Disputas internas: O Federalismo e a contestação do poder centralizado no
contexto Histórico e na Pandemia de Covid-19 no Brasil.
Cyro Porto Martins
Universidade federal de Santa Maria
Introdução:
A formação dos Estados nacionais na América Platina (Argentina, Bolívia, Brasil,
Paraguai e Uruguai) foi marcado por diversos conflitos e disputas que atravessaram o
século XIX. Disputas essas que foram influenciadas por diferentes visões acerca da
conformação do Estado e dos interesses de diferentes grupos que compunham esses
territórios. Nesse contexto, as disputas sobre o Federalismo e sua antítese, o
Unitarismo/Centralismo, foram determinantes nos conflitos que se deram na formação do
Estado brasileiro desde da sua independência em 1822, chegando também até ao início
da República nos anos finais do século XIX. Não obstante, atualmente com a Pandemia
que assola o planeta, as disputas entre o governo central e as unidades federativas se
mostram latentes. Nesse sentido, o presente trabalho busca fazer um paralelo entre as
disputas pelas bandeiras do Federalismo e Unitarismo/Centralismo ao longo do século
XIX, com a atual desavença entre o governo central do Brasil e suas Unidades
Federativas.
Federalismo e a América Platina:
Com advento das ideias iluministas, no século XVIII e a propagação das ideias da
Revolução Francesa, fizeram-se presentes em diversos processos que impactaram de
forma significativa o continente americano. Entres esses, destacamos as independências
da América Espanhola e do Brasil nas primeiras décadas do século XIX. Nesse sentido,
a “bandeira” do Federalismo e sua oposição o Unitarismo/Centralismo, estiveram latentes
durante diversos conflitos e disputas entre e dentro esses Estados, essas estavam
relacionadas com as fronteiras, com a reorganização do espaço geográfico da América
Platina e com a consolidação dos Estados Nacionais. Não obstante, com os processos de
independência da América Espanhola, bem como, do Brasil, o termo Federalismo sofreu
modificações que decorreram daqueles processos.
A invasão napoleônica na península ibérica e as reações dos Vice-reinos
espanhóis, como também a do Brasil, no caso desse último com a transferência da capital
do Império Português para o Rio de Janeiro, ocasionaram os processos de rupturas nas
colônias espanholas e a elevação do Brasil a Reino Unido de Portugal e Algarve. Nesse
sentido, nos Vice-reino do Rio da Prata1, com a deposição do Rei Carlo VI pelas tropas
napoleônicas, diversas questões administrativas que passavam pelo aval do Rei
anteriormente, levaram no Vice-Reino do Rio da Prata, à convocação das autoridades
coloniais e sequencial declaração de Cabildo Aberto (GOLDMAN, 2009).
Ao analisarmos os processos de independência do Vice-Reino do Rio da Prata, até
a formação da República da Argentina, em 1863, os termos Federalismo e
Confederalismo foram significativos ao longo do processo de formação do Estado
Argentino (CHIARAMONTE, 1996). Nesse segmento, os termos Federalismo e
Conderalismo possuíam um significado semelhante no período. O autor destaca, também,
que no caso do Vice-Reino do Rio da Prata:
Entre 1810 y 1853, el conjunto de pueblos que compodrían la futura República
Argentina careció de texto contituicional y de estructuras estatal permanente.
En esse periodo, el llamado deferalismo argentino era um conjunto de
tendencias politicas doctrinamente poco definidas, que lo más que produjo ,
sobre la base de um pacto, fuel uma débil confederación vigente entre 1831 y
1853 (1996, p. 81).
O processo de independências das colônias ibéricas na América Platina passa pela
questão da fronteira. Na Imagem a seguir podemos visualizar que as fronteiras, essa que
foi central nas disputas que se deram na formação dos Estado-Nação, entre as colônias
lusitanas e castelhanas não estavam definidas. Na imagem a seguir visualiza os Processos
de independência das Colônias Espanholas:
1 Vice-Reino do Rio da Prata era uma região administrativa do Império Espanhol, compelia às atuais regiões da Argentina, Paraguai, Uruguai e partes da Bolívia e do Brasil.
Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Guerras_de_independ%C3%AAncia_n/a_Am%C3%A9rica
espanhola#/media/Ficheiro:SAI_Wiki_2.png. Acesso em: 28/082020, às: 15:23.
Podemos observar, na imagem, que as fronteiras entre e dentro dos Vice-reinos e
conseguinte, na formação dos Estados, as fronteiras entre essas regiões estavam em
constantes transformações.
