FORMAS BULBARES DA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ
P A U L O P I N T O P U P O *
E L I O V A Z U K E R M A N * *
N E L S O N A L V A R E S C R U Z * * *
J . G E R A L D O D E C A M A R G O L I M A * * * *
C E M E J O R D Y * * * *
F E R N A N D O M E N E Z E S B R A G A * * * * *
O acometimento dos nervos bulbares na síndrome de Guillain-Barré parecia-nos raro. Entretanto, nestes últimos 18 meses tivemos a oportunidade de observar 6 pacientes em que tal aconteceu, o que nos chamou a atenção para o fato e nos levou a empreender uma revisão do assunto. Nesta revisão deparamos com idéias por vêzes as mais desencontradas, quer em relação ao diagnóstico clírtico, quer no que diz respeito às formas clínicas, quer quanto à própria conceituação da síndrome individualizada por Guillain e Barré, quer em relação aos achados anátomo-patológicos.
Predomina hoje, entretanto, o conceito de que a afecção descrita por Guillain-Barré-Strohl, com um quadro clínico definido, de evolução favorável é, em última análise, conseqüência de uma reação alérgica ao nível das raízes, nervos e mesmo do neuro-eixo, em face de fatôres desencadeantes os mais variáveis. Nesse conceito é que nós nos situamos. É à luz dêsses conhecimentos que focalizamos os nossos casos e é nêles que baseamos nosso diagnóstico.
É interessante enunciar êste ponto de vista, porque muitos casos de perturbações neuríticas de moléstias tóxicas ou infecciosas têm sido assinalados, em particular casos de afecções neuríticas relacionadas à difteria. Na literatura alguns dos casos de forma bulbar da polirradiculoneurite, o foram, como o de Gareiso 3 1 , e, em nosso próprio material clínico dois casos foram tidos como tendo sofrido difteria anteriormente, e um dêles realmente sofreu desta afecção (caso 7) . Seriam êles realmente neurites tóxicas, ou seriam verdadeiras polirradiculoneurites de natureza alérgica, desencadeadas pelo próprio estado infeccioso e evoluindo de modo benigno, tal como a síndrome de Guillain-Barré, acompanhando-se de dissociação albumino-citoló-gica no L C R ?
A eventualidade do comprometimento dos nervos cranianos nos casos de polirradiculoneurites generalizadas ou mesmo, a do comprometimento exclusivo dêsses nervos cranianos levou os diversos autores que têm tratado do assunto, a discutir classificações as mais variadas para formas clínicas
Traba lho do Se rv iço de N e u r o l o g i a da Escola Paul is ta de Medicina (P ro f . Pau l ino
W . L o n g o . * Chefe de Cl ínica; ** Assis tente; *** Assis tente ex t r anumerá r io do Ser
v i ço de Oto r r ino la r ingo log ia (P ro f . P a u l o Mangabe i r a A l b e r n a z ) ; **** Médico in
terno; * * * * * Doutorando interno.
diferentes da mesma afecção, relacionando a isto também o aspecto de
maior ou menor gravidade dos casos clínicos de per si 1, 14, 16, 18, 38, 43, 62, 66,
6 9 , 7 0 , 7 3 , 8 2 , 8 4 , 1 0 2 , 1 0 3 , 1 0 4 , 1 0 5 .
Naturalmente não interessa reviver essas discussões. Achamos mais in
teressante, a fim de situar na literatura os nossos casos, fazer uma análise
da incidência do comprometimento dos nervos cranianos em grande número
de casos, cuja descrição clínica encontramos bem discriminada na literatura 1,
2 , 4 , 6 , 8 , 1 0 , 1 2 , 1 6 , 1 7 , 1 8 , 1 9 , 2 1 , 2 3 , 2 6 , 2 7 , 2 9 , 3 1 , 3 3 , 3 4 , 3 9 , 4 0 , 4 3 , 4 4 , 4 7 , 4 8 , 5 3 , 5 4 , 5 5 ,
5 6 , 5 8 , 5 9 , 6 3 , 6 4 , 6 5 , 68, 7 1 , 7 3 , 7 4 , 7 7 , 7 8 , 79, 8 3 , 8 4 , 8 5 , 8 6 , 8 8 , 9 3 , 9 4 , 9 5 , 9 7 , 9 8 , 9 9 , 1 0 1 , 1 0 2 ,
1 0 3 , 1 0 4 , 1 0 5 , 1 0 6 Com êles elaboramos o gráfico 1, referente a 189 pacientes
diferentes, estando projetados quantas vêzes cada nervo craniano foi com
prometido.
