quine, relatividade ontológica (pp. 133-140)

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    2. A RELATIVIDADE ONTOLOGICA

    IOuvi Dewey falar sobre Arte como Experiencia quando eu era estudante depos-graduacao, na primavera de 1931. Dewey estava entao em Harvard como 0primeiro Conferencista das Conferencias William James. Orgulho-me agora de

    estar em Columbia como 0 primeiro Conferencista das Conferencias John Dewey.Filosoficamente estou ligado a Dewey pelo naturalismo que dominou suastres iiltimas decadas. Com Dewey, eu sustento que conhecimento, mente e signi-ficado sao parte do mesmo mundo com que eles tern aver e que eles tern de serestudados com 0 mesmo espirito empfrico que anima a ciencia natural. Nao halugar algum para uma filosofia a priori.Quando urn filosofo naturalista se dirige a filosofia da mente, ele estapronto para falar de linguagem. Significados sao, em primeiro lugar e antes detudo, significados da linguagem. A linguagem e uma arte social que nos todosadquirimos, tendo como tinica evidencia a comportamento aberto de outras pes-soas em circunstancias ipublicamente reconheciveis. Os significados, portanto,esses verdadeiros modelos de entidades mentais, resultam em agua para 0moinhodo behaviorista. Dewey foi explicito sobre esse ponte: "0 significado. .. naoeuma existencia psiquica; e , primeiramente, uma propriedade do comportamento".'Uma vez apreciada a instituicao da linguagem nesses termos, vemos quenao pode haver, em nenhum sentido util,uma linguagem privada. Esse ponto foiacentuado por Dewey nos anos 20. "0 solil6quio", escreveu ele, " e 0 produto eo reflexo da conversa com os outros" (170). Mais adiante, ele expandiu 0 temadeste modo: "A linguagem e especificamente urn modo de interacao de, pelo me-nos, dois seres, urn-locutor e urn ouvinte;ela pressupoe urn grupo organizado aoqualessas criaturas pertencem e do qual elas adquiriram seus habitos de discurso.

    Ela e , portanto, urn parentesco" (185). Anos mais tarde, Wittgenstein rejeitou deigual modo a linguagem privada. Quando Dewey estava a escrever comessa veianaturalista, Wittgenstein ainda sustentava sua teoria da linguagem como c6pia.A teoria da copia, em suas varias form as, permanece mais proxima da prin-cipal tradicao filosofica e da atitude do senso comum de hoje. A semantica naocritica e a mito de urn museu no qual as coisas expostas sao significados e aspalavras sao etiquetas. Mudar as linguagens e mudar as etiquetas. Ora, a objecaoprimaria do naturalista a esse modo de ver nao e uma objecao a significados pelofato de eles serem entidades mentais, ainda que iS80 pudesse ser objecao suficiente.A objecao primaria persiste mesmo se tomarmos as coisas expostas etiquetadas,nao como ideias mentais, mas como ideias Platonicas, ou mesmo como os objetos. concretos denotados. A semanticae viciada por um mentalismo pernicioso en-I J. Dewey, Experience and Nature (La Salle, III, open Court, 19-15, 19:5&), p. 179.

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    134 QUINEquanta considerarmosa semantica de um homem como de algum modo determi-nada em sua mente alem do que poderia estar implicito em suas disposicoes a umcomportamento aberto.vxao os proprios fatos sobre significado, nao as entidadessignificadas, quedevem ser interpret ados em termos decomportamento.

