraes mentais para os quais a linguagem

    simplesmente serve de evidncia. Widdowson diz ainda que Chomsky v competncia

    como conhecimento gramatical, um estado mental abaixo do nvel do uso da linguagem.

    Competncia no , necessariamente, segundo essa viso, habilidade para fazer alguma

    coisa. Para Hymes (1972), ao contrrio, competncia seria a habilidade para usar a

    linguagem.

    A partir da idia de competncia comunicativa, inicia-se nos estudos lingsticos

    uma corrente bastante forte de estudos da pragmtica e da sociolingstica, e comea-se

    a perceber que no possvel ser proficiente em uma lngua sem ser proficiente no seu

    uso. A partir da, a pesquisa na rea de avaliao de lngua comeou a procurar formas

    de incluir o uso da lngua em contexto nos testes, e iniciou-se a procura por testes de

    proficincia que apresentassem tarefas mais contextualizadas e que permitissem ao

    candidato respostas menos restritas do que as que os testes de pontos discretos

    permitiam at ento.

    Os estudos na rea da competncia comunicativa levaram os lingistas a

    acreditar que o todo comunicativo era consideravelmente maior que a soma dos seus

    elementos lingsticos (Clark 1983:432). Essa crena levou os estudos lingsticos a se

    preocuparem mais com a lngua como um todo e a dar mais valor ao seu uso em

    contexto, ao contrrio do que acontecia antes, quando o uso era praticamente renegado.

    Essa corrente de pesquisas na rea de avaliao foi chamada por Brown (1993) de

    integrativa-sociolingstica.

    A abordagem dos pontos discretos obviamente encontrou crticas quando

    comeou a era do integrativo-sociolingustico e sua nfase na comunicao,

    autenticidade e contexto. A crtica veio largamente de Oller (1979), que argumentava

    que competncia lingstica era uma gama unificada de habilidades interacionais queno poderiam ser separadas. Pensava-se que competncia comunicativa seria to global

    e requereria tal integrao (da o termo avaliao integrativa) que no poderia ser

    capturada em testes somados de gramtica, leitura, vocabulrio e outros pontos discretos

    da lngua. Se itens discretos separam as habilidades lingsticas, os testes integrativos

    os unem de novo. Enquanto itens discretos tentam testar conhecimento de lngua um

    pouco de cada vez, os testes integrativos tentam avaliar uma capacidade do aprendiz de

    usar todos os pedaos ao mesmo tempo (Oller, 1979:37).

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    Foi nessa poca que surgiu a hiptese da proficincia unitria, que propunha a

    viso da proficincia como sendo indivisvel. Segundo essa hiptese, vocabulrio,

    gramtica, fonologia, bem como as quatro habilidades de ler, escrever, ouvir e falar no

    poderiam ser separadas. Essa hiptese foi largamente defendida por Oller (1979), que

    argumentava que existiria uma proficincia lingstica global que a soma de todos os

    pontos discretos no chegaria a atingir.

    A hiptese da proficincia unitria foi bastante contestada por outros tericos,

    como Farhady (1982), que evidenciavam que era possvel a um aprendiz, dependendo

    da sua lngua materna, grau de estudo ou campo de interesse, ter um aproveitamento

    muito melhor em algumas habilidades do que em outras. Segundo esses autores, a

    proficincia no seria formada por um todo unitrio, mas por habilidades que,

    integradas, dariam condies pessoa de interagir na lngua.

    2.4- A proficincia comunicativa

    A partir do conceito de competncia proposto por Chomsky (1965), e, mais

    tarde, do conceito de competncia comunicativa proposto por Hymes (1972), teve incio

    nos estudos lingsticos uma nova representao de proficincia, que leva em conta

    fatores comunicativos, socioculturais e situacionais. Bachman (1990) descreve

    habilidade lingstica comunicativa como consistindo de conhecimento (ou

    competncia) e capacidade para implementar ou executar essa competncia em uso

    comunicativo da lngua apropriado e contextualizado.

    Os estudos chamados comunicativos foram, a partir do final dos anos 70,

    muito importantes na rea de aquisio e descrio da linguagem, tomando, quase que

    totalmente, o lugar dos estudos estruturalistas que dominavam at ento. Vrios

    modelos de competncia comunicativa j foram propostos, sendo que um dos mais

    conhecidos, o de Canale e Swain (1980), conclui que no provvel que a competnciacomunicativa possa ser reduzida a apenas uma dimenso global de proficincia

    lingstica. Segundo esse modelo, a competncia comunicativa dividida em (pelo

    menos) trs dimenses diferentes: competncia gramatical (que inclui lxico,

    morfologia, sintaxe e fonologia), competncia sociolingstica (que consiste de regras

    socioculturais e discursivas que regulam o uso da lngua) e competncia estratgica

    (estratgias de comunicao verbal e no verbal que entram em ao para compensar

    eventuais problemas na comunicao).

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    Ser proficiente em uma lngua estrangeira, segundo Widdowson (1991),

    significa mais do que compreender, ler, falar e escrever oraes nessa lngua. Significa

    tambm saber utilizar essas oraes de modo a conseguir o efeito comunicativo

    desejado. Tambm segundo o autor, nas interaes sociais em nossa vida cotidiana,

    geralmente se exige que usemos o nosso conhecimento do sistema lingstico com o

    objetivo de obter algum tipo de efeito comunicativo. Isso equivale a dizer que

    geralmente se exige que produzamos exemplos de uso da linguagem (Widdowson,

    1991:16 grifo do autor). Sendo assim, o que um falante precisa para ser proficiente

    no somente conhecer o sistema abstrato da lngua, mas saber como us-la

    adequadamente em determinada situao.

    Seguindo a idia da proficincia comunicativa, de que as habilidades lingsticas

    funcionam de maneira integrada em situaes reais, no suficiente que um teste de

    proficincia mea as habilidades lingsticas do candidato descontextualizadas da sua

    situao de uso. Um exame assim poderia certificar como proficiente um candidato que

    apenas tem conhecimento abstrato da lngua, mas que no de fato proficiente em

    situaes reais de comunicao. Para Widdowson (1991:97), a aprendizagem das

    habilidades lingsticas no parece garantir a conseqente aquisio da capacidade

    comunicativa numa dada lngua. A pessoa que proficiente em uma lngua estrangeira

    sabe mais do que compreender, falar, ler e escrever oraes. Ela tambm conhece as

    formas como as oraes so utilizadas para conseguir um efeito comunicativo.

    2.5- Os testes comunicativos

    Se a partir da dcada de 70 os mtodos de ensino de lngua, em sua grande

    maioria, foram influenciados pelos estudos comunicativos e a nfase passou a ser a

    interao, a prtica de avaliao tambm foi influenciada por esses estudos e os testes,

    que antes eram em sua maioria objetivos (de pontos discretos), passaram a contemplartambm o uso da lngua em situaes de comunicao.

    Segundo Brown (1993), um teste comunicativo tem que ser pragmtico no

    sentido de exigir que o candidato use a lngua dentro de um contexto apropriado. Alm

    disso, ainda segundo o autor, para um teste ser chamado de comunicativo necessrio

    que ele teste o aprendiz em uma variedade de funes da linguagem. Os testes

    comunicativos devem medir uma gama variada de habilidades lingsticas incluindo

    conhecimento de coeso, funes da linguagem e conhecimentos sociolingsticos.

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    Harrison (1983) diz que um teste no se torna comunicativo ao se misturar nele

    um pouco de realidade: ele comunicativo por causa do uso que se faz dele, e se ele no

    puder ser usado para representar um propsito comunicativo, ele no um teste

    comunicativo.

    2.6- A busca por testes de desempenho

    Como vimos, o conceito de proficincia lingstica j foi objeto de desacordo

    entre muitos estudiosos e ainda necessita de definies mais claras. Vollmer (1983:152)

    diz que depois de vrios anos de investigao, o que ainda se pode dizer sobre

    proficincia que ela o que os testes de proficincia medem. E os testes de

    proficincia acabam por medir aquilo que os seus elaboradores querem que eles meam,

    baseados nas teorias lingsticas em que acreditam, e de acordo com as definies de

    lngua e linguagem em que acreditam.