Da análise dêsse quadro ressalta, logo, a predominância do acometimento do nêrvo facial, lesado em 140 de 189 casos. A seguir se situam os nervos bulbares, glossofaríngeo e pneumogástrico, lesados respectivamente em 69 e 78 casos. Os nervos espinal e hipoglosso foram acometidos em proporção muito menor nessa casuística (11 e 18 vêzes respectivamente).
Dos demais nervos cranianos acometidos assinalam-se, em ordem decrescente de incidência, os nervos motor ocular comum, motor ocular externo, trigêmeo, patético, acústico e óptico. O nervo olfativo não foi citado como tendo sido acometido.
O comprometimento dos nervos bulbares não é, pois, uma raridade quando associadamente a outros nervos cranianos, em particular ao nervo facial. Entretanto, muito menos freqüente é o acometimento isolado dêsses nervos. No gráfico 2, isto é bem evidente, pois em apenas 21 dos 189 casos êsses foram os únicos nervos cranianos acometidos, mas, assim mesmo, associados ao acometimento dos membros. Em um caso apenas o seu acometimento foi exclusivo.
No Serviço de Neurologia da Escola Paulista de Medicina, de 1939 a
1959 foram registrados 18 casos de síndrome de Guillain-Barré, seguidos em
tempo suficiente para que êsse diagnóstico pudesse ser bem afirmado. Dês
ses 18 pacientes, 9 apresentavam sòmente paralisia dos membros; um apre
sentava, além da paralisia dos membros, o acometimento do nervo facial
bilateralmente; em um havia paralisia dos membros e do nervo motor ocular
externo; em 7 havia comprometimento dos nervos bulbares. É esta última
eventualidade que se destaca pela alta incidência de comprometimento dos nervos bulbares e pelo fato de a maioria dos casos ter aparecido em tempo relativamente curto, o motivo do presente trabalho. Vamos analisar, pois, cada um dos 7 casos de síndrome de Guillain-Barré em que o acometimento dos nervos bulbares estêve presente.
O B S E R V A Ç Õ E S
C A S O 1 — E.R.P. , 5 anos, sexo feminino, branca, brasileira, mat r icu lada em 1-
4-1958. H á dois meses, febre e dor nas regiões parot idianas, seguindo-se entumesci-
mento re t romandibular b i la tera l ; fe i to t r a t amento com ant ibiót icos e cortisona, re
g red i r am comple tamente , em poucos dias, os sintomas da parot id i te . Duas semanas
após começou a apresentar di f iculdade na deg lu t ição e v o z rouca, que se tornou,
depois, anasalada; a seguir, instalou-se p rogress ivamente f raqueza gera l e dôres nos
braços e pernas. O quadro s in tomát ico foi piorando progress ivamente . Exame ge
ral — Pac ien te abatida, emagrec ida e a febr i l ; pressão ar ter ia l 1 1 0 x 7 0 . Exame
neurológico — A b o l i ç ã o dos re f lexos profundos dos membros superiores e infer iores ,
nos quais não se no tava qualquer a l t e ração do tonus ou da mot i l idade vo lun tá r ia .
