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  • Organizadores

    Gustavo Ferreira Santos

    João Paulo Allain Teixeira

    Marcelo Labanca Corrêa de Araújo

    Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva

    Recife, 2015.

  • CRÉDITOS

    Editora: Associação Pernambucana de Pós-gradução em Direito

    Organização: Gustavo Ferreira Santos,

    João Paulo Allain Teixeira,

    Marcelo Labanca Corrêa de Araújo

    Conselho Editorial: Gustavo Ramos Carneiro Leão,

    Maria Lúcia Barbosa,

    Raquel Fabiana Lopes Sparemberger

    Design da capa: Ana Catarina Silva Lemos Paz

    Composição do miolo: Ana Catarina Silva Lemos Paz

  • SUMÁRIO

    I. DEMOCRACIA BRASILEIRA: UMA ANÁLISE DA REALIDADE POLÍTICO-ELEITORAL DE ACORDO COM OS PRECEITOS CONSTITUCIONAIS

    Luize Lacerda 15

    II. DA EFICÁCIA PROGRESSIVA À CIVITAS MAXIMA: EMBARAÇOS AO SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS

    Arthur Magalhães Costa Lucas Barreto Campello 30

    III. UMA NOVA INTERPRETAÇÃO DE ACESSO À JUSTIÇA: MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL E ARBITRAGEM.

    Alberto Jonathas Maia 42

    IV. NOVO CONSTITUCIONALISMO LATINO-AMERICANO E PLURINACIONALIDADE: A RESSIGNIFICAÇÃO DA SOBERANIA POPULAR E O RECONHECIMENTO DE NOVOS DIREITOS PARA A INCLUSÃO DO CIDADÃO

    Mariana Dionísio de Andrade 54

    V. PASSE LIVRE ESTUDANTIL: REGIME JURÍDICO E PERSPECTIVAS DE IMPLEMENTAÇÃO

    Alexandre Moura Alves de Paula Filho Paulo César Tavares Filho 67

    VI. O TRANSCONSTITUCIONALISMO E A INCOMPATIBILIDADE DA DECISÃO DO STF NA ADPF 153 E A SENTENÇA CONDENATÓRIA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO CASO GUERRILHA DO ARAGUAIA.

    Renata Santa Cruz Coelho Nara Fonseca de Santa Cruz Oliveira Julia Santa Cruz Gutman 80

  • VII. A IGREJA CATÓLICA E O ESTADO NO BRASIL: DO REGALISMO À LAICIDADE?

    Rafaella Amaral de Oliveira 91

    VIII. A (INAPLICABILIDADE DA) DOUTRINA DE PETER HARBELE NO JULGAMENTO DAS AÇÕES PENAIS ORIGINÁRIAS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

    Fábio Rodrigo de Paiva Henriques 106

    IX. ATIVISMO JUDICIAL NO STF EM MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA: ANÁLISE DO RE 631240 QUE DETERMINOU A OBRIGATORIEDADE DO PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PARA JUDICIALIZAÇÃO DE DEMANDAS PREVIDENCIÁRIAS

    Tassiana Moura de Oliveira 117Luciana Dubeux Beltrão Alves 117

    X. AUDIÊNCIAS PÚBLICAS: DIREITO OU FACULDADE?

    Maria Eduarda C. H. Velho Barretto 127

    XI. O PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL SUSTENTÁVEL NAS LICITAÇÕES E SUA INSPIRAÇÃO CONSTITUCIONAL

    Francisco Luiz de Sá Araujo Roberta Cruz da Silva 135

    XII. ACESSO À INFORMAÇÃO, DIREITO FUNDAMENTAL GARANTIDO

    Gabriel Filipe Avelino Soares 153

    XIII. ATIVISMO JUDICIAL NA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL

    Fábio Gabriel Breitenbach 161

    XIV. A EFETIVIDADE DO MODELO DE GESTÃO DE RODOVIAS EM REGIME DE PARCERIA PÚBLICO- PRIVADA: UM ESTUDO CRÍTICO SOBRE A BR 232

    Maria Ivanúcia Mariz Erminio Roberta Cruz da Silva 172

  • XV. MECANISMOS DE TUTELA JURISDICIONAL DOS DIREITOS HUMANOS ATRAVÉS DOS SISTEMAS REGIONAIS EUROPEU E INTERAMERICANO

    Caroline Alves Montenegro 186

    XVI. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DO DEPENDENTE QUÍMICO COMO FORMA DE RESSURGIMENTO DO MODELO HOSPITALOCÊNTRICO: ANÁLISE DA SUA (IN)CONSTITUCIONALIDADE

    Ana Paula Cavalcanti da Matta Ribeiro Lessa Fernando Antônio Carvalho Alves de Souza 198

    XVII. A IMPORTÂNCIA DO MARCO CIVIL NA DEMOCRATIZAÇÃO DA INTERNET

    Danilo Scalzo Faro 213

    XVIII. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES ENTRE PARTICULARES. ANÁLISE AMPLIATIVA

    Felipe Soares Torres Graciliano de Souza Cintra 219

    XIX. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO INSS QUANTO AOS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS FRAUDULENTOS

    Graciliano de Souza Cintra 228

    XX. A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA E A COOPERAÇÃO PENAL INTERNACIONAL: RESTRIÇÕES CONSTITUCIONAIS À EXTRADIÇÃO

    Andreia Cadore Tolfo Eliane de Almeida Broker 240

    XXI. UM OLHAR SOBRE A EFETIVIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E INTEGRIDADE DOS REEDUCANDOS NO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO

    Isabelle Laís Simões de Oliveira Wedja Carla de Souza 249

    XXII. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS E CULTURAIS – UMA ANÁLISE SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DO DIREITO À INFORMAÇÃO PARA A EFETIVAÇÃO DA TRANSPARÊNCIA FISCAL BRASILEIRA

    Géssyca Correia 255

  • XXIII. DA ANÁLISE DO DESFECHO DOS PROCESSOS CRIMINAIS NA VARADE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DO RECIFE: A REAL FUNDAMENTAÇÃO DA POLÍTICA CRIMINAL DE COMBATE À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

    Débora de Lima Ferreira Marília Montenegro Pessoa de Mello 263

    XXIV. A PREMÊNCIA DA REESTRUTURAÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO COM VISTAS À EFETIVIDADE CONSTITUCIONAL

    Arthur Albuquerque de Andrade 274

    XXV. A PROBLEMÁTICA DA RECEPÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NO ORDENAMENTO BRASILEIRO: A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº45 E SEU IMPACTO NAS CONVENÇÕES QUE VERSAM SOBRE DIREITOS HUMANOS

    Tereza Margarida Costa de Figueiredo 284

    XXVI. O NOVO CONSTITUCIONALISMO LATINO AMÉRICANO E OS CRITÉIOS ADOTADOS EM CASO DE DISSENSO NA APLICAÇÃO DE UM DISPOSITIVO LEGAL

    Fernando Flávio Garcia da Rocha João Manoel Moury de Barros Coelho Alexandre Henrique Tavares Saldanha 293

    XXVII. CIDADANIA E EDUCAÇÃO: A CRISE DO DIREITO À EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DE HANNA ARENDT

    Joseane Batista Azevedo Barros 300

    XXVIII. ASSENTADOS DO PRONERA E DIREITO À EDUCAÇÃO SUPERIOR: ESTUDO ANALÍTICO DOS PARECERES JURÍDICOS DA PROCURADORIA DO INCRA

    Joseane Batista Azevedo Barros Maria Creusa de Araújo Borges 310

    XXIX. CONSTITUCIONALISMO E DEMOCRACIA: A DUALIDADE DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL

    Ana Catarina Silva Lemos Paz Igor Santiago de Oliveira 321

  • XXX. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, PROCESSO CONSTITUCIONAL E MÍDIA IMPRESSA: O ACOMPANHAMENTO DA ADI 3510 (CÉLULAS-TRONCO) NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E SUAS REPERCUSSÕES PARA O JULGAMENTO FINAL

    Flávia Danielle Santiago Lima Maria Eduarda da Costa Pinto 333

    XXXI. A REFORMA DO PROCESSO DE NOMEAÇÃO DOS MINISTROS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

    Sergio Ludmer 345

    XXXII. SISTEMAS LEGAIS NO MUNDO: OS MOTIVOS QUE FIZERAM NASCER AS DIFERENTES FORMAS DE JURISDIÇÃO

    Thâmara Carla dos Santos Rodrigues 358

    XXXIII. REFLEXÕES SOBRE AS CORRENTES POLÍTICO-JURÍDICAS DE TRATAMENTO DA PROSTITUIÇÃO

    Vanessa Alexsandra de Melo Pedroso Felipe Jardim da Silva 365

    XXXIV. DEMOCRACIA: UM INSTITUTO EM CONSTANTE CONSTRUÇÃO

    José Guerra de Andrade Lima Neto 373

    XXXV. PENSAMENTO POLÍTICO ISLÂMICO - O FUNCIONAMENTO ESTATAL

    Gabriela Araújo Tabosa de Vasconcelos 386

    XXXVI. A EFICÁCIA DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

    Paula Tatiany Galeno Pinheiro de Morais Camila Magalhães Cutrim 391

    XXXVII. O ATIVISMO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E O ATENTADO À PRODUÇÃO DEMOCRÁTICA DO DIREITO: ANÁLISE DO JULGAMENTO DA ADPF 132/RJ E DA ADI 4277/DF

    Bruna Barboza Correia dos Santos 402

  • XXXVIII. A SOBERANIA E OS ESTADOS VADIOS: UMA ANÁLISE DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS E DO PODER GLOBAL A PARTIR DE JACQUES DERRIDA

    Isabela Costa 418

    XXXIX. A CONSTITUCIONALIDADE DO CASAMENTO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO

    Sérgio Souza Costa Floro 429

    XL. DA AUTONOMIA PRIVADA NAS RELAÇÕES EXISTENCIAIS: ESTUDO COMPARADO DOS PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS DA FILIAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO E PORTUGUÊS

    Juliana Marques Lyra Carneiro Leão Maria Rita de Holanda Silva Oliveira 440

    XLI. FEMINISMO E DEFICIÊNCIA: PERSPECTIVAS E LUTAS PARA A GARANTIA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

    Maria Eduarda Cavalcanti de Albuquerque Mello 452

    XLII. A DEMOCRACIA E A APARENTE CONSCIÊNCIA DEMOCRÁTICA

    Arlã Rocha Barbosa 462

    XLIII. OS MUNICÍPIOS E O PRINCÍPIO DO INTERESSE LOCAL

    Mayara Nunes Medeiros de Souza 470

    XLIV. A LIBERDADE DE PLANEJAMENTO FAMILIAR NA FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA

    Rebeca Monteiro Moura Magalhães Maria Rita de Holanda Silva Oliveira 481

    XLV. CONFLITO ENTRE DIREITOS FUNDAMENTAIS: LIBERDADE DE EXPRESSÃO DA MÍDIA X DIREITO À INTIMIDADE DOS ARTISTAS

    Manoella Varejão de Andrade 487

  • XLVI. DIREITO PENAL E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER: UMA BOA PARCERIA?