    Por essa razo, Bachman (1990) acredita que todos os testes de lngua devem ser

    baseados em uma definio clara das habilidades lingsticas. Nessa mesma linha,

    Scaramucci (2000) afirma que as divergncias maiores no residem na interpretao do

    termo proficincia, mas nas concepes do que saber uma lngua que o termo

    representa. Ao se elaborar um teste, muito importante definir o que se entende por

    saber uma lngua, porque a maneira como definimos as habilidades est intimamente

    relacionada com as caractersticas do teste que vamos usar.

    Alm da definio clara das habilidades lingsticas que um exame de

    proficincia vai avaliar, outros critrios tambm precisam ser levados em conta na

    elaborao de um teste. Em primeiro lugar, um teste precisa ser prtico existem

    limitaes financeiras e restries de tempo, ento importante que o teste seja fcil de

    administrar, pontuar e interpretar. A praticidade depende de aspectos como tempo

    disponvel, nmero de candidatos, disponibilidade de avaliadores e disponibilidadefinanceira. Um teste que exija entrevista individual, por exemplo, pode ser considerado

    prtico se o nmero de candidatos for pequeno ou se existirem vrios avaliadores, mas

    certamente ser impraticvel se forem muitos os candidatos e um s o avaliador.

    Outro aspecto importante para um teste a confiabilidade. A confiabilidade de

    um teste reside em minimizar os efeitos na avaliao dos fatores externos ao teste,

    fazendo com que a habilidade lingstica do candidato seja avaliada de maneira

    uniforme. Existem vrios fatores que podem afetar o desempenho do candidato em umteste e assim provocar equvocos na avaliao da habilidade lingstica comunicativa.

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    Dentre esses fatores est o cansao do candidato ou do avaliador, o domnio ou

    desconhecimento de determinado tpico, discrepncia de referenciais tericos entre os

    avaliadores, preferncia ou aptido pessoal para um determinado tipo de teste, bem

    como o conhecimento ou desconhecimento da situao de avaliao. Quanto menos

    esses fatores afetarem a avaliao de um teste, maior importncia ter no teste o

    domnio das habilidades lingsticas que queremos medir e, conseqentemente, maior a

    confiabilidade dos escores do teste.

    Para que possamos diminuir o efeito dos fatores externos, no entanto,

    necessria uma especificao cuidadosa e analtica do instrumento e das grades de

    avaliao. Segundo Brown and Bailey (1984), essa especificao maior pode aumentar

    significativamente a confiabilidade do teste. Tambm a uniformidade das condies de

    aplicao e um treinamento uniforme de todos os avaliadores pode colaborar

    sensivelmente para o aumento da confiabilidade do exame, uma vez que assim eles

    tero a oportunidade de compreender melhor as grades e o prprio instrumento de

    avaliao.

    Mas segundo Bachman (1990), o critrio mais importante a ser considerado nos

    processos de desenvolvimento, interpretao e uso de um teste no deve ser se os seus

    escores so confiveis, mas se a interpretao e o uso que fazemos desses escores so

    vlidos. Para o autor, quando aumentamos a confiabilidade das nossas medies,

    estamos tambm satisfazendo uma condio necessria para a validade: para o escore de

    um teste ser vlido, necessrio que ele seja primeiro confivel.

    Para Brown (1993), validade o grau segundo o qual o teste realmente mede o

    que ele se prope a medir. Essa idia segue a definio formulada por Lado: o teste

    mede o que ele deve medir? Se ele mede, ele vlido (Lado, 1961:321). A literatura na

    rea de avaliao apresenta trs tipos de validade: validade de contedo, validade de

    construto e validade de face. Segundo Brown (1993), em um teste com validade decontedo as tarefas devem ser representativas do contedo ou das habilidades a que o

    teste se prope, isto , o teste deve testar as habilidades ou conhecimentos sobre as

    quais quer arbitrar valor. Um teste que tem como objetivo medir a habilidade

    conversacional em lngua estrangeira, por exemplo, ter validade de contedo se

    apresentar tarefas que exijam do candidato interao oral dentro de um contexto. Se o

    teste se limitar a apresentar questes escritas de mltipla escolha, por exemplo, no ter

    validade de contedo.

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    Validade de construto diz respeito a como definimos o que queremos medir e ao

    fato de que o teste realmente mede as habilidades necessrias para o que se prope um

    teste que quer medir habilidade de comunicao oral mas apresenta apenas tarefas de

    gramtica no possui validade de construto, pois o domnio da gramtica apenas um

    dos conhecimentos necessrios para a comunicao oral, por exemplo. Construto a

    definio terica do objeto a ser medido. Quando um pesquisador interpreta a pontuao

    de um aprendiz em um teste de vocabulrio, por exemplo, como um indicador de

    conhecimento de vocabulrio, ento conhecimento de vocabulrio o construto que

    d sentido pontuao.

    Para ter validade de face importante que as tarefas do teste paream estar de

    acordo com o construto que o teste pretende medir. Se um teste quer medir habilidade

    de leitura em lngua estrangeira, por exemplo, importante que ele possua questes de

    leitura, e no apenas de gramtica. Segundo Brown (1993), a validade de face

    importante do ponto de vista dos candidatos que se submetem ao teste, pois estes se

    sentem mais seguros com relao validade do teste se puderem perceber uma relao

    entre as tarefas propostas e o construto que o teste diz medir.

    Outro ponto importante ressaltado por Bachman (1990) o aspecto preditivo da

    validade. Esse aspecto diz respeito s predies que podemos fazer sobre as situaes

    para as quais os candidatos esto aptos, com base no resultado dos testes. Assim, testes

    como o Celpe-Bras, em que no se busca aferir conhecimentos a respeito da lngua,

    por meio de questes sobre a gramtica e o vocabulrio, mas sim a capacidade de uso

    dessa lngua e em que a competncia do candidato avaliada pelo seu desempenho

    em tarefas que se assemelham a situaes da vida real (Schlatter et ali, 2003:4), podem

    predizer a habilidade do candidato para realizar um curso universitrio ou trabalhar no

    pas, objetivo de muitos candidatos que se submetem a esse exame. Um teste que no

    preditivamente vlido pode no ser de muito uso na sociedade.Ainda segundo Bachman (1990), a interpretao e o uso que fazemos do

    desempenho nos testes podem no ser igualmente vlidos para todas as habilidades e em

    todos os contextos. Isso quer dizer que um teste s pode ser considerado vlido dentro

    de um determinado contexto e em determinadas circunstncias. Um teste que apresenta

    apenas tarefas de compreenso de leitura ou de gramtica, por exemplo, no pode ser

    considerado vlido para definir habilidade de fluncia oral. Tambm um teste que se

    prope a verificar as habilidades lingsticas de candidatos adultos com um certo graude estudo (caso do Toefl, por exemplo) no ser vlido se for aplicado em crianas.

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    Outro aspecto importante, ressaltado por Messick (1989, apud McNamara,

    1996), o que o autor chama de validade de impacto (consequential validity). Segundo

    o autor, toda avaliao causa algum tipo de impacto nos contextos educacionais em que

    praticada. Esse impacto dos testes nos contextos educacionais descrito pelos

    estudiosos como efeito retroativo (washback effect).

    Os defensores dos testes comunicativos de desempenho apontam o efeito

    retroativo como um dos grandes argumentos para a adoo desses testes. Segundo esses

    estudiosos, como Frederiksen and Collins (1989, apud McNamara, 1996), a adoo de

    testes de desempenho teria como conseqncia um ensino direcionado para a

    preparao dos alunos para as tarefas presentes nesses testes, e assim, indiretamente, os

    alunos seriam tambm preparados para usar a lngua em situaes reais de

    comunicao, devido semelhana entre as tarefas desses testes e as situaes reais de

    uso da lngua. Essa conseqncia, chamada pelos autores de efeito retroativo positivo,

    se ope conseqncia dos testes cujas tarefas esto relacionadas apenas indiretamente

    ao desempenho lingstico esperado dos candidatos, como os testes de mltipla escolha,

    por exemplo. Esses testes desencadeariam o que os autores chamam de efeito retroativo

    negativo, fazendo com que professores e alunos centrassem seus esforos na preparao

    para o teste, e no no desenvolvimento do desempenho das habilidades lingsticas em

    si.

