o castelo - fichamento

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O castelo Franz Kafka – trechos esparsos – edição Companhia das letras, Tradução Modesto Carone. “ Era tarde da noite, quando K. chegou. A aldeia jazia na neve profunda. Da encosta não se via nada, névoa e escuridão a cercavam, nem mesmo o clarão mais fraco indicava o grande castelo. K. permaneceu longo tempo sobre a ponte de madeira que levava da estrada á aldeia e ergueu o olhar para o aparente vazio. “ pag 7 “ No conjunto o castelo, tal como se mostrava a distancia, correspondia ás expectativas de K. Não era nem um burgo feudal nem uma residência nova e suntuosa, mas uma extensa construção que consistia de poucos edifícios de dois andares e de muitos outros mais baixos estreitamente unidos entre si; se não soubesse que era um castelo seria possível considerá-lo uma cidadezinha. K. viu apenas uma torre mas não era possível discernir se pertencia a uma habitação ou a uma igreja. Bandos de gralhas circulavam ao seu redor. “ pag 14 Descrição do pátio, atrás da hospedaria dos senhores, onde Klamm iria pegar sua carruagem: “ Como era silencioso e belo ali! Um pátio quadrangular, limitado em três lados pela casa e, na direção da rua – uma rua lateral, que K não conhecia -, por um muro alto e branco com um grande e pesado portão que agora estava aberto. “ pag 119 Entrada de K. na carruagem: “ quando, porém, a porta já estava aberta, sentiu-se tão atraído para entrar no trenó que não conseguiu resistir: queria ficar sentado lá apenas por um instante. Deslizou para dentro. No trenó fazia um calor extraordinário e continuou assim, embora a porta, que K. não ousava fechar, permanecesse escancarada. Não era possível saber em absoluto se a pessoa estava sentada num banco, tantas eram as cobertas, almofadas e peles; podia-se virar e se esticar para todos os lados que sempre se mergulhava no macio e no tépido. (...)Como se estivesse anestesiado pelo calor depois de ficar longamente em pé na

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Fichamento livre do Romance "O Castelo" de Franz Kafka

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Page 1: O Castelo - Fichamento

O castelo Franz Kafka – trechos esparsos – edição Companhia das letras, Tradução Modesto Carone.

“ Era tarde da noite, quando K. chegou. A aldeia jazia na neve profunda. Da encosta não se via nada, névoa e escuridão a cercavam, nem mesmo o clarão mais fraco indicava o grande castelo. K. permaneceu longo tempo sobre a ponte de madeira que levava da estrada á aldeia e ergueu o olhar para o aparente vazio. “ pag 7

“ No conjunto o castelo, tal como se mostrava a distancia, correspondia ás expectativas de K. Não era nem um burgo feudal nem uma residência nova e suntuosa, mas uma extensa construção que consistia de poucos edifícios de dois andares e de muitos outros mais baixos estreitamente unidos entre si; se não soubesse que era um castelo seria possível considerá-lo uma cidadezinha. K. viu apenas uma torre mas não era possível discernir se pertencia a uma habitação ou a uma igreja. Bandos de gralhas circulavam ao seu redor. “ pag 14

Descrição do pátio, atrás da hospedaria dos senhores, onde Klamm iria pegar sua carruagem: “ Como era silencioso e belo ali! Um pátio quadrangular, limitado em três lados pela casa e, na direção da rua – uma rua lateral, que K não conhecia -, por um muro alto e branco com um grande e pesado portão que agora estava aberto. “ pag 119

Entrada de K. na carruagem: “ quando, porém, a porta já estava aberta, sentiu-se tão atraído para entrar no trenó que não conseguiu resistir: queria ficar sentado lá apenas por um instante. Deslizou para dentro. No trenó fazia um calor extraordinário e continuou assim, embora a porta, que K. não ousava fechar, permanecesse escancarada. Não era possível saber em absoluto se a pessoa estava sentada num banco, tantas eram as cobertas, almofadas e peles; podia-se virar e se esticar para todos os lados que sempre se mergulhava no macio e no tépido. (...)Como se estivesse anestesiado pelo calor depois de ficar longamente em pé na neve, K. desejou que Klamm finalmente chegasse. (...) de qualquer forma dava no mesmo, também nesta ultima havia garrafas. Puxou uma delas para fora, desatarraxou a tampa e cheirou; teve de rir involuntariamente porque o cheiro era tão doce, tão acariciante, como quando alguém ouve elogios e belas palavras de uma pessoa a quem se quer muito bem e não sabe exatamente do que se trata, nem que saber, mas está feliz com o conhecimento de que é essa pessoa que fala desse modo. “ pag 121

“ Na parte de cima ficou iluminada apenas a fenda na galeria de madeira, capturando um pouco o olhar errante, uma vez que parecia a K. que agora todas as ligações com ele tivessem sido rompidas e estivessem sem duvida mais livre que nunca e pudesse ali esperar no local antes proibido para ele quanto tempo quisesse e tivesse lutado por essa liberdade como quase

