orquídeas

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Capítulo I: O encontro A jovem Clara Rafaela tinha alguns sonhos estranhos que não sabia distinguir se era realidade ou apenas delírios de sua imaginação. Em seus sonhos ela via um céu estrelado e um homem vestido de preto abraçando-a. Clara não sabia quem era, mas sentia fascínio pela imagem que aquela figura misteriosa representava. Em um dia frio e chuvoso, em Petrópolis, na Praça Pedro II, perto do Museu Imperial, Clara encontrava-se sentada embaixo da estátua do imperador quase de madrugada. A jovem estava refletindo sobre sua vida e admirando o céu nebuloso quando ocorreu um fato inesperado. Alguém se aproximou dela: – Olá jovem! O que tu fazes sentada aqui sozinha em tamanha noite nebulosa? Não tens medo? Assustada, Clara respondeu: – Não senhor! Estou bem. – Queres uma companhia? A propósito, não sou Senhor! Oh, me desculpe, não quis ofendê-lo. Estou refletindo sobre minha vida acadêmica, não encontrei o material de pesquisa que desejava, todavia, farei o que posso com o que tenho... – É teu costume refletires à noite sozinha? Perguntou o misterioso homem tranquilamente. – Sim. À noite é um bom momento para reflexão! Bom, me desculpe, mas já está na hora de eu ir embora. Boa noite! – Boa noite, senhorita. Tenha bons sonhos! – Obrigada! 1

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Page 1: Orquídeas

Capítulo I: O encontro

A jovem Clara Rafaela tinha alguns sonhos estranhos que não sabia distinguir se

era realidade ou apenas delírios de sua imaginação. Em seus sonhos ela via um céu

estrelado e um homem vestido de preto abraçando-a. Clara não sabia quem era, mas

sentia fascínio pela imagem que aquela figura misteriosa representava.

Em um dia frio e chuvoso, em Petrópolis, na Praça Pedro II, perto do Museu

Imperial, Clara encontrava-se sentada embaixo da estátua do imperador quase de

madrugada. A jovem estava refletindo sobre sua vida e admirando o céu nebuloso

quando ocorreu um fato inesperado. Alguém se aproximou dela:

– Olá jovem! O que tu fazes sentada aqui sozinha em tamanha noite nebulosa?

Não tens medo?

Assustada, Clara respondeu: – Não senhor! Estou bem.

– Queres uma companhia? A propósito, não sou Senhor!

– Oh, me desculpe, não quis ofendê-lo. Estou refletindo sobre minha vida

acadêmica, não encontrei o material de pesquisa que desejava, todavia, farei o que posso

com o que tenho...

– É teu costume refletires à noite sozinha? Perguntou o misterioso homem

tranquilamente.

– Sim. À noite é um bom momento para reflexão! Bom, me desculpe, mas já

está na hora de eu ir embora. Boa noite!

– Boa noite, senhorita. Tenha bons sonhos!

– Obrigada!

Clara se despediu do cortês homem não perguntando o nome dele. A conversa

que eles tiveram foi tão sutil e rápida que não valia à pena. A jovem dirigiu-se até a

calçada para entrar no seu carro quando se deu conta da desventura que a esperava:

– Oh, meu Deus! Perdi minha chave do carro. E o que é pior o pneu está furado!

Onde está meu celular? O que está acontecendo comigo! – Disse a jovem irritada.

No mesmo instante reapareceu o homem misterioso oferecendo ajuda a moça:

– Posso ajudar-te senhorita? Aconteceu algo? – Perguntou ele com ternura.

– Não tenho como sair daqui porque estou sem minha carteira. Está tudo dentro

do carro e eu perdi a chave. – Respondeu Clara com um ar de desespero.

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Page 2: Orquídeas

– Se concordares, tu podes se hospedar hoje em minha casa. – Disse o

desconhecido homem.

Clara estava desolada naquele dia, não somente pelo fracasso de sua pesquisa.

Ela também havia perdido alguém que muito amava. Clara acabou aceitando o convite

do misterioso homem, pois o olhar dele parecia ser terno e confiável, era um olhar

irresistível. A jovem parecia atraída por uma sinfonia romântica, uma música que a

levava dizer sim, mesmo que tivesse com medo:

– Acho melhor não, nem conheço você!

– Desculpe-me senhorita pela insolência! Entretanto, não poderei deixar-te

sozinha neste horário sem chave, sem carro nessa chuva. Venha comigo!

– Bom, sendo assim, irei. Mas que fique claro que você é um estranho e que

poderei me arrepender.

– Garanto que não te arrependerás. Qual o teu nome senhorita?

– Clara Rafaela Martins. E o seu?

– Jean Willian Lindolck Hauser.

– Você não é brasileiro, certo?

– Não sou.

– Mas você fala o português tão bem, tão corretamente, melhor ainda do que eu

que sou brasileira. – Disse Clara curiosa. Willian pareceu se esquivar do assunto: – Está

chovendo, vamos logo para a minha casa. – Tu queres me dar o braço, a fim de irmos

juntos até o meu carro? – Tudo bem. – Respondeu a jovem desconfiada.

Ambos foram de braços dados para o carro de Jean Willian, sob uma grande

chuva que gerava ventos e raios. O que Clara não sabia era que aquele encontro

misterioso e inesperado mudaria profundamente a sua vida. E Jean Willian porque

chegara repentinamente na vida da delicada moça? Qual o seu interessante por Clara.

Capítulo II: O fascínio

Durante a viagem, Clara não conseguira refletir sobre o que realmente estaria

acontecendo, não sabia se o que vivia era realidade ou mais um daqueles sonhos em que

sua consciência livre das repressões e recalques do dia a dia permitia que a fantasia

tomasse conta da noite.

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Page 3: Orquídeas

Clara era uma moça que sabia conter bem seus sentimentos, sentidos e atitudes.

Ela sabia usar várias máscaras num mesmo dia se preciso. A jovem era o espelho da

razão. Ao mesmo tempo, ela era sensível como uma flor, pois percebia e sentia todas as

coerções que uma sociedade impõe sobre as pessoas. E isso, perturbava profundamente

a consciência, os atos e o pensar da moça. Contudo, Clara procurava controlar seus atos

e tudo ao seu redor. No entanto, a jovem não poderá controlar o que acontecerá em sua

vida, após o encontro com misterioso homem.

Durante a viagem no carro de Jean Willian, a moça estava cada vez mais

fascinada pela força física daquele homem, que parecia ter seus trinta e cinco anos. Não

sabia se o que sentia era fascínio ou medo. A viagem parecia tranqüila, todavia, a chuva

não parava de cair. De repente, o homem entrou por uma rua interiorana e apesar das

luzes dos postes tudo começou a ficar mais escuro, parecia que eles tinham chegado à

zona rural de Petrópolis ou algo parecido a isso. A moça agora estava com medo,

entretanto, ainda se sentia fascinada...

– Tu estás cansada senhorita Clara?

– Sim, estou. Tive um dia conflituoso!

– Apesar da chuva, a noite está bela, não achas?

– Sim, está.

– Tu gostas de orquídeas? Na minha casa há muitas.

– É a minha flor predileta. – Disse Clara com receio.

Da parte de Jean Willian, não se sabe o que ele pensava em sua misteriosa

mente. Era tranquilo, parecia ter controle de tudo. Apesar de concentrado o misterioso

homem tinha uma expressão dócil, confiável e experiente. Fazia de tudo para que Clara

não sentisse medo, parecia um herói aos moldes americanos. Entretanto, sua pessoa

causava uma expressão de profundo mistério. Após Clara cochilar no carro, Willian e

ela chegaram ao sítio do misterioso homem. Um lugar imenso que possuía uma casa

enigmática e fascinante para uma jovem pesquisadora:

– Que casa linda! – Disse Clara que já havia acordado do sono.

– Gostou? Eu comprei há alguns séculos. Ou digo, há alguns anos!...

– Amei é linda!

– Quanto tempo você está aqui no Brasil?

O homem ficou constrangido com a pergunta de Clara. Porém, sem hesitar,

respondeu:

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– Há muitos anos passo férias no Brasil! É um lugar especial para mim. Vamos

entrar?

– Sim. – Disse Clara.

Apesar de toda insegurança, a moça acompanhou o misterioso homem. Estava

cansadíssima e sonolenta. O que ela mais queria era descansar. Assim, não percebeu

quase nada da bela e intrigante casa. Quando entraram, Willian olhou sedentamente à

jovem com a expressão de um mostro que leva sua presa ao calabouço. Mas, Clara nada

percebeu, pois tinha muito sono:

– Queres que eu te prepare algo?

– Não obrigada. Estou morta de sono, você pode me mostrar os meus aposentos?

– Sim. Venha comigo.

Após subirem as escadas Jean Willian ofereceu à Clara o quarto de hóspedes.

Contudo, a moça entorpecida de sono, não sabia o que realmente estava acontecendo,

ela só queria dormir. Enquanto isso, uma música tocava na casa, parecia música

clássica.

– É aqui. Tu estás bem, senhorita Clara?

– Sim, estou. Desculpe-me o jeito.

– Não te perturbes, fiques bem. Boa noite!

– Boa Noite. Que música é essa?

– É Mozart que toca.

– Obrigada senhor Willian. Boa Noite.

– Durma bem, senhorita Clara Rafaela.

A noite foi tranquila, Clara dormiu como um anjo.

E Willian, o que fez durante a noite? Ele se retirou para a biblioteca onde

passara suas noites lendo diversos livros. Ao acordar pela manhã, Clara olhou o quarto.

Era um belo lugar. Tinha um modesto espelho e uma penteadeira em frente à cama. A

cama era linda, possuía um grande mosqueteiro. Não havia no quarto ventilador.

Entretanto havia lindíssimas janelas de vidros cristalinos que iluminavam e refrescavam

bem o quarto. Existia também uma grande escrivaninha, com livros e penas de escrever.

Ao verificar uma das gavetas, a moça percebeu que havia cadernos novos e um lindo

estojo de canetas.

Ao sair do quarto olhou bem o corredor do segundo andar que era extenso,

formoso com vários quadros de pintores franceses e italianos. Também tinha quadros de

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Page 5: Orquídeas

Portinari, de Picasso e de muitos outros artistas. Clara ficava encantada com o quarto e

com o corredor. Mas um detalhe não chamou a atenção da moça devido à beleza dos

quadros. As muitas portas trancadas que havia no corredor...

Ao descer pela grande escada pode reparar como a casa de Willian era imensa.