    Carolina Salazar l’Armée Queiroga de Medeiros Marília Montenegro Pessoa de Mello Erica Babini Lapa do Amaral Machado 494

    XLVII. MÃO DE OBRA INFANTO-JUVENIL: (IN) EXISTÊNCIA NO MAIOR SÃO JOÃO DO MUNDO DE 2014

    Larise Pachú Lucas Brasileiro de Oliveira Gomes Clésia Oliveira Pachú 510

    XLVIII. A PROTEÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ATRAVÉS DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS E AS NOVAS EXIGÊNCIAS DEMOCRÁTICAS DAS SOCIEDADES PLURALISTAS

    Ana Virgínia Cartaxo Alves Caroline Alves Montenegro 515

    XLIX. O ACESSO À JUSTIÇA SOB A ÉGIDE DO NEOCONSTITUCIONALISMO

    Ana Virgínia Cartaxo Alves 532

    L. TUTELA JURÍDICA DA HOMOPARENTALIDADE

    Elaine Cavalcanti de Lima Azevedo 544

    LI. A EFICÁCIA DAS FORMAS DE ACESSO AS UNIVERSIDADES: O IMPACTO DAS COTAS

    Ludmila Inachvili 554

    LII. A DUPLA PROTEÇÃO JURISDICIONAL DOS DIREITOS HUMANOS: JURISDIÇÃO INTERNA E JURISDIÇÃO INTERNACIONAL

    Andreia Cadore Tolfo Fabiane Segabinazi 558

  • LIII. EFEITOS INFRINGENTES NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO: UMA ANÁLISE DA INTERDISCIPLINARIDADE HERMENÊUTICA, PROCESSUAL E CONSTITUCIONAL

    Luciana Dubeux Beltrão Alves Tassiana Moura de Oliveira 567

    LIV. DO ATO INFRACIONAL A “SITUAÇÕES PROBLEMÁTICAS” - OLHARES DE MAGISTRADOS E DE ADOLESCENTES SOBRE FATOS “ILÍCITOS”

    Érica Babini Lapa do Amaral Machado Marília Montenegro Pessoa de Mello 575

    LV. O DIREITO FUNDAMENTAL À PARTICIPAÇÃO DO PROCESSO POLÍTICO LOCAL PELA VIA DO SISTEMA DE GOVERNO PARLAMENTAR NO ÂMBITO DO ESTADO-MEMBRO

    Isabela CostaMarcelo Labanca 588

    LVI. A HERANÇA DE NINA RODRIGUES NO TRATAMENTO DOS PORTADORES DE SOFRIMENTO PSÍQUICO SUBMETIDOS AO SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL BRASILEIRO

    Thayara Castelo Branco 597

    LVII. OS MOVIMENTOS SOCIAIS COMO PRESSUPOSTOS DE UMA NOVA ORDEM DEMOCRATICA

    Vanessa Alexsandra de Melo Pedroso Daniela Madruga Rego Barros Victor Silva 618

    LVIII. SUSTAÇÃO CAUTELAR DO PROTESTO CAMBIÁRIO

    Roney José Lemos Rodrigues de Souza Raymundo Juliano Feitosa 632

    LIX. ENTRE O ATIVISMO E A JUDICIALIZAÇÃO: A ATUAÇÃO DO STF NA CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO SOCIAL À SAÚDE

    Glauco Salomão Leite Helder Felipe Oliveira Correia 638

    LX. TRAÇOS DA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL

  • Marcelo Schenk Duque 648

    LXI. RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL E DESCUMPRIMENTO DE SÚMULAS VINCULANTES

    Glauco Salomão Leite Gustavo Ferreira Santos 665

    LXII. LA DOPPIA ESSENZA DEL DIRITTO ALL’ISTRUZIONE: DIRITTO FONDAMENTALE E STRUMENTO PER GLI ALTRI DIRITTI FONDAMENTALI

    Daniele Matteucci 671

    LXIII. EFETIVIDADE DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA PARA OS SERVIDORES PÚBLICOS ESTATUTÁRIOS

    Fábio Túlio Barroso Semíramis de moura Roriz 683

    LXIV. DA EFETIVIDADE DA NORMA CELETISTA NO INÍCIO DA EXECUÇÃO. RESPEITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL

    Fábio Túlio Barroso 687

    LXV. PELO CABIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO EM FACE DE DECISÕES JUDICIAIS OMISSIVAS

    Alexandre Freire Pimentel Lúcio Grassi de Gouveia 691

    LXVI. REVISITAÇÃO HISTÓRICO-CRÍTICA DOS CONCEITOS DE DIREITO SUBJETIVO NA ERA DA PUBLICIZAÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

    Alexandre Freire Pimentel 712

    LXVII. CONSTITUIÇÃO E O DIREITO ORDINÁRIO: JURISDIÇÃO E POLÍTICA LEGISLATIVA

    Marcelo Schenk Duque 723

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 13

    APRESENTAÇÃO

    Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva foi o tema do Congresso Pu-blius de Direito Constitucional, realizado no mês de outubro de 2014, na Universidade Católica de Pernambuco. O evento reuniu diversos professores e pesquisadores na área do Direito Constitucional e Ciência Política do Brasil, como, por exemplo, Dirley da Cunha, Michelle Fernandez, André Rosa, George Marmelstein, Marcelo Labanca, Luciano Oliveira, Ivo Dantas, Glauco Salomão Leite, Gustavo Ferreira Santos, João Paulo Allain Teixeira, Walter Claudius Rothemburg, Fabiana Dantas, Wilson Steinmetz, George Galindo, Ecio Oto Ramos Duarte, Ernani Carvalho, Marcilio Toscano Franca Filho, Raquel Sparember-ger, Adriana Rocha, Ademário Tavares, Marcelo Casseb, Flavia Santiago e Alessandra Silveira.

    As atividades foram realizadas com a segmentação de 11 mesas temáticas a seguir indicadas: Poder Judiciário e efetivação dos direitos fundamentais; eficácia dos direitos sociais e culturais; federação brasileira nos 25 anos das Constituições estaduais; reforma política e reforma constitucional; a agenda criminal em direitos fundamentais; movimen-tos sociais; democracia brasileira; direito, multiculturalismo e constituição; novo consti-tucionalismo latino-americano; controle de constitucionalidade e, por fim, direito consti-tucional e ordem jurídica internacional.

    As discussões das mesas temáticas eram realizadas em plenária e, também, em GT’s criados para apresentação dos trabalhos científicos submetidos pelos congressistas. Ou seja, além da parte expositiva no auditório principal, o Congresso se desenvolveu também em diversas salas dos grupos de trabalho referentes às temáticas do Congresso acima in-dicadas.

    A metodologia adotada pelos grupos de trabalho foi de mais discussão coletiva e inte-rativa e menos apresentações expositivas. Por isso, cada um dos pesquisadores que sub-meteram seus trabalhos tinham um tempo curto para expor e defender suas pesquisas, mas depois todo o grupo de trabalho poderia criticar e apontar falhas ou necessidades de aprimoramentos.

    Encerrado o evento, foi dado prazo para que os congressistas que tiveram seus tra-balhos apresentados pudessem finalizar os seus respectivos textos, incorporando o fruto das discussões nos GT’s. A organização do evento recebeu, então, no mês de dezembro de 2014 o produto final das apresentações em forma de artigos que agora são publicados no presente livro eletrônico.

    Como se poderá perceber, este livro é eclético em temas. Há artigos falando sobre passe livre estudantil e movimentos sociais, democracia brasileira, ativismo judicial, efi-cácia dos direitos culturais, recepção de tratados internacionais , novo constitucionalismo latino-americano e cidadania, dentre tantos outros. Mas todos eles são representativos das discussões travadas nos respectivos grupos de trabalho que foram divididos de acor-do com as mesas temáticas do evento. Assim, todos os trabalhos que aqui se encontram são, literalmente, produto da atividade do encontro de pessoas e ideias em salas temáti-cas, resultados de um processo de amadurecimento daquilo que se escreveu pelo debate interativo em cada grupo.

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 14

    Uma outra característica do livro é que, muito embora haja trabalhos com temas distintos, todos eles possuem um elemento de interseção, que é justamente o tema dos direitos fundamentais ou humanos e, por isso mesmo, manteve-se como título deste livro o mesmo título do Congresso Publius, ou seja, “Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva”.

    Desejamos boa leitura a todos.

    Os organizadores.

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 15

    DEMOCRACIA BRASILEIRA: UMA ANÁLISE DA REALIDADE POLÍTICO-ELEITORAL DE ACORDO COM OS PRECEITOS CONSTITUCIONAIS

    Luize Lacerda1

    O organograma da política brasileira apresenta, desde a independência política de Portugal – em 1822, uma descontinuidade no que concerne às formas de governos, como também em relação aos regimes políticos adotados e, no presente momento, as diretrizes que guiam o governo brasileiro são democráticas.

    O processo de transição que se instaurou no Brasil de meados de 1984 até a quase posse de Tancredo Neves pode ser classificado como um processo de redemocratização.

    Durante este processo de redemocratização, o Brasil, como outros países da Améri-ca Latina (Equador, Peru, Bolívia, Argentina, Uruguai, Chile, México, Granada, Panamá e Nicarágua) se enquadra, na Terceira Onda de democratização por haver transitado do regime militar para democracia em 1985.

    Atualmente podemos afirmar que o Brasil não vive plenamente a sua Constituição, que é democrática em sua formulação, em sua inspiração e em sua objetivação. O Brasil vive um período dito pré-eleitoral, tendo somente sua democracia embasada na época an-tecedente às eleições, ou até mesmo o “ano eleitoral” a cada dois anos quando acontece o pleito para os cargos públicos executivos e legislativos, nacionais e/ ou estaduais.