    Apesar de ser bastante comentado na teoria sobre avaliao, existem ainda

    poucos estudos que comprovem esse efeito retroativo benfico dos testes de

    desempenho nos contextos educacionais. Scaramucci (1999b) relata que, algumas vezes,

    a influncia de um teste pode afetar o objeto do ensino (o que ensinado), mas no se

    refletir na metodologia utilizada (como ensinado). Segundo a autora, outros elementos

    existentes na escola, na educao e na sociedade exercem sua influncia sobre o que

    ensinado e como se ensina na sala de aula, fazendo com que essas duas coisas no sejamexplicadas unicamente a partir das caractersticas do exame para o qual o ensino

    prepara.

    No possvel, dessa forma, pensar em efeito retroativo de uma maneira

    determinista, imaginando que o teste tenha influncia imediata no ensino em sala de

    aula. Outros fatores, alm do instrumento em si, parecem tambm ser muito importantes

    para a determinao do contedo e do mtodo de ensino, como a formao do professor,

    a crena dos alunos e do prprio professor na possibilidade ou no de aprovao noexame, o currculo proposto e a crena dos sujeitos envolvidos do que seja ensinar e

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    aprender uma lngua estrangeira. Para Scaramucci, necessrio relativizar o efeito

    retroativo conseguido com os testes de desempenho, porque inovaes educacionais

    no so conseguidas automtica e unicamente, atravs da implementao de propostas

    direcionadoras e exames externos (Scaramucci, 1999b:18).

    2.7- Testes de proficincia oral

    Para os testes tradicionais, a avaliao oral no era considerada importante na

    determinao da proficincia. Esses testes, como j vimos, se preocupavam mais em

    medir estruturas gramaticais e habilidades de leitura, e a habilidade oral era deixada de

    lado.

    Segundo Shohamy (1988), foi s nos anos 60 que a avaliao oral da lngua

    comeou a receber maior ateno. Pimsleur (1965, apud Shohamy, 1988) descreve os

    primeiros testes orais como consistindo na repetio de palavras e frases, e tambm em

    respostas-padro a perguntas-padro, executados em laboratrios equipados de

    gravadores. Apesar de terem sua validade comunicativa bastante comprometida, esses

    testes tiveram o mrito de inserir a avaliao oral nas discusses e estudos sobre a

    avaliao de lngua, abrindo caminho para os testes mais elaborados e teoricamente

    embasados que vieram depois.

    Nos anos 70, o fluxo muito grande de estudos de teorias comunicativas trouxe

    crticas bastante severas aos testes orais. Estudos dessa poca argumentavam que a

    linguagem oral produzida nessas ocasies era artificial, pois os candidatos, ao invs de

    interagirem com outras pessoas, como em situaes naturais, falavam com mquinas.

    Comeou ento a ser necessrio o desenvolvimento de testes orais que exigissem do

    candidato produo na lngua-alvo e interao com pessoas reais.

    Devido a essa necessidade, na dcada de 70 foi desenvolvida a estrutura da

    Entrevista Oral, teste que vem sendo o mais usado durante os ltimos anos para medirproficincia oral em lngua estrangeira. A entrevista oral consiste na interao oral de

    um (ou mais de um) candidato e um (ou mais de um) avaliador. O avaliador faz ao

    candidato perguntas sobre vrios tpicos, e as respostas do candidato, que representam a

    amostra da sua habilidade oral, so medidas pelo avaliador com a ajuda de uma escala

    de avaliao.

    A entrevista oral desde o seu incio foi considerada como um grande avano em

    relao aos testes orais anteriores, e em pouco tempo foi tomando o lugar deles, masganhou ainda mais popularidade quando o Conselho Americano para o Ensino de

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    Lnguas Estrangeiras (ACTFL American Council on the Teaching of Foreing

    Languages) a adotou como instrumento oficial para avaliar a proficincia em lngua

    estrangeira em escolas e universidades americanas.

    Desde a popularizao da entrevista oral, no entanto, muito se tem criticado o

    seu mtodo de avaliao. O primeiro problema apontado no uso das entrevistas orais

    como medidoras de proficincia oral comunicativa que uma entrevista em muito

    pouco se assemelha com um evento comunicativo real, possvel de ocorrer em situaes

    naturais de interao.

    Silverman (1976, apud Ross and Berwick, 1992) define entrevista como um

    encontro marcado entre participantes desiguais, no qual um desses participantes (o

    avaliador) assume o direito de fazer as perguntas e de organizar o tpico e a conversa. A

    entrevista oral, enquanto parte de um teste de proficincia, vista como um mtodo

    apropriado para determinar a habilidade de um indivduo para trocar informaes

    atravs de comportamento conversacional, que inclui, por exemplo, o exerccio de

    direitos recprocos para negociar significados e manter a responsabilidade pela

    explorao dos tpicos em uma conversa. A alocao do controle nas mos do

    avaliador, no entanto, distingue claramente as entrevistas dos processos

    conversacionais. Segundo Ross and Berwick (1992), esse controle assimtrico da

    interao constitui um problema para a validade do procedimento de entrevista oral.

    Um outro elemento que separa as entrevistas de proficincia das conversas

    naturais, segundo Ross and Berwick (1992), o fato de muitas das perguntas em uma

    entrevista serem planejadas para elicitar apenas amostras de conhecimento, competncia

    e informao lingstica possudas pelo entrevistado. Para Clark and Clifford (1988),

    uma entrevista bem conduzida, mesmo parecendo na superfcie ser uma conversa

    informal sobre uma variedade de tpicos, ao mesmo tempo uma tentativa

    cuidadosamente estruturada para determinar a habilidade ou falta de habilidade docandidato em cumprir as tarefas de uso da lngua de acordo com cada um dos nveis da

    escala de avaliao. Segundo Van Lier (1989), as regras que regem a entrevista de

    proficincia oral freqentemente enfatizam a necessidade de o entrevistador prestar

    ateno lngua usada pelo candidato ao invs de prestar ateno na informao que

    est sendo expressa (afinal, a lngua, e no o contedo da conversa, que est sendo

    avaliada). Ao contrrio das situaes naturais de uso da lngua, em que as perguntas e

    respostas em uma conversa giram em torno do contedo, na entrevista de proficincia

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    com a forma que os avaliadores esto mais preocupados, porque ela que levada em

    conta na hora de atribuir uma determinada certificao ao candidato.

    Outro grande problema das entrevistas de proficincia oral que elas buscam

    medir a proficincia dos candidatos com base no que seria feito por um falante

    proficiente em situaes reais de comunicao. Segundo Lantolf and Frawley (1985,

    1988, apud Ross and Berwick, 1992), as grades de proficincia existentes no esto

    ligadas a nenhuma observao ou descrio de como se d a comunicao natural, mas

    so listas de caractersticas que, presumivelmente, deveriam representar um falante

    proficiente. O problema, segundo os autores, que esse falante proficiente ideal ainda

    no foi definido, e que pouco se sabe sobre como os falantes, nativos ou no,

    relacionam a estrutura lingstica s funes da linguagem e como as colocam em uso

    nas situaes de comunicao que enfrentam no dia-a-dia.

    Para Lantolf & Frawley (1988), o grande entrave da validade das entrevistas de

    proficincia oral que os indivduos reais foram deixados de lado. Essas entrevistas so

    baseadas em escalas de proficincia construdas arbitrariamente, sem estudos de

    observao da realidade. Isso bastante problemtico porque, segundo os autores, para

    uma real investigao do que seja proficincia, necessrio que o principal foco de

    ateno sejam indivduos reais, em ao no seu mundo. Pienemann and Johnston (1987,

    apud Van Lier, 1989) reforam essa posio quando dizem que a falta de estudos

    descritivos sobre o que seja proficincia acaba nos levando a pensar que a proficincia

    oral consiste dos aspectos de competncia comunicativa que so exibidos e avaliados

    nas entrevistas de proficincia oral, j que esses so praticamente os nicos aspectos da

    proficincia descritos at hoje.