Notou que no corrimão tinha um bilhete do misterioso homem:

“Infelizmente, não posso acompanhar-te durante o teu dia, posto que, sou tomado por muitos afazeres durante as matinas e tardes. Encontrarei a ti quando o sol se puser na minha sala de visitas. Teu café da manhã estar servido na sala de refeições abaixo da escada, em frente à sala de visitas. Não te preocupes com teu carro, já mandei buscar. Tenha um agradável dia, há empregados na casa para atender-te...

Com carinho, Jean Willian Lindorck. ”

A moça surpresa não sabia que atitude tomar, parecia sentir medo e curiosidade

de ficar naquela intrigante casa. Tudo a fascinava naquele misterioso homem: sua

pessoa, suas palavras, sua casa, suas atitudes elegantes e corteses. Clara tomou seu café,

olhou bem a casa. É verdade que não reparou detalhes importantes como a falta de

espelhos. Depois resolveu passear pelo exterior da casa que tinha lindas plantas, muitas

árvores e jardins o que era comum nas casas brasileiras. O jardim era belíssimo e

graúdo, bem cuidado com a presença de um grande chafariz que fazia a água jorrar ao

redor. Cercado por roseiras, o jardim possuía mesas e cadeiras de bronze. E bem no

fundo dele havia uma casinha decorada de vidros cristalinos, era o orquidário o que logo

chamou a atenção de Clara, já que orquídeas eram suas flores preferidas. Ao chegar ao

orquidário se deparou com alguém:

– Quantas orquídeas! São belíssimas – Exclamou a jovem.

– Gostou? Elas são do Senhor Willian. É ele que faz questão de cuidar. Também

só cuida durante a noite.

– Olá me desculpe por não me apresentar. Meu nome é Clara Rafaela e é você?

– Ah, me desculpe! Sou empregado do Sr. Willian, meu nome é Alexandre. Se

precisar estarei ao seu dispor.

– Muito prazer Alexandre!

– O Sr. Willian me recomendou que eu cuidasse da senhorita.

– Ah, não será necessário. Muito gentil de sua parte, Alexandre, mas logo eu irei

embora. Assim que meu carro chegar. Enfim, ainda não sei bem o que farei, mas tenho

que voltar para casa. Disse Clara preocupada.

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Page 6: Orquídeas

– De certo que sim senhorita. Mas não se preocupe o senhor Willian cuidará de

tudo. Bem, não vou ocupar mais a senhorita. Fique à vontade com as orquídeas. Ah, o

almoço lhe será servido por volta de meio-dia. Qualquer coisa eu moro no caminho

atrás do orquidário em direção da floresta. Lá está minha esposa e seus filhos.

– Mas porque tão longe, Alexandre? – Perguntou Clara.

– Não sei, quando cheguei a casa já estava construída. A senhorita não viu nem a

metade deste sítio. O patrão tem outra casa, lá no meio dá floresta. Tem gado, porco e

galinha lá. Este sítio é quase uma fazenda.

O sítio parecia muito grande. A distância da mansão para o orquidário e a casa

de Alexandre era considerável. Depois de ver as orquídeas, Clara andou mais um pouco

pelo quintal, ficou cansada e foi almoçar. Seus olhos não escondiam o fascínio e a

preocupação que tinha sobre tudo o que a acontecia.

Capítulo III: Quem é você?

A moça passara à tarde, andando pela casa, todavia, não conseguiu entrar em

certos lugares por estarem trancados. Clara foi à biblioteca, olhou com afinco os

variados e múltiplos livros e enciclopédias que Williams tinha em sua casa. Clara, olhou

ainda o computador, o fax e o telefone. Aquela sala parecia trazer o antigo arrumado a

novas tecnologias. O computador ao lado do caderno e da máquina de escrever. As

canetas ao lado das penas.

Willian também tinha um ateliê em que guardara obras de arte legítimas e

também cópias de quadros e de esculturas. Além disso, havia muitos quadros e

esculturas dele próprio. Havia também instrumentos musicais: pianos, violinos, violões,

guitarras, caixas de som, micro-fones.

Quem era este misterioso homem? Era pergunta que Clara fazia dentro de si...

Após vistoriar o que pode da bela mansão, pois essa era grandíssima, a jovem

fora pela segunda vez passear pelo imenso quintal. Não conseguira ver tudo, posto que

estivesse cansada e fascinada pelo lindo sítio de Willian.

A noite caiu, e na sala grande da mansão, em meio à televisão Clara se distraiu.

Logo, o homem intrigante chegou:

– Olá! Senhorita Clara, Boa noite! Como passaste o dia?

– Olá! Passei bem. Sua casa é belíssima. Parabéns!

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Page 7: Orquídeas

– Aproveitaste bem? Viste o orquidário? Fostes ver a piscina? – Perguntou o

homem ansioso.

– Não, a piscina eu não vi!

– Que pena! Fica para o lado esquerdo do sítio. É um pequeno clube. Ah,

Senhorita Clara, já estás sabendo das novas notícias sobre o Brasil?

– Que notícias? – Perguntou a jovem curiosa.

– O Rio de Janeiro vai ser a sede das olimpíadas.

– Ah sim, acabei de ver pela televisão. Então o Brasil ganhou. – Respondeu a

moça com pouco entusiasmo.

– Achei que tu ficarias mais feliz.

– Não, estou sim. É muito bom para o esporte e para a cidade. Entretanto,

precisamos vencer muitos desafios ainda. Não somente o Rio, mais todo o país. Apesar

de tudo, o país estar crescendo bastante.

– Queres jantar?

– Não. Estou sem fome.

– Então vamos conversar um pouco mais na biblioteca. Venha comigo.

– Claro. Onde estão seus empregados?

– Não trabalham à noite. Se tu precisares de algo, é minha obrigação prover-te.

E foi ambos, conversarem na biblioteca do misterioso homem. Novamente uma

música tocou. Clara estava cada vez mais intrigada com a postura daquele homem, com

sua casa, seu sítio. Assim, começou a questioná-lo durante a conversa na biblioteca:

– Senhor Williams, o que faz aqui no Brasil?

– Bem, de início, vim passar aqui apenas férias. Depois de me encantar por

Petrópolis, resolvi morar de vez neste belo país. Neste lindo estado que é o Rio de

Janeiro.

– Qual a sua origem? – Perguntou Clara.

– Sou inglês. Entretanto, nasci na França. Em resumo, meu pai era inglês e

minha mãe francesa. Mas, por que tu estás tão curiosa ao meu respeito?

– Fiquei curiosa. O que você faz, qual é a sua profissão e há quanto tempo você

está no Brasil?

Apesar das perguntas da moça, repentinamente alguém bateu na porta e Willian

não as respondeu:

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Page 8: Orquídeas

– Ah, com sua licença senhorita. Deve ser o chaveiro que veio te entregar a

chave de teu carro. Vou atender a porta.

– Eu vou com você. – Respondeu a moça.

– Não é preciso! – Insistiu, Willian. Eu o trarei aqui.

– Tudo Bem.

Após passar um agradável dia no sítio do misterioso homem, a jovem começou

sentir ao cair do crepúsculo uma agonia adventícia pela qual não sabia por que surgiu.

Foi quando, Willian entrou na biblioteca com o homem estranho:

– Senhorita Clara, o seu carro chegou.

– Ah, o meu carro? – Disse Clara espantada.

– Está na garagem do sítio. Chegou a pouco, mandei consertar o pneu.

– Quem o trouxe?

– Alexandre.

– Bom sendo assim, me vou para o Rio de Janeiro.

– De maneira alguma, senhorita. Faço questão que tu jantes aqui, e que esperes o

dia amanhecer para ires, pois a serra é perigosa à noite.

– Bom, mas preciso ir embora, vou aproveitar a companhia do chaveiro.

– Ele se foi, entregou a chave a Alexandre. Fiques por favor.

– Tudo bem, o dia foi muito agradável, vou deixar para ir amanhã com calma.

Cada vez mais a jovem se perguntava quem poderia ser esse misterioso homem

dono da casa onde ela se hospedara.

Jean Willian por sua vez sabia que a moça estava com medo. E tentou durante

aquela noite agradá-la e tranquilizá-la como no primeiro dia em que se conheceram:

– Você está bem senhorita?

– Estou. Bem, já que o chaveiro se foi. Vou dormir, se me permitir?

– Senhorita, gostaria que tu ficasses um pouco mais. Quero mostrar-te alguns

livros, tu não comestes nada, vou trazer-te algo.

– Me desculpe, mas estou com sono. – Respondeu a moça impaciente para subir

para o quarto.

– Por favor! Não aceito suas desculpas.

– Tudo bem! Ficarei um pouco.

– Então, venha comigo. Farei um chá para tu beberes. Vou à cozinha, me espere

na biblioteca.

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Page 9: Orquídeas

– Sim.

Repentinamente uma música começou a tocar e Clara se assustou. Teve ânsias

de desmaio e tentou andar em direção ao seu quarto, porém Willian chegou:

– O que se passou? Tu estás bem.

– Afinal, quem é você? - Perguntou a moça cansada...

– Tu não estás bem. Vamos te levarei ao quarto.

E a moça desmaiou de sono, mais uma vez nos braços daquele estranho homem.

Que a carregou e a deixou em seu quarto. Quem poderia ser tal sujeito?

Uma música não parava de tocar...

Capítulo IV: A Aurora e o Crepúsculo

Após passar horas em sua biblioteca, lendo um romance horrendo e épico. Jean

Willian percebera que a aurora se daria logo. Então foi até o quintal, próximo ao

orquidário onde encontraria Alexandre:

– Olá senhor! – Disse Alexandre.

– Olá Alexandre. Bom, como fazemos toda madrugada, deixarei as

recomendações do sítio contigo. Está tudo escrito. Ah, não te esqueças de servires bem

a moça. Ela precisará de ti, e dos quitutes de tua esposa. A propósito, como vão as

crianças?

– Bem, senhor. Fique tranquilo. Cuidarei da moça e lerei atentamente suas

recomendações.

– Obrigada, Alexandre. Agora irei, antes que o dia amanheça.

– Bom dia!

–Igualmente.

– Senhor, viu as orquídeas?

– Vi sim Alexandre! Há um item sobre elas no papel. Adeus!

– Adeus...

O dia amanheceu, e Clara acordou com uma mesa de café da manhã com muitos

quitutes como recomendara Jean Willian a Alexandre. Havia um jarro de orquídeas de

muitas cores perto da cama. A moça não lembrava que fora carregada nos braços por

Willian. Contudo, sabia muito bem que tinha que ir embora daquela casa o quanto antes.

Após comer ela desceu para ir até a biblioteca. Começou a olhar atentamente os livros.