    Desta feita, seria adequado dizermos que o Brasil vive uma democracia limitada pela atividade da cidadania em sentindo estrito, no que diz respeito a escolha dos responsáveis por representar o povo. Porém, tal modo de escolha demonstra falhas que impedem a efe-tivação da democracia de um sistema político e eleitoral como um todo.

    Apesar desse entrave, o arcabouço constitucional do modelo de Estado é baseado em um conjunto de princípios democráticos e fiéis a soberania popular. No entanto, há uma discrepância entre o sistema normativo e a realidade social e política vivenciadas pauta-das sobre a Constituição.

    Essa contradição entre o modelo jurídico democrático positivado, fundamentado em valores e princípios coerentes com o ideal de Justiça servente à concretização daquela proposta, e a experiência havida na dinâmica política da sociedade impossibilita o exer-cício da cidadania e a consequência de tal limitação é o enfraquecimento da democracia como princípio Constitucional, emanado da soberania popular, com a participação efetiva e exercendo ativamente o poder que lhes é de direito.

    Nesse sentido, há de se mencionar o projeto de lei 2.679/2003 que alteraria as leis nº 4.737, de 1965, nº 9.096, de 1995, e nº 9.504, de 1997 com objetivo de sanar antigos problemas do sistema eleitoral brasileiro, que afetam candidatos e partidos políticos du-rante as campanhas.

    As instituições democráticas2 modernas são moldadas de acordo com o sistema polí-tico adotado (presidencialismo, parlamentarismo, sistema híbridos, de assembléia e suas variantes) e sofrem influências de fatores sociais, econômicos e culturais que vão atingir

    1 Internacionalista, advogada e mestre em Ciência Política.

    2 No caso do Brasil, por exemplo, as instituições democráticas vêm a ser os poderes executivos, legisla-tivos e judiciários, como também quaisquer organizações que façam parte desse arcabouço intranacional.

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 16

    diretamente o comportamento dessas organizações. Tais instituições podem ser mensu-radas de acordo com o seu grau de institucionalização, ou seja, o grau com que as suas instituições nacionais são legitimadas (CINTRA, 2004).

    Segundo Hall e Taylor, “o termo ‘neo-institucionalismo’ é utilizado na ciência política para designar uma perspectiva teórica que atrai muita atenção e também certas críticas” (2003, p.193).

    Este termo ganhou força a partir da década de 80 (do século passado), quando houve um consenso entre os teóricos do institucionalismo sobre as diferentes vertentes desse pensamento, passando a fazerem parte dessa esfera o institucionalismo histórico, institu-cionalismo da escolha racional e institucionalismo sociológico.

    Segundo Mainwaring (2003), as instituições só vêm assumir um papel autônomo em relação aos atores secundários, ou seja, os sociais, após 1945. Tal mudança deu as insti-tuições o papel de atores essenciais na formulação da vida política de um país por serem as responsáveis tanto pela criação dos atores políticos como da criação de incentivos que vão desenhar o quadro comportamental destes, dotando-os inclusive, de uma previsão de ação de outrem, dependendo da quantidade de informação obtidas por aqueles.

    Baseado em dois pressupostos teóricos, tal modelo vem demonstrar as maneiras como as instituições devem estar posicionadas no cenário nacional. O primeiro versa que as instituições políticas devem estar acima de interesses secundários, visando principal-mente, aos assuntos inerentes às dimensões estatais, sobrepondo-se aos assuntos essen-cialmente sociais. O segundo pressuposto versa sobre o delineamento da vida política, defendendo que são as instituições que devem ser os atores fundamentais desta. (MARCH; OLSEN apud MAINWARING, 2003).

    Dessa forma, concluímos que as instituições formais trazem consigo vastas consequ-ências no que diz respeito ao processo democrático por gerarem efeitos distributivos e po-derem afetar “a capacidade de lidar com a complexa agenda política com que se defronta a nova democracia” (MAINWARING, 2002 p. 37).

    Nesse sentido, se faz importante observarmos como seria o indivíduo influenciado pelas instituições, já que estas têm papel na modelação do comportamento coletivo. Exis-tem duas perspectivas que Hall e Taylor denominam calculadora e cultural. A primeira diz respeito à maximização de ganhos pessoais pelos indivíduos, denotando um pensamento estratégico que os favorece diretamente e a uma espécie de previsão comportamental do presente e do futuro dos outros atores, ou seja, dos outros indivíduos, de modo que, a ação de uma pessoa é influenciada pelas informações advindas das instituições, no sen-tido político. A segunda perspectiva decorre do contexto do qual o indivíduo faz parte, ou seja, sua própria percepção da vida enquadrada nos padrões morais e informativos, os quais permitem um delineamento de ação aos indivíduos de acordo com essa percepção.

    As instituições são responsáveis pela investigação “situações políticas nacionais e, em particular, da distribuição desigual do poder e dos recursos”. Tal abordagem deriva da influência por parte dos teóricos estruturo-funcionalistas apesar de delinearem a es-trutura das organizações institucionais como fator fundamental na explicação das ações coletivas.

    As instituições ainda possuem características próprias originais, como demonstra Hall e Taylor, a observar as relações intra-institucionais, que são importantes por expres-sarem interesses pessoais dos indivíduos ou grupos deles desproporcionalmente, como também, as assimetrias de poder, à medida que estas tentam explicar os momentos de crises institucionais, como também de descontinuidades – de regimes, de sistemas parti-dários. (HALL ; TAYLOR, 2003).

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 17

    Os teóricos da escolha racional por sua vez, consideram que os atores agem dentro de certos limites mais ou menos previsíveis e guiados pelos seus próprios interesses, ou seja, no seu âmbito de atuação, estes tem suas prioridades e, dentro desse conjunto, eles vão mensurar o que vai lhe trazer mais beneficio com menos custo. (MAINWARING, 2002 p. 37).

    De acordo com Hall e Taylor, a maior parte dos trabalhos da escolha racional con-vergem em, pelo menos, quatro pontos, a saber: de acordo com “pressupostos comporta-mentais”, ou seja, os atores tendem a agir de forma a maximizar seus ganhos dentro dos limites daquilo que eles consideram de maior relevância; em um segundo momento, esses teóricos tendem a “considerar a vida política como uma série de dilemas de ação coletiva”, que na busca pela maximização de suas preferências, as atitudes individuais podem acar-retar danos ao coletivo3. Um outro ponto em comum é “o papel da interação estratégica na determinação das situações políticas”, os quais defendem que as ações individuais são guiadas por uma observação dos custos e lucros de tal comportamento, que por sua vez é afetado pelas ações de outros atores baseados nas regras das instituições. Finalmente, eles oferecem uma “explicação da origem das instituições”, que por sua vez são originadas mediante um consenso entre os atores envolvidos no processo de desenvolvimento das instituições, salientando que os grandes ganhadores são esses atores que estão envolvidos na criação das instituições (2003, p. 8).

    Defende Ames (2003, p.25) também que cada indivíduo tem um determinado com-portamento inerente à realidade, isto é, história de vida, cultura, costumes. E, como a re-alidade se modifica, o comportamento também sofrerá mudanças que se adequem melhor a ela:

    Sem negar a relevância dos valores, eles sugerem que as preferências estraté-gicas são determinadas pelas regras formais da própria política. E, sobretu-do, os institucionalistas da teoria da escolha racional sustentam que o com-portamento muda, quaisquer que sejam as atitudes culturais subjacentes, quando as instituições mudam.

    Sendo assim, os teóricos da escolha racional são muitas vezes considerados simplis-tas e, até certo ponto, omissos em suas teorias.

    Sobre a importância da utilização das teorias da escolha racional para o estudo do sistema político brasileiro, Mainwaring (2002) afirma que “elas ajudam a explicar as fra-quezas dos partidos brasileiros”, como também o porquê das atitudes tomadas pelos polí-ticos influenciarem de maneira significativa a forma de organização desse sistema e suas inter-relações.

    Em poucas palavras, as regras formais determinam até que ponto os partidos contro-lam os políticos individuais, quer se trate de organizações disciplinadas ou indisciplina-das, centralizadas ou descentralizadas (MAINWARING, 2002 p. 39).

    Para um melhor entendimento das dimensões que estudamos em nosso trabalho, faz-se necessária uma explanação sobre tipologias e conceitos que habitarão nas expli-cações durante o desenrolar desta pesquisa. Sabemos, porém, que tipologias e conceitos não têm muito valor se não forem aplicados a alguma situação específica, e, desse modo, deixamos claro que todas as definições neste artigo, serão direcionadas ao caso brasileiro, como também as comparações das quais este fará parte.

    3 O autor exemplifica tal situação através do clássico “Dilema do prisioneiro”, ou seja, “um jogo para duas pessoas com quatro resultados possíveis: (1) a melhor alternativa de A, que é a pior para B. (2) A melhor al-ternativa de B, que é a pior para A. (3) A pior alternativa para ambos. (4) Uma alternativa satisfatória, melhor do que a pior para cada um deles, mas um pouco menos satisfatória para cada um do que seu melhor (...). É vedada a comunicação entre os jogadores”. (DAHL, 2005, p. 151)

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 18

    À luz deste trabalho torna-se pertinente a conceituação e diferenciação de alguns cri-térios pelos quais podemos analisar as configurações institucionais de governo4.

    Não existe uma conceituação única do termo democracia devido à quantidade de di-mensões e possíveis significados inerentes a esta palavra. Segundo Dahl, devemos utilizar “o termo ‘democracia’ para um sistema político que tenha como uma de suas caracterís-ticas, a qualidade de ser inteiramente, ou quase inteiramente, responsivo a todos os seus cidadãos”. E ainda, afirma que, para garantir essa responsividade por um certo espaço temporal, ou seja, para assegurar a igualdade entre os cidadãos, no sentido político, é ne-cessário, por parte do governo, uma certeza de que, do mesmo modo, haverá oportunida-des igualmente proporcionais para todos no tocante à liberdade de expressão, direitos de voto e possibilidade de ocupação de cargos estatais, por exemplo (DAHL, 2005, p. 25-26).

    O conceito de democracia apresentado não se aplica a nenhum caso real por envolver dimensões muito mais complexas que as apresentadas, não podendo ser observados neste caso, Estados que tenham alcançado o modelo completo de democratização. Para tanto se considera o termo poliarquia como o processo de transição que as democracias, em fase de consolidação, estão atravessando em direção a uma democracia plena, ou seja, todos os regimes políticos que apresentam algum grau de democratização são considerados regi-mes poliárquicos. Tais regimes existem e podem ser encontrados em quaisquer processos de transição que visem ao implemento, mesmo que mínimo, de instituições democráticas.