    Muitos estudiosos apontam, ainda, o fato de a entrevista oral no ser

    representativa da proficincia oral necessria a um falante proficiente. Shohamy, Reves

    and Bejerano (1986, apud Shohamy, 1988), por exemplo, questionam o fato de aentrevista oral s apresentar um tipo de situao de uso da linguagem, a entrevista, no

    sendo representativa de outros tipos de interao com os quais o candidato certamente

    vai se deparar no dia-a-dia, como a narrao, a conversa, a exposio oral, entre outros.

    Esses questionamentos levaram vrios tericos (ver Shohamy 1988, Bachman 1990,

    Lantolf and Frawley, 1988) a concluir que a entrevista oral, sozinha, tem muitas

    restries para ser considerada um instrumento vlido de medio da habilidade oral, e

    que outras interaes orais so necessrias para, junto com a entrevista, poder formarum teste oral vlido.

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    As questes aqui expostas so altamente relevantes para a continuidade das

    pesquisas na rea da avaliao de proficincia oral em lngua estrangeira. Sabemos da

    necessidade de estudos nessa rea que descrevam as caractersticas da proficincia oral

    e que venham a contribuir para a melhoria dos mtodos de avaliao. Tambm

    acreditamos que a anlise mais detalhada das avaliaes de proficincia oral em testes

    de desempenho, como o Celpe-Bras, possam colaborar para essa discusso.

    Outra questo problemtica levantada pelos pesquisadores em relao

    entrevista de proficincia oral diz respeito subjetividade da avaliao. Ao contrrio

    dos antigos testes discretos, na entrevista oral, por representar uma interao entre duas

    pessoas, impossvel fugir de uma avaliao subjetiva. Segundo Shohamy (1988), a

    entrevista oral depende muito da relao que se estabelece entre o avaliador e o

    candidato, as suas personalidades, o propsito da interao, o tpico e o contexto, entre

    outras variveis, e isso faz com que a avaliao se torne complexa e difcil de controlar

    (ver Shohamy, 1988, e McNamara, 1996).

    Segundo McNamara (1996), a avaliao nos testes de desempenho (como a

    entrevista oral, por exemplo) necessariamente envolve julgamentos subjetivos. Segundo

    o autor, isso apropriado: a avaliao de qualquer desempenho humano complexo

    muito dificilmente pode ser feita automaticamente. Julgamentos que envolvem

    subjetividade vo inevitavelmente ser complexos e envolver atos de interpretao por

    parte do avaliador, e ento estar sujeitos discordncia. Para identificar e quantificar a

    extenso de discordncia entre os avaliadores, e para reduzi-la a nveis aceitveis, o

    autor prope trs procedimentos importantes a serem tomados quando do processo de

    avaliao (McNamara 1996:117):

    1- o uso de descries de desempenho (grades de avaliao) cuidadosamente

    formuladas para cada nvel de avaliao possvel, incluindo exemplos

    ilustrativos das caractersticas do desempenho em cada nvel;2- treinamento cuidadoso dos avaliadores no uso dos procedimentos de avaliao;

    3- avaliao de cada candidato mais de uma vez e adoo de procedimentos para

    lidar com a discrepncia que possa surgir.

    Essa necessidade de reduzir a subjetividade da avaliao nos testes que avaliam

    desempenho, como a entrevista oral, afeta diretamente, como j vimos, as escalas de

    avaliao. Quanto mais precisos e restritos forem os descritores dessas escalas, mais

    uniforme e pontual ser a avaliao, aumentando assim, conseqentemente, aconfiabilidade do exame. Por essa razo, existe uma preocupao dos estudiosos que

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    desenvolvem as escalas de avaliao de descrever e refinar esses descritores, de maneira

    a qualificar o trabalho dos avaliadores e uniformizar a avaliao. Esta , tambm, a

    razo deste trabalho.

    2.8- Escalas de avaliao de desempenho

    Para Turner and Upshur (2002), entre as mudanas mais promissoras na

    avaliao em segunda lngua nos ltimos 20 anos est o crescimento do uso de testes

    que apresentam tarefas que requerem que os candidatos realmente produzam lngua

    escrita ou falada. Em contraste com os testes discretos de segunda lngua, que requerem

    que os candidatos respondam a perguntas escolhendo entre vrias alternativas, os testes

    comunicativos, em que os candidatos precisam produzir lngua, oferecem a promessa de

    uma descrio mais completa e complexa da habilidade do candidato para usar a lngua.

    Mas o cumprimento dessa promessa depende largamente da qualidade do procedimento

    utilizado para avaliar as respostas dos candidatos, isto , da escala de avaliao.

    McNamara (1996:32) considera muito importante a determinao dos critrios

    segundo os quais a avaliao do exame ser feita. Segundo Clark (1972:128, apud

    McNamara, 1996:32), a base conceitual da avaliao de proficincia oral no (ou no

    somente) o procedimento de exigir demonstraes da proficincia do candidato, a

    entrevista em si, mas so os critrios de desempenho nas escalas de avaliao atravs

    das quais o desempenho julgado. Para o autor, a viso que o teste tem de lngua e

    proficincia lingstica est, inevitavelmente, descrita na escala de avaliao utilizada.

    Dessa forma, segundo McNamara (1996:32), ainda que os exames no faam referncia

    explcita a nenhuma teoria, a posio terica fica implcita nos critrios pelos quais os

    avaliadores fazem os seus julgamentos.

    As escalas de avaliao dos testes comunicativos so esquemas de pontuao

    que incluem descries dos diferentes nveis de lngua em um continuum, normalmenteda falta de conhecimento at o nvel mais alto de conhecimento. O processo de

    avaliao da qualidade das amostras lingsticas obtidas envolve combin-las com as

    descries da escala e definir um grau para o candidato de acordo com essa escala.

    Para Kunnan (1999), a primeira preocupao de um exame deve ser se a sua

    grade de avaliao tem igual validade para diferentes candidatos ou grupos de

    candidatos definidos por caractersticas como idade, gnero, raa/etnia, lngua e cultura.

    Em outras palavras, a preocupao primeira deve ser a clarificao dos instrumentos deavaliao. Essa clarificao dos instrumentos de avaliao pode ser entendida como

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    uma descrio mais fina do desempenho esperado pelos candidatos em cada nvel de

    proficincia certificado, e tambm por exemplos de cada nvel de proficincia que

    possam ser usados em treinamentos para os avaliadores. Quanto mais finos e mais bem

    descritos forem os descritores da escala de avaliao, menor a probabilidade de os

    avaliadores enfrentarem dificuldades na avaliao do desempenho do candidato.

    Clarificando os instrumentos de avaliao estamos, assim, aumentando a confiabilidade

    do exame.

    Segundo Turner (1998), a validao (descrio dos parmetros) das grades de

    avaliao dos testes de proficincia , em geral, dada somente depois de aplicado o

    exame. Para a autora, um dos maiores problemas dessas grades a falta de base

    emprica para os descritores. Fulcher (1996, apud Turner, 1998) props uma abordagem

    para o desenvolvimento da escala de avaliao que seria a priori baseada

    empiricamente. Dos resultados da sua pesquisa, ele concluiu que as escalas baseadas

    empiricamente poderiam ser mais especficas e informativas para o examinador, pois

    permitiriam uma uniformidade maior aos exames do que as grades baseadas somente na

    opinio dos especialistas ou na teoria. Fulcher (1996:228, apud Turner, 1998) diz que

    at que os pesquisadores estudem seriamente a validao das grades de avaliao dos

    testes, o problema da indeterminao e da ininterpretabilidade dessas grades vai

    permanecer. no sentido de auxiliar na melhor descrio e refinamento da grade de

    avaliao do exame Celpe-Bras que se justifica o presente estudo.