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Page 10: Orquídeas

E percebeu que tinha em cima da mesa um catálogo de livros. A jovem principiou no

fascínio quando viu a quantidade de raras obras que o misterioso homem possuía em sua

biblioteca.

O sol brilhava ardentemente do lado de fora e refletia sua luz até mesmo na

biblioteca. Foi quando a moça resolveu deixar o livros e apreciar a natureza. Foi

novamente ao orquidário e encontrou a esposa de Alexandre:

– Olá senhora?

– Olá senhorita. Deseja algo? – Respondeu a esposa de Alexandre.

– Não. A senhora parece tão assustada. É você que cuida das orquídeas? –

Perguntou a moça propositalmente.

– Não. É o senhor Willian. Não sei como consegue cuidar de plantas à noite.

Para falar a verdade, esse homem faz tudo à noite. Não sei como consegue!

– Que estranho. E a senhora, o que faz na casa?

– Sou a cozinheira. Você quase não me ver, porque cozinho na minha casa e já

levo a comida pronta para a senhorita.

– Por que a senhora não cozinha na mansão?

– Ah, minha filha. Não gosto daquela mansão estranha. Por mim não estaria aqui

neste sítio. Mas, Alexandre insiste.

– Há quanto tempo estão aqui?

– Faz uns dois anos. Esse lugar é mal assombrado. E ninguém para aqui,

ninguém. Só o doido do meu marido que quer ficar. Também, sempre fomos caseiros de

sítios. E esse patrão foi o que mais nos pagou bem.

– O que Willian faz durante o dia?

– Ah, não sabemos se ele dorme ou se trabalha. Mas, acho que trabalha à noite

no seu escritório. E Alexandre não me diz nada. Acredito que durante o dia ele dorme.

Eu como só entro lá para levar a comida de hóspedes...

– Ele faz sua própria comida?

– Sim. Faz. E você é uma das poucas hóspedes dele. Como você sabe, ele não é

do Brasil. Vem nas férias. Mas dessa vez as férias durou dois anos. Não sei o que ele

quer aqui, mas tenha cuidado, esse homem pode ser perigoso!

– Quem mais vem aqui? – Perguntou Clara muito intrigada com esse diálogo.

– Alguns embaixadores estrangeiros. Algumas autoridades estrangeiras e

brasileiras.

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Page 11: Orquídeas

– Que tipo de autoridades?

– Juízes. Mas, sobretudo políticos. Ministros, deputados, governadores. Só não

me lembro de presidentes. Seu Willian é um homem de política, da diplomática,

viajado. Como diz Alexandre, que se vê todo feliz por cuidar do sítio de um homem

assim. E a senhorita o que faz aqui?

– Sou apenas uma simples hóspedes. Como ele pode se expressar tão bem em

português?

– Foi o que lhe falei. Esse homem visita o Brasil há anos...

– Ah, me desculpe. Qual é seu nome? – Interrompeu Clara.

– Madalena.

– Você tem filhos com Alexandre?

– Tenho. Mas não gosto que fiquem aqui. Prefiro que morem no Rio com a avó.

Não quero meus filhos aqui nesta casa mal assombrada! No entanto, Alexandre insiste

que eles fiquem! – Exclamou a senhora de Alexandre exaltada.

– Por quê? – Perguntou Clara instigada.

– Moça, vai embora enquanto é tempo. Olha. Nunca vi o rosto do patrão. Toda a

madrugada, por volta das cinco horas, ele se encontra aqui no orquidário com Alexandre

para entregar ao meu marido as instruções escritas para dirigir o sítio durante o dia. E

ele some e só aparece à noite. Depois tudo se repete. Pode alguém assim ser coisa boa?

Quando o vejo da janela de costas tenho muito medo. Sinto um aperto no coração por

mim, por Alexandre e nossos filhos.

– Madalena, obrigada por tudo o que você me disse a respeito de Willian. Fique

tranquila, nada vai me acontecer. Olha, não comente com Alexandre sobre nossa

conversa.

– Assustei você! Moça, eu quero seu bem como quero o bem dos meus filhos.

– Obrigada pela preocupação. Qualquer problema eu recorrerei a você. Bom dia!

– Seu almoço. Será servido por Alexandre às 12:00!

– Uma última pergunta. Alexandre e você são os únicos empregados do sítio?

– Não. Há o Breno. Mas mora na cidade.

– O que faz esse Breno? – Perguntou Clara pensando no homem que trouxe o

seu carro.

– Tudo o que senhor Willian deseja na cidade.

– Obrigada Madalena, adeus!

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Page 12: Orquídeas

– Adeus, minha filha! Coitada, não sabe o que a espera!

Nesse dia antes que o crepúsculo viesse, à jovem Clara decidiu vasculhar mais

atentamente a mansão de Willian. Não achou, contudo, nada que a surpreendesse, pois

as portas de alguns cômodos estavam trancadas.

Em seguida, a senhorita resolveu durante à tarde ficar lendo alguns livros de

História na biblioteca do misterioso homem. Foi, quando um fato meticuloso aconteceu

com a moça. Ao tentar pegar numa prateleira alta da estante de livros um livro de

História, Clara acabou esbarrando numa alavanca que contornou a estante e uma porta

ofuscada foi revelada.

A moça ficou extremamente assustada com a passagem, entretanto não teve

coragem de entrar no corredor escuro que a porta sinalizava.

À noite logo cairia após esse acontecimento e o jantar da jovem foi servido na

sala de jantar por Alexandre, quando Clara perguntou:

– Alexandre, você conhece bem o Sr. Willian?

– Não muito, senhorita. Faço apenas o que ele me pede, mas se você está

perguntando sobre a vida pessoal do patrão, conheço muito pouco.

– O que ele faz durante o dia?

– Olha não sei ao certo se dorme ou se vai trabalhar, pois sai na madrugada.

Você sabe que ele é um intelectual, escritor. Deve escrever durante a noite.

– Eu encontrei uma porta falsa, hoje, atrás da grande estante da biblioteca.

– Ah, sim. Existe uma porta falsa.

– Você já entrou no corredor, Alexandre?

– Não! Jamais faria isso! E você também não deve fazê-lo. Esta casa é sondada

por câmeras. Para trabalhar com Sr. Willian, ou ter qualquer tipo de relacionamento

com ele é preciso descrição e respeito por seus espaços secretos! – Disse Alexandre,

bem exaltado!

– Não, Alexandre! Eu não ousei entrar, só estou contando a você! Desculpe-me!

– Tudo bem! Estou apenas alertando a senhorita, pois afinal de contas você será

a esposa do patrão.

– Esposa? Como assim, nem conheço direito este homem! Mal sei que ele é! –

Exclamou Clara surpresa!

– Como não senhorita! O Sr. Willian não traria uma jovem aqui, senão para ser

sua senhora. O patrão jamais trouxe mulher alguma em sua casa.

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Page 13: Orquídeas

– Mas, somos apenas amigos.

– Não é o que parece, quando ele fala de você.

– O que ele fala como diz? - Perguntou a jovem curiosa.

– Fala com brilho nos olhos. E um dos itens das instruções escritas no papel que

o patrão me entregou estava: “Cuide bem de minha jovem noiva”.

– O quê? Instruções?

– Sim. Quase todas as madrugadas o Sr. Willian me entrega em frente ao

orquidário um rolo de instruções de como o sítio deve ser tratado.

– Que loucura é essa! Adeus, Alexandre! Estou indo embora agora!

– Não senhorita, fique. O patrão não vai gosta disso! Já está quase na hora dele

aparecer!

– Pois diga ao louco de seu patrão, que me fui. Adeus! Vou ao quarto pegar os

meus pertences!

Enquanto a jovem subiu as escadas, o misterioso homem chegou. E fora até a

sala de jantar cumprimentar Alexandre e dispensá-lo do serviço como fazia todos os

crepúsculos. Alexandre tentou alertar o seu patrão sobre a decisão da jovem. Todavia,

Willian sempre tranquilo disse ao empregado que se fosse bem, pois a moça não iria

embora...

Capítulo V: Discussão e surpresa

Posteriormente a saída de Alexandre, Willian sentou no sofá da sala e aguardou

a descida da jovem. Enquanto isso, Clara estava sentada na cama de seu quarto

refletindo sobre a conversa que teve com Madalena e com Alexandre, bem como o

acontecimento da biblioteca.

A moça não conseguia compreender com que espécie de pessoa estava lidando.

Então resolveu descer com sua bolsa para ir de fato embora para sua casa. No entanto,

não esperava o encontro tão repentino com Willian:

– Olá Sr. Willian! Como foi o trabalho? – Perguntou a moça com um tom de

ironia.

– Vejo que a senhorita, não teve um dia agradável. – Exclamou o misterioso

homem com uma calma assustadora.

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Page 14: Orquídeas

– Quem é você? O que quer de mim? Que história é essa de casamento, eu não

tenho nada com você! Que loucura! - Afirmou a moça muito exaltada.

– Calma senhorita! Vou preparar um chá para ti.

– Que chá? Onde está o Alexandre? Eu vou embora para minha casa.

Uma música principiou a tocar...

– Que música, é essa!

– Fique tranqüila, senhorita! Vou fazer para ti um chá!

Enquanto Willian preparava o chá na cozinha, Clara decidiu ficar na casa do

misterioso homem, pois queria descobrir quem ele poderia ser. Pensou, além disso, em

tentar descobrir o que tinha por trás daquela porta falsa da biblioteca.

Quando Willian voltou com o chá, a moça já estava com um semblante calmo e

renovado. Assim, buscou ouvir atentamente tudo que o misterioso homem tinha a lhe

dizer:

– Tu estás mais calma agora?

– Sim. Decidi ficar mais um pouco em sua casa, Sr. Willian.

– Ah, por favor, tu me chamaste de senhor!

– Bem, Willian, eu resolvi ficar.

– Venha, vamos então tomar um chá na biblioteca. Sei que lá é um lugar que te

agrada. Quero te mostrar algo.

– Sim, eu irei.

Enquanto ambos se dirigiam à biblioteca, a música continuava a tocar... Essa

parecia ser de Vila Lobos:

– É uma canção de Villa - Lobos que toca.

– É sim, senhorita. Tome o teu chá, pois quero te mostrar algo sobre teu país e

sua cidade de coração.

– Pois bem, não precisa esperar eu beber o chá. Eu quero saber logo do que se

trata. – Falou Clara com ânsia.

Nesse momento, o homem misterioso apertou a alavanca que ficava na parte

superior da estante de livros e mostrou à moça a porta falsa que ela descobrira no cair da

tarde. A jovem ficou muito surpresa e extasiada frente ao acontecimento. Resolveu,

todavia, fingir que nunca tinha visto a porta falsa:

– Senhorita, esta porta nos levará a minha biblioteca interiorana. Venhas, tu

terás outra grandiosa surpresa. Dê - me o braço!