    Dahl versa sobre dois caminhos que devem ser percorridos em busca de uma maior proximidade de uma democracia plena. Tais indicativos são o grau em que um indivíduo está incluso em uma sociedade, isto é, o quanto ele é ativo nesta e ainda, o grau a que esta mesma sociedade está aberta para esta participação. Tais caminhos são denomina-dos pelo autor como duas dimensões teóricas de democratização: uma de “inclusividade” (participação) e a outra de “liberalização” (contestação pública), respectivamente (2005).

    Concluímos então, que a idéia central de democracia é de um governo exercido por representantes eleitos pelo povo da qual podemos extrair a seguinte classificação: demo-cracias diretas, indiretas e semidiretas, ou seja, de acordo com o grau de participação popular e a forma como tal participação será exercida (DAHL, 2005)

    Quanto à forma de governo, essas democracias se organizam de duas maneiras: república e monarquia. Aquela forma de governo se denuncia através de fatos como: a representatividade de um regime, quem é considerado elegível ou não, por quanto tempo um mandato perdurará e as responsabilidades dos mandatários elegíveis, como se dá o equilíbrio entre as funcionalidades dos poderes e, quais são as oportunidades que um in-divíduo possui dentro do sistema. Já nesta última, por exemplo, o chefe de estado não é eleito e sim assume o cargo por uma hereditariedade, tendo um mandato vitalício. Porém a quantidade de poder político que este possui é mínima, pois as monarquias contempo-râneas5 dotam de um chefe de governo que, por sua vez, representa o partido ou partidos políticos que detêm o apoio popular majoritário.

    Existem várias inter-relações que as monarquias ou repúblicas podem realizar com os sistemas de governo, sendo elas de quatro naturezas: parlamentarismo, presidencia-lismo, semi-presidencialismo e governo de assembléia, que, em particular, apresentam muitas variedades internas (CINTRA, 2004).

    4 O único regime político que iremos considerar e explanar neste trabalho será o regime democrático; ou-tros regimes serão denominados, para fins comparativos, de regimes não-democráticos.

    5 Todavia, existem monarquias nas quais o chefe de Estado é também responsável pelo governo do país, ou seja, chefe de Estado e Governo, a exemplo da Arábia Saudita. Essas monarquias são denominadas de monarquias absolutistas.

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 19

    Levando em consideração o exposto acima, é preciso ter em mente que as demo-cracias modernas passaram por muitas mudanças políticas ao longo do seu processo de formação e consolidação. Tais mudanças compreenderam processos de transições e osci-lações entre regimes democráticos e não-democráticos (ditaduras militares, monarquias absolutistas, regimes fascistas, oligarquias, entre outros) e, essas nunca aconteceram isoladamente em uma única nação, isto é, as mudanças sempre se davam entre grupos de países que apoiados na experiência de outros transitavam entre democracias e não--democracias. Sendo, deste modo, muito peculiares quando tratamos das suas formas de organização. Dificilmente encontramos organizações democráticas puras, ou seja, que conseguem se encaixar perfeitamente em condições pré-estabelecidas, ou em modelos democráticos teorizados.

    Em suas análises, Lijphart classifica os modelos de democracia sob duas óticas, a saber: o modelo Westminster de Democracia e o modelo Consensual de Democracia. Em sua proposta original, Lijphart enumera dez elementos, que são apresentados em duas dimensões – executivos-partidos e federal-unitária, para descrever os aspectos marcan-tes das democracias majoritárias e consensuais. No modelo Westminster, os dez elemen-tos considerados são: concentração do Poder Executivo em gabinetes unipartidários e de maioria mínima, gabinete dominante em relação à legislatura, sistema bipartidário, siste-ma de eleições majoritários e desproporcional, pluralismo de grupos de interesses, gover-no unitário e centralizado, concentração do poder legislativo numa legislatura unicameral, flexibilidade constitucional, ausência de revisão judicial e um banco central controlado pelo Poder Executivo.

    No segundo modelo de democracia proposto, os elementos essenciais que compõem o sistema consensual são definidos na seguinte ordem: partilha do Poder Executivo por meio de gabinetes de ampla coalizão, equilíbrio de poder entre Executivo e Legislativo, sis-tema multipartidário, representação proporcional, corporativismo dos grupos de interes-ses, governo federal e descentralizado, forte bicameralismo, rigidez constitucional, revisão judicial e independência do Banco Central.

    Para uma melhor compreensão do tema modelos de democracia é necessária uma apreciação sobre as formas de organizações estatais e suas formas organizacionais, con-sequentemente faremos uma análise sob à luz da Constituição Brasileira de 1988.

    Acerca disso, versa a constituição brasileira de 1988:

    Art. 1º. A república Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e Distrito Federal, constitui-se em Estado Demo-crático de Direito (...).

    Parágrafo único: Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de re-presentantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

    Analisando o artigo supracitado, concluímos que o Brasil é uma República em sua forma de governo; tendo como Forma do Estado, uma Federação – por ser constituído de Estados-membros que dotam de uma certa autonomia no que diz respeito aos assuntos políticos e jurídicos; sendo ainda um Estado Democrático de Direito, isto é, igualdade de todos perante as leis criadas pelo povo e pelo Estado, divisão de poderes estatais – exer-cendo um mútuo controle entre si; e democrático por ser embasado no princípio de sobe-rania popular – “todo o poder emana do povo”, por versar sobre assuntos sociais e ainda por ter em seu ambiente uma pluralidade partidária, o que impede que um único partido institucionalize a autoridade.

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 20

    Sobre o Estado democrático brasileiro, faz-se mister a menção de que o Brasil, apesar de fazer parte do modelo de democracia consensual, apresenta, em seu arcabouço político características também do sistema majoritário, isto é, relações entre Executivo e Legisla-tivo em que o executivo é dominante e sistemas eleitorais majoritários e desproporcionais (LIJPHART, 2003).

    Ainda sobre essa esfera de análise é necessária a observação de que o Brasil além de ser uma democracia de consenso, pode ser considerado em seu regime político como uma democracia semi-direta e representativa por possuir alguns fatores (referendo, plebiscito, a iniciativa popular, o veto popular e o recall) que possibilitam uma maior participação do indivíduo e ainda, por ser, este mesmo indivíduo o responsável pela escolha de seus representantes, que, por sua vez, serão as pessoas que tomarão as decisões diretas. Sobre esse ponto, vale salientar que o direito ao voto é algo que não pode ser tirado do indivíduo, porém, as outras maneiras de participação (referendo, plebiscito, etc) podem sofrer altera-ções, o que caracteriza o voto popular como um instituto superior àqueles (DEMOCRACIA DIRETA, 2014).

    Desse modo, podemos observar que o Brasil faz parte das democracias que se encon-tram em consolidação, sendo assim, uma poliarquia por permitir a inclusividade dos indi-víduos através da iniciativa popular, que não limita a participação dos cidadãos somente por meio do voto. E, além disso, permite que algumas das decisões tomadas pelos poderes Executivo e Legislativo sofram alterações, até certo ponto, por iniciativas emanadas do povo, como também que decisões de extrema importância sejam tomadas de acordo com a opinião dos indivíduos, ou ainda que decisões sejam baseadas na opinião pública (DAHL, 2005).

    Outra característica do sistema de democracia brasileira é o chamado presidencia-lismo, o qual só é possível na forma republicana de governo, que vem a ser um sistema de governo onde o Presidente da República é, ao mesmo tempo, o Chefe de Estado e de Governo eleito pelos cidadãos de forma direta. Além disso, tal sistema possui uma rigorosa independência entre o Legislativo e o Executivo, não sendo possível o Legislativo depor o poder Executivo - a não ser, na hipótese de impeachment, quando o Presidente pode ser demitido pelo voto parlamentar – nem o Legislativo ser dissolvido pelo Executivo. Outra característica do presidencialismo é a unipessoalidade do poder Executivo que é respon-sável para nomear ministros (tendo estes que prestarem serviço ao Executivo, e não ao Legislativo).

    Outro ponto importante é conceituar a fase na qual se encontra o Estado Brasileiro segundo sua formação. Sobre este tema Limongi (2002, p. 110) disserta que

    (...) o país ultrapassou a primeira fase do desenvolvimento político, a fase da formação do Estado nacional e, desde então, se viu às voltas com o problema da integração das massas ao sistema político. Portanto, do ponto de vista do desenvolvimento político, do tenentismo6, ao regime militar, vivemos uma mesma e invariante realidade: “as vicissitudes que se seguem ao ingresso” na fase da política ideológica. A continuidade dessa problemática oferece a chave para interpretar e fazer projeções sobre os resultados da transição do autoritarismo à democracia. A redemocratização nos remeteria, pura e sim-plesmente, às mesmas experiências do passado.

    6 “Nome que se dá ao movimento político desencadeado durante a década de 20 por jovens oficiais, a maioria tenentes e capitães, em oposição ao governo e à alta oficialidade, que defendia os interesses da oli-garquia” (GLOSSÁRIO, 1999).

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 21

    O sistema eleitoral brasileiro foi estabelecido pela lei no 4.737, de 15/7/65 atualizado com as modificações da Lei 9.504/97, que constitui o código eleitoral, o qual em sua Parte Quarta, Título I, versa sobre os princípios adotados nas eleições para representante do Poder Executivo, dos Estados federados e municípios, respectivamente, bem como sobre a obrigatoriedade e as formas adotadas nos atos eleitorais. A saber:

    Art. 82. O sufrágio é universal e direto; o voto, obrigatório e secreto.

    Art. 83. Na eleição direta para o Senado Federal, para Prefeito e Vice-Prefeito, adotar-se-á o princípio majoritário.

    Art. 84. A eleição para a Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais obedecerá ao princípio da representação proporcional, na forma desta Lei.

    Art. 85. A eleição para Deputados Federais, Senadores e suplentes, Presi-dente e Vice-Presidente da República, Governadores, Vice-Governadores e Deputados Estaduais far-se-á simultaneamente em todo o País.

    Art. 86. Nas eleições presidenciais, a circunscrição será o País; nas elei-ções federais e estaduais, o Estado; e nas municipais, o respectivo Município (BRASIL, 1997).