    Neste captulo, apresentamos um histrico das teorias que guiaram o

    desenvolvimento dos testes de proficincia em lngua estrangeira, do perodo chamado

    por Spolsky (1995) de pr-cientfico at as avaliaes comunicativas, como o caso do

    exame Celpe-Bras. A seguir, apresentaremos um breve histrico do exame, suas

    caractersticas, e discutiremos a influncia que a proximidade entre as lnguasportuguesa e espanhola pode ter para a avaliao.

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    3- O EXAME CELPE-BRAS

    3.1-Origens

    O exame para obteno do Celpe-Bras (Certificado de Proficincia em Lngua

    Portuguesa para Estrangeiros), que comeou a ser elaborado a partir da constituio da

    Comisso Permanente para a Elaborao do Exame de Proficincia de Portugus para

    Estrangeirospela Secretaria de Ensino Superior (SESu), do Ministrio da Educao do

    Brasil, em junho de 1993, era h muito tempo uma necessidade e um desejo antigo dos

    profissionais da rea de Portugus para estrangeiros. Segundo Schlatter (1999), era

    necessrio um exame que servisse como referncia de proficincia tanto para

    professores de portugus/lngua estrangeira como para estrangeiros que quisessem ou

    necessitassem comprovar seu conhecimento da lngua.

    A necessidade da realizao de um exame de proficincia em Portugus do

    Brasil aumentou ainda mais em razo do crescimento do nmero de intercmbios

    econmicos, culturais e cientficos do Brasil com outros pases, especialmente depois da

    criao do Mercosul, e da crescente procura por cursos de graduao e ps-graduao

    no pas, para os quais a comprovao do domnio da lngua portuguesa fundamental.

    Esse exame, que passou pelas fases de elaborao e testagem nos anos de 1993 e

    1994, e j aplicado sistematicamente desde 1998, comeou a ser exigido pelo MEC e

    pela CAPES, a partir do ano 2000, como requisito bsico para o ingresso de alunos

    estrangeiros no programa Estudante-Convnio de Graduao (PEC-G) e de Ps-

    Graduao (PEC-PG)3em Instituies de Ensino Superior do pas. Hoje o Celpe-Bras

    tambm j exigido por rgos e conselhos de classe, como o Conselho Federal de

    Medicina, para reconhecimento do diploma de indivduos estrangeiros que cursaram a

    graduao fora do pas.

    Segundo Davies (1977:46, apud McNamara 1996:28), proficincia em umalngua implica controle adequado das habilidades lingsticas para um propsito

    extralingstico. Para o autor, um exame de proficincia deve avaliar a adequao em

    segunda lngua tendo em vista as possibilidades que o candidato tem de fazer outras

    3 O PEC-G (Programa de Estudante-Convnio de Graduao) e PEC-PG (Programa de Estudante-Convnio de Ps-Graduao) so atividades de cooperao entre o Brasil e outros pases emdesenvolvimento, cujo objetivo a formao de recursos humanos, a fim de possibilitar aos cidadosdesses pases com os quais o Brasil mantm acordos educacionais ou culturais realizarem estudos

    universitrios no pas, em nvel de graduao ou de ps-graduao, nas Instituies de Ensino Superior(IES) brasileiras participantes do PEC-G e do PEC-PG. Para mais informaes sobre os programas, verhttp://www.mec.gov.br/sesu/convgrad.shtm(acessado em 16-08-2003).

    http://www.mec.gov.br/sesu/convgrad.shtmhttp://www.mec.gov.br/sesu/convgrad.shtm
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    coisas por meio dessa lngua. O Manual do Candidato do Celpe-Bras (Schlatter et ali,

    2003:3) define exame de proficincia como aquele que tem objetivos de avaliao e

    contedo definidos com base nas necessidades de uso da lngua-alvo. No caso do

    Celpe-Bras, essas necessidades incluem as habilidades necessrias para realizar estudos

    ou desempenhar funes de trabalho no Brasil ou no exterior, quando o uso do

    portugus se fizer necessrio.

    O Celpe-Bras se props, desde o seu incio, a ser um exame de proficincia com

    base comunicativa. Para Scaramucci (1995), uma avaliao comunicativa aquela

    centrada no desenvolvimento de uma habilidade de expresso ou de uma competncia

    de uso. Ela o uso de um cdigo em situaes reais de comunicao, que requer muito

    mais do que a manipulao de formas e de regras lingsticas, mas o conhecimento

    tambm de regras de comunicao, de forma que sejam no apenas gramaticalmente

    corretas, mas socialmente adequadas.

    Segundo Scaramucci (1999a), as principais caractersticas do exame Celpe-Bras

    so a nfase na comunicao/interao e a utilizao de contedos autnticos ou

    contextualizados. Para McNamara (1996), a caracterstica definidora de um teste de

    proficincia nesses moldes que o aprendiz precisa demonstrar no somente

    conhecimento da lngua, mas habilidade no uso desse conhecimento em cenrios que

    sejam de alguma maneira comunicativos. Um teste assim pode requerer uma

    demonstrao de conhecimento, mas vai demandar tambm demonstrao de habilidade

    no desempenho.

    Como vimos anteriormente, uma pessoa que possui conhecimentos tericos

    sobre a lngua mas que ainda no aprendeu a aplicar em usos prticos seus

    conhecimentos provavelmente no ser bem sucedida em um teste comunicativo. Sendo

    a comunicao o foco central do Celpe-Bras, um candidato que domine a gramtica da

    lngua, mas que no seja capaz de colocar em prtica, em situaes reais decomunicao, o seu conhecimento, no considerado apto para ser aprovado no exame.

    Por ser um exame de natureza comunicativa, ao Celpe-Bras interessa a capacidade do

    candidato de interagir na lngua e o uso de regras e funes gramaticais

    contextualizadamente adequadas para as diversas situaes de uso da linguagem.

    Segundo McNamara (1996:43), um exame dessa natureza no um teste

    estritamente lingstico. As tarefas do mundo real requerem essa capacidade de interagir

    na e com a lngua, e de grande ajuda que os testes de proficincia investiguem asprticas de avaliao natural no dia-a-dia e na vida profissional.

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    3.2- Formato do Exame

    O exame Celpe-Bras composto de duas partes: uma coletiva, com durao de

    aproximadamente duas horas, e outra individual, que dura cerca de 20 minutos. Na parte

    coletiva, os candidatos respondem por escrito a quatro diferentes tarefas a partir da

    compreenso de textos escritos, de um trecho de vdeo e de uma gravao em udio. A

    parte individual consiste de uma conversa, com durao de cerca de 20 minutos, e

    avaliada pelo aplicador e por um observador, por meio de uma grade de avaliao que

    inclui os seguintes aspectos (ver Schlatter et ali, 2003:17 Manual do Candidato):

    Compreenso

    - Compreenso do fluxo natural da conversao.

    Produo- Recursos interacionais e estratgicos: contribuio para o desenvolvimento da

    conversa, flexibilidade na mudana de tpico, uso de estratgias comunicativas,

    adequao ao interlocutor.

    - Fluncia: manuteno do fluxo da conversa.

    - Pronncia: adequao na pronncia, ritmo e entoao.- Gramtica: variedade e adequao no uso de estruturas lingsticas.

    - Lxico: extenso e adequao no uso do vocabulrio.

    O exame, na poca da coleta dos dados analisados no presente trabalho,

    concedia dois nveis de certificao4: Certificado Intermedirio, que corresponde

    competncia parcial na lngua, e Certificado Avanado, que corresponde competncia

    4 A partir da aplicao de abril de 2003, o exame passou a certificar quatro nveis de proficincia,descritos a seguir (folder do Celpe-Bras verso 2003):

    Certificado Intermedirio: conferido ao candidato que evidencia um domnio operacional parcialda lngua portuguesa, demonstrando compreenso e produo de textos orais e escritos, especialmente emcontextos conhecidos, podendo apresentar algumas imprecises, inadequaes e interferncias nacomunicao.

    Certificado Intermedirio Superior: conferido ao candidato que preenche as caractersticasdescritas no nvel Intermedirio, apresentando inadequaes e interferncias na pronncia e na escritamenos freqentes do que no nvel anterior.