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Page 15: Orquídeas

– Claro. – Respondeu a moça abismada.

– Esse corredor nos levará a uma biblioteca especial! – Disse o homem confiante

na sua revelação.

Enquanto passavam pelo corredor escuro, Clara novamente percebeu as obras de

arte em gesso e pintadas em quadros, assim como no corredor que a levava ao seu

quarto. Quando menos esperou, os dois chegaram à porta da misteriosa biblioteca.

Novamente, a moça entrou em estado de êxtase devido os mistérios de Willian:

– Veja senhorita com teus olhos um recinto sobre teu país!

– É lindo, quantas obras! E esses quadros, são réplicas de Portinari, Anita

Maffalti, Esculturas de Aleijadinho, o Cristo Redentor. Por que você tem isso tudo

aqui?

– Por que admiro a grandeza e beleza do teu país. Além disso, sou um homem

curioso que se encanta por vários lugares.

– Bem, tenho que admitir Willian que fico cada vez mais surpreendida com os

seus mistérios. A sala é belíssima! Nunca vi algo parecido!

– Então, tu estás feliz!

– Não poderia ser diferente!

A moça se alegrara ao ver tantas réplicas de pinturas e esculturas de artistas

brasileiros. Bem como, livros sobre o Brasil, grandes obras de intelectuais e poetas

brasileiros, como Machado de Assis, Olavo Bilac, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de

Holanda, Câmara Cascudo, Caio Prado Júnior, entre outros. Além disso, havia discos de

grandes cantores, fotos de atores e atrizes, do teatro Tablado. Havia uma sessão inteira

sobre o samba e sobre o futebol! Sessões sobre os animais e as florestas brasileiras.

Sobre outros ritmos musicais do país como o frevo, o sertanejo, o forró. Além disso,

haviam mapas dos estados e cidades do país.

E mais, o misterioso homem tinha em sua sala um grande mapa sobre o Estado

do Rio de Janeiro. Uma maquete da bela cidade que liga seus dois lados opostos em seu

Centro: a zona sul e a zona norte. A jovem estava impressionadíssima com tudo aquilo.

O misterioso homem parecia ter uma espécie de antiquário em sua casa que trazia vários

elementos do antigo e do novo sobre a formação do Brasil, simbolizado pelo esplêndido

Rio de Janeiro, o espelho, o cristal, a menina dos lindos olhos do Brasil!

Capítulo VI: Dança e Paixão

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Page 16: Orquídeas

Enquanto, a moça admirava alegremente mais uma das surpresas do misterioso

homem, uma música ao som de violino começou a tocar. As luzes se apagaram e Jean

Willian, convidou a jovem para dançar, com uma orquídea roxa em suas mãos:

– Tu me concedes a honra desta dança, senhorita?

– Sim. – Respondeu à jovem, tímida.

– Tu não fiques envergonhada, só quero dançar contigo. Dê-me o teu braço, por

favor.

Clara, não respondeu, mas deu o braço, e começou a dançar com o misterioso

homem que a envolveu com toda sedução e beleza dele, deixando a jovem com o corpo

estremecido e leve, como uma borboleta que bate suas azas, feliz durante um dia de sol,

próximo a teia de uma feroz aranha. E levando a moça, ao som de uma valsa, Willian

fez com que ela repousasse sua cabeça no peito dele. Depois, olhou-a nos olhos e a

abraçou fortemente, e logo pões a orquídea em seus cabelos dizendo:

– Tu és uma moça, muito bela. Se eu pudesse casaria hoje mesmo contigo.

E a moça, extasiada perguntou:

– Quem é você, porque não me deixa ir?

– Fique comigo, senhorita, me apaixonei por ti! – Respondeu o homem.

– Como assim, mal nos conhecemos, por que você me encontrou naquela noite e

me trouxe à sua casa?

Após a pergunta da moça, os dois continuaram, a dançar ao longo de toda a noite

até que sem mais palavras beijaram-se e por volta das quatro horas da madrugada, o

misterioso homem resolveu que a jovem deveria ir para o quarto dela:

–Tu deves ir agora! – Disse o homem entristecido.

– Mas, porque devo ir Willian? Está bom aqui, quero ficar com você! – Disse a

moça com um olhar seduzido.

– Eu preciso ir, o amanhecer se aproxima.

– O que você faz no decurso do dia? E por que você desaparece? É o seu

trabalho? – Questionou Clara.

– Sim, é o meu trabalho... Vamos, te levarei ao teu quarto!

– Vamos, então.

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Page 17: Orquídeas

E beijando-a mais uma vez, Willian acompanhou Clara ao quarto e novamente

desapareceu...

Capítulo VII: O sonho

Clara estava acordada e alegre. A noite tinha sido feliz apesar de estranha. Clara

esteve nos braços de um homem que começava a gostar. Quando percebeu que o

misterioso homem saiu do seu quarto, quis ela pensar na noite em que estiveram juntos,

a dançar, a beijar-se e abraçar-se, além da surpresa que o homem a revelou sobre o

Brasil naquela sala. Estava fascinada e feliz, bem como admirada com tantos mistérios

ocorridos desde que conheceu Jean Willian. Clara parecia estar apaixonada. A jovem

chegou a pensar em ir procurar pelo misterioso homem. Contudo, se conteve, pois

apesar da noite ter sido bela e fascinante ela mal conhecia Willian.

Aos poucos, a jovem foi adormecendo, e o que poderia ser um agradável sonho

se tornou o mais terrível dos pesadelos. A moça começou sonhando com os beijos de

seu amado. Ela sonhou que em uma noite escura e tenebrosa estava nos braços de

Willian em frente ao orquidário. Além disso, teve as belas visões de que seu amado a

mostrara novamente aquela sala que continha elementos do tão amado e Brasil e tão

esplêndido Rio de Janeiro. Todavia, de repente Clara começou a ter muitos delírios

tenebrosos sobre a sua cidade. Ela viu horrendos hospitais com muitas pessoas feridas e

deixadas ao léu. A pior visão delas, foi ver um homem nu, numa maca de hospital, de

qual não sabia onde era ao lado de um grande shopping.

Em outro ponto da cidade, apareceram crianças e jovens, envoltos no crack, e

em outras drogas, ao lado do Cristo Redentor. No sonho havia tiroteios ao lado casas e

de canções. Tinha trens cheios, metros abarrotados de pessoas ao lado de exposições,

de jogos, de fogos. Que sonho terrível!

A moça viu ainda invasões da polícia que feriam muitas pessoas em

contraposição a grandes comemorações em Copacabana e no Maracanã! Pessoas mortas

e outras felizes! Pessoas doentes e outras sadias e risonhas! Viu pessoas intermediárias,

nem tristes, felizes, mas que podiam viver melhor!Sonhou com novos locais de

atendimento de saúde, ao lado de um grande lixão que estava sendo construído sobre

uma bela área verde. Viu novas e apresadas construções, ao lado de desabamentos!

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Page 18: Orquídeas

Por fim, a jovem começou a sonhar com o seu país! Viu crianças sendo

exploradas de todas as formas. Viu tantas crianças viciadas em drogas, vendidas. Viu

construções de Shoppings, grandes shows, espetáculos, recolhimentos de pessoas.

Que coisas horríveis! Acordou a moça com um grande susto, que sonho horrível!

E começou a chorar sentada na cama, pois tivera um assombrador pesadelo. E pensou

que talvez tenha sido influenciada pela televisão que vira dias antes, mas como tudo isso

aparecera de uma só vez em seu sonho? Perguntou-se Clara.

A jovem não conseguiu dormir mais, e o primeiro pensamento que passou pela

sua mente após a crise de choro, foi fugir daquele lugar onde estava. Contudo, não teve

coragem, pois estava muito envolvida e possivelmente apaixonada pelo misterioso

homem, ainda que sem saber quem de fato ele fosse.

Logo, a manhã veio e a jovem adormeceu, e passou o dia no quarto, sem descer

para comer ou fazer qualquer outra coisa. Até que o crepúsculo chegou, Clara tomou

seu banho, e mais uma vez Jean Willian foi a visitar, desta vez com um presente:

– Olá senhorita! Como tu estás? Soube que não tu não desceste. O que te

aconteceu?

– Não estou me sentindo bem hoje! Eu quero ir embora, o meu carro está

preparado?

– Não senhorita, gostaria de jantar contigo hoje e trouxe algo para você!

E a moça se exaltou:

– Olha, eu não conheço você. Eu vou hoje embora, não importa o que você diga

ou o que você faça! Adeus! – Levantou-se a jovem exaltada. Mas, Jean Williams

calmamente lhe falou.

– Trouxe estas flores para ti! São orquídeas, eu mesmo as planto, tenho um belo

orquidário e gostaria de levar-te lá! – Respondeu o homem tranquilamente.

– São lindas! Obrigada, mas não ficarei mais, preciso ir! Onde está o meu carro?

– Está na garagem. Ficarei desapontado se ires! – Exclamou o homem.

– Sendo assim, ficarei apenas hoje. Mas, amanhã cedo irei para a minha casa,

pois preciso voltar para o Rio de Janeiro.

– Está bem, isso se tu ainda quiseres voltar. Entretanto, vai jantar primeiro e te

esperarei na sala.

– Você não come? – Perguntou à jovem.

– Logo terei meu alimento...

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Page 19: Orquídeas

E ambos foram de braços dados ao primeiro andar da mansão. A jovem jantou,

pois estava faminta. Willian a serviu e depois a esperou na sala, diante da janela que

estava em direção ao orquidário, posteriormente, foram eles ver as orquídeas...

Capítulo VIII: As Orquídeas

Chegando lá no orquidário, Willian mostrou cada arranjo de flores que preparou

à jovem. Havia arranjos com combinações de vários tipos de orquídeas, e dentre um dos

arranjos o homem pediu à moça que procurasse algo. Ao achar, Clara percebeu que era

um belo cartão no qual estava escrito:

“Queres casar-te comigo, senhorita Clara Rafaela?”

– Como assim? – Perguntou a moça surpresa.

– Me apaixonei por ti, quando te vi saindo à noite do museu imperial, quando

fostes fazer tuas pesquisas. Fiquei todos esses dias a te vigiar. Fui eu que furei teu pneu,

quanto à chave, não foi façanha minha.

– Quem é você senhor Willian, porque você está dizendo isso, quais são as suas

intenções comigo? Eu mal conheço você! – Disse Clara apreensiva.

– Será que realmente tu não me conheces senhorita, de longa data?