    O processo de eleição para ocupação de cargos políticos no Brasil não se dá de ma-neira uniforme. As posições dos Executivos federal, estaduais e municipais, são feitas de acordo com a apuração de um candidato vencedor, que se dá por maioria absoluta, ou seja, 50% dos votos válidos mais um. Caso esse coeficiente não seja atingido, os dois candidatos com maiores números de votos válidos irão concorrer entre si em um segun-do turno, excetuando-se dessa hipótese os municípios com menos de 200 (duzentos) mil eleitores. Já a ocupação de cargos do Legislativo se dará de maneira diferente em relação à composição do congresso brasileiro – Câmara dos Deputados e Senado Federal. Nas fun-ções de Deputados, as cadeiras são distribuídas proporcionalmente entre os Estados com maior eleitorado, sabendo que nenhum estado pode ter menos que oito cadeiras e mais que setenta. Nas eleições do senado, a escolha dos políticos é feita por maioria simples, sendo que cada estado é representado pelos três senadores mais votados de cada região (AMES, 2003).

    Feitas as devidas considerações sobre o sistema de democracia vigente no Brasil, partimos agora para uma análise mais detalhada sobre os problemas que habitam seu arcabouço.

    É fato que a política democrática contemporânea tem marcas significativas da diferenciação de graus de institucionalização das organizações partidárias entre os vários países.

    Mainwaring (2001, p. 395) discorre sobre o assunto, afirmando que

    Sete regras e aspectos institucionais têm importância geral (grifo do autor) na determinação das perspectivas de institucionalização de um sistema partidá-rio: (1) a escolha de um sistema de governo presidencialista, semipresiden-cialista, parlamentarista ou híbrido; (2) o grau em que as normas eleitorais estimulam a fragmentação do sistema partidário; (3) a extensão em que as organizações partidárias controlam a ordem em que os candidatos são elei-tos; (4) a sequência das eleições; (5) quem controla a seleção dos candidatos; (6) o estabelecimento de um sistema federativo ou unitário de governo; (7) o fato de o presidente ter poder para legislar por decreto.

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 22

    O sistema eleitoral brasileiro traz em seu escopo problemas que dificultam um maior controle dos políticos por parte da população, isto é, podemos dizer que praticamente não existe ligação entre os eleitores e aqueles que os representam.

    Segundo Ames, o sistema eleitoral “personaliza a política e enfraquece o controle dos partidos sobre os políticos tanto na condução das campanhas quanto na atividade par-lamentar” (2003, p. 352). Tal fato complica as decisões democráticas brasileiras de modo que, apesar de a representação proporcional (RP) de lista aberta não trazer problemas de desigualdade, o meio de que os candidatos fazem uso para disputarem seus votos torna-se peculiar por não visarem à conquista da ideologia dos eleitores, e sim, uma conquista de votos de maneira regional, ou seja, geográfica.

    A disputa pelo eleitorado é muito mais física do que ideológica. Os políticos, em geral, buscam regiões que lhe dão maior apoio eleitoral através de incentivos econômicos, ou seja, este processo passa a ser financiado por entes influentes nessas regiões, deturpando todo o sistema eleitoral.

    Esses esquemas de alianças corruptas criam uma massa de eleitores insatisfeitos com o sistema, aumentando, nesse sentido, o número de votos inválidos e brancos. Esse tipo de eleitorado é mais frequente em regiões mais desenvolvidas, ou seja, aquelas que aparentemente apresentam um eleitorado mais consciente das verdadeiras responsabili-dades políticas (AMES, 2003).

    Essa espécie de decepção sofrida pelos eleitores faz com que, quando não invalidem os seus votos, aqueles acabem elegendo políticos descomprometidos com os problemas nacionais. Segundo Mainwaring, essa insatisfação dos eleitores e o impulso que estes dão a políticos da oposição podem ser em resposta à baixa legitimidade institucional dos parti-dos. Dessa forma, tal comportamento é facilmente encontrado em democracias de Terceira Onda (2001).

    Nesse mesmo raciocínio, os políticos tendem a direcionar suas campanhas e suas buscas por financiamentos eleitorais para regiões periféricas, onde o eleitorado é menos racional e se vende mais facilmente e por um menor preço.

    Ainda sobre o problema Ames (2003, p. 334) discorre que

    O sistema eleitoral brasileiro dá novo sentido à tão usada expressão interes-ses especiais (grifo do autor). A RP de lista aberta facilita o que se poderia mais propriamente chamar de auto-representação – isto é, a tendência de certos deputados a representarem seus interesses econômicos pessoais ou os interesses de setores muito estreitos. A chamada “bancada ruralista” não representa os interesses dos eleitores que puseram esses deputados na Câ-mara, mas os interesses pessoais de parlamentares que são grandes proprie-tários rurais. Seu estilo de representação está, para dizer o mínimo, muito longe do sentido usual da noção de responsabilidade pública.

    A busca pessoal pelo poder político se torna ainda mais complicada devido à falta de coerências e teor nas ideologias dos partidos e suas respectivas coligações, criando um sistema multipartidário fragmentado e fraco, sem ideais políticos de peso e comprometi-mento com o eleitorado (AMES, 2003).

    Outro fator gerado pela personificação do poder político é a necessidade de campa-nhas eleitorais “hollywoodianas”, pois, mais vale o carisma pelo qual o eleitor será atingido do que demonstrar realmente as ações políticas que seriam tomadas pelos candidatos. Essa circunstância fortalece o poder da mídia na escolha do candidato, especialmente da

  • Constituição e Direitos Fundamentais em Perspectiva · 23

    televisão, que, apesar de ser um meio importante em quase todas as democracias, tem um papel muito mais decisivos naquelas que têm um baixo grau de institucionalização e um alto grau de personalismo.

    Esse tipo de comportamento estratégico e personalista por parte dos políticos, vai ge-rar uma falta de compromisso entre o partido e o candidato, que este por sua vez vai sem-pre buscar aquele partido que lhe dê mais condições de se eleger e o partido, por sua vez, procurará ter em seu corpo político candidatos que tenham condições de serem eleitos.

    Esta é uma afirmação, no mínimo, confusa, pois “é paradoxal que, no Brasil, onde o grau de personalismo da política é alto, os políticos não sejam individualmente responsa-bilizados por seus atos” (MAINWARING, 2001, p. 388).

    O sistema eleitoral brasileiro atualmente é de lista aberta – ou seja, os eleitores votam em nomes de políticos ao invés de votar em legendas partidárias como ocorre na lista fe-chada – e desproporcional no sentido de não haver uma relação entre extensão territorial e número de participação nos assuntos nacionais. O fato de as eleições serem de lista aberta gera, além de outros fatores, uma personificação dos políticos, o que é resultado, de uma baixa institucionalização do sistema eleitoral brasileiro.

    Este cenário, somado a outras duas mudanças não ocasionadas por determinações estatais de sistema partidário, gera um conflito interno, à medida que, torna-se uma constante mudança, originando, de certa forma, uma descrença do sistema de governo brasileiro.

    Além de uma descontinuidade permanente do sistema partidário, observamos dentro da esfera política brasileira um alto teor de volatilidade das organizações partidárias em si. Isto é, notamos, sem muito esforço, a formação como a dissolução, e ainda em menor proporção, a junção destes vários partidos políticos em um curto espaço de tempo.

    O sistema partidário brasileiro conviveu, desde sua formação, no século XIX, com in-tervenções estatais e influência de interesses de elites políticas. Esta situação derivou em cinco reformas dos sistemas partidários provocados por intervenções da elite estatal – em 1889, 1930, 1937, 1965 e 1979 – que dissolveram os sistemas existentes substituindo-os por outros regimes, excetuando-se em 1937 quando apenas ocorreu a extinção do sistema partidário existente (MAINWARING, 2002).

    Porém, torna-se pertinente mencionarmos a mudança ocorrida na situação dos po-líticos dentro das organizações partidárias no período pós-regime militar e de redemocra-tização.

    Até 1985, a disciplina de um partido político era moderada, em sua maioria, para poder sobreviver à época do governo militar. Apesar das heranças ganhas, a indisciplina partidária tomou o lugar da moderação. Desta feita, foi colocada em jogo a fidelidade7 como também a disciplina partidária por parte dos políticos.

    Até o dado momento, a mudança partidária era controlada pela legislação eleitoral que reservava às organizações partidárias o direito de deferir ou não o requerimento de entrada por parte dos políticos de outros partidos. A derrubada de leis que controlavam o sistema partidário brasileiro, no que concerne à fidelidade dos políticos aos partidos, ge-rou então uma grande movimentação por parte dos políticos entre vários motivos, em sua grande maioria, por interesses pessoais e ideológicos (MAINWARING, 2002).

    7 Diferentemente do que ocorre no Brasil, o sistema partidário britânico exerce um rígido controle sobre seus membros, onde em casos de desobediência partidária seu poder de atuação ficará comprometido, po-dendo em casos extremos derivar no encerramento de suas atividades políticas (CINTRA, 2004).

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    Grande parte dos problemas da democracia brasileira é causada por serem gerados em suas instituições muitos veto-players8. Tais atores são os responsáveis pela dificuldade em aprovar novas políticas, isto é, aquelas que apresentam forte disparidade com as idéias já absorvidas por estas instituições. Como exemplo de instituições disfuncionais, ou seja, aquelas que apresentam problemas de funcionalidade, podemos citar, no caso do Brasil, o sistema eleitoral, as regras que versam sobre a criação de partidos políticos, a organi-zação do poder presidencial, e ainda, o equilíbrio de poder entre a União, seus estados e municípios (AMES, 2003).

    Ademais, a concentração do poder Executivo Federal nas mãos de um único agente responsável ao mesmo tempo pela chefia de governo e Estado, aliado ao multipartidarismo brasileiro que produz um legislativo multifacetado, é um entrave à consolidação e fortale-cimento da democracia brasileira.

    Essa relação entre o Executivo centralizado e o Legislativo multifacetado vai levar a uma obstrução parlamentar, ou seja, situação e oposição compartilham o mesmo governo gerando o que Ames chama de veto-players. Dessa maneira, as decisões políticas muitas vezes são comprometidas pelas divergências partidárias daqueles que estão no poder, criando um poder baseado em um jogo de interesses, o qual impede que políticos venham a legislar pelo interesse geral.

    A relação entre Executivo e Legislativo vai ainda se deparar com os obstáculos exigi-dos pelas regras de procedimentos parlamentares (AMES, 2003).