    Certificado Avanado: conferido ao candidato que evidencia um domnio operacional amplo dalngua portuguesa, demonstrando compreenso e produo fluente de textos orais e escritos, podendoapresentar inadequaes ocasionais na comunicao, especialmente em contextos desconhecidos.

    Certificado Avanado Superior: conferido ao candidato que preenche todos os requisitos do nvelAvanado, apresentando raras inadequaes na comunicao.

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    ampla, como descrito a seguir5. O desempenho do candidato avaliado de forma global,

    a partir de um desempenho integrado em todas as tarefas do exame. A obteno de um

    ou de outro certificado est condicionada a esse desempenho global do candidato no

    exame, o que pressupe um equilbrio no desenvolvimento das tarefas.

    Segundo Schlatter et ali (2003:6), o desempenho do candidato corresponde,

    respectivamente, ao seguinte perfil para cada nvel:

    - Certificado Intermedirio: conferido ao candidato que evidencia um domnio

    operacional parcial da lngua portuguesa, demonstrando ser capaz de

    compreender e produzir textos orais e escritos sobre assuntos limitados, em

    contextos conhecidos e situaes do cotidiano; trata-se de algum que usa

    estruturas simples da lngua e vocabulrio adequado a contextos conhecidos,

    podendo apresentar inadequaes e interferncias da lngua materna e/ou de

    outra(s) lngua(s) estrangeira(s) mais freqentes em situaes desconhecidas.

    - Certificado Avanado: conferido ao candidato que evidencia domnio

    operacional amplo da lngua portuguesa, demonstrando ser capaz de

    compreender e produzir textos orais e escritos, de forma fluente, sobre assuntos

    variados, em contextos conhecidos e desconhecidos. Trata-se de algum,

    portanto, que usa estruturas complexas da lngua e vocabulrio adequado,

    podendo apresentar inadequaes ocasionais na comunicao, especialmente em

    contextos desconhecidos. O candidato que obtm este certificado tem condies

    de interagir com desenvoltura nas mais variadas situaes que exigem domnio

    da lngua-alvo.6

    Partindo do princpio de que um exame comunicativo, a avaliao no exame

    Celpe-Bras deve refletir o uso da lngua em situaes reais de comunicao. O exame

    testa, portanto, a capacidade de compreender e de produzir a lngua de forma adequada

    em situaes cotidianas. Para tal fim, a grade de avaliao expressa em descritores decompetncia e desempenho do candidato, hierarquizados por uma pontuao, segundo

    os objetivos comunicativos a serem atingidos em cada tarefa. Segundo Schlatter et ali

    (2003:5) a tarefa um convite para agir no mundo, um convite para o uso da

    linguagem com um propsito social. Em outras palavras, uma tarefa envolve

    basicamente uma ao, com um propsito, direcionada a um ou mais interlocutores.

    5Abaixo da competncia parcial no h certificao, embora a comisso elaboradora do exame esteja

    pensando, atualmente, na atribuio de um Certificado Bsico, ainda em estudo.6Os certificados Intermedirio e Avanado mantiveram a mesma descrio aps a ampliao dos nveisde certificao.

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    Ainda segundo Schlatter et ali (2003:5), em cada tarefa h sempre um propsito

    claro de comunicao e um interlocutor, de forma que o candidato possa adequar seu

    texto situao de comunicao. Na correo, esses aspectos so importantes para se

    julgar a adequao da resposta do candidato. Segundo Cunha e Santos (1999), a

    avaliao dos conjuntos de tarefas feita por meio de procedimentos qualitativos e

    holsticos, sendo expressa por descritores de competncia e desempenho (por exemplo,

    o examinando reconhece o ponto de vista do autor expresso explcita e implicitamente

    ou reconhece o ponto de vista do autor expresso explicitamente, tem dificuldade

    quando esse ponto de vista expresso implicitamente).

    Como vimos anteriormente, todos os testes de desempenho como o Celpe-Bras

    caracterizam-se pela subjetividade presente na avaliao. Tambm j foi discutida a

    importncia de se tomarem alguns cuidados para controlar os efeitos dessa subjetividade

    na avaliao dos candidatos, de maneira a garantir que o resultado do exame possa ser

    considerado confivel e vlido. Para que a subjetividade no extrapole os nveis

    aceitveis, no Celpe-Bras as condies de aplicao do exame so padronizadas (todas

    as instituies aplicadoras necessitam de infra-estrutura mnima para a aplicao, e

    seguem as mesmas instrues quando da aplicao do exame). Os aplicadores do

    exame, tanto da parte coletiva quanto da parte individual (entrevista oral), bem como os

    corretores do exame, so em sua maioria professores qualificados e com experincia no

    ensino de Portugus para estrangeiros, e passam por treinamento. A avaliao do

    exame, tanto da parte oral como da parte escrita, feita sempre por dois avaliadores, e

    as grades de avaliao passam por um processo de elaborao e testagem antes de serem

    aplicadas.

    Por ser um teste discursivo e necessitar avaliao individual de cada tarefa, o

    Celpe-Bras, assim como os demais testes de desempenho, pode ser considerado pouco

    prtico, j que demanda aplicadores e corretores especializados e requer mais tempo doque os testes objetivos, que podem ser corrigidos por mquinas. Apesar de exigir uma

    avaliao mais demorada, os testes de desempenho possibilitam uma melhor descrio

    das habilidades do candidato do que os testes objetivos, porque se propem a avaliar o

    desempenho do candidato em situaes similares s que ele poderia encontrar no mundo

    real. Para aumentar a validade e a praticidade do exame necessrio que as escalas de

    avaliao estejam bem descritas, dando ao avaliador condies de definir de maneira

    clara o nvel de proficincia dos candidatos.

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    Por ser um exame muito recente, ainda no h estudos que descrevam os nveis

    de proficincia oral do Celpe-Bras e proponham refinamentos na sua grade de

    avaliao. Existe j um estudo feito sobre o desempenho dos candidatos nas tarefas de

    compreenso e produo textual no exame, e que prope refinamentos para a grade de

    avaliao da parte escrita. Esse estudo, desenvolvido por Sidi (2002), buscou descrever

    de forma mais detalhada o desempenho em leitura e escrita dos candidatos falantes de

    espanhol. Aps definir as inadequaes mais recorrentes aos critrios da grade de

    avaliao do exame e realizar uma anlise qualitativa, o estudo apontou os aspectos

    salientes para caracterizar cada um dos nveis de certificao, e props ajustes nos

    descritores das grades de avaliao. Os resultados desse estudo demonstraram

    consistncia com a proposta de avaliao do exame, uma vez que apresentaram o

    cumprimento da tarefa de forma satisfatria como caracterstica do Certificado

    Avanado, de forma parcial como caracterstica do Certificado Intermedirio e de forma

    insatisfatria como caracterstica da no certificao.

    Estudos como o relatado acima (e tambm como o presente trabalho) tornam-se

    ainda mais relevantes em se tratando de descrever a proficincia dos candidatos falantes

    de espanhol (em torno de 70% dos candidatos ao exame, como j mencionado

    anteriormente). Os falantes de espanhol, devido proximidade das duas lnguas,

    costumam cumprir com xito as tarefas propostas, porm muitas vezes o fazem com

    problemas de pronncia, sintaxe e adequao lexical, entre outros, devido

    transferncia de elementos do espanhol para o portugus. Uma descrio mais detalhada

    dos nveis de proficincia considerados no exame poder auxiliar os examinadores a

    avaliar os candidatos falantes de espanhol.

    A seguir, discutiremos o importante papel da proximidade entre as lnguas

    portuguesa e espanhola na avaliao de proficincia.

    3.3- Proximidade entre as Lnguas Portuguesa e Espanhola

    Dentre as lnguas romnicas, o portugus e o espanhol so as que mantm maior

    afinidade entre si. Segundo Almeida Filho (1995), a condio de serem lnguas assim

    to prximas encapsula uma subjacente proximidade tipolgica das duas lnguas. A

    ordem cannica da orao nas duas lnguas altamente coincidente, a fonte maior do

    lxico basicamente a mesma e as bases culturais onde se assentam so em larga

    medida compartilhadas. Ulsh (1971) estabelece, por exemplo, que mais de 85% dovocabulrio portugus tem cognatos em espanhol.