Para l i s ia do véu do paladar . Ausência dos ref lexos fa r íngeo e de náusea, assim
como dif iculdade acentuada na deg lu t ição , com re f luxo de a l imentos pelo nar iz ;
v o z anasalada; paresia da corda v o c a l esquerda. Exame de secreção amigdaliana
—· n e g a t i v o para baci lo dif tér ico. Exame do liqüido cefalorraqueano lombar — l í
quor l ímpido e incolor, fo rmação de re t ícu lo f ibrinoso; 1,8 células por m m 3 ; 98 m g %
de proteínas totais; opalescência às reações de Nonne , We ichb rod t e Pandy; reação
de T a k a t a - A r a posi t iva, t ipo f loculante ; 731 m g % de c loretos; 63 m g % de gl icose ;
reação do benja im coloidal 00000.22222.20000.0; reações de Wassermann, de Steinfeld,
de E a g l e e do desvio do complemento para cisticercos, nega t ivas ; em síntese, dis
sociação a lbumino-c i to lógiea . Diagnóstico: Síndrome de Gui l la in-Barré . Tratamen
to: v i t amina B 1 , te tracicl ina, sulfato de estr iquinina e predinisolona. Evolução —
E m 5 de agôs to de 1958, ref lexos profundos normais , com exceção dos aqui l ianos
que persistem abol idos; mot i l idade normal do véu do paladar ; re f lexos f a r íngeo e
de náusea, normais ; deg lu t i ção normal ; v o z normal . Exame do LCR lombar —
l iquor l ímpido e incolor ; 1,8 células por m m 3 ; 32 m g % de proteínas totais ; reações de
Pandy, Weichbrod t e N o n n e nega t ivas ; reação do benjoim coloidal 00000.02220.00000.0;
reação de T a k a t a - A r a n e g a t i v a ; demais reações normais ; em síntese, t axa de pro
teínas no l imi te superior de normal idade . O caso evolu iu para a cura em 4 meses.
Síntese — Quadro cl ínico de início infeccioso gera l , a r re f l ex ia profunda genera
l izada, dôres radiculares e compromet imen to dos I X e X nervos cranianos; evo lução
f a v o r á v e l , cura e m 4 meses, tendo como seqüela a r re f l ex ia aqui l iana .
C A S O 2 — A . C . L . T . , 7 anos, sexo feminino, branca, brasileira, mat r icu lada em
16-4-1958. H á 3 meses, estado aparen temente gr ipai , com dôres no corpo, abat i
mento gera l e febre; l ogo no início surgiu dif iculdade na deg lu t i ção tanto para só
lidos como para líqüidos, com re f luxo pelo nar iz; a v o z in ic ia lmente rouca, tor
nou-se u l ter iormente impercept íve l , indo a té à afonia. V in te dias após, apareceram
dôres na reg ião cerv ica l , sendo a cabeça mant ida permanentemente incl inada para
a direita. O médico assistente fêz t r a tamento com ant ibiót icos e v i taminas , sem
resultado. O quadro cl ínico foi p iorando progress ivamente a té a data atual . Exa
me geral — Pac ien te abat ida; pulso 80; pressão ar ter ia l 80 χ 60; tempera tura 36,5°C. Exame neurológico — Inc l inação da cabeça para a direita, h ipotonia do músculo
externocle idomastoideu e t rapézio à esquerda; paresia das cordas voca i s . N o s m e m -
bros superiores e nos inferiores não hav ia a l t e ração da mot i l idade, dos ref lexos ou
do tonus. Dôres radiculares cerv ica is bi laterais , mais intensas à direi ta . Exame
radiográfico simples do crânio, normal . Exame radiogrâfico simples da coluna cer
vical: escolíose s in is t ro-convexa da coluna ce rv ica l ; t ransição crânio-ver tebra l nor
mal . Exame para a pesquisa do bacilo diftérico na secreção faríngea, n ega t ivo .
Exame do liqüido cefalorraqueano lombar — l íquor l ímpido e incolor ; 1,8 céiulas
por m m 3 ; 84 m g % de proteínas totais ; opalescência às reações de N onne e Pandy ;
720 m g % de c lore tos ; 54 m g % de g l icose ; reação do benjoim coloidal 00000.12222.