    Desta relação entre o Executivo versus Legislativo constitui outro problema da de-mocracia brasileira: a limitação de poder que o Executivo dá ao Legislativo. Isto é, só o Executivo versa sobre assuntos orçamentários, salariais e, ainda, pode criar leis através de Medidas Provisórias (MP) que vigoram até 60 (sessenta) dias, prorrogáveis por igual período, sem a votação em plenário.

    Segundo Figueiredo e Limongi, tais poderes detidos pelo Executivo não sofrem riscos de diminuição. Dessa forma, criam-se barreiras a empecilhos das ordens do Executivo por parte do Legislativo. Sendo, quando o Executivo utiliza um de seus poderes conferidos constitucionalmente, cria-se automaticamente uma defesa a possíveis retaliações que se-riam feitas pela oposição, quer dizer, o Executivo possui, desse modo, um “controle de veto points9” escapando, assim, de arquivamentos de processos de seu interesses (2001, p. 25).

    A falta de políticos comprometidos com o sistema político brasileiro aliado aos obs-táculos enfrentados na relação Executivos versus Legislativos gera um governo corrupto que se utiliza, muitas vezes, de práticas clientelistas ou de alianças políticas em troca de cargos públicos para se manter no poder e permitir um grau de governabilidade melhor com o afrouxamento do entrave Executivo versus Legislativo, gerando um governo extre-mamente comprometido e sem muitas mudanças políticas, mesmo quando muda o eixo governamental (esquerda – direita) e seus representantes.

    A busca de objetivos particulares dá ao Brasil o status de democracia de baixa insti-tucionalização, pois esse comportamento político trava o processo político brasileiro impe-dindo as discussões de interesse geral sobre o problema das instituições nacionais (AMES, 2003).

    Neste raciocínio, entende-se por reforma política um conjunto de novas normas que terão força de lei, ou seja, normas estas que se aprovadas pelo plenário – Câmara dos De-putados e Senado Federal – deverão ser incluídas no ordenamento jurídico do país.

    8 Os veto-players são instituições que podem sair de seus status quo, ou seja, podem obstruir as decisões tomadas por outrem. Como por exemplo coligações partidárias. (AMES, 2003).

    9 Nome que se dá aos processos decorrentes dos atos dos “veto-players”.

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    A proposta de uma reforma política deve conter um conjunto de proposições que buscam alterar alguma falha constitucional que impede que a vontade de população seja posta em prática pelos políticos, aos quais esses cidadãos delegam um poder representati-vo através do processo eleitoral. Essa por sua vez, deve ainda ser constituída de alterações no sistema eleitoral, no sistema político-partidário, nos mecanismos de representação política, mudança no sistema de governo, entre outras que fazem parte do conjunto de mecanismos que formam o sistema político.

    Desde 1988, quando o Brasil - através de sua Constituição - optou pela manutenção do presidencialismo, pela representação proporcional de lista aberta, pelo bicameralismo e pelo federalismo, a discussão sobre o tema reforma política é uma constante, visto que a grande parte da população brasileira encontra-se insatisfeita com a forma de represen-tação política que vem sendo desempenhada por parte dos candidatos eleitos nas urnas. Ainda assim, a instabilidade político-democrática do Brasil, a qual podemos verificar ex-plicitamente através dos constantes escândalos de corrupção que ocorrem no seio do poder central, contribuem para aumentar ainda mais a falta de credibilidade do sistema político brasileiro.

    Nesse quadro de constante instabilidade, foi apresentado no ano de 2003 pela Co-missão Especial de Reforma Política, um projeto de lei, visando à modificações de algumas normas que regem o sistema eleitoral e partidário brasileiro (CINTRA, 2005).

    Esse projeto de lei (PL) sobre a reforma política, o PL n° 2.679/2003 – que modificaria substancialmente a lei 9.504/1997, cujo relator é o deputado federal Ronaldo Caiado, ver-sa sobre o financiamento público e exclusivo das campanhas, lista fechada de candidatos e “cláusula de barreira”.

    Em primeiro lugar financiamento público e exclusivo das campanhas – em sua es-sência, o projeto de lei busca minimizar os gastos das campanhas eleitorais. Atualmente, cada candidato é responsável por administrar a captação de recursos financeiros que irão financiar suas campanhas. Com a reforma, os financiamentos necessários às campanhas eleitorais serão distribuídos exclusivamente pelo poder público ao partido, ou seja, os partidos políticos através de recursos federais irão administrar e financiar a campanha de todos os seus candidatos. Nesse mesmo sentido, fica proibido qualquer tipo de captação de recursos privados para o financiamento de tais campanhas, sejam eles de fonte própria ou doações.

    Ainda de acordo com a reforma, o financiamento público, que passará a ser exclusi-vo, será acrescido dos R$ 120 milhões anuais para aproximadamente R$ 800 milhões, dis-tribuídos aos partidos para estes custearem as campanhas eleitorais de seus candidatos.

    Em segundo lugar a reforma defende a Lista fechada de candidatos – a atual sistemá-tica de voto no Brasil adota o esquema de lista aberta para compor os cargos do Legisla-tivo. Nesse sistema, o voto no Brasil pode ser entendido como nominal ou personalizado, cujo eleitorado vota em uma preferência para compor as Câmaras do Legislativo.

    Com a adoção do PL n° 2.679/2003 esse sistema de lista aberta seria substituído pelo de lista fechada, no qual os eleitores brasileiros passarão a votar exclusivamente nas legendas, ou seja, ao invés de votar na pessoa de seus candidatos, aqueles eleitores pas-sarão a votar nos partidos.

    Consequentemente, os partidos deverão compor uma lista preordenada de candida-tos e, divulgá-la antes do início do processo eleitoral para que o eleitorado brasileiro tenha conhecimento dos seus respectivos candidatos.

    No sistema de lista fechada, o candidato que estiver no topo da lista tem a prioridade para compor uma das cadeiras do parlamento e representar a população em nome do seu partido.

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    No mesmo raciocínio, existe a Cláusula de desempenho e federações partidárias ou “cláusula de barreira” – o PL n° 2679/2003, que visa alterar a chamada “cláusula de bar-reira” criada pela Lei n° 9.096/1995 (Lei dos Partidos), prontas para entrarem em vigor nas eleições de 2006, que reza

    Art. 13. Tem direito a funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legis-lativas para as quais tem elegido represente, o partido que, em cada eleição para a Câmara dos Deputados, obtenha o apoio de, no mínimo, 5% dos votos apurados, não computados os brancos e os nulos, distribuídos em, pelo me-nos, um terço dos estados, com mínimo de 2% do total de cada um (BRASIL, 1995).

    Esta por sua vez, passará a ser entendida de forma que, ao invés da representação estatal, se dá em no mínimo um representante em nove Estados brasileiros, já com a re-forma este limite baixará para apenas cinco Estados, onde os partidos políticos deverão eleger, no mínimo, um representante, não sendo modificado o percentual mínimo para o merecimento de cadeiras no plenário.

    Desta forma, partidos que são pequenos em sua formação e representação e, que podem apresentar forte ideologia, ficarão assegurados no que tange ao direito de ocupar cadeiras no Parlamento.

    Por último, o projeto de lei n° 2.679/2003 prevê ainda que sejam extintas as coliga-ções entre partidos nas eleições proporcionais, ou seja, nesse sentido só será permitido que partidos se juntem em uma única frente nas eleições majoritárias, isso quer dizer para cargos do executivo.

    O PL n° 2.679/2003 encontra-se atualmente esperando votação no plenário desde o final do ano de 2004, quando foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça de Cidadania (CCJC) (BRASIL, 2003).

    De acordo com o objetivo traçado no início deste artigo nos permitimos a expor algu-mas conclusões sobre a implementação do Projeto de Lei 2.679/2003 na situação atual da democracia brasileira.

    Analisar a democracia brasileira nos permite visualizar a dissociação do que DEVE-RIA ser com o que realmente ocorro no sistema político e eleitoral brasileiro.

    Notamos uma disparidade significativa sobre a idéia de representação ideológica--partidária e de como de fato é a vida político-partidária do cidadão ao exercer seu dever/direito ao eleger seus representantes.

    E tal conclusão se deu sobre a análise de quatro problemas encontrados no escopo democrático, os quais consideramos serem os mais contundentes:

    1. Personalização do Sistema Eleitoral;

    2. Sistema Eleitoral de lista aberta;

    3. Volatilidade do Sistema Partidário; eAtuação do Executivo versus Legislativo.

    Desta análise feita, verificamos o principal remédio para tais problemas brasileiros encontrados no Projeto de Lei 2.679/2003, que versa sobre a possibilidade de uma Refor-ma Política.

    Antes de tudo, podemos citar uma derrota da reforma. Criada em 2003, a reforma foi votada pela CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) em julho de 2004 e seus criadores almejavam a votação no Congresso Nacional antes de outubro de 2005,

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    pois, para entrar em vigor nas eleições de 2006 – como era a vontade daqueles – a refor-ma deveria ser aprovada um ano antes dessas, pois, a Constituição Federal defende, em seu art. 16 que “a lei que alterar o processo eleitoral só entrará em vigor um ano após sua promulgação (BRASIL, 1988).

    E não foi só na eleições de 2006 que a referida Reforma não foi entrou em vigor. Hoje, o PL 2.679/2003 se encontra ainda na CCJC esperando apreciação.

    Além disso, nosso artigo teve como objetivo analisar alguns aspectos da democracia brasileira, como também a situação de suas instituições democráticas através do ins-titucionalismo histórico e da escolha racional no que concerne aos incentivos seletivos previstos por esta de forma a entender o porquê do texto constitucional positivido não ser vivenciado plenamente.

    A partir disto, constatamos que a democracia brasileira sofre de um baixo grau de institucionalização em seu sistema eleitoral, em suas organizações partidárias e ainda, na relação entre seu Executivo e Legislativo.

    Um estudo mais profundo, mostra que, para aumentar o grau de institucionalização da democracia brasileira, é necessária uma reforma política que mude, ao menos, mini-mamente os preceitos constitucionais que versam sobre assuntos ligados ao direito polí-tico e a partidos políticos, isto é, os Capítulos IV e V do Título II da Constituição Federal.

    Sobre esse assunto, notamos que o PL 2.679/2003 visa à modificação de três pro-blemas que acreditamos serem básicos do sistema político brasileiro (financiamento de campanhas, mudança de listas eleitorais e “cláusula de barreira”).