– Que eu saiba não. Por favor, vamos parar com essa conversa, ela está me

deixando encabulada. Eu tenho que ir embora. Na noite passada tive pesadelos

horríveis. Algo poderá acontecer, tenho que ir ao Rio. Minha família está lá. E eles já

devem estar preocupados comigo. O meu carro? Como você conseguiu que o abrissem?

– Me desculpe Clara. Eu não a intenção de magoá-la. Eu entendo. Enfim tenho

os meus meios.

– Você me chamou de Clara, foi a primeira vez que me chamou pelo meu

primeiro nome sem o “senhorita”.

– O que posso fazer Clara, para ter o teu amor?

– Você é muito sedutor Willian, mas isso não é o suficiente para que eu me case

com você. Eu sempre tive a minha vida, o amor não é feito de conquistas repentinas e

muito menos de beijos e abraços. Bem, eu vou me deitar. Amanhã quero acordar cedo e

ir embora.

– Tudo bem, tu deves ir, pois esta é tua vontade.

– Quem é você senhor Williams, se ao menos eu soubesse. Boa noite!

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Page 20: Orquídeas

– Boa noite senhorita! Um dia tu saberás quem eu sou. Ah, não te esqueças

quando fores de’ levar contigo as orquídeas...

Capítulo IX: Compreender

Após a conversa no orquidário de Clara com Willian, a jovem resolveu subir

para o seu quarto e dormir para na manhã seguinte ir embora. Contudo, ao deitar na sua

cama ficou pensando sobre tudo que aconteceu desde o dia em que conhecera o

misterioso homem. Pensou no porquê de Willian não querer falar sobre ele, e qual o

motivo de sua vinda para o Brasil. Pensou no pedido de casamento, pensou na

misteriosa casa, nos objetos, no antiquário sobre país dela. Pensou também na ausência

durante o dia do estranho homem. Pensou no que ele disse sobre ela o conhecer de

longa data. A jovem resolveu, então, ficar e tentar compreender um pouco sobre o

enigmático homem.

A jovem Clara sempre foi uma moça muito curiosa e questionadora, todavia,

apesar de ter em sua mente o desejo de ordem e progresso em sua vida, ela sempre foi

um pouco tímida em seus sentimentos, nunca conseguiu os expor de fato. A moça

sempre foi uma pessoa impetuosa, forte e capaz de enfrentar sozinha, os desafios da

vida e também de uma sociedade excludente, conservadora e desigual. A menina

desejou consecutivamente um sonho: ser capaz! Tornar-se uma moça perfeita,

desenvolvida no patamar das pessoas tidas por ela como superiores. Um sonho ideal de

alcançar algo que a menina sempre cultivou ao longo de sua vida.

Um patamar quase mitológico de ser uma mulher ideal, moderna, ordenada na

vida, estável economicamente. A mulher do progresso, desenvolvida, tanto na

concepção dos outros, como na sua, em sua relação entre o “eu” e o “outro”. Mas quem

não tem seus sonhos? Quem não se engana em suas concepções ao longo da vida?

Quem não tenta agradar os outros ao invés de agradar a si mesmo? E quem não pensa

que o progresso e a civilização é a melhor escolha para a vida? E quanto à razão? A

jovem Clara prezava a racionalidade mais do que tudo. Certamente, Clara não era a

única...

A moça não podia negar, além disso, que no seu interior ela estava começando a

gostar de Willian. Clara não sabia ainda quem ele era, mas se sentia inquieta e fascinada

pela beleza do homem. Jean Willian era formidável, sedutor e fascinante tanto no seu

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Page 21: Orquídeas

porte físico quanto nos seus atos corteses. Entretanto, faltava à Clara conhecer um

pouco do mundo interior dele, e isso era o mais difícil, pois ele não revelava facilmente.

Quais seriam os pensamentos deste misterioso homem? Quais suas ideologias? O que

estaria por trás de tanta cordialidade?

A jovem Clara era o tipo de pessoa que compreendia o amor como uma

abstração e como um conceito essencial para a vida. Embora, não soubesse lidar com

ele, o tinha como o ponto mais crucial que o ser humano poderia pensar em

compreender e em viver. Na concepção da moça, até um olhar poderia transmitir a

forma do verdadeiro amor e era isso, que a jovem buscava no olhar e no interior de

Willian. Apesar de temerosa às vezes, Clara era uma jovem corajosa e verdadeira com

seus sentimentos, por isso ela resolveu ficar.

Capítulo X: A decisão

Depois da decisão de ficar na casa de Willian, Clara sentiu um impulso

repentino de ir comunicar ao homem misterioso essa notícia. Ao descer do quarto foi

encontrá-lo na biblioteca, pois sabia que ele estaria lá. Assim, a jovem o encontrou

lendo um livro e exclamou:

– Como poderei me casar com um homem que não conheço?!

– Ora, senhorita! Tu não me conheces? Tu sabes que sim, dos teus sonhos... Mas

entendo que tu deves me conhecer e descobrir quem sou eu! Somente não te

decepciones se descobrires! – Argumentou o homem exaltado.

- Tenho certeza que não vou me decepcionar, por isso eu ficarei!

- Prefiro que vá, será melhor para ti!

- Quando me decido, vou até o fim Willian! – Retrucou a impetuosa jovem.

- Tu não tens medo das consequências, senhorita?

- Eu só tenho medo de mim mesma.

- Está bem! Fique a vontade em minha casa.

- Boa noite, Willian!

- Boa noite, senhorita Clara, tenha bons sonhos!

E a jovem saiu depressa da biblioteca para subir ao seu quarto. Lá refletiu em

sua cama se a decisão que tomou era correta, visto que Willian era desconhecido.

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Page 22: Orquídeas

Contudo, Clara pensou que não poderia viver com aquela dúvida em sua mente. Ela

queria descobrir quem era aquele homem.

Clara pensou ainda na mudança de opinião de Jean Willian, pois agora ele queria

que a moça fosse embora de sua casa. Uma estranha mudança de postura que parece ter

sido tomada bem no momento em que a jovem disse que ficaria. Clara sabia também

que Willian não a amava e que ela fazia parte de algum tipo de projeto do estranho

homem, mesmo assim, ela resolveu ficar. No fundo a jovem não resistira aos encantos

dele, entretanto, desejava investigar a vida daquele enigmático homem. Logo Clara

adormeceu, pois à hora já se estendia pela madrugada.

No dia seguinte, enquanto durmia a moça, alguém batia pela manhã na porta de

seu quarto. Era para surpresa de Clara, Madalena a mulher de Alexandre:

– Pode entrar. – Respondeu Clara.

– Sou eu senhorita, a Madalena.

– Oi Madalena, Bom dia! Entre. Que coisa boa a sua visita, a que devo a honra

de sua presença, você não entra nesta casa.

– Senhorita Clara, bom dia. Eu vim porque estou preocupada com a senhorita.

– Ora Madalena, deixe a senhorita de lado. E por que a preocupação comigo?

– A senhorita, digo, você Clara, ainda está aqui nesta casa, com este homem. Ele

é louco, vai embora daqui, você e eu não sabemos quem ele é. Só estou aqui neste sítio

porque Alexandre insiste, mas a senhorita não deve ficar. – Disse Madalena com um ar

amedrontado.

– Calma Madalena. Por que você está assim? Fique tranquila, nada vai me

acontecer. Vou ficar mais um tempo, pois preciso descobrir quem é Willian. Não

precisa temer, ao final vai dar tudo certo. E se você me ajudar descobriremos juntas

quem é este homem.

– Ajudar? O que posso fazer para ajudar à senhorita? Eu quero o seu bem. Eu

tenho muito medo dele.

– Bom. Primeiro Madalena pare de me chamar de senhorita. Chame-me de você.

Precisarei de sua ajuda para descobrir o que Willian quer. Eu sei que estou vivendo num

jogo e quero descobrir as intenções do jogador. Mas precisarei de você, pois Alexandre

não parece estar disposto a dizer quem é o patrão, nem suas verdadeiras intenções. Você

me ajuda?

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Page 23: Orquídeas

– Sim Clara, eu quero ajudar você. Mas só se você me prometer que assim que

saber quem é o senhor Willian, a senhorita, digo você, vai embora.

– Às vezes eu acho que você Madalena sabe quem ele é. Mas não quer me

contar. Qual é o seu medo e também o de Alexandre? – Disse Clara, desconfiada.

– Nenhum, eu só quero o seu bem, como você disse, não sabemos quem é este

homem. Bom eu já vou, o que você precisar sabe onde me procurar.

– Adeus Madalena. Espere! Responde-me uma coisa, Willian nunca aparece

durante o dia mesmo?

– Não senhorita.

-–Obrigada Madalena, não diga nada a Alexandre, por favor.

– Não senhorita. Não direi. Mas, tome cuidado, ao anoitecer o senhor Willian

retorna. Espere eu acho que tem alguém que poderá nos ajudar. Se você estiver disposta

em sair alguns instantes comigo? Tem uma senhora aqui do interior que consegue

desvendar as coisas.

– Sim. Eu vou. Podemos ir agora? – Disse Clara curiosa.

– Então vamos, porque o Alexandre não está no sítio. Eu vou me aprontar.

Espero a senhorita no orquidário. Até.

– Está bem. Eu vou comer algo e encontro você lá daqui a meia hora. Está certo?

– Sim.

E Madalena deixou Clara sozinha em seu quarto. A jovem decidiu comer algo e

trocar-se logo para juntas irem visitar a velha senhora antes que o Crepúsculo chegasse.

Ela desejava que à noite caísse logo, pois buscaria interrogar Willian. A jovem estava,

portanto, decidida a ficar e desvendar o mistério que envolvia o jogador...

Capítulo XI: Os conselhos da bruxa

Conforme o combinado Madalena e Clara encontraram-se no orquidário.

Aproveitando que Alexandre não estava no sítio, elas foram às pressas a pé à casa da

senhora. A casa da vidente não era longe. Elas demoram quarenta minutos para

chegarem lá. A casa localizava-se em um pequeno morro. Do lado oposto ao sítio de

Willian. Finalmente viram a bruxa esperando na porta de sua casa. Uma casinha de

barro com uma cobertura de sapê. A mulher estava sentada fazendo tricô perto de seu

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Page 24: Orquídeas

fogão de lenha. A comida estava cheirando longe. Os cachorros estavam deitados ao

redor de sua dona até que avistaram Madalena e Clara. Logo eles saíram a latir pelo

cercado de bambu que envolvia o terreno da senhora. As galinhas estavam mariscando

soltas pelo quintal. Havia também uma cabra e muitos gatos pelo quintal. As mulheres

bateram palmas em frente ao portão de bambu. Quando a senhora levantou-se e foi

atender às senhoras:

– O que estão procurando minhas filhas?