20000.0; reações de Wassermann, de Steinfeld, de Eag le , nega t ivas ; em síntese, dis
sociação a lbumino-c i to lóg ica . Diagnóstico: S índrome de Gui l la in-Barré . Tratamen
to: Cort icóides, sulfato de estr iquinina e v i t amina B 1 . Evolução — E m 26 de abri l
de 1958, regressão comple ta de todo o quadro c l ín ico; a paciente f a l ava bem, a
deg lu t ição j á era normal e a cabeça assumia a sua posição normal ; a fôrça mus
cular e o tonus dos músculos ex ternocle idomasto ideu e t rapézio e s t avam normais .
Síntese — Caso inic iado por processo infeccioso gera l , com dôres radiculares
cerv ica is ; compromet imen to dos I X e X nervos cranianos, b i la tera lmente , e do X I
ã direi ta; evo lução f a v o r á v e l em 10 dias.
C A S O 3 — M . R . L . , 9 anos, sexo feminino, branca, brasileira, mat r icu lada em 30-
4-1958. H á dois meses estado aparentemente gr ipai , com cefaléia , dôres no corpo,
aba t imento gera l , febre e dor de ga rgan ta . Quat ro dias após, dif iculdade de deg lu
t ição, tanto para sólidos como para l íqüidos que re f lu íam pelo nariz; v o z anasalada.
H á 15 dias, v i são dupla e cefalé ia moderada . Exame geral — Pac ien te abat ida;
pulso 80; pressão ar ter ia l 110 χ 70; tempera tura 36°C. Exame neurológico — Globos
oculares desviados para dentro, com impossibi l idade de excursão la tera l ; v o z anasa
lada; paresia b i la tera l do véu do paladar ; ausência dos ref lexos fa r íngeo e de náu
sea; incapacidade de deg lu t ição voluntár ia , com ref luxo de a l imentos pelo nariz;
paresia das cordas voca is . N ã o hav ia distúrbios da sensibilidade. Exame do liqüido
cefalorraqueano suboccipital — Aspec to l ímpido e incolor ; 1 célula por m m 3 ; 32 m g %
de proteínas totais ; opalescência à reação de Pandy ; 725 m g % de c loretos; 58 m g %
de g l icose ; reação do benjoim coloidal 00000.02220.00000.0; reações de T a k a t a - A r a ,
Wassermann, Steinfeld e E a g l e e do desvio do complemento para cisticercos, nega
t ivas ; em síntese, dissociação a lbumino-c i to lóg ica . Diagnóstico: Síndrome de Gui l
la in-Barré . Tratamento: Sulfa to de estriquinina, v i t amina B1 e prednisolona. Evo
lução — E m 14 de ma io de 1958, regressão to ta l das paresias oculares e dos distúr
bios da deg lu t ição e da fonação, com mot i l idade normal do véu do paladar e das
cordas voca is ; r e f lexos fa r íngeo e de náusea normais .
Síntese — Caso de início infeccioso gera l com compromet imen to bi la tera l dos
V I , I X e X nervos cranianos; evo lução para cura após 16 dias.
C A S O 4 — A . M . F . , 7 anos, sexo masculino, branco, brasileiro, mat r icu lado em
10-6-1958. H á dois meses, febre e dor de ga rgan ta ; o médico assistente adminis
trou penicil ina, com o que os s intomas desapareceram comple tamente . U m mês
após, o paciente foi amigda l ec tomizado ; no terceiro dia de pós-operatór io o pa
ciente j á se apresentava normal re tornando à escola; no quinto dia começou a se
que ixa r de dor de cabeça e, no sexto dia, o paciente apresentava-se enfraquecido,
mal podendo caminhar, com a v o z anasalada e a deg lu t ição dif icul tada, inclus ive
para líqüidos, os quais re f lu íam pelo nariz. O quadro cl ínico foi piorando pro
gress ivamente a té a data atual . Exame geral — Pac ien te abatido, a febr i l ; pressão
ar te r ia l 90 χ 60. Exame neurológico — Parapares ia f lácida, com abol ição dos re
f lexos patelares, aqui l ianos e médio-plantares ; re f lexos cutâneo-plantares normais .