    1. Isto é, a reforma pretende reorganizar tais partes do sistema político brasileiro:

    2. a deturpação do sistema eleitoral causada pelas coligações partidárias nas elei-ções proporcionais;

    3. a extrema personalização do voto nas eleições proporcionais, resultado do enfra-quecimento dos partidos;

    4. os crescentes custos das campanhas, que tornam o financiamento dependente do poder econômico;

    5. a excessiva fragmentação do quadro partidário;

    6. as constantes migrações entre as legendas, cujas bancadas no Legislativo oscilam ao longo das legislaturas.

    Em outras palavras, o que isto quer dizer é que, as coligações partidárias acabarão, podendo apenas acontecer espacialmente; acabará também a personificação do político, fazendo com que os votos sejam de listas fechadas, aumentando a complexidade das elei-ções, como os poderes do partidos e diminuindo a identificação por parte do eleitor, sobre os candidatos nos quais votará, o que pode acarretar numa votação mais ideológica por uma maior identificação com as propostas partidárias; diminuirão ainda as despesas com campanhas eleitorais, evitando uma maior desproporcionalidade de recursos interparti-dários, ainda que não evitando o caixa dois; distanciar a fragmentação partidária brasilei-ra por meio da diminuição da “cláusula de barreira” e ainda, dificultar com a infidelidade partidária.

    Nesse sentido, concordamos com Ames (2003) quando este diz que seria a melhor opção no caso brasileiro a implementação de uma reforma eleitoral do tipo alemão, onde metade do Legislativo é eleita em distristos de um representante e a outra metade pelo sistema de RP de lista aberta.

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    Outro ponto é que, o projeto de lei não versa sobre o problema de alta concentração de poder por parte do Executivo, especialmente no que diz respeito à possibilidade de redação de medidas provisórias que podem vigorar mesmo se não aprovadas pelo Legislativo.

    Tal fato gera uma centralização de poder por parte do Executivo, não ajudando na melhoria do grau de institucionalização brasileiro, por não haver, como deveria, um equi-líbrio real e significativo entre o Executivo e Legislativo.

    Visto que uma reforma política abrange muito mais elementos do sistema político brasileiro do que a proposta em questão visa modificar, acreditamos que esta seja uma reforma muito tímida se considerarmos que a estrutura do sistema de decisões políticas apresenta outros problemas que impedem o aperfeiçoamento da democracia brasileira, tais como suas tradições autoritárias, centralizadoras e elitistas.

    Desta forma, destacamos que a simples implementação de tal PL não aumentará o grau de institucionalização da democracia brasileira, necessitando de reformas pontuais que possam organizar, ao menos, o sistema eleitoral e partidário para que o eleitor faça valer todos os direitos que lhe são assegurados.

    REFERÊNCIAS

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    BRASIL. Constituição Federal, 1988. Disponível em: Acesso em: 13 out. 2012.

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    DA EFICÁCIA PROGRESSIVA À CIVITAS MAXIMA: EMBARAÇOS AO SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS

    Arthur Magalhães Costa1 Lucas Barreto Campello2

    1. Introdução

    Sabe-se que no intento humanitário de criar um amparo mínimo à dignidade da pessoa humana no cenário internacional, tendo em vista o descalabro das duas grandes guerras mundiais3 e a forte influência do Sistema Global de Direitos Humanos, foi ideali-zado no continente americano, o Sistema Interamericano de Direitos Humanos.4 Tal fato se deu a partir da criação da Convenção Interamericana de Direitos Humanos em 1969, entrando em vigor na data de 1978. No mais, o panorama delicado em que vive a America Latina também foi levado em consideração para influenciar a aceitação de uma jurisdição internacional específica para assuntos dessa qualidade. É dizer, em face do alto grau de exclusão e desigualdade social, que compromete a vigência plena dos direitos humanos na região, sendo fator de instabilidade o próprio regime democrático, a América Latina tornou-se a região com o mais elevado índice de desigualdade no mundo, considerando primordialmente a distribuição de renda. (PIOVESAN, 2012).

    Nesse contexto, a CADH surgiu para amenizar a insuficiência do direito interno dos países americanos, possibilitando soluções, reexames e reapreciações de matérias con-sideradas paradigmáticas, reputando o individuo como verdadeiro sujeito de direitos no plano internacional5. No entanto, a priori, não busca o SIDH6 substituir por completo as instâncias domésticas, mas sim buscar por força de cooperação institucional, a eficiência na prestação jurisdicional que diga respeito à Dignidade da Pessoa Humana7. É dizer:

    1 Especializando em Direitos Humanos pela Universidade Católica de Pernambuco, aluno especial do Programa de Mestrado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco. Graduado em Direito pelas Faculdades Integradas Barros Melo. E-mail: [email protected]

    2 Aluno especial do programa de mestrado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco. Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. E-mail: [email protected]

    3 Inolvidável a reflexão do jusfilósofo: “Se o Séc.XX é a era dos direitos humanos, seu triunfo é no mínimo, um paradoxo. Nossa época tem testemunhado mais violações de seus princípios do que qualquer uma das épocas anteriores e menos iluminadas. O século XX e o século do massacre, do genocídio, da faxina étnica, a era do Holocausto” (DOUZINAS, 2009, p.20).

    4 Conforme a pesquisadora: “No universo de direitos, destacam-se: o direito à personalidade jurídica; o direito à vida; o direito a não ser submetido à escravidão; o direito à liberdade; o direito a um julgamento justo; o direito à compensação em caso de erro judiciário; o direito à privacidade; o direito à liberdade de consciência e religião; o direito à liberdade de pensamento e expressão; o direito à resposta; o direito à liberdade de associação; o direito ao nome; o direito à nacionalidade; o direito à liberdade de movimen-to e residência; o direito de participar do governo; o direito à igualdade perante a lei; e o direito à proteção judicial” (PIOVESAN, 2012, p.141).

    5 A própria razão de ser dos Direitos Humanos: “Os direitos humanos estão internamente fissurados: são usados como defesa do individuo contra um poder estatal construído à imagem de um individuo com direitos absolutos. É este paradoxo no coração dos direitos humanos que tanto move sua história quanto torna sua realização impossível (DOUZINAS, 2009, p.38).

    6 No tocante à estrutura do SIDH: “Para controle do cumprimento da Convenção pelos Estados Partes, a CmIDH e a CrIDH atuam de maneiras distintas. Enquanto a CmIDH, composta por sete membros, formula recomendações aos Estados, a CrIDH, com-posta por sete magistrados, elabora sentenças de caráter obrigatório” (VENTURA; CETRA, 2013, p.11).

    7 Acerca de tal princípio basilar, vale colacionar as palavras do constitucionalista espanhol: “En un clima de hegemonía de valo-res neoconservadores e insolidarios, de un estrecho realismo de corto plazo y de un cansancio general de la política, una demanda de este tipo puede parecer más cercana al optimismo de la voluntad que al de la inteligencia. Se trata, en todo caso, de los costos del

    mailto:[email protected]:[email protected]

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    Ao acolher o sistema interamericano, bem como as obrigações internacionais dele decorrentes, o Estado passa a aceitar o monitoramento internacional no que se refere ao modo pelo qual os direitos fundamentais são respeitados em seu território. O Estado tem sempre a responsabilidade primária relati-vamente à proteção dos direitos humanos, constituindo a ação internacional uma ação suplementar, adicional e subsidiária. É sob essa perspectiva que se destaca a atuação da CIDH e da CorteIDH (PIOVESAN, 2012, p.143).

    Todavia, ao tempo em que se adota a jurisdição internacional, pode-se dizer que as obrigações dela decorrentes vinculam todos os poderes e órgãos dos Estados-membros, que por sua vez devem garantir o perfeito cumprimento das disposições desse instrumen-to legal e seus efeitos próprios no plano de seu direito interno. (CALDAS, 2013). No mais, para todos os Estados do continente americano que livremente a adotaram, a Convenção Americana equivale a uma Constituição supranacional atinente aos Direitos Humanos8. Desse modo, todos os poderes públicos e esferas nacionais, bem como as respectivas legis-lações federais, estaduais e municipais de todos os Estados aderentes, estão compelidos a respeitá-la e a ela se adequar (CALDAS, 2013).

    Doravante, expor-se-á no presente trabalho, os aspectos que engendram o relacio-namento entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito doméstico dos Estados membros, em prima, sob o viés teórico, esboçando em curtas linhas a evolução de pensamento em face da presente dicotomia, desde a concepção mais conservadora e nacio-nalista, até aquela mais dedicada com a formação da civitas máxima, idealmente voltada para a formação de uma jurisdição superior às observadas no plano interno de cada um dos Estados. No mais, imperioso compreender os mecanismos de adequação axiológica e de supressão antinômica, corroborados no inovador Controle de Convencionalidade. Por fim, importará destacar a principal jaça do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, qual seja, a repartição ou subdivisão dos direitos humanos em direitos civis e políticos e direitos econômicos, sociais e culturais, que fomenta o Principio da Eficácia Progressiva dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, sem perder de vista a motivação idealista que fundamenta o presente estudo.

    2. Relações entre Soberania, Dualismo, Monismo Nacionalista e Monismo Internacionalista

    É sabido que no tocante à relação entre Direito Interno e Direito Internacional, duas teorias podem ser confrontadas. Trata-se como se disse acima, de pressuposto lógico que dá vida e justifica o presente estudo. Sua importância reside no fato de que, a depender do ponto de vista que se tenha do fenômeno jurídico, só haverá direito onde houver previsão normativa. Mais ainda, só haverá direito se esta previsão normativa for recepcionada pela Constituição. Tal documento, pois, guarda relações com os limites territoriais da Sobera-nia o que desde já incita boas discussões. Como avistar uma garantia ainda que ela não esteja formalmente prevista na Constituição? Urge identificar melhor tais observações.

    As relações entre o Direito Internacional Público e o Direito Interno Estatal podem ser ponderadas a partir de duas correntes doutrinárias. São elas, dualismo e monismo. A primeira posição guarda nomes como Alfred von Verdross, Carl Heinrich Triepel, Strupp, Walz, Listz, Anzilotti, Balladore Pallieri e Alf Ross. Mister colacionar que:

    constitucionalismo democrático, claramente menos oneroso y más idóneo para garantizar la paz social y la igual consideración de la dignidad de las personas que cualquier otro sistema de autoridad política conocido” (PISARELLO, 2001, p.105).

    8 Não é demais repetir que: “Desse modo, todos os poderes públicos e esferas nacionais, bem como as respectivas legislações federais, estaduais e municipais de todos os Estados aderentes, estão compelidos a respeitá-la e a ela se adequar” (CALDAS, 2013, p.411).