Ao trabalharmos com o Brasil, o Federalismo está ligado diretamente com o
processo de formação do Estado, bem como no processo independência. A transferência
da Coroa Portuguesa para o Brasil, em 1808, elevou a região a Reino Unido do Brasil,
Portugal e Algarve. Essa modificação contribuiu, para que em 1822, o Brasil fizesse sua
independência em relação a Coroa Portuguesa. Nesse sentido, o Federalismo estava
pautado pela constituinte. Porém, com a implantação da Constituição outorgada por Dom
Pedro I, o Unitarismo prevaleceu. Assim, houveram rebeliões questionando deste modelo
de organização do estado brasileiro, como a Confederação do Equador, em 1824, que foi
derrotada pelas forças imperiais. O Federalismo não desaparecerá e se manifestará,
especialmente, com a vacância do poder no Brasil, com a abdicação do Imperador. O
período que se iniciou com as regências (1831-1840), as disputas e conflitos se mostraram
intensos, pois o centralismo do governo se chocou com os interesses regionais e com as
ideias Federalistas e Republicanas que encontravam-se circulando pela América. Mesmo
que com a reforma à Constituição, como Ato Adicional de 1834, que cria as Assembleias
Legislativas provinciais, não resolveram os descontentamentos regionais (GRAHAM,
2001).
A Revolução Farroupilha (1835-1845), na província de Rio Grande de São Pedro
e a Guerra dos Cabanos (1835-1840) na província do Grão-Pará, são alguns exemplos
desses conflitos. Nesse contexto, alguns autores trabalham o Federalismo no Brasil em
diferentes aspectos, especificamente, na Revolução Farroupilha, as disseminações das
ideias republicanas e os variados significados de federalismo durante a revolta
mostraram-se presente no conflito. Nesse sentido:
(...) as relações de poder e as reivindicações regionalistas manifestadas com a
Revolução Farroupilha, mostravam que a Província, através de sua elite, exigia
uma redefinição de seu espaço econômico-social e político tanto no âmbito
nacional, quanto regional. E, é nesse sentido que encontramos a defesa do
federalismo e também da república presentes nos informes de periódicos que
circulavam na Província do Rio Grande como no âmbito regional,
exemplificando nas terras da Banda Oriental (do rio Uruguai) (PADOIN e
PEREIRA, 2012).
Ainda que Federalismo fosse, uma dentre outras ideias presentes nas revoltas
regenciais, as derrotas destas não significaram a morte do Federalismo. Não obstante,
nesse mesmo período as ideias federalistas estavam em plena discussão na conformação
dos Estados vizinhos ao Império do Brasil. A guerra Grande no Uruguai (1839-1851) e o
Pacto Co(n)feral nas Províncias Unidas do Rio da Prata2 são exemplos da plena latência
das ideias federalista na América Platina.
A partir da terceira década do século XIX, a região platina passava por diversas
transformações nas suas fronteiras, como também na organização estatal. O pacto
2 Atual Argentina.
Co(n)federal, na atual região da Argentina, reunião as províncias em uma Confederação3,
nesse segmento Bravo aponta que:
Bajo estos fundamentos, las provincias suscribieron pactos de unión. El más
importante fue el de 1831, denominado Pacto Federal, a través del cual esas
entidades delegaron el manejo de la representación exterior en el gobernador
de Buenos Aires, Juan Manuel de Rosas.5 A pesar del invocado propósito de
unión, los pactos airmaban en la práctica la tendencia confederal que no llegó
a cristalizar en una estructura institucional deinida. En parte por la
imposibilidad de las provincias a suscribir un acuerdo de mayor alcance que
expresara los intereses contrapuestos de las partes y también por la incapacidad
de la entidad política más poderosa, la provincia de Buenos Aires, de liderar
un proceso de unidad territorial y organización política.6 La situación de
indeinición institucional se prolongó por más de cuatro décadas y generó una
situación de statu quo, en la que las provincias del ex virreinato del Río de la
Plata operaron sin constitución alguna (2013, p.208).
Uma guerra civil no Uruguai é desencadeada entre dois principais grupos
conformados em dois partidos, os Blancos e os Colorados. Cada um com suas
representações e interesses nas quais o Império do Brasil e o Partido Unitário da
Confederação Argentina fizeram-se presentes no apoio ao partido colorado. A Guerra
Grande no Uruguai ou a Guerra contra Oribe (Blanco) e Rosas (Partido Federal
Confederação Argentina) como ficou conhecida, abarcou interesses econômicos de
fronteiras, mas sobre tudo sobre a conformação dos Estados platinos pós os processos de
independência. Apesar do fim do conflito no Uruguai, as contradições internas ainda se
fariam presentes anos depois.