Nos membros superiores d iminuição dos ref lexos profundos e da fôrça muscular,
sem paresia nít ida. N ã o hav ia distúrbios da sensibilidade. Pares ia do véu do pa-
ladar; ausência do re f l exo fa r íngeo e do r e f l e x o de náusea; di f iculdade acentuada
para a deg lu t i ção ; v o z anasalada; r e f luxo de a l imentos pelo nariz . Exame da se-
creção amigdaliana: n ega t i vo , para bac i lo di f tér ico . Exame do liqüido cefalorra-
queano lombar: l íquor l ímpido e incolor ; 1 célula por m m 3 ; 64 m g % de proteínas
totais; opalescência às reações de N o n n e e Pandy ; 749 m g % de c lore tos ; 65 m g %
de g l icose ; reação do benjo im colo ida l 00000.22222.00000.0; reações de Wassermann,
do desvio do complemento para cisticercos, de Steinfeld, de Eag le , nega t ivas ; em sín
tese, dissociação a lbumino-c i to lóg ica . Diagnóstico: Síndrome de Gui l la in -Bar ré . Tra
tamento: Prednisolona, sulfato de estriquinina, v i t a m i n a B1 e v i t amina C. Evolução
— E m 24 de junho de 1958, melhora acentuada da mot i l idade dos membros infe
riores, j á com possibil idade de se man te r bem de pé, marcha prà t icamente no rmal ;
ref lexos patelares, aqui l ianos e médio-plantares presentes, mas h ipoa t ivos ; nos m e m
bros superiores, os ref lexos e s t avam normais , não havendo mais d iminuição da força
muscular; r e f l exo fa r íngeo presente, deg lu t i ção normal , v o z ainda um pouco ana
salada.
Síntese — Quadro com início infeccioso, paresia f lácida dos membros inferiores,
compromet imen to dos I X e X nervos cranianos; evo lução f a v o r á v e l para a cura
e m 14 dias.
C A S O 5 — W.C.L . , 4 anos, sexo masculino, branco, brasi leiro, mat r icu lado em
3-6-1958. H á 45 dias, febre e dor de ga rgan ta . O médico assistente suspeitou de
dif ter ia; ent re tanto os exames subsidiários não conf i rmaram essa hipótese; foi insti
tuído t ra tamento com ant ibiót icos e sôro ant i -dif tér ico, não ocorrendo melhoras
apreciáveis . H á 25 dias, f raqueza nos membros inferiores, d i f iculdade de deglu t i
ção e a l terações da v o z . O quadro c l ín ico foi piorando progress ivamente a té a
data atual . Exame geral — Pac ien te abat ido, pál ido; tempera tura 36,5°C, ax i l a r ;
pulso 100 por minuto . Exame neurológico — Pa rap l eg i a f lácida com abol ição dos
ref lexos patelares, aqui l ianos e médio-plantares ; re f lexos cutâneo-plantares normais .
Nos membros superiores a mot i l idade , o tonus e os ref lexos profundos e s t avam
normais . Hiperestesia táct i l e dor à compressão muscular nos membros infer iores .