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    Para os adeptos dessa corrente, o Direito interno de cada Estado e o Direito Internacional são dois sistemas independentes e distintos, ou seja, consti-tuem círculos que não se interceptam (meramente contíguos), embora se-jam igualmente válidos. As fontes e normas do Direito Internacional (nota-damente os tratados) não tem, para os dualistas, qualquer influência sobre questões relativas ao âmbito do Direito interno, e vice-versa, de sorte que entre ambos os ordenamentos jamais poderia haver conflitos. (...) Portanto conforme os dualistas, quando um Estado assume um compromisso exte-rior o está aprovando tão somente como fonte do Direito Internacional, sem qualquer impacto ou repercussão no seu cenário normativo interno. Para que isto ocorra, ou seja, para que um compromisso internacionalmente assumido passe a ter valor jurídico no âmbito do Direito interno desse Esta-do, é necessário que o Direito Internacional seja transformado em norma de Direito interno, o que se dá pelo processo conhecido como adoção ou trans-formação. Assim, o primado normativo, para os dualistas, é da lei interna de cada Estado e não do Direito Internacional (MAZZUOLI, 2008, p.67) (g.n).

    Por tal posição doutrinária percebe-se a preponderância do Direito Interno sobre o Direito Internacional, a partir do momento que para que esse possa ter alguma valida-de no interior de um Estado, deve aquele “permitir” ou não, sua entrada. Tal separação funda-se no primado da Soberania, que tem como objeto fixar “a noção de predomínio que o ordenamento estatal exerce num certo território e numa determinada população” (BONAVIDES, 2008, p.132-3). Por força disso, prega a corrente do século XVII, conforme os apontamentos históricos do cientista político brasileiro, que “a soberania é una e in-divisível, não se delega a soberania, a soberania é irrevogável, a soberania é perpétua, a soberania é um poder supremo, eis os principais pontos de caracterização” (BONAVIDES, 2008, p.136).

    Entretanto, ante o panorama atual, já reconhece a doutrina, que o conceito ideal de Soberania encontra óbices uma vez que com o avanço da comunicação, da influência de Estados sobre outros e da ordem internacional sobre o âmbito interno de cada país, é perfeitamente compreensível a evidência de uma crise conceitual. Salienta a doutrina que:

    A crise contemporânea desse conceito envolve aspectos fundamentais: de uma parte, a dificuldade de conciliar a noção de soberania do Estado com a ordem internacional, de modo que a ênfase na soberania do Estado implica sacrifício maior ou menor do ordenamento internacional e, vice-versa(...) Há juristas, sociólogos e pensadores políticos que entendem tratar-se de um conceito já em declínio. Hoje por exemplo, conforme alguns publicistas, as ideologias pesam mais nas relações entre os Estados do que o sentimento nacional de soberania (BONAVIDES, 2008, p.133-143).

    O conceito de Soberania pois, longe de frustrar a identidade nacional de cada indivi-duo deve respeitar a principal razão de ser do Estado. Ora, se é este fruto do Contrato So-cial, os pactuantes não podem perder ou ver ameaçada ou desconsiderada a sua dignida-de por força de legislação interna indiferente às pressões internacionais. A razão de ser do Estado é o homem e esse não pode ser suprimido em face de um respeito cego à Soberania.

    O Dualismo pois, é amplamente passível de críticas, uma vez que

    Se o Direito é uno e anterior à vontade dos Estados, não se pode entender de outra maneira senão como estando o Direito interno inserido no Direito Internacional, de onde retira o seu fundamento de validade. Pensar de outra forma significa entender o Estado como algo estranho à sociedade interna-

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    cional e à margem do mundo exterior, fechado assim a qualquer tipo de in-tegração jurídica ou social o que não pode ser admissível a qualquer título (MAZZUOLI, 2008, p.71).

    O Dualismo9, pois em sua substância, se mostra teratológico ante o cenário atual das discussões neoconstitucionalistas como iremos abordar mais a frente. Percebe-se que se forja em um sistema ultrapassado e que desconsidera as relações entre os Estados como se vivessem em universos distintos. A Soberania, pois, não pode mais obstar o triunfo axiológico do Principio da Dignidade da Pessoa Humana, que cobra muito mais do que recepção, mas também aplicação.

    A outra corrente doutrinária, chamada de Monismo, seguida por Kelsen, Verdross, Mirkine-Guetzévich, Lauterpacht, Haroldo Valadão, Celso D. de Albuquerque Mello, et all, toma como raciocínio a unicidade do conjunto das normas jurídicas, internas e interna-cionais (MAZZUOLI, 2008, p.73). Para tal teoria, “o Direito Internacional se aplica direta-mente na ordem jurídica dos Estados, independentemente de qualquer ‘transformação’” (MAZZUOLI, 2008, p.72), onde se pode tirar a lógica conclusão de que “tanto o Direito Interno como o Direito Internacional estariam aptos para reger as relações jurídicas dos indivíduos, sendo inútil qualquer processo de incorporação formal das normas interna-cionais no ordenamento jurídico interno” (MAZZUOLI, 2008, p.72). O Direito interno, pois retira do Direito Internacional sua validade lógica, tendo na sua carga valorativa a Norma Fundamental ou Grundnorm, não precisando que haja a construção de um novo diploma normativo no interior do Estado, nada obstante já haver a presença daquele tratado. Pre-za-se pois por “um só universo jurídico, coordenado, regendo o conjunto das atividades sociais dos Estados, das Organizações Internacionais e dos indivíduos” (MAZZUOLI, 2008, p.73), de modo que baste a existência de compromissos exteriores para que esteja o pre-sente Estado inserto naquele ordenamento externo, ganhando este aplicabilidade prática e imediata no interior daquele.

    A presente corrente, é imperioso que se diga, subdivide-se a partir do momento em que se avistam antinomias. Sem embargo, um arcabouço normativo por abranger muitas complexidades pode encontrar-se diante de perspectivas antinômicas, naturais em qual-quer Ordenamento. Todavia, insurge aqui a presente dúvida. Em caso de antinomias, que normas deverão preponderar? Os tratados internacionais, ou as regras internas? Aqui se empreende a subdivisão monista. Inicialmente poder-se-á explicitar o Monismo Naciona-lista. Conforme tal postura doutrinária apregoa-se o primado do direito nacional de cada Estado soberano, resultando a aplicação dos tratados internacionais como faculdade dis-cricionária ao ordenamento interno (MAZZUOLI, 2008, p.78). Prestigia-se antes o Direito Interno, reputando-o como prevalente sobre o Direito Internacional. É dizer:

    O Direito Internacional só tem valor internamente sob o ponto de vista do or-denamento interno do Estado, pois é a ordem jurídica estatal que prevê quais são os órgãos competentes para a celebração de tratados e como esses órgãos podem obrigar, internacionalmente, em seu nome, a Nação soberana.(...) o

    9 Conforme o raciocínio engendrado na doutrina: “Dualismo é corolário dogmático-apológico da teoria da soberania absoluta do Estado. Ora, se o Direito não é produto exclusivo da vontade do Estado, mas antes, lhe é anterior, o que o Estado faz é apenas reconhecer a sua obrigatoriedade, por meio de normas jurídicas, tanto no plano interno, como no plano internacional. Se o Estado reconhece tal obrigatoriedade, é porque além de consagrar que o Direito é uno, também reconhece que por meio de um principio geral anterior é que lhe foi concedido o poder de criar normas jurídicas de cunho obrigatório. Se este principio emanado da ordem jurídica internacional- consubstanciando na norma pacta sunt servanda lhe é anterior, não se pode olvidar que do sistema interna-cional é que advém a obrigatoriedade do Direito interno” (MAZZUOLI, 2008, p.72).

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    Direito Internacional só é internamente obrigatório porque o Direito interno – no exercício de sua competência soberana – o reconhece como vinculante em relação a si (MAZZUOLI, 2008, p.79).

    A outra posição doutrinária por sua vez, parece atender perfeitamente aos ditames neoconstitucionais que contemporaneamente se sobressaem sobre o Direito Doméstico, reforçando a posição de que não pode o ordenamento interno obstar a prevalência do Di-reito Internacional sobre os Estados, dada sua natural supraconstitucionalidade10. Tra-ta-se do Monismo Internacionalista, defendido por Hans Kelsen, Alfred Verdross e Josef Kunz.

    O monismo que preza a total primazia do Direito Internacional sobre o Direito Interno corrobora-se em virtude da concepção de que os tratados internacionais sobrepõem-se ao ordenamento doméstico, haja vista fundar-se este, naqueles. O Direito Internacional pois, representa-se como ordem jurídica hierarquicamente superior. Apresenta-se aqui o con-ceito de supraconstitucionalidade, como previsão jurídica capaz de prestar-se acima das cartas constitucionais, nada obstante servir de fundamento para estas11.

    Em outras palavras, o Direito Internacional passa a ser hierarquicamente superior a todo o Direito interno do Estado, da mesma forma que as nor-mas constitucionais o são sobre as leis ordinárias e assim por diante. E isto porque o seu fundamento de validade repousa sobre o princípio pacta sunt servanda, que é a norma mais elevada da ordem jurídica mundial e da qual todas as demais normas derivam, representando o dever dos Estados em cumprirem as suas obrigações. Ademais, se as normas do Direito Internacio-nal regem a conduta da sociedade internacional, não podem elas ser revoga-das unilateralmente por nenhum dos seus atores (MAZZUOLI, 2008, p.74).

    Pode-se registrar ainda que o monismo internacionalista “fomenta o desenvolvimento do Direito Internacional e a evolução da sociedade das nações rumo à concretização de uma comunidade internacional universal, ou seja, a civitas maxima” (MAZZUOLI, 2008, p.77).

    A par de tudo isso, se a aspiração explorada é de fato a que almeja a Proteção Interna-cional dos Direitos Humanos, não é compreensível que normas internas possam obstar as pretensões mundiais que objetivem valorar a dignidade da pessoa humana com argumen-tos burocráticos que defendam obtusos ideais, escondendo-se sob a égide da constituição. Estando certos que a norma internacional é pressuposto de validade da interna, reputada assim a sua supraconstitucionalidade, não há falar em Soberania capaz de sobrepor-se ao jus cogens. As liberdades e garantias individuais, como igualdade de oportunidade, exempli gratia, não podem depender da discricionariedade dos Estados em assinar ou não tratados, devendo pois valer-se a partir do momento de sua existência, independente de anuência ou recepção

    10 Mister que se diga: “A tendênci