    Ha duas partes no conhecimento de uma palavra. Uma parte e estar familia-rizado com 0 som dela e ser capaz de reproduzi-lo. Essa parte, a parte fonetica,se cumpre pela observacao e imitacao do comportamento de outras pessoas e naoha nenhuma ilusao importante acerca do processo. A outra parte, a parte seman-tica, e saber como usar a palavra. Essa parte, mesmo 110 caso paradigma, e maiscomplexa que a parte Ionetica. A palavra se refere, no caso paradigma, a algumobjeto visivel. 0 aprendiz tem agora nao somente de aprender a palavra foneti-camente, ouvindo-a de um outro locutor, ele tem tambem de ver 0 objeto; e, emacrescimo a isso, a fim de capturar a relevancia do objeto para a palavra, ele ternde ver que 0 locutortambem ve 0 objeto. Dewey resumiu assim esse ponto: "Ateoria caracteristica sobre a compreensao dos sons de A por Beque este respon-de acoisa do ponto de vista de A" (178). Cada um de nos, enquanto aprende sualinguagem e um estudioso do comportamento de seu vizinho; e, inversamente,na medida em que suas tentativas sao aprovadas ou corrigidas, e um sujeito doestudo comportamental feito pelo vizinho.A parte semantica do aprendizado de uma palavra e, portanto, mais com-plexa que a parte fonetica, mesmo nos casos simples: temos de vet 0 que estaestimulando 0 outro locutor. Nocaso de palavrasque nao atribuem diretamentetraces observaveis as coisas, 0 processo de aprendizado e, de modo crescente;:complexo e obscuro;e a obscuridade e 0 lugar de procriacao da semantica men-talista. Aquilo em que 0 nautralista insiste e que, mesmo nas partes complexase obscuras do aprendizado da linguagem, 0 aprendiz nao tem dado algum comque trabalhar a nao ser 0 comportamento aberto de outros Iocutores.Quando nos voltamos assim, com Dewey, para um modo naturalista dever a linguagem, aquilo a que renunciamos nao e somente a imagem do discursocomo museu. Renunciamos a uma garantia de determinacao, Vistas conformeao mito do museu, as palavras e sentencas de uma linguagem tern seus significa-dos determinados. Para descobrir os significados das pa1avras do nativo, podemoster de observar seu comportamento mas, ainda assim, supoe-se que os significadosdas palavras estao determinados na mente do nativo, em seu museu mental, mes-mo em casos nos quais criterios comportamentaissao impotentes para descobri-lospara nos. Quando, por ,9utro lado, reconhecemos com Dewey que."0 significa-. d o . . . e, primariamente, uma propriedade do comportamento", reeonhecemos quenao ha significado algum, nem semelhanca nem distincao de significado, alern dosqueestao implicitos nas disposicoes das pessoas ao comportamento aberto. Parao natura1ismo, a pergunta sobre se duas expressoes sao semelhantes ou desseme-lhantes quanta ao significado nao tem nenhuma resposta deterrninada, conhecidaou desconhecida, exceto na medida em que a respostae decidida em principiopelas disposicoes das pessoas ao discurso, conhecidas ou desconhecidas. Se, poresses padroes, ha casos indeterminados, tanto pior para a terminologia do signifi-cado e da semelhanca de significado.

    Para ver a que se asseme1haria uma tal indeterminacao, suponha-se que hou-vesse uma expressao numa linguagem remota que pudesse ser traduzidaem por-tugues, de modo igualmente defensavel, de duas maneiras distintas, dessemelhantesquanta ao significado em portugues. Nao estou fa1ando de ambigiiidade dentroda linguagem nativa. Estou supondo que urn mesmo uso nativo da expressao pos-sa receber uma ou outra das traducoes portuguesas, acomodando-se cadauma