– A senhora. – Respondeu Clara.

– Sim. Eu já sabia. Entrem por favor. Madalena como vai? – Perguntou à amável

senhora que tinha um rosto terno, uma baixa estatura, a pele enrugada, as mãos com

calos e um lenço na cabeça.

– Eu vou bem, dona Dionísia.

– E você minha mocinha? Como está? – Perguntou a vidente a Clara:

– Estou bem senhora.

– Entrem então.

Chegando lá. A senhora pediu que elas sentassem nos banquinhos de madeiras

que havia no quintal e esperassem lá, enquanto ela pegaria a chaleira para esquentar

água para coar um café. – Não se preocupem minhas filhas, serei rápida. Logo coou o

café, buscou umas xícaras em casa e serviu as visitas. Enquanto bebiam o café em

silêncio, a amável senhora disse as mulheres sentadas no quintal:

– O que direi a vocês é o que digo sempre. Eu não adivinho as coisas. Apenas

partilho a sabedoria de uma mulher que já viu muita coisa nesta vida. Este homem que

vocês vieram saber sobre ele. Ele tem um coração mediano. Não é ruim, nem mão.

Apenas humano. Um humano de longa data. Já deveria ter partido deste mundo, mas

ainda está aqui. Ele pode fazer mal sim. Tenha cuidado jovem moça. Ao mesmo tempo

ele pode não fazer nada. Ele não é tão mal assim. A escolha será dele. Todos nós

podemos escolher. Uns mais, outros menos. Tem pessoa que não tem escolha. Mas este

homem poderá escolher, pessoas como ele sempre podem. Eles controlam suas vidas e

também as vidas dos outros. Agora vão. Tenho que alimentar meus animais que são

muitos... Clara e Madalena não conseguiram dar uma só palavra. Apenas ouviram os

conselhos da senhora que parecia ser uma mulher muito sábia.

Capítulo XII: Perguntas e Aventura

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Ao chegarem ao sítio a jovem logo foi à procura de alguma pista na casa do

misterioso homem. Mas nada encontrou além dos quadros e dos livros, pois os quartos e

as salas estavam trancados, os computadores desligados, os diários pareciam estar

guardados. Contudo, talvez Clara não prestasse atenção na ausência de importantes

objetos e símbolos para a compreensão de quem seria o jogador.

A moça se preparou como nunca para aquela esperada noite. Arrumou-se,

passou perfume, prendeu os cabelos com uma orquídea e pediu à Madalena que

ajustasse um belo vestido que encontrou no seu quarto, um dos muitos que Willian

colocou lá. Clara também refletiu sobre este fato. A jovem também pensou porque seu

quarto não parecia ser de hóspedes, mas aparentemente preparado para uma mulher. A

moça jantou e resolveu aguardar a chegada de Willian na biblioteca, queria interrogá-lo,

mas não de uma forma muito formal. Logo, o misterioso homem chegou:

– Boa noite, senhorita Clara, como passaste o dia?

– Boa noite Willian, passei muito bem. – Respondeu a jovem com um olhar

misterioso.

– Que bom! Fico feliz que estejas bem em minha casa.

– E o frio, como o tempo está descontrolado. – Disse Clara mudando o rumo da

conversa.

– Sim, senhorita, está bem frio.

– O que o senhor prefere? Frio ou calor?

– Bom convenhamos, que Petrópolis não é um lugar muito quente, por isso vim

para cá.

– Ah, quer dizer que o senhor prefere o frio e também à noite, pois só surge

durante a noite. O senhor deve preferir a Europa, pois lá é frio. Sendo assim, quais são

seus interesses no Brasil?

– Boa senhorita o Brasil é um lugar crucial para mim, pois tenho negócios aqui.

– Que tipo de negócios? Eu posso saber? – Indagou a moça.

– Flores, senhorita. Sou um empresário de flores.

– Ah sim.

– A senhorita quer que eu te prepare um chocolate quente.

– Quero sim. Que pena que o senhor nunca me acompanha em seus quitutes.

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Page 26: Orquídeas

– Bom, acredito que a noite está belíssima hoje. E apesar de muito frio, o céu

está estrelado e a lua cheia. A senhorita não quer me acompanhar ao orquidário, pois

vou cuidar de minhas flores, depois de tu tomares o chocolate.

– É claro, Williams. O senhor parece estar bem ocupado hoje. Não ficarei por

muito tempo para atrapalhá-lo.

– Não senhorita, fique quanto tempo desejar, é que hoje preciso cuidar das

flores.

– Acho que não quero o chocolate, quero ir agora com você ao orquidário.

– Sendo assim, é melhor ir colocar uma roupa mais quente, pois lá fora está

muito frio. Embora a senhorita esteja lindíssima com esta roupa. Vejo também que tens

uma orquídea no cabelo. Como tu estás bela... – Disse Willian com anseio no olhar.

– Obrigada. Vou me trocar.

– Eu te esperarei.

Em seguida, a jovem desceu com uma nova roupa, agora de calça comprida e

casaco. E foram para o orquidário. A noite estava fria e clara, iluminada pela lua cheia.

Ao chegarem ao orquidário, a moça imediatamente perguntou:

– O seu sítio é muito extenso?

– É sim senhorita. É extensíssimo.

– E você tem outras propriedades no Brasil?

– Sim, tenho no Rio Grande do Sul.

– Você mantém este sítio e os outros somente com as orquídeas? – Perguntou

Clara curiosa.

– Sim. Mas, também tenho minhas propriedades na Europa.

– E por que está aqui, então. É por conta da crise financeira mundial?

– Perguntou Clara inquieta.

– Não senhorita, em parte sim, eu tenho investimentos aqui, mas antes da crise

quis vim para cá, sempre visitei o Brasil. Mas afinal porque o interrogatório hoje?

– Nada, em especial. Estão lindas suas flores.

– Obrigada.

Neste momento, Clara se aproximou de Willian com muita sedução. Simulou que iria

beijá-lo, entretanto, parou no meio do caminho e disse:

– Bem vou entrar.

– Tudo bem, boa noite senhorita Clara Rafaela.

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– Boa noite Willian.

E a jovem Clara foi insatisfeita para a mansão, posto que Willian parecesse um

pouco indiferente a ela, respondendo naturalmente as suas perguntas. No meio do

caminho, a moça se irritou e foi novamente encontrar o misterioso homem que estava

trabalhando nas orquídeas do seu jardim:

– Senhor Jean Williams, precisamos conversar!

– Senhorita, tu voltastes. O que houve?

– O que o senhor quer? Primeiro você vivia me seduzindo, me trouxe para essa

casa, não me deixou ir embora. E agora está indiferente a minha presença! Eu exijo que

me diga agora quem é você, e quais são suas intenções! Estou cansada deste mistério! O

que você faz aqui em Petrópolis?

– Calma senhorita! Vejo que tu estás muito exaltada. É melhor ires descansar.

– Eu estou muito bem. Eu quero saber agora, quem você é! E pare de cuidar

destas flores, olha nos meus olhos!

– É melhor tu ires, senão.

– Senão o quê?

– Eu vou te deixares aqui falando sozinha.

– Você não teria coragem!

– Pois saiba que sim. Com sua licença, adeus!

– Seu grosso! – Exclamou a jovem aborrecida.

Willian saiu da presença de Clara, e foi andando em direção a um estábulo

distante, depois da casa de Alexandre e Madalena. A jovem num ímpeto de raiva foi

atrás do misterioso homem. E o encontrou montando em seu cavalo e partindo para um

caminho que visava ser longo e bem longe. Como fosse uma mulher corajosa, Clara

rapidamente entrou no estábulo que ficou aberto e pegou um cavalo com intuito de

seguir o homem. Esperou alguns minutos. E logo montou no animal. Para sua sorte o

cavalo era muito veloz e manso.

Willian seguia assim para o interior de seu sítio, que dava para o início de uma

alta colina rodeada por precipícios e matas. A noite continuava estrelada, porém muito

fria, com uma grande nebulosidade. Quando o homem percebeu que a jovem o seguia,

tratou de ir mais rápido com seu cavalo. Contudo, Clara não hesitou e com um cavalo

mais veloz, ficou logo atrás dele. Willian, não havia contado com os dotes de montaria

da jovem que sempre gostou de andar a cavalo. Ao chegar bem próximo do homem,

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Clara gritou para que ele parasse, pois queria falar-lhe. Ele, entretanto, continuou a

cavalgar mais rápido, como se quisesse fugir da corajosa moça:

– Eu não vou parar senhorita, é melhor tu desistires. – Gritou o homem.

– Então nós ficaremos cavalgando à noite inteira! – Replicou a jovem.

–Vai embora senhorita, não quero que te machuques. Aqui é perigoso, tu podes

cair, nessas pedras.

Quando ainda acabava de falar, o cavalo de Clara se assustou com um barulho

na mata e começou a empinar, a jovem ficou assustava, mas conseguiu conter o cavalo.

Willian parou e foi socorrê-la, acalmando o cavalo:

– Tu estás bem senhorita?

– Foi só um susto, vamos descer e parar num lugar? – Disse Clara ofegante.

– Sim, vamos. Ali, perto daquela pequena pedreira.

– Está bem, vamos.

E parando amarraram os cavalos nas árvores e ficaram a observar o luar, bem

como a altura do morro em que estavam:

– Eu sempre venho aqui senhorita. Tem muitas frutas, frio, escuridão. Posso ver

a lua de mais perto.

– Esse lugar é lindo, é uma bela vista. Que aventura! – Disse Clara.

– Tu estás bem, te machucastes? Tu foste muito corajosa.

– Sim, estou bem. Obrigada.

– Vamos descansar um pouco, então, na pedra. Tu queres o meu palitó, está

muito frio?

–Sim, quero.

E sentaram em silêncio na pequena pedreira. Ali eles ficaram bastante tempo

sem falarem nada, entretanto sentados um ao lado do outro naquele frio. Até que se

deram às mãos e finalmente abraçaram-se...

XIII – Confissão e a Carta:

Após a aventura vivida por Willian e Clara, o misterioso homem decidiu voltar

para casa, pois faltariam poucas horas para o amanhecer. A jovem adormecera e

Willian começou a pensar na loucura que poderia cometer se a jovem continuasse ali

dormindo tão próxima dele. Assim, resolveu acordá-la, depois de ter refletido algum

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tempo. Esse gesto seria de certa forma um adiantamento da decisão posterior de

Willian. Pela primeira vez, o misterioso homem parecia manifestar verdadeiramente sua

personalidade:

– Senhorita Clara, por favor, acorde! Temos de ir, o dia se aproximará daqui a

duas horas. Acorde, senhorita!