A consolidação do Estado argentino em 1961, em uma República Federal, como
também as disputas que se mantiveram ao longo do período, entre Blancos e Colorados
no Uruguai, colocou novamente as disputas de interesses dos Estados Platinos em xeque.
O Império do Brasil e a República Argentina colocaram-se a favor dos Colorados
enquanto, nesse período, um outro Estado Platino envolveu-se nos conflitos em volta do
rio da Prata, o Paraguai. Este em decorrências de fatores territoriais, econômicos e
militares apoiou, no conflito, o Partido Blanco. A ocorrência de diversos interesses na
3 Nesse período o terno Confederação já possuiu uma distinção do termo Federalismo. Confederalismo, basicamente, é a união de determinadas regiões para defesa ou representação mútua, sendo que não se configura como um Estado Único. A exemplo a união de determinados estados para defesa mútua ou de representação diplomática.
região, juntamente com os diversos interesses que envolviam diferentes grupos, levou o
Império do Brasil a invadir o Uruguai, na qual resultou em uma resposta paraguaia com
invasão a província do Mato Grosso. Nesse contexto as bases para um conflito
generalizado que ficou conhecido, no Brasil como “A Guerra do Paraguai” (1864-1970)
(IZECKSON, 2009).
Interesses políticos, ideológicos, militares e econômicos fizeram do conflito, entre
os Estados Platinos, o maior confronto do século XIX na região. As consequências da
beligerância platina foram principalmente na modificação das fronteiras nacionais nesses
territórios. Ainda que a derrota paraguaia e o violento perda demográfica e social que ela
causou sejam de extrema relevância, a perda territorial e a consolidação do Brasil e da
Argentina como Estados foram grandes fatores para que entendamos os abalos internos
que causaram aos países vencedores. No caso brasileiro, a Guerra do Paraguai
potencializou as contradições internas do sistema brasileiro (LEMOS, 2009). Nesse
sentido o autor defende ainda, que juntamente com o fortalecimento dos fazendeiros de
café e das ideias republicanas, proporcionaram uma troca nas figuras de poder, nesse
segmento o “projeto republicano e federalista oferecia a esses agricultores efetiva via de
acesso ao poder político, uma vez que o poder econômico eles já encarnavam” (2009,
p.415).
As consequências da Guerra do Paraguai e o fortalecimentos dos cafeicultores
paulistas foram de grande impacto que proporcionaram a queda da monarquia no Brasil.
Todavia, o fortalecimento do Partido Republicano, principalmente no Rio Grande do Sul
e em São Paulo não colocariam a maioria dos deputados eleitos em 1889 (CASTRO,
2000). Não obstante, os interesses desses grupos, aliados aos descontentamentos da
“Casta Militar”4 colocariam o fim na monarquia, em novembro de 1889, através de um
golpe, na qual foi proclamada a República do Brasil. Nesse sentido, Castro (2000)
Os republicanos ‘doutrinários’ eram em sua maioria ex-membros do Partido
Liberal. Tinham o manifesto de fundação do partido como referência,
centrando suas esperanças na descentralização política através do
enfraquecimento do Executivo e do fortalecimento das províncias —
“federação” era a palavra mágica.
4 As ideias republicanas faziam-se presente nas fileiras no exército, principalmente nas escolas militares.
O projeto Federalista da República Brasileira, outorgado pelo golpe de 1889,
ofereceu as elites locais do Brasil acesso a participação política. No entanto, esses projetos
e essas partição política não foram para todos. Nesse caminho, as ideias federalistas ainda
circulavam pelos -agora- estados, ainda que a constituição de 1891 previsse uma
República Federativa, os descontentamentos internos se faziam presentes. Nesse
segmento, as disputas de poder se manifestaram no conflito entre os partidários de Júlio
de Castilhos e de Silveira Martins no Rio Grande do Sul, estava declara a Revolução
Federalista. Nesse sentido, a Revolução Federalista (1892-1895), no sul do Brasil,
demonstra que as perspectivas do entendimento sobre o Estado Republicano Federalista
implantado, encontrou divergências entre o centro do poder brasileiro e o sul do Brasil.
A constituição do Rio Grande do Sul, em 1891, com forte posição positivista, possuía o
centralismo, dentro do estado, como forma de governo. O estado liderado por Júlio de
Castilhos, foi derrubado por grupos internos que o depuseram que duraria por pouco
tempo. Esse período ficou marcado pela sucessão de poder na região na qual os grupos
contrários a Castilhos não conseguiram formar uma coesão no governo. Esses
acontecimentos, juntamente com a volta de Gaspar Silveira Martins do exílio,
ocasionaram uma aproximação de Castilhos com então presidente Floriano Peixoto
(ANDRADE, 2016).