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    RELA TIVIDADE ONTOL6GICA 135delas mediarite ajustamentos compensatorios na traducae de outras palavras. Su-ponha-se que ambas as traducoes, juntamente com essas acomodacoes em cadacaso, se acordem igualmente bern com todo comportamento observavel de partedos locutores da Iinguagemremota e dos Iocutores do portugues. Suponha-se queelas se acordem perteitamente nao so com 0 comportamento efetivamente obser-vado, mas com todas as disposicoes ao comportamento par parte de todos aslocutores a que concernem. Com essas hipoteses, seria para sempre impossivelsaber que uma dessas traducoes era a certa e. a outra, a errada. Ainda assim, seo mito do museu fosse verdadeiro, haveria urn certo e urn errado, nesse assunto;ocorre apenas que nunca saberiamos, por nao termos acesso ao museu. Conside-re-se a linguagem de urn modo naturalista, por outro lado, e se tera de ver a no-< : ; 8 . 0 de semelhanca de significado num tal caso simplesmente como urn absurdo.Estive atendo-me ao hipotetico, Voltando agora a exempIos, deixem-me co-mecar com urn que ISdesapontador e trabalhar a partir dele. Na construcao fran-cesa ne. " rien, pode-se traduzir rien em ingles a vontade por anything ou pornothing e acomodar, entaora escolha, traduzindo-se ne por not ou interpretando-se ne como pleonastico. Esse exemplo e desapontador porque se pode objetarque eu meramente recortei muito pequenas as unidades francesas. Pode-se acre-ditar no mito mentalista do museu de significados e, ainda assim, conceder querien nao tern por si mesmo nenhum significado, nao sendo nenhuma etiqueta in-teirare parte de ne... rien, que tern seu significado como urn todo.Comecei com esse exemplo desapontador porque penso queseu trace no-ravel - sua dependencia do recorte da linguagem em segmentos curtos demaispara veicular significados - e igualmente 0 segredo dos casas mais series. 0 quetorn a outros casos mais series ISque os segmentos que eles envoIvern sao seria-mente longos: suficientemente longos para serem predicados e para serem verda-deiros de coisas e, portanto, penr tr-se-ia, para veicular significados.Urn exemplo artificial que usei alhures 2 depende do fato de que urn coelhointeiro esta presente quando e somente quando uma parte nao destacada de urn 'coelho esta presente; tambem quando e somente quando uma fase temporal deurn coelho esta presente. Se estamos querendo saber se traduzimos uma expres-sao nativa gavagai par coelho ou por parte nao destacada de coelho ou por [asede coelho, nunca podemos decidir 0 assunto simplesmente por ostensao - isto e ,simplesmente por prop or repetidamente a expressao gavagai ao assentimento oudissentimento do nativo na presenca de estimulaeoes adequadas.Antes de ir adiante para insistir em que tambem nao podemos decidir 0 as-sunto por meios nao .ostensivos, deixem-me elaborar urn pouco essa dificuldadeostensiva. Nao 'estou me preocupando, como foi 0 caso de Wittgenstein, com casossimples de ostensao. A paIavra para cor sepia, para tomar urn de seus exemplos, 3pode certamente ser aprendida por urn processoordinario de condicionamento ouinducao. Nem mesmo ISpreciso que se nos diga que sepiae uma cor e nao umaforma ou urn material ou urn artigo. E verdade que, excluindo tais indicacoespode-se precisar de muitas licoes, de modo a eliminar generalizacoes erroneasbaseadas antes na forma, no material, etc., que na cor, e de modo. a eliminarnocoeserroneas quanto a demarcacao tencionada de tum exemplo indicado e demodo a delimitar as variacoes admissiveis da propria cor. Como todocondiciona-mento ou inducao, 0 processo dependera, em ultima instancia, tambem de nossa2 Quine, Word and Ob=ct (Cambridge, Mass., MIT Press, 1960), 12.3 L. 'Wittgenstein, Philosophical Investigations (Nova York, Macmillan, 1953), P: 14.

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    136 QUINEpropria propensao inata a achar uma estimulacao qualitativamente mais afimcom uma segunda estimulacao do que com uma terceira; de outro modo, nuncapode haver qualquer reforco e extincao de respostas seletivas. 4 Aindaassim, denada mais se precis a, em principia, ao aprender sepia do que em qualquer condi-cionamento au inducao.