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    Devido proximidade das duas lnguas, os falantes de espanhol tm amplas

    vantagens na aquisio do portugus em comparao com falantes de outras lnguas,

    uma vez que eles j trazem consigo conhecimentos e habilidades que so comuns s

    duas lnguas. De acordo com Almeida Filho (1995), o elevado grau de

    compreensibilidade da lngua-alvo permite ao falante de espanhol mais segurana e

    maior capacidade de risco.

    Mas se a semelhana entre as lnguas um elemento favorvel aquisio, a

    proximidade entre elas tambm pode causar problemas. Segundo Ferreira (1997), a

    proximidade entre o Portugus e o Espanhol faz com que os falantes percebam mais as

    semelhanas do que as diferenas entre as duas lnguas. Dessa forma, muitos falantes de

    espanhol, ao achar que esto falando portugus, acabam falando portunhol, termo que

    usado para designar a produo de um falante de espanhol ou de portugus tentando

    falar a outra lngua.

    Colin Rodea (1990, apud Ferreira, 1995) define o portunhol como a expresso

    mais imediata do contato entre as lnguas portuguesa e espanhola, que pode ser

    observado como um estgio de interlngua muitas vezes com nveis de fossilizao

    bastante acentuados. Selinker (1992, apud Villalba, 2002:27) entende fossilizao como

    a manuteno de certas estruturas lingsticas da L1 que pareciam ter sido erradicadas,

    independentemente da idade do aluno e da quantidade de prtica que tenha realizado. A

    produo de aspectos fonolgicos segmentais (por exemplo, a nasalizao, a distino

    entre fonemas voclicos abertos e fechados, o ensurdecimento de consoantes sonoras

    fricativas intervoclicas) e de aspectos fonolgicos suprasegmentais (por exemplo,

    portugus como lngua de ritmo acentual, espanhol como lngua de ritmo silbico) so,

    segundo Colin Rodea (1990), alguns exemplos de transferncia evidenciados na fala de

    aprendizes de portugus que tm o espanhol como lngua materna.

    Segundo Odlin (1989), transferncia lingstica a influncia resultante dassimilaridades e diferenas entre a lngua-alvo e qualquer outra lngua que j tenha sido

    previamente adquirida (Odlin, 1989:27). Entre o portugus e o espanhol, j que essas

    similaridades so muitas, a transferncia acaba por se mostrar uma constante no

    desenvolvimento dos aprendizes. Para Villalba (2002), a semelhana lexical e a

    percepo dessa semelhana entre as duas lnguas que favorece a ocorrncia de

    transferncia. Tambm segundo a autora, a falta de percepo de que o lxico das duas

    lnguas diferente favorece a ocorrncia de fossilizao.

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    Por ser um exame recente, como j foi dito acima, o Celpe-Bras ainda no

    possui estudos que descrevam seus nveis de proficincia. Essa lacuna fica ainda mais

    evidente quando os examinadores se deparam com candidatos que provm de uma

    lngua materna em vrios aspectos to parecida com o portugus. Os candidatos falantes

    de espanhol, como j foi citado, normalmente no costumam ter problemas de

    compreenso quanto s tarefas do exame, e as realizam sem maiores dificuldades.

    Contudo, nem sempre esses candidatos realizam as tarefas em lngua portuguesa.

    Muitas vezes, ao pensar que est falando portugus, o candidato expressa-se em

    portunhol ou mesmo em espanhol. Esse comportamento pode criar dificuldades para o

    entrevistador porque os candidatos falantes de espanhol costumam ser fluentes e, muitas

    vezes, so compreendidos pelos entrevistadores mesmo que apresentem muita

    interferncia da sua lngua materna. Como os descritores da grade de avaliao

    especificam interferncia da lngua materna em nveis ainda muito amplos, como

    rara, alguma e muita, a avaliao do candidato depender da interpretao que

    cada avaliador far desses descritores.

    O exame Celpe-Bras portanto, tambm, ainda carente de descries mais

    refinadas das suas grades de avaliao. Partindo dessa necessidade de descrever melhor

    as grades de avaliao da entrevista oral do exame, este estudo pretende fazer uma

    anlise das produes orais de candidatos que obtiveram o Certificado Avanado, o

    Certificado Intermedirio e de candidatos que no receberam certificao no exame

    Celpe-Bras, para descrever as caractersticas da proficincia desses candidatos e propor,

    baseado nessa descrio, refinamentos nos descritores presentes na grade de avaliao,

    de maneira a auxiliar o avaliador na hora de tomar a deciso sobre qual certificao

    deve ser concedida ao candidato.

    Neste captulo, apresentamos o exame Celpe-Bras, falando um pouco da sua

    histria e dos nveis de proficincia por ele certificados. Tratamos tambm daimportncia da proximidade entre as lnguas portuguesa e espanhola para a avaliao da

    proficincia. No captulo que segue, descreveremos a metodologia utilizada para a

    anlise dos dados, discutindo as categorias selecionadas, e mostraremos os

    procedimentos adotados para descrever a proficincia dos candidatos nos trs nveis

    certificados pelo exame Celpe-Bras.

    4- METODOLOGIA

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    4.1- Percurso da pesquisa

    Este trabalho iniciou com uma anlise de trs entrevistas de cada um dos nveis

    certificados pelo exame Celpe-Bras (avanado e intermedirio), e tambm de trs

    entrevistas de candidatos que no obtiveram certificao com base em dados gerados na

    aplicao de 1998. Aps o refinamento das transcries j existentes, passou-se a uma

    anlise preliminar dos dados, que evidenciou uma srie de restries quanto ao uso

    dessas entrevistas, principalmente relativas mudanas na Parte Individual do exame,

    ocorridas nas aplicaes seguintes coleta dos dados.

    Foram enfrentados ainda outros percalos metodolgicos decorrentes da

    antigidade dos dados. Uma das fitas que continha parte dos dados havia sido

    extraviada, e em algumas outras a gravao no estava boa. Tambm tentamos ampliar

    a amostra, mas no existiam mais fitas disponveis de um dos nveis de certificao.

    Todos esses problemas, somados vontade de tornar o trabalho mais atualizado e

    possvel de ajudar na descrio refinada dos nveis de certificao atuais, bem como no

    refinamento da grade de avaliao oral do exame, fizeram com que preferssemos optar

    pela troca dos dados a serem analisados, mesmo que isso significasse reiniciar o

    trabalho de seleo e transcrio das entrevistas.

    Pelas razes acima expostas, acabamos por selecionar novos dados, gerados na

    aplicao do exame Celpe-Bras de outubro de 2002. A princpio, pensamos em ampliar

    a nossa amostra, abarcando mais entrevistas de cada nvel, para que pudssemos propor

    ajustes na grade de avaliao com uma base de sustentao maior. Foram ouvidas, no

    total, cerca de dez fitas de cada nvel, sendo que muitas no puderam ser aproveitadas,

    seja por problemas tcnicos (gravao ruim, o que inviabilizava a anlise), seja por

    falhas do avaliador (o gravador era desligado e religado durante a entrevista, fazendo

    com que no tivssemos acesso ntegra da interao ocorrida). Foram transcritas seis

    entrevistas de candidatos avanados, seis entrevistas de candidatos intermedirios equatro entrevistas de candidatos sem certificao. Optou-se, finalmente, por limitar a

    amostra analisada para quatro entrevistas de cada nvel, julgando-se que essa amostra

    ilustrava exemplares tpicos da Parte Individual do exame Celpe-Bras.

    4.2- Objetivos

    Este estudo visa a fazer uma descrio detalhada das caractersticas da fala doscandidatos falantes de espanhol no exame Celpe-Bras, apontando as caractersticas da

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    sua proficincia. Tambm objetivo deste trabalho saber de que maneira a grade de

    avaliao do exame, atravs dos seus descritores, contempla tais caractersticas, e

    verificar que refinamentos poderiam ser feitos nesses descritores para que a grade se

    tornasse mais objetiva, dando mais subsdios para o examinador avaliar a proficincia

    oral dos candidatos falantes de espanhol. Por fim, pretendemos tambm elaborar uma

    sugesto de grade descritiva para cada um dos nveis de certificao, baseada nas

    entrevistas analisadas.