Pares ia bi la tera l do véu do paladar . Ausência do re f l exo f a r íngeo e de náusea;
incapacidade para deg lu t i ção vo lun tá r i a ; v o z anasalada; r e f luxo de a l imentos pelo
nariz. N ã o hav ia nít ida a l te ração da mot i l idade das cordas voca is . Incapac idade
de excursão do ôlho esquerdo para fora. Exame do lìqüido cefalorraqueano lom
bar — L i q u o r l ímpido e incolor ; 0,4 células por m m 3 ; 180 m g % de proteínas totais;
opalescência às reações de Pandy e N o n n e ; 725 m g % de c loretos; 64 m g % de g l i
cose; reações de Wassermann, do desvio do complemento para cisticercos, de Stein
feld, nega t ivas ; reação do benjoim colo ida l 02220.22222.22222.0; em síntese, dissocia
ção a lbumino-c i to lógica . Diagnóstico: S índrome de Gui l la in -Bar ré . Tratamento:
A C T H , v i t amina B1 e sulfato de estr iquinina. Evolução — Melhora progress iva do
quadro cl inico, tendo o paciente recebido a l ta hospi talar 10 dias após, apresentando
ainda paresia f lácida dos membros inferiores, abol ição dos re f lexos patelares, aqui
lianos e médio-plantares ; marcha possível com apoio. Persis t ia o distúrbio da fona-
ção, porém não mais a dif iculdade de deg lu t ição , nem o re f luxo de l íqüidos pelo
nariz. Exame do líqüido cefalorraqueano: L í q u o r l ímpido e incolor ; 1 célula por
m m 3 ; 195 m g % de proteínas totais; opalescência às reações de Pandy e N o n n e ;
731 m g % de cloretos; 62 m g % de gl icose ; reação de Wassermann nega t iva ; reação
do benjoim coloidal 00000.20000.00000.0. Fo i recei tado prednisolona, v i t amina B1 e
sulfato de estr iquinina. R e e x a m i n a d o a 5 de agôs to de 1958, o paciente apresen
t ava marcha com pequena instabil idade, fôrça e tonus muscular nos membros in
feriores normais; r e f l exo pate lar h ipoa t ivo à direita, normal à esquerda; re f lexos
aqui l ianos ausentes b i l a te ra lmente ; v o z pouco anasalada; paresia do pá la to mole à
di re i ta pouco ev iden te ; ref lexos f a r íngeo e de deg lu t ição normais ; mot i l idade ocular
normal . N o v o exame do liqüido cefalorraqueano: L í q u o r l ímpido e incolor; 1,4 cé
lulas por m m 3 ; 60 m g % de proteínas totais, opalescência às reações de Pandy e
Nonne . E m síntese, dissociação a lbumino-c i to lóg ica menos acentuada.
Síntese — Quadro c l ín ico que se iniciou com distúrbios da deg lu t ição e da f o -
nação, seguidos, 20 dias após, progress ivamente , de parap leg ia f lácida. O e x a m e
neuro lóg ico reve lou paral isia dos V I , I X e X nervos cranianos, associada a paralisia
per ifér ica dos membros inferiores, com dor à compressão muscular e hiperestesia
táct i l . Melhora em 15 dias, com al ta hospi ta lar ; cura em 60 dias, com seqüelas
mínimas .
C A S O 6 — I .P . , branca, 24 anos, brasileira, casada, examinada em 2-3-1955. H á
3 semanas parestesias nas ex t remidades distais dos quatro membros ; há 8 dias, di
f iculdade na m o v i m e n t a ç ã o dos membros inferiores, há 4 dias, déf ic i t funcional dos
membros superiores, assim como impossibi l idade para l evan ta r a cabeça do t raves
seiro; nesta ocasião começou a ter diplopia e dif iculdade para deglu t i r a l imentos
sólidos e l íqüidos. Exame geral — Pac i en t e abat ida e afebr i l . Exame neurológico
Tetrapares ia intensa, restando apenas alguns mov imen tos globais dos membros su
periores e dos dedos das mãos; a r re f l ex ia profunda genera l izada . Pares ia facial de
t ipo per i fér ico de moderada intensidade; paral isia total e bi la tera l dos I I I , I V e V I
nervos cranianos, com impossibi l idade de m o v i m e n t a ç ã o dos g lobos oculares em tô
das as direções; paresia dos I X e X nervos cranianos com grande dif iculdade na
deg lu t ição e abol ição dos ref lexos fa r íngeo e de náusea; paresia dos músculos tra-
pézio e ex te rnoc le idomas tó ideo ( X I ne rvo c r an i ano ) , b i la te ra lmente . Exame do li
qüido cefalorraqueano lombar — L i q u o r xan toc rômico ; 380 m g % de proteínas; 1
célula por m m 3 ; f o rmação de re t ículo f ibr inoso; reações para globul inas posi t ivas;
714 m g % de c loretos; 58 m g % de gl icose ; reação do benjoim coloidal 22222.22000.