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nenhum outro e ninguém tivesse permissão para tocá-lo ou mandá-lo embora, nem mesmo interpelá-lo. No entanto essa convicção era no mínimo igualmente forte, como se, ,ao mesmo tempo não existisse nada mais sem sentido, nada mais desesperado do que essa liberdade, essa espera, essa invulnerabilidade. “ pag 125

“ No entanto K. não tinha uma percepção correta disso; ele, que se esforçava com todas as energias para captar um olhar de Klamm, não dava um valor muito alto, por exemplo, para a posição de um Momus, que podia viver sob os olhos de Klamm; estava longe de sentir admiração, para não dizer inveja, pois para ele não era a proximidade de Klamm o almejável, mas que ele, K., só ele, nenhum outro, chegasse ate Klamm com os seus desejos, os dele e os de mais ninguém, não para pousar perto dele, mas sim para passar por ele, ir em frente rumo ao castelo. “ pag 130

A carta sensacional de Klamm: “ Ao agrimensor no Albergue da Ponte. Os trabalhos de agrimensor que o senhor realizou até agora gozam do meu reconhecimento. Os trabalhos dos ajudantes também são louváveis; o senhor sabe induzi-los bem ao serviço. Não ceda no seu zelo! Leve os trabalhos a um bom termo. Uma interrupção me deixaria contrariado. De resto confie em que a questão dos honorários será decidida em breve. Eu não o perco de vista. “ pag 139

Fala da professora: - não posso tolerar isso. Que belo estado de coisas ! vocês tem permissão para dormir na sala de aula, mas eu não tenho obrigação de lecionar no dormitório de vocês. Uma família de serventes que fica se espreguiçando na cama até altas horas da manhã. Que asco! “ pag 150

“ Foi ai que Amália, com superioridade que não conhecíamos nela, disse que ninguém devia por muita fé naqueles discursos dos senhores; nessas ocasiões eles costumavam dizer com gosto algo agradável, mas que isso significava pouco, mas havia sido dito já tinha sido esquecido para sempre, embora certamente as pessoas, na próxima oportunidade, estivessem sem duvida outra vez na mão deles. “ pag 230

Comunicado de demissão, de Seemann ao pai de Olga: “ Talvez, sem as realizações brilhantes do pai na festa do dia anterior, não se tivesse ido tão longe, mas esses feitos haviam atraído particularmente a atenção oficial; a associação estava então sob plena luz e precisava velar por sua pureza ainda mais do que antes. Ora, havia sucedido o insulto do mensageiro, por isso a associação não tinha encontrado nenhuma outra saída, e ele, Seemann, assumira o difícil dever de comunicá-lo. “ pag 233

“ mais tarde, quando as pessoas começaram a nos visitar novamente, torciam o nariz sobre coisas totalmente sem importância, por exemplo que o pequeno lampião a óleo pendia sobre a mesa. Onde seria possível pendurá-lo a não ser

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sobre a mesa? Para elas, porém, parecia algo insuportável. Se no entanto colocássemos a lâmpada em outro lugar, não mudaria em nada sua má vontade. Tudo o que éramos e tínhamos, encontrava o mesmo desprezo. “ pag 240

“ Com grande cuidado e após muitos preparativos comunicamos ao pai a suspensão do nosso apoio financeiro, o que ele alias aceitou tranquilamente. Em sua mente já não era capaz de perceber a falta de perspectiva de suas intervenções, embora estivesse com certeza cansado das continuas decepções. Disse, de fato – não falava mais tão claramente como antes, quando sua fala era quase nítida demais -, que até então havia gasto muito pouco dinheiro, hoje ou amanha saberia de tudo e agora tudo tinha sido em vão, o fracasso fora só por dinheiro etc.; mas o tom em que falava tornava evidente que não acreditava em nada daquilo.“ pag 243/244

“ mas será que um funcionário pode individualmente perdoar? Seria no máximo assunto da autoridade conjunta, mas mesmo esta, provavelmente, não pode perdoar, apenas julgar. Mas como um funcionário tem condições, mesmo querendo descer da carruagem e cuidar do assunto segundo aquilo que o pai, o pobre, velho, envelhecido homem, lhe balbucia, de formar uma imagem da questão?” 244

“ Nós estávamos freqüentemente com eles, levávamos comida ou só íamos visitá-los, querendo convencê-los a voltar para casa; quantas vezes os encontramos lá, afundados e se apoiando um no outro sobre seu assento estreito, envoltos por uma coberta fina, que mal os cobria, por toda a vista nada senão o cinza da neve e da névoa, e dias inteiros nenhuma pessoa ou carruagem – que visão K., que visão! “ pag 247