– Sim, já está na hora de irmos?

– Sim. Tu irás comigo no meu cavalo.

– Ah, não precisa. Eu vou atrás de você. – Respondeu a moça ainda sonolenta.

– Não. Faço questão de ires comigo. O outro cavalo sabe voltar sozinho.

– Sendo assim, tudo bem. Estou com muito sono.

– Então vamos, me dê tua mão.

Ao dar a mão para o estranho homem, Clara olhou bem nos olhos dele. E em

seguida tentou beijá-lo, colocando as suas dóceis mãos no rosto dele. Entretanto ele

sutilmente se esquivou, dizendo que deveriam partir. Contudo, ao caminharem até os

cavalos, Willian fez um gesto gentil de estender sua mão para ajudar a jovem montar no

cavalo dele e olhando em silencio para a moça, acabou a surpreendendo com acalorado

beijo. Em seguida se desculpou, dizendo que não poderia beijá-la:

– Mas porque não, Willian? Eu quero seus beijos!

– Desculpe - me, senhorita! Mas, não posso magoar- te dessa maneira!

–Tudo bem. Você parece está confuso. Esquece o que eu lhe disse. – Respondeu

Clara com lágrimas nos olhos.

– Não chores, por favor, não suportarei ver-te sofrer. Eu não sei o que está

acontecendo comigo. Eu preciso ir, adeus! – Respondeu o homem com desespero na

voz.

– Willian. Espera calma!

O misterioso homem montou com muita pressa em seu cavalo e saiu muito na

frente da jovem, que enxugou suas lágrimas e subiu logo cavalo dela, tentando

acompanhar Willian que desaparecera ao longo do caminho. Como o dia não tardou em

nascer, a jovem pode chegar segura a casa. Transtornada, perguntou a Alexandre que

fora ao encontro dela nas montanhas:

– Onde está o Willian, Alexandre! Ele me abandonou, que cretino! – Disse a

brava jovem.

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Page 30: Orquídeas

– Calma senhorita. Ele não lhe abandonou, ele me mandou ir ao seu encontro. A

senhorita está bem?

– Sim estou. Mas com raiva daquele covarde.

– Vamos, então. A senhorita precisa descansar e se alimentar.

– Vamos. Mas diga a ele que irei embora. Que canalha, patife, safado! –

Esbravejou a jovem.

–Tudo bem, senhorita! Mas primeiro você precisa descansar e comer alguma

coisa.

– Está bem, Alexandre. Vamos!

Ao chegar à casa de Williams, Clara se alimentou e logo foi dormir. Ao acordar

quando já estava noite, a moça teve uma desagradável surpresa, uma carta foi deixada

por Willian no criado mudo do quarto. Assim que acordou, Clara viu a carta que Jean

Williams lhe deixou no criado - mudo. Em seguida, pegou a carta e leu-a:“Senhorita Clara Rafaela, Por fortes motivos, necessitei me ausentar para outro lugar que seja longe de minha casa. É

bem verdade, senhorita, que estou confuso quanto a meus pensamentos e decisões.Preciso compreender o que está acontecendo comigo, assim, compreendo que para o teu bem,

seria melhor que tu fosses para a tua casa.Não sabes de fato quem eu sou e quais foram minhas intenções iniciais. Por favor, tu deves ir embora e te esqueceres de tudo que passamos.

Eu não saberei como agir, como me comportar frente a ti, pois estou muito confuso, sem ideias ou reflexões.Meus empregados estarão a tua disposição quando fores.

Peço que me perdoe e não entendas essa carta como uma desfeita a tua presença em minha casa, mas como o salvo-conduto de teu destino. Prometa que me esquecerás. Eu não devia ter obrigado a tua presença em minha casa. Perdão senhorita, eu mereço ser desprezado pelos teus sentimentos.

Alexandre entregará a ti um arranjo de orquídeas. Vai salva tua vida e apaga-me de tua mente, bem como de teu coração. Não mereço teu amor. Acredite, pela primeira vez estou sendo sincero.

Jean Willian Lindorck Hauser, 23 de julho de 2010.”

Quando acabou de ler, Clara começou a chorar sentada na cama e decidiu ir

embora da casa do misterioso homem. Desceu, falou com Alexandre e com Madalena

que a aguardava no quintal. Tudo já estava preparado para sua partida:

– Adeus, Alexandre e Madalena! E obrigada por tudo.

– Não tem de quê senhorita Clara. Fiquei muito triste com a decisão do patrão.

–Disse Alexandre.

– Não se preocupe Alexandre. Está tudo bem. – Argumentou Clara com um

olhar desamparado.

– Madalena, obrigada por sua dedicação. Por tudo. Você bem que me avisou.

– Ah senhorita! Que tristeza. No fundo gostaria que ficasse.

– Obrigada Madalena! Bem tenho que ir. O meu carro está pronto, certo?

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Page 31: Orquídeas

– Sim. – Respondeu Alexandre. Está do lado de fora do portão do sítio. Aqui

estão as chaves.

– Ainda não sei como Willian conseguiu encontrar essas chaves. Sei que você

não irá me responder Alexandre.

– Não se preocupe com isso senhorita. Você deve partir o quanto antes para o

seu próprio bem.

– Você está certo Alexandre. Vocês me acompanham até o portão do sítio?

– Sim, senhorita. Vamos Madalena?

– Vamos sim. – Respondeu Madalena.

Após se despedirem por uma última vez, a jovem voltou para sua casa em

Petrópolis deixando para ir ao Rio de Janeiro visitar sua família outro dia. Fez o trajeto

do sítio ao centro de Petrópolis em profundo silêncio. Logo que chegou seguiu para seu

quarto, chorou mais um pouco, dormiu, acordou e prosseguiu sua vida conforme

Willian a havia recomendado. Enquanto isso. Alexandre perguntou a Madalena que tipo

de amizade ela tinha com Clara. Perguntou se a esposa teria revelado os segredos do

patrão. Madalena insistiu que não:

– Tem certeza Madalena que você não disse nada? – Perguntou novamente

Alexandre à esposa.

– Não. Eu já disse que não. – Respondeu Madalena apreensiva.

– Espero que para o nosso bem você esteja dizendo a verdade. Você sabe do que

ele é capaz. Você bem sabe o que ele é.

– Mas Alexandre ele nunca nos feriu, nem aos nossos filhos!

– Porém agora ele está apaixonado pela moça. Mas não quer revelar-se. Um

homem apaixonado pode fazer muitas coisas. Inclusive a quem sempre foi fiel como

nós. Apesar de provermos tudo para ele. De eu colocar os animais lá para ele se

alimentar. Mas nós sabemos o que é. Nada mudará isso! – Disse Alexandre preocupado.

– Não se preocupe marido. A senhora Dionísia disse que tudo ficará bem.

– Ela pode ser sábia Madalena. Mas eu não acredito em vidência. Vocês não

deveriam ter ido lá. E se ele machucar a pobre senhora. Por que ela sempre soube o que

ele era. Ela foi quem nos contou. Aquela velha é esperta, ela descobre tudo. Eu não sei

como...

– Eu sei. – Disse Madalena.

– Como mulher?

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– Um dia ele chegou lá, pedindo algumas ervas. Tinha alho e um crucifixo na

casa dela. Então ele se apavorou!

– Ele foi pedir ervas? Para quê?

– Ora, para ver se voltava ser humano com alguma porção. Ele ouviu falar da

fama de curandeirismo de dona Dionísia.

Alexandre e Madalena passaram toda a noite conversando sobre a identidade de

Jean Willian e do pobre destino que estaria reservado para Clara Rafaela. Ambos

sabiam que ele iria atrás da moça.

Capítulo XIV: A verdade

Clara permaneceu em Petropólis, pois decidiu que escreveria seu trabalho

acadêmico lá. Certo dia ao escrever no computador até altas horas da noite, a jovem

estudante resolveu ir dar uma volta sozinha em uma Praça de Petrópolis, sentou nas

escadarias da Catedral de São Pedro de Alcântara e lá ficou pensando sobre sua vida,

suas ideias, sonhos e projetos. A noite estava estrelada e a lua cheia.

A moça não admitia, mas estava triste e depressiva, até que começou a refletir

sobre sua própria identidade. Pensava em quem era, do que gostava, se saberia cuidar e

governar sua própria vida. Refletiu se preferia ela tomar suas decisões, conduzir sua

vida, ou se preferia que os “outros” a conduzisse ou impusesse suas opiniões e escolhas.

A jovem pensou em quais seriam seus valores, e se uma escolha própria seria

para ela uma causa a lutar, um ideal, uma ideologia. Depois de refletir sobre isso, Clara

resolveu ir pegar seu carro que estava estacionado em frente à Igreja, e ir até a Praça do

Palácio de Cristal para contemplá-lo. A hora já estará avançada quando Clara chegou lá,

e no caminho encontrou com um guarda que a indagou porque estaria de carro sozinha.

Ela respondeu que estava indo para casa e continuou seu trajeto para o palácio.

A verdade é que Clara ficou sentada em frente ao Palácio fechado até a

madrugada, pensando em Willian, em quem ele era. O misterioso homem em tal

madrugada, no pensamento de Clara, já deveria estar em casa, acordado em sua

biblioteca lendo algo. Durante a manhã com certeza se ausentaria, como sempre fazia,

em meio a estadia da jovem em sua casa.

Clara não acertou. Willian não estava em sua casa, estava a caminho, chegando

ao centro de Petrópolis. Ele estava dirigindo em grande velocidade, logo chegou ao

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Page 33: Orquídeas

Palácio de Cristal como se pressentisse a presença da jovem naquele lugar. O misterioso

homem ficou de longe observando a moça. Porém, não se manifestou.

Contudo, Clara não decidiu ir dormir naquela madrugada, pegou rapidamente o

seu carro, que não ficava distante do Palácio de Cristal, e saiu em direção ao Rio de

Janeiro, saiu da cidade de Petrópolis. Willian foi atrás dela, mas ela não percebeu.

A jovem foi em rápida velocidade. Até que chegou a Serra de Petrópolis, a

famosa BR-040. A Serra estava escura e nebulosa, embora o céu estivesse claro. Willian

continuou a seguindo de longe. Depois de um longo percurso, a moça resolveu parar o

carro em frente a um mirante sob grande altura e precipícios. Clara parecia

desgovernada. Estaria ela fora de si?