22222.0; reação de T a k a t a - A r a posi t iva; t ipo v e r m e l h o ; reações de Wassermann,
Steinfeld, E a g l e e do desvio do complemento para cisticercos, nega t ivas ; em síntese,
dissociação a lbumino-c i to lóg ica . Diagnóstico: S índrome de Gui l la in-Barré . Trata
mento: A C T H endovenoso, sa l ic i la to de sódio endovenoso e estriquinina. Evolução
— A p ó s 3 a 4 dias de t ra tamento , a paciente j á conseguia deglu t i r bem, desapare
cendo progress ivamente as paralisias oculares, tendo al ta hospi talar após 38 dias de
internação. Nes ta ocasião havia apenas fraqueza muscular genera l izada, embora
conseguisse andar per fe i tamente . R e s t a v a ainda abol ição dos ref lexos profundos.
N o v o exame do liqüido cefalorraqueano, fe i to 20 dias após o pr imeiro, mostrou dis
sociação a lbumino-c i to lóg ica (820 m g % de proteínas e 0,4 células por m m 3 ) ; rea
ções para g lobul inas posi t ivas; demais e lementos normais. R e e x a m i n a d a 26 dias
após al ta hospitalar, a paciente apresentava-se per fe i tamente bem, sem qualquer
a l te ração , restando apenas a r re f l ex ia profunda genera l izada .
Síntese — His tór ia de três semanas; quadro cl ínico de parestesias, depois tetra
paresia f lácida com a r re f l ex ia profunda genera l izada e compromet imen to dos I I I ,
V I , V I I , I X , X e X I nervos cranianos; evo lução f a v o r á v e l e cura em dois meses,
restando apenas a r re f l ex ia profunda genera l izada .
C A S O 7 — E.A.C. , 4 anos, sexo feminino, branca, brasileira, examinada e m 9-5-
1959. H á um mês a paciente es têve internada no Hospi ta l de I so lamento por ter
di f ter ia ; permaneceu 8 dias em t ra tamento saindo perfe i tamente bem, sem qualquer
seqüela ou distúrbio ob je t ivo . Após 8 dias, estrabismo e dif iculdade para apreender
objetos, andar, aba ixar e levantar . Êstes s intomas progred i ram, apresentando t am
bém dif iculdade de deg lu t ição e fonação, não conseguindo engo l i r l íqüidos ou sóli
dos e só emi t indo alguns sons. Exame geral — Pac ien te abatida, afebr i l . Exame
neurológico — Déf ic i t do m o v i m e n t o la tera l para fora dos g lobos oculares, b i la te
ra lmente , mais à direi ta ; paresia do véu do paladar com dif iculdade para deglu t i -
ção; abol ição dos re f lexos fa r íngeo e de náusea; não hav ia a l t e ração nít ida da
m o v i m e n t a ç ã o das cordas voca i s ; paresia acentuada nos quat ro membros , com maior
déf ic i t muscular nos músculos das raízes dos membros ; a r re f l ex ia profunda gene
ra l izada . Exame do liqüido cefalorraqueano lombar — L í q u o r l ímpido e incolor ;
0,8 células por m m 3 ; 82 m g % de proteínas totais ; opalescência às reações para
globul inas; 708 m g % de cloretos, 48 m g % de gl icose, reação do benjo im coloidal
22222.22200.02222.0; reação de T a k a t a - A r a posi t iva, t ipo v e r m e l h o ; reações de W a s -
sermann, Eag le , Steinfeld e desvio de complemento para cisticercos, n e g a t i v a s ; em
síntese, dissociação a lbumino-c i to lóg ica . Diagnóstico: S índrome de Gui l la in-Barré .
Tratamento: Dexametazona , estriquinina, v i t a m i n a B1 e com p l e xo B. Evolução —
A paciente melhorou progress ivamente e, após um mês, apresentava-se per fe i tamente
bem do ponto de vis ta gera l e neurológico , com ót ima m o v i m e n t a ç ã o gera l , r eg re
dindo todos os sinais de compromet imen to de nervos cranianos e os distúrbios m o
tores dos membros , restando apenas a r re f l ex ia profunda genera l izada .