    Mas a grande diferenca entre coelho e sepia e que, enquanto sepia e urn ter-mo de massa como dgua, coelho e urn termo de referencia dividida. Como tal, elenao pode ser dominado sem que se domine seu principio de individuacao: ondecessa urn coelho e comeca outro. E isso nao se pode dominar por pura ostensao,ainda que persistente.Tale a dificuldade com gavagai; onde cessa urn gavagai e corneca outro. A(mica diferenca entre coelhos, partes nao destacadas de coelhos e fases de coelhosesta em sua individuacao, Se se toma a porcao dispersa total do mundo espacio-temporal que e constituida de coelhos e aquela que e constituida de partes naodestacadas de coelhos e aquela que e constituida de fases de coelhos, obtern-se,cada uma das tres vezes, a mesma porcao dispersa do mundo. A unica diterencaesta em como ela e repartida. E como reparti-lae 0 que a ostensao ou 0 simplescondicionamento, ainda que persistentemente repetido, nao podem ensinar.Assim, considere-se especificamente 0 problema de decidir entre coelho eparte niio destacada de coelho, como traducao de gavagai. Nenhuma palavra dalinguagem nativa e conhecida, com a excecao de que nos fixamosem alguma hi-p6tese de trabalho no que respeita aquais palavras ou gestos nativos interpretarcomo assentimento e dissentimento em resposta a nossas indicacoes e indagacoes,Ora, 0 que estorva e que, sempre que apontamos para diferentespartes do coelho,mesmo encobrindo algumas vezes 0 resto do coelho, tambem estamos apontandoa cada vez para 0 coelho. Inversamente, quando indicamos 0 coelho inteiro comurn gesto amplo, estamos ainda assim apontando para uma multidao de partesde coelho. E note-se que nem mesmo temos urn analogo nativo de nossa terrni-nacao plural para explorar, ao perguntar gavagai? Pareee claro que nenhuma de-cisao, mesmo tentativa, entre coelho e parte niio destacada de coelhodeve serprocurada a esse nivel,Como decidiriamos finalmente? Minha mencao de passagem de terminacoesplurais e parte da resposta. Nossa individuacao de termos de referencia dividida,em portugues, esta ligada a urn conjunto de particulas e construcoes gramaticaisinter-relacionadas: terminacoes plurais, pronomes, numerais, 0 e de identidade esuas adaptacoes mesmo e outro. E 0 conjunto de expedientes inter-relacionadosem que se toma central a quantificacao quando a regulamentacao da logica sim-bolica e imposta. Se pudessemos perguntar ao nativo em sua linguagem Estegavagai e 0 mesmo que aquele?, fazendo do mesmo tempo rmiltiplas ostensoesapropriadas, entao estariamos de fato bern a caminho de decidir entre coelho,parte niio destacada de coelho e fase de coelho. E,. sem diivida, 0 lingiiista acabaalcancando 0 ponto em que ele pode perguntar 0 que pretende seja aquela per-gunta. Ele desenvolve urn sistema para traduzir contextualmente no idioma nativonossas pluralizacoes, pronomes, numerais, identidade e expedientes relacionados.Ele desenvolve urn tal sistema por abstracao e hipotese. Ele abstrai particulas econstrucoes nativas de sentencas nativas observadas e tenta associa-las de variasmaneiras a particulas e construcoes portuguesas. Na medida em que as sentencasnativas e as portuguesas que lhes sao assim associadas parecam combinar no que4 Cf. Word and Object, 17.