O misterioso homem parou um pouco atrás, ligou o pisca alerta e ficou a

observando a jovem. Clara ficou encostada nas colunas do mirante olhando o precipício

da grande Serra. Dali dava para ver bem as estrelas e a lua. Foi quando Willian decidiu

descer do carro, e com uma face apresentando o sentimento de medo, decidiu ir ao

encontro de sua amada. Pela primeira vez, Jean Willian sabia que amava alguém. Ao se

aproximar de sua paixão, falou sutilmente:

– Senhorita Clara! Não te assustes sou eu, Jean Willian.

A jovem virou o corpo com uma expressão trêmula. E o homem continuou:

– Senhorita, me perdoe por tudo. Eu vim aqui para te dizer que eu te amo. Não

sei como posso, mas te amo. Não quero te perder! – Disse o homem gaguejando.

– Como assim, Willian? Você disse que eu deveria ir embora. Agora está aqui!

Você me seguiu! Afinal, o que você quer? – Respondeu a jovem estarrecida.

– Eu preciso te dizer a verdade, eu estou sendo sincero. Eu preciso que tu saibas

quem eu sou. Depois, tu podes me odiar, pois mereço. Mas, me escute, por favor.

– Sim, pode falar!

–Tu sempre quiseste saber sobre mim, quem eu sou. Hoje vou te falar. Eu sou

um vampiro e você é a minha vítima. Eis a verdade!

– O quê? Que brincadeira é essa Williams! Você quer que eu acredite nisso! Que

absurdo, seu infantil! Vai me dizer que você tem séculos de vida, e que o sol o derrete!

– Exatamente. Por isso, aparecia a você apenas durante a noite. – Respondeu o

homem com um olhar sereno.

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– E você quer que eu acredite nisso, Willian? Diga a verdade! Você está

arrependido de ter me abandonado em sua casa e agora me vem com isso! – Disse a

jovem com raiva.

– Sim, eu estou arrependido. Por tudo de mal que te fiz, por ter te levado para

aquela casa, por querer você como minha vitima. Perdoe-me! Digo a verdade, pela

primeira vez em minha existência!

– Seu louco! Você me levou para aquela casa, e agora me diz isso! Eu posso

processar você. – Respondeu a jovem exaltada!

– Nos seus sonhos, um homem de capa preta aparecia. Tu estavas numa

montanha, o céu estrelado, a lua cheia, alguém a abraçava por de trás. Tu tinhas medo,

mas permitia o abraço. Uma música tocava. Sou eu, o vampiro que te perseguia! Eu te

atraí para minha casa, pesquisei os teus trajetos, sua profissão, teu jeito de ser. E você

Clara, por sorte minha, devido aos teus gostos te encaixastes no meu perfil e no da

minha casa. Por isso, te atraí para lá e fiz de tudo para conquistá-la. Usei minha

elegância, minha cortesia, dissimulei tudo. Mas...

– Como assim! – Interrompeu Clara.

– Por favor, não me interrompa. As coisas não saíram como eu previ. Tu és uma

jovem resistente, decidida e acabaste confundindo minhas ideias e meus sentimentos, se

é que eu posso sentir. Eu sempre agi de forma fria, apesar de ter tido um lado humano,

sou imortal.

– Eu não sei o que dizer. Willian!

– Por favor! Eu peço que tu me escutes. Respondo a tua antiga pergunta. Eu

cheguei aqui por volta de 1850, durante o reinado de Dom Pedro II, fui convidado por

ele. Desde este período sempre passei as férias aqui no Brasil. Já morei no Sul do país e

agora resolvi ficar de vez em Petrópolis.

– Que loucura! Eu não quero acreditar! Como você me conheceu?

– Na praça principal daqui, sempre te vi transitando perto da Catedral. Eu não

entro em Igrejas, mas via você sentada toda noite na escadaria.

– Como você chegou ao Brasil?

– Via mar!

– Que horror! Ainda não posso acreditar.

– Pois, acredite Clara.

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Page 35: Orquídeas

– Suponhamos que você Willian, esteja me dizendo a verdade, eu sei que você

está confuso. Você não me matou por quê?

– Eu me apaixonei por ti. Por que tu começaste a me questionar. De outras

vezes, as jovens não resistiam a mim. Mas você insistiu em saber quem eu era, me

questionou.

– O quê? Teve outras mulheres? Eu estou diante de um assassino! Preciso ir!

– Calma, não vou te atacar. Meu feitiço virou contra mim, não posso te atacar.

Não quero que tu morras. Por isso, pedi que tu fosses embora. Eu te amo! Por favor,

acredites em mim! Eu não cheguei a levar as outras mulheres a minha casa, foram

conversas em bares. Eu não tive relação com nenhuma. Eu me alimento apenas de

animais, aliás, como vós humanos que maltratam tanto como eu, os pobrezinhos. Eu os

crio o livre, vós os mantendes presos em uma vida de sofrimento e tortura.

– Meu Deus! Que loucura, isso tudo deve ser uma alucinação. Você deve estar

brincando comigo.

– Não. Estou sendo sincero. Olha para mim, vê a verdade em meus olhos... Eu

sempre pensei em fazer uma vítima humana. Houve uma mulher aquém amei séculos

passados. Mas não pude machucá-la. Desde lá só encontrei a ti. Nunca toquei em

nenhum humano.

– Então você é vegetariano?

– Não.

– Deveria ser. Pobres dos animais que são sugados por você. Que horror! Que

hipocrisia minha e sua!

Enquanto Clara falava, Willian se aproximou dela e ambos entrelaçaram seus

olhares. Clara correspondeu ao olhar, mas logo resistiu dizendo que precisaria pensar

sozinha. Pegou o carro e voltou para sua casa em Petrópolis. Willian a seguiu e logo

desapareceu, pois o dia se aproximaria...

Capítulo XV: Ida para o Rio de Janeiro

Com o passar da noite, Clara acordou, arrumou suas coisas e partiu para o Rio de

Janeiro pela manhã. E lá foi para a sua casa em Barra de Guaratiba. O natal já estava

aproximando-se. Escrevera também sobre Willian, sobre o que ele era. A jovem estava

o muito confusa.

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Em um momento posterior a moça foi dar uma volta na praia grande e lá ficou

sentada na areia olhando o mar que estava calmo, durante uma noite bela, clara e

estrelada. Um novo ano se aproximava. E a moça decidira ir romper o ano na Ilha de

Paquetá. Ao chegar o dia trinta e um de dezembro, Clara prosseguiu ao entardecer para

o centro da cidade do Rio de Janeiro, chegando à Praça XV, região em que pegaria um

barco à Ilha. Após observar a Baía de Guanabara, a jovem pegou um barco particular. A

noite se aproximou, o céu estava estrelado e a lua cheia. Ao se aproximar o seu barco,

Clara percebeu que quem estava conduzindo o barco era Jean Willian, a jovem decidiu

então não ir:

– Senhorita! Não tenhas medo, não vou te machucar!

– Vai embora, Willian me deixe em paz!

– Como eu posso te deixar em paz, se eu te amo! – Gritou ele.

– Você não vê que estou confusa, que não sei de mais nada, que perdi minhas

razões. Por favor, me deixe, vai embora! Desapareça daqui senão vou gritar! –

Exclamou Clara.

– Tudo bem, Clara eu vou. Tu estás certa. – Virou-se Willian decidindo partir.

Contudo teve uma surpresa, pois a jovem gritou.

– Não, não vai. Eu também amo você! Só estou confusa, fique!

Ao ouvir o que Clara disse, Willian a abraçou e ambos beijaram-se. Até que

foram pegar o barco para Paquetá. Eles foram juntos olhando a lua, as estrelas e a baía

de Guanabara sombria pela noite.

Após chegarem à ilha uma carruagem os esperava. Eles foram até o parque de

Paquetá no qual os portões estavam abertos. Clara e Willian dirigiram-se às colunas, e lá

ficaram até que ano novo brotasse:

– Como você sabia que eu viria? – Perguntou Clara.

– Eu sabia que tu tinhas uma casa aqui. Por isso comprei minha casa aqui.

– E agora, o que vamos fazer? O que vai acontecer comigo? – Indagou a jovem

ansiosa.

– Queres que eu te diga?

– Sim, estou pronta! – Respondeu temidamente a moça.

– Você será minha esposa, e viverás comigo, não te preocupes não farei nada de

mal a ti. Mas agora, vamos, ainda quero te mostrar algo.

– O que, Willian?

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– Venha e veja!

Ao saírem do parque, novamente tomaram a carruagem em direção a casa de

praia de Jean Willian. Ao chegarem lá, os portões da casa se abriram. A casa do

misterioso homem era tão linda como a de Petrópolis. A casa tinha um majestoso

jardim. Williams levou Clara ao belo orquidário que lá havia. Eles passavam noites

naquele formidável orquidário. Naquele lugar permaneceram em silêncio abraçados até

que a madrugada chegou. Clara adormeceu nos braços de Willian sendo levada por ele

até a casa. Como de costume o misterioso homem desapareceu e voltou outra vez ao

cair do crepúsculo.

Capítulo XVI: O final de tudo

Não há final, conclusão, ponto final para essa estória de amor. Se é que pode ser

chamada de amor esta estória. Muitos finais podem ser imaginados, assim como inícios.

Clara poderia ter se tornado a esposa de Willian e ambos viveriam felizes até

que o dia em que ela morreria como qualquer mortal.

A outra opção seria Willian ter a consumido, chegando Clara ao fim de sua vida

humana. Assim, ela se transformaria em uma vampira.

Ela também poderia ir embora para sua segurança. Ou eles, poderiam se separar

como outros apaixonados.

Ou ainda, Willian poderia ter sido destruído pelo amor dos dois, pois será que

vampiros amam? Acredita-se que sim. Será que o amor tem o poder de mudar, unir ou

superar as coisas, mesmo quando passarem contraditórias?

Afinal, quem seria Willian? Que espécie de vampiro, de homem, de

representação? Que mortal venceria os instintos sugadores de um vampiro? Será que

realmente venceu? Uma armadilha foi criada ou não? Quantas perguntas, quantos

possíveis finais...

Capítulo XVII: O encontro com a loucura

Certo dia pela madrugada a jovem Clara acordou assustada. A moça percebeu

que teve um intenso sonho... Clara Rafaela ao dormir criou em sua mente uma história

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fantasiosa repleta de delírios e de imaginação. Tudo não passou de um sonho. De um

encontro com a loucura...

Dias antes, a jovem ouviu de uma vizinha aparentemente louca que gritava na

rua para os moradores do bairro:

– Onde estão os doentes? Vocês é que são os doentes! Vocês pensam que tem a

razão. No fundo escondem as suas insanidades!

O Fim

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