Síntese — Quadro de pol i r radiculoneuri te , instalado 8 dias após cura clínica de
difteria, com compromet imen to bi la tera l dos V I , I X e X nervos cranianos, te trapa-
resia f lácida com ar re f lex ia profunda genera l izada . L í q u o r com dissociação a lbumi
no-c i to lógica . E v o l u ç ã o para cura em 30 dias.
C O M E N T Á R I O S
O comprometimento dos nervos bulbares I X e X (glossofaríngeo e pneu-mogástrico) foi comum a todos os casos aqui registrados. Acometimento menos freqüente foi o do X I nervo (espinal), evidente sòmente nos casos 2 e 6. O X I I nervo (hipoglosso) em caso algum foi lesado.
A afecção dêsses nervos bulbares se apresentou isolada somente nos casos 2 e 3. Nos demais casos ela se apresentou associada à afecção de membros (casos 1, 4, 5, 6 e 7) ou à do nervo abducente (casos 3, 5, 6 e 7), do nervo motor ocular comum (caso 6), do nervo facial (caso 6) . Chama a atenção o fato de o comprometimento do nervo facial ter se apresentado sòmente no caso 6, em contraste com o que se vê na literatura, onde êste nervo craniano é considerado como o mais freqüentemente afetado.
Como comentário final resta assinalar o fato de que a lesão dos nervos
bulbares na síndrome de Guillain-Barré não foi eventualidade rara em nossa
casuística.
R E S U M O
Uma revisão crítica do conceito, das formas clínicas, das teorias patogênicas relativas à síndrome de Guillain-Barré é feita preliminarmente, com finalidade de situar o ponto de vista dos autores em relação às idéias que encontraram na literatura, por vêzes bastante divergentes. A seguir, uma revisão relativa ao comprometimento dos nervos cranianos nos casos publicados veio mostrar que o nervo facial é o mais freqüentemente atingido, sendo bastante mais raro o comprometimento dos nervos motores oculares ou dos nervos bulbares.
São relatadas 7 observações de casos de síndrome de Guillain-Barré com dissociação albumino-citológica no líqüido cefalorraqueano e evolução favorável para a cura em tempo relativamente curto, nos quais a lesão dos I X e X nervos cranianos foi constante. Êste acometimento foi isolado em 2 casos (em um dêles tendo sido também lesado o X I nervo), associada a outros nervos cranianos não bulbares em 4 casos e à paralisia de membros em 5 pacientes.
Particular atenção merece o fato de estarem estas 7 observações incluídas em uma casuística de 18 casos de síndrome de Guillain-Barré, 6 dos quais observados no Serviço de Neurologia da Escola Paulista de Medicina em um curto período de 18 meses. Sua alta incidência contrasta, pois, com o que é habitualmente assinalado na literatura.
S U M M A R Y
The bulbar forms of the Guillain-Barré syndrome.
The ideas found in the medical literature about clinical and pathological aspects concerning the Guillain-Barré syndrome are varied; the authors try in this paper to give their opinion on the subject.
As far as the cranial nerves are concerned, the literature shows that the V I I t h is doubtless the more frequently injured; the oculomotor and bulbar nerves are seldom damaged.
This study was done in 7 patients selected from 18 cases with Guillain-Barré syndrome in the Serviço de Neurologia da Escola Paulista de Medicina. All 7 presented an albumino-cytologic dissociation in the C.S.F., a swift recovery towards cure and envolvement of the I X t h and X t h nerves. One case presented isolated lesion of the I X t h and X t h nerves; one case, involvement of the I X t h , X t h and X I t h nerves; four cases, associated lesion of the I X t h , X t h and others than bulbar nerves; four cases, paralysis of the limbs besides involvement of the cranial nerves.
The authors call attention to high incidence of the bulbar form of the Guillain-Barré syndrome in their material, in contrast with what has been reported in the literature (7 bulbar cases out of 18 Guillain-Barré syndrome patients).
R E F E R Ê N C I A S
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