Com a formação do Partido Federalista e a aclamação de Silveira Martins como
presidente, desencadearam a guerra civil. As disputas pelo poder perpassavam pelas
questões ideológicas, contudo os federalistas opuseram-se ao positivismo da constituição
castilhista na qual previa um governo centralizado dentro do estado. Podemos perceber
que o Federalismo não possuiu um único entendimento, nesse caso Castilhos era aliado
do governo federal, ou seja, não previa um Centralismo na esfera nacional, contudo, na
esfera regional, baseados nas ideias positivista, previa um Centralismo. Não obstante, os
motivos ideológicos não foram as únicas causas para o conflito no Rio Grande do Sul,
motivos e interesses de grupos rivais fizeram presentes durante o conflito. Nesse sentido,
para um melhor entendimento da revolução e a participação desses grupos recomendo a
dissertação de Gustavo Andrade (2016).
O Século XX e o as considerações atuais.
O longo século XIX, parafraseando Eric Hobsbwam, foi um período de diversas
disputas na conformação dos Estados como na consolidação destes. Nesse sentido, o
Federalismo passou por transformações nos seus entendimentos, bem como, foi utilizado
em diversos conflitos e disputas que ocorreram dentro e entre os Estados da América
Platina. No entanto, a partir do século XX o Federalismo é envolvido nos acontecimentos
que ocorreram ao longo do século XX.
A partir de 1930, com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder no Brasil, este
natural do estado do Rio Grande do Sul, mudanças no panorama nacional são sentidas.
Nesse segmento, medidas direcionadas à classe trabalhadora e a construção de uma
identidade nacional são postas em práticas em âmbito nacional, buscando atender a
reivindicações de diversos grupos sociais. A constituição de 1934, prevê um Federalismo
no Brasil, fazendo menção a proclamação da República em 1889 (BRASIL, 1934).
Entretanto, a partir de 1937, Getúlio Vargas instaura, através de um golpe, um regime
ditatorial, que ficou denominado Estado Novo.
Nesse contexto, o Federalismo foi previsto pela Constituição de 1937, “O Brasil
é um Estado federal, constituído pela união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal
e dos Territórios. É mantida a sua atual divisão política e territorial” (BRASIL, 1937).
Todavia, a nomeação dos governadores ficava a cabo do Presidente da República, nesse
caso ao ditador Vargas, sendo que a participação social, bem como de grupos que eram
considerados não aliados com o governo ficou restrita. Nesse sentido, o Brasil, passa por
um período com um Estado Centralizado, na qual a participação e grupos regionais, não
aliados ao governo, foram reprimidas. A constituição de 1937, nos possibilitava observar
o nacional como o centro do poder no país, colocando-se acima do regional. Nesse
caminho, “A bandeira, o hino, o escudo e as armas nacionais são de uso obrigatório em
todo o País. Não haverá outras bandeiras, hinos, escudos e armas. A lei regulará o uso dos
símbolos nacionais” (BRASIL, 1937). Podemos observar que o Federalismo apesar de
ser previsto pela constituição, era representado, de fato, pelo poder central5.
5 Não me refiro ao fim do federalismo nesse período, mas sim sua mudança em relação ao projeto federal das constituições anteriores.
Ainda podemos observar que parte dos grupos políticos locais apoiassem o
governo Vargas, muitas desses, que na primeira República exerceram os poderes locais,
perderam autonomia durante o período.
A Constituição de 1946, após a queda de Vargas e a restituição da democracia,
manteve a forma federal e representativa da República. No entanto, dezenove anos
depois, o Brasil passou novamente por um ano período ditatorial. A ditadura Civil-Militar
(1964-1985), estabeleceu na sua Constituição, outorgada em 1967, a representação
federativa do Estado. E, diferentemente da Constituição de 1937, ambas sob uma
ditadura, previa que “Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão ter símbolos
próprios” (BRASIL, 1967), o que não se observa na Carta Magna de 1937. Não obstante,
ainda que a Carta Constitucional de 1967, previsse o Federalismo a nível nacional, a nível
estadual previu que os estados possuíam interventores federais e/ou eleitos indiretamente
pelas assembleias locais. Territórios de fronteira eram de interesse nacional, sendo que
prefeitos de cidade fronteiriças eram nomeados pelo “Presidente da República”.