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    RELATIVIDADE ONTOL6GICA 137respeita a ocasi6es apropriadas de uso, 0 lingiiista sente-se confirmado nessas hi-poteses de traducao -'- 0 que eu chama de hipoteses anallticas. SMas parece que esse metodo, embora louvavel na pratica e 0 melhor quepossamos esperar, nao resolve em principio a indeterminacao entre coelho, parteniio destacada de coelho e lase de coelho. Pois, se um sistema de modo geral pra-ticavel de hip6teses analiticas prove a traducao de uma dada expressao nativapor e 0 mesmo que, talvez um outro sistema igualmente praticavel, mas sistema-ticamente diferente, traduziria aquela expressao nativa antes por algo como esta .junto com. Entao, quando tentamos perguntar na linguagem nativa Este gavagaie 0mesmo que aquele?, poderiamos igualmente estar perguntando Este gavagaiestd junto com aquele? Nessa medida, 0 assentimento do nativo nao constitui ne-nhuma evidencia objetiva para traduzir gavagai por coelho ao inves de por parteniio destacada de coelho ou lase de coelho.Esse exemplo artificial compartilha da estrutura do exemplo trivial anteriorne. .. rien. Fomos capazes de traduzir rien por anything au par nothing, gracasa um ajustamento compensatorio no tratamento de ne. E eu sugiro que podemostraduzir gavagai por coelho ou parte niio destacada de coelho ou lase de coelho,gracas a ajustamentos compensatorios na traducao de locucoes nativas acompa-nhantes. Outros ajustamentos poderiam ainda acomodar a traducao de gavagaipor coelhice ou de outras maneiras. Acho isso plausivel por causa do caniter am-plamente estrutural e contextual de quaisquer consideracoes que pudessem con-duzir-nos a traducoes nativas do grupo portugues de expedientes inter-relacionadosde individuacao. Pareee obrigat6rio haver escolhas sistematicamente muito dife-rentes, todas as quais fazem justica a todas as disposicoes ao comportamento ver-bal por parte de todos os interessados.Um verdadeiro lingtiista de eampo seria, sem duvida, suficientemente judi-cioso para equacionar gavagai com coelho, rejeitando para longe alternativas per-versas tais como parte ndo destacada de coelho e lase de coelho. Essa escolhajudiciosa e outras como ela ajudariam, par sua vez, a determinar suas hipotesessubseqiientes no que respeita a quais locucoes nativas deveriam corresponder aoaparato portugues de individuacao e, assim, tudo acabaria dando certo. A maximaimplicita que guiaria sua escolha de coelho e escoihas similares para outras pala-vras nativas e que um objeto duradouro e relativamente homogeneo, movendo-secomo urn todo contra urn pano de fundo contrastante, e uma reterencia provavelpara uma expressao curta. Se ele viesse a tornar-se consciente dessa maxima, po-deria celebra-la como urn dos universais lingufsticos, ou traces de todas as lin-guagens e nao teria nenhuma dificuldade em assinalar sua plausibilidade psico-logica. Mas ele estaria errado: a maxima e sua propria imposicao, no sentido deIixar 0 que e objetivamente indeterminado. E uma imposicao muito judiciosa e eunao recomendaria nenhuma outra. Mas eu estou marcando urn ponto filos6fico.E filosoficamente interessante, alem disso, que 0 que e indeterminado nesseexemplo artificial nao e apenas 0 significado. Minhas observacoes sobre a inde-rerminacao comecaram como urn desafio a semelhanca de significado. Eu nos pusa imaginar "urna expressao que pudesse ser traduzida em portugues, de modoigualmente detensavel, de duas maneiras distintas, dessemelhantes quanto ..ao sig-nificado em portugues". Semelhanca de significado e por certo uma nocao obscura,repetidamente posta em xeque. De dois predicados que sao semelhantes em ex-tensao nunea foi claro quando dizere quando nao dizer que eles sao semelhantes5 Word and Object, 15. Para urn sumario de meu ponto de vista geral, ver tambern 1de "Falando de Objetos", neste volume.

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    138 QUINEem significado; e a velha questao de bipedes implumes e animais racionais, ou detriangulos eqiiiangulos e eqiiilateros. Referencia, extensao, tern sido a coisa firme;significado, intensao, a coisa infirme. Entretanto, a indeterminacao de traducaocom que nos confrontamos agora se entrecruza de modo semelhante com extensaoe intensao. Os termos coelho, parte nao destacada de coelho e fase de coelho di-ferem nao apenas em significados; eles sao verdadeiros de coisas diferentes. A pro-pria referencia se mostra comportamentalmente inescrutavel.Dentro dos limites paroquiais de nossa propria linguagem, podemos conti-nuar como sempre a achar 0 discurso extensional mais claro que 0 intensional.Pois a indeterminacao entre coelho, fase de coelho e 0 resto dependia apenas deuma indeterminacao correlativa de traducao do aparato portugues de individua-