    4.3- A entrevista oral do exame Celpe-Bras

    Segundo o Manual do Exame (Schlatter et ali, 2003:17), a entrevista oral do

    exame Celpe-Bras

    constitui-se de uma conversa, com durao de 20 minutos, entre candidato eentrevistador, sobre atividades e interesses do candidato, a partir dos tpicos queconstam no questionrio de inscrio (famlia, hobbies, profisso, dentre outros), esobre tpicos do cotidiano e de interesse geral (ecologia, educao, esportes, dentreoutros), com base em fotos, cartuns, quadrinhos, textos curtos, etc..

    A Parte Individual avaliada por dois aplicadores, um entrevistador e um

    observador, que para tanto se utilizam de uma grade de avaliao. O objetivo da

    entrevista avaliar a produo oral do candidato, que solicitado a conversar com o

    avaliador a respeito dos tpicos abordados. Os textos que servem como ponto de partida

    para a discusso dos tpicos so acompanhados de sugestes de perguntas para o

    avaliador desenvolver a discusso.

    4.4- Perfil da amostra selecionada

    Foram analisadas quatro entrevistas que obtiveram certificado avanado, quatro

    entrevistas que obtiveram certificado intermedirio e quatro entrevistas que no

    obtiveram certificao, o que totaliza doze entrevistas. A amostra analisada constitui-se

    de trs candidatos argentinos (Ana, Fbio e Paula), um candidato chileno (Fernando),

    trs candidatos equatorianos (Felipe, Joo e Jos) e cinco candidatos bolivianos (Joana,

    Andr, Marcelo, Antonio e Carla)7. Todas as entrevistas foram realizadas nos pases de

    origem dos candidatos entre os dias 22 e 23 de outubro de 2002. A idade dos candidatos

    varia de 22 a 35 anos, sendo que a mdia de idade de 26,5 anos. Dos doze candidatos

    analisados, oito so homens e quatro so mulheres. Todos os candidatos declararam

    possuir grau de instruo universitrio, sendo que trs so engenheiros, um socilogo,

    7Os nomes foram alterados para preservar a identidade dos candidatos.

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    um economista, trs so estudantes, um contador e trs so mdicos. Essa amostra

    foi escolhida considerando-se as condies tcnicas das gravaes e a observao das

    normas do exame por parte dos aplicadores. Todos os avaliadores do exame so

    professores de portugus e falantes nativos de portugus do Brasil.

    4.5- Transcries

    Foram transcritas, ao todo, dezesseis entrevistas realizadas na aplicao do

    exame de outubro de 2002, sendo que doze delas foram utilizadas para a anlise final.

    As entrevistas tm cerca de 20 minutos de durao, sendo que a mais curta tem 16

    minutos e 36 segundos de durao, e a mais longa tem 26 minutos e 13 segundos8.

    As transcries dos dados analisados foram feitas levando em conta critrios que

    acreditamos ser relevantes para a anlise e descrio dos dados. Dessa forma, foram

    consideradas as pausas ocorridas na interao, indicando-se se as pausas foram curtas

    ou mais longas, conforme simbologia expressa a seguir. Pausas de at um segundo

    foram consideradas pausas curtas, e pausas entre um e trs segundos, pausas longas. A

    partir de trs segundos, as pausas foram cronometradas, estando o tempo de durao

    entre parnteses. Incompreenses ou dvidas na compreenso de trechos de fala

    tambm foram marcadas, assim como os reparos e os prolongamentos de vogal. Outros

    critrios normalmente utilizados em transcries, como nfase em uma determinada

    slaba, por exemplo, no foram marcados por no terem sido julgados relevantes para

    esta anlise.

    A seguir, expomos a simbologia utilizada nas transcries:

    ( . ) indica pausa curta (menos de um segundo)

    ( ... ) indica pausa mais longa (entre um e trs segundos)

    (0.0) indica o tempo exato da pausa (para pausas maiores que trs segundos)

    ( ? ) indica que no foi possvel compreender o trecho

    8

    Est em curso na comisso de elaborao do Celpe-Bras uma avaliao da Parte Individual do exame,que tem como objetivo uniformizar os procedimentos da entrevista oral em todas as instituiesaplicadoras (entre os quais a observao do tempo estipulado para a Parte Individual).

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    36

    (palavra?) indica que a palavra ou trecho entre parnteses provavelmente o que foi

    dito, mas a compreenso difcil

    / indica que a palavra foi cortada, e que houve reparo na fala

    : indica alongamento da vogal precedente

    4.6- A grade de avaliao do exame

    Com base em uma primeira anlise dos dados, faremos a seguir uma

    problematizao das categorias de avaliao do exame, mostrando como elas so

    descritas na grade de avaliao vigente e quais, a partir de uma primeira anlise, so

    relevantes para o aplicador.

    Essa problematizao inicial das categorias da grade de avaliao tem como

    objetivo ressaltar os aspectos importantes presentes na grade e localizar possveis

    carncias ainda no contempladas pelas categorias e descritores atuais. Este

    mapeamento servir como base para a seleo das categorias utilizadas posteriormente

    em nossa anlise. Ressalva-se que a abrangncia do presente estudo limitada, uma vez

    que analisamos aqui somente entrevistas de candidatos falantes de espanhol. Estudos

    com amostras maiores de dados, que inclussem falantes de outras lnguas, seriam

    necessrios para diagnosticar a aplicabilidade ou no dos resultados aqui obtidos para a

    avaliao de falantes no hispanos.

    A grade de avaliao da parte oral do exame Celpe-Bras, apresentada abaixo9,

    est dividida em 6 grandes categorias, que se dividem depois em subcategorias. Essas

    seis categorias so: Competncia Interacional, Fluncia, Pronncia, Adequao

    Gramatical, Adequao Lexical e Compreenso.

    Certificado Avanado

    Competnciainteracional

    Fluncia Pronncia Adequaogramatical

    Adequaolexical

    Compreenso

    > Flexibilidade namudana de tpico.> Adequao da

    > Pausas ehesitaespara

    > Pronncia(sons, ritmo eentoao)

    > Uso de umavariedade ampla deestruturas na

    > Vocabulrioamplo eadequado para

    > Compreensodo fluxo naturalda

    9A partir da aplicao de abril de 2003 foram descritos dois novos nveis de certificao na grade deavaliao, Intermedirio Superior e Avanado Superior, j apresentados anteriormente. A descriodesses novos nveis visa a tornar mais precisa a avaliao e a certificao do exame, j que reduz a

    amplitude de cada um dos nveis. Como os dados aqui analisados foram gerados na aplicao de outubrode 2002, antes da descrio desses novos nveis, optamos por apresentar a grade antiga do exame, emvigor quando da seleo dos dados.

  • 8/12/2019 Tese Sobre Celpebras

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    conversa ao interlocutor,ao assunto e aocontexto.> Contribui para odesenvolvimento daconversa.> Usa estratgias(reformulaes,

    parfrases, correes)para resolver problemaslexicais, gramaticais e/oufonolgicos.

    organizao dopensamento e,eventualmente,para resolveralgum problemade construolingstica, seminterrupes no

    fluxo daconversao.

    adequada.>Sotaque/algumasinterfernciasda lnguamaterna.

    discusso de tpicosdo cotidiano e naexpresso de idiase opinies sobreassuntos variados.> Poucasinadequaes nautilizao de

    estruturas maiscomplexas e rarasinadequaes nouso de estruturasmais bsicas.

    discusso detpicos docotidiano eexpresso deidias eopinies sobreassuntosvariados

    conversao, >Raros pedidosde repetio edereestruturaoocorrem nocaso depalavras menos

    freqentes e /ouacelerao dafala.

    Certificado Intermedirio

    Competnciainteracional

    Fluncia Pronncia Adequaogramatical

    Adequaolexical

    Compreenso

    > Dificuldade em ajustar-

    se mudana de tpico.&g