Observamos, também, que há um centralismo nesse período, contudo grupos políticos
regionais, em sua grande maioria, mantiveram o controle local, mesmo com as
intervenções do governo federal, que por muitas vezes nomeavam membros desses
mesmo grupos.
Por fim, podemos destacar as atuais contestações do Federalismo e suas
implicações nas atuais circunstâncias. A partir da redemocratização do Brasil, em 1886,
e a promulgação da Constituição cidadã de 1988 a conformação do Estado brasileiro
baseou-se nos princípios democráticos. A Constituição da República, prevê em seu 1°
artigo que “ A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de
Direito (...)” (BRASIL, 2016). Por conseguinte, podemos observar que o federalismo se
mantém, contudo, a instauração de um Estado Democrático de Direito assegura a
democracia, que no caso brasileiro assegura eleições livres para as três esferas do poder,
Federal, Estadual e Municipal.
Nesse contexto, a partir da década de 1990, os acordos comercias com os países
da América Platina configuraram uma proposta de auxilio econômico e acordos
comerciais entre os países da região. O Mercado Comum no Sul, o MERCOSUL,
sustenta-se em um bloco econômico, composto por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai
e Venezuela6 na qual ocorre um livre mercado entre os membros, mas também há
proposta de união monetária e livre circulação entre as fronteiras, semelhantes a União
Europeia. Essas propostas se assemelham Confederalismo, na qual se mantem a
independência regional, mas se mantém uma parceria supranacional.
Com a pandemia de Covid-19, em 2020, as disputas entre o governo central e os
estados se mantém presentes. A decretação a pandemia pela Organização Mundial da
Saúde (OMS) e os decretos estaduais de isolamento social geraram atritos entre os
governos estaduais e municipais com o governo federal do Brasil. Em abril de 2020, o
jornal Correio Braziliense noticiava como manchete a entrevista do Presidente da
República Jair Bolsonaro, a manchete diz: “ Bolsonaro culpa Governadores por mortes e
reclama da repercussão do ‘e daí’ ” (FERNANDES, 2020) e continua
Esculhambaram comigo. Fui achincalhado por parte da mídia, fiz minha parte
desde o começo, a missão do chefe é decidir. O STF (Supremo Tribunal
Federal) decidiu que essas medidas (de restrição) são a cargo dos governadores
e prefeitos; reclamou o presidente, que voltou a culpar os chefes de estados e
municípios pelas mortes, e citou diretamente o governador de São Paulo, João
Doria (PSDB), e o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB)
(FERNANDES, 2020).
Nesse sentido, na entrevista podemos observar que os atuais atritos entre os
poderes da República continuam latentes na atualidade. Não busquei fazer um estudo
aprofundado do período atual, mas trazer a ocorrência de disputas entres e dentro os
Estados ao longo do período histórico. As disputas pelo poder, passam pelo Federalismo.
Considerações Finais:
Dessa maneira, as bandeiras do Federalismo mantiveram-se presentes
durante os séculos XX e XXI, ainda que na América Platina, mais especificamente
Argentina e Brasil, essas bandeiras, por diversos períodos, passaram por Ditaduras que
centralizaram o poder, mas não conseguiram implementar um Unitarismo de fato,
fazendo concessões a grupos que mantinham o poder local. Nesse caminho, a constituinte
6 Venezuela foi aderida em 2012 pelo bloco, contudo foi suspensa em 2016 devida a uma violação do acordo de adesão, segundo a organização.
brasileira de 1988 e o Acordo de Assunção em 1991, na qual fundou os alicerces do
Mercado Comum do Sul (Mercosul), configurou diferentes discussões acerca do
Federalismo na América Platina, essa que vão além das fronteiras nacionais. No caso da
Constituição da República de 1988, a criação de novos estados e municípios mostrou uma
descentralização do Poder Executivo, ainda em que no Brasil a arrecadação de impostos
e as leis federais mantiveram-se ligadas fortemente ao Poder Executivo Nacional. No que
se refere ao segundo, a criação do Mercosul e as propostas de União Aduaneira, livre
mercado e de leis supranacionais, entre os integrantes do bloco (Argentina, Brasil,
Paraguai, Uruguai e Venezuela), e configurou uma integração que vai além das fronteiras
nacionais, nas quais há propostas de União Monetária e livre circulação entre esses
territórios, aos moldes da União Europeia. Apesar disso, essas propostas ainda se
encontram em discussões e as novas configurações de parcerias e disputas internas dentro
desses Estados nos mostram que a bandeira do Federalismo se encontram latentes nos
tempos atuais.
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