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    RELATIVIDADE ONTOL6GICA 139termo individuador verdadeiro de cada bovino, e a outra maneira trata aquelapalavra antes como urn termo de massa cobrindo a totalidade nao individuada decarne de boi sobre cascos. Essas sao duas rnaneirasmuito diferentes de tratar aterceira paIavra japonesa; e a frase de tres palavras como urn todo da urn bornresultado em. ambos os casos somente por causa das diferencas compensatoriasem nosso tratamento da segunda palavra, 0 classificador.Esse exemplo lembra, de algum modo, nosso trivial exemplo inicial, ne ...rien. Fomos capazes de representar rien como anything ou como nothing, toman-do ne compensatoriamente como negativa ou como vazia. Somos capazes agorade representar uma palavra japonesa ou como urn termo individuador para bovi-nos ou como urn termo de massa para carne de boi viva, tomandocompensato-riamente 0 classificador como a declinar 0 numeral ou como a individuar 0 termode massa. Entretanto, a trivialidade de um exemplo nao se transfere sem maispara 0 outro. 0 exemplo anterior foi rejeitado com base em que tinhamos recor-tado muito pequeno; rien era muito curta para uma traducao significativa por sipropria e ne. .. rien era a unidade significativa. Mas nao podemos rejeitar 0exemplo japones dizendo que a terceira palavra era muito curta para uma tra-ducao significativa por si propria e que somente a frase inteira de tres paIavrasequivalente a cinco bois era a unidade significativa. Nao podemos tomar essa li-nha a menos que estejamos preparados para chamar uma paIavra de muito curtapara uma traducao significativa, mesmo quando ela e suficientemente longa paraser urn termo e veicular denotacao, Pois aterceira palavra japonesa e, numa enoutra abordagem, urn termo: numa abordagem, urn termo de referencia divididae,na outra, urn termo de massa. Se de fato estamos preparados para chamar umapalavra de muito curta para uma traducao significativa, mesmo quando eia e urntermo denotativo, entao estamos concedendo, por urn processo as avessas, 0 queeu queria provar: a inescrutabilidade da referencia,Entre as duas explicacoes dos classificadores japoneses, nao ha nenhumaquestao de certo e errado. Uma explicacao tende a prover uma traducao maiseficiente no portugues idiomaticoca outra tende a prover mais sensibilidade paracom 0 idioma japones. Ambasse harmonizam igualmente bern com todo com-portamento verbal. Todas as sentencas inteiras, e mesmo frases componentes co-mo cinco bois, admitem as mesmas traducoes portuguesas emtodos os casos ni-tidas, numa e noutra explicacao. Esse tanto e invariante. Mas 0que e Iilosofica-mente interessante e que a referencia ou extensao de termos mais curtos podedeixar de ser invariante. Se aquela terceira palavra japonesa e, ela propria, ver-dadeira de cada boi ou se, por outro lado, ela e urn termo de massa que precisaser ajuntado ao classificador ,Para formar urn termo que seja verdadeiro de cadaboi - eis aqui uma questao que permanece nao decidida pela totalidade das dispo-sicoes humanas ao comportamento verbal. Ela e indeterminada em principio; naoha nenhum fato nessa materia. Uma e outra resposta podem ser acomodadas poruma explicacao do classificador. Aqui esta de novo, entao, a inescrutabilidadeda referencia - ilustrada desta vez por urn ponto vulgar de traducao pratica.Pode-se trazer a inescrutabilidade da referencia para mais perto de casa,considerando-se a palavra alta ou, de novo, a palavra verde. Em nosso uso dessaspalavras e de outras como elas, ha uma ambigiiidade sistematica. As vezes usamostais palavras como termos gerais concretos, como quando dizemos que a gramae verde, ou que alguma inscricao comeca com urn alfa. As vezes, por outro lado,usamo-las como termos singulares abstratos, como quando dizemos que verde euma cot que alfa e uma letra. Uma tal ambigliidade e encorajada pelo fato deque nao ha nada na ostensao para distinguir os dois usos. 0 ato de apontarqueseria feito ao ensinar oermo geral concreto verde ou alia nao difere em nada

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    140 QUINEdo ato de apontar que seria feito ao ensinar 0 termo singular abstrato verde oualia. Porern, os objetos a que se refere a palavra sao muito diferentes nos doisusos; num usa, a palavra e verdadeira de muitos objetos concretos e, no outrouso, ela nomeia um objeto singular abstrato.

    Podemos, sem duvida, relatar a parte os dois usos, vendo como a palavraaparece em sentencas: se ela toma um artigo indefinido, se ela toma uma termina-