curso intensivo avanÇado para o xlvii concurso da ... … · dir. constitucional - aula 3 data:...

14
1 CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA MAGISTRATURA TJ/RJ DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional brasileira Nossa primeira Constituição, a de 1824, teve inspiração ideológica dos franceses e dos ingleses, com suas ideias liberais, que dominaram o final do século XVIII e o início do século XIX. Tivemos em razão destas ideias libertárias, inúmeros movimentos de sublevação (as chamadas revoltas populares), que, embora, tivessem fracassado, trouxeram as primeiras ideias liberais. Não podemos conceber a CF de 1824, senão à luz dos ideais liberais, ou melhor, do liberalismo reinante, em especial na Europa, à época. Tal corrente de pensamento, que tem como ponto central colocar o homem, individualmente considerado, como base de todo o sistema social, foi a inspiração para as principais ideias contidas na referida Carta Magna, pois as mesmas se opunham frontalmente à monarquia absolutista. Entretanto, é necessário reconhecer, que este constitucionalismo liberal encontrava plena consonância com os ideais dominantes na época, inclusive com as elites do país. Porém, não deixaria de encontrar toda a sorte de dificuldades para se tornar eficaz, como por exemplo, o pequeno desenvolvimento econômico do país, a falta de participação política, as grandes distâncias, e a precariedade dos transportes e das comunicações. O liberalismo era uma corrente política que se afirmava na Europa, mas também na América do Norte a partir de meados do século XVIII. Combate o intervencionismo do Estado em todos os domínios. Na economia defende a propriedade e a iniciativa privada, assim como a autorregulação econômica através do mercado. Na política preconiza um Estado mínimo confinado a simples funções judiciais e de defesa. O pensamento liberal é marcado por uma enorme diversidade de ideias, que foram evoluindo de acordo com a própria sociedade. John Lock conta-se entre os pioneiros do liberalismo, ao defender um conjunto de direito naturais inalienáveis do indivíduo anteriores à própria sociedade: a liberdade, a propriedade e a vida. Em 1934, tivemos a promulgação de nova CF, sob inspiração e influência das constituições do “Weimar” e da carta de “Bonn”. Verifica-se nesta CF, seu caráter democrático, com um colorido social. Procurou-se conciliar a democracia liberal, com o socialismo, no domínio econômico-social, o federalismo com o unitarismo, o presidencialismo com o parlamentarismo. A Constituição de Weimar (alemão: Weimarer Verfassung) era o documento que governou a curta república de Weimar (1919-1933) da Alemanha. Formalmente era a Constituição do estado alemão (Die Verfassung des Deutschen Reiches). O título da Constituição era o mesmo que a constituição imperial que a precedeu. A palavra alemã Reich é traduzi da geralmente como “império”; entretanto, uma tradução mais exata seria “reino” ou “comunidade”. O termo persistiu mesmo após o fim da monarquia em 1918. O nome do oficial de estado alemão era Deutsches Reich até a derrota da Alemanha Nazista no final da Segunda Guerra Mundial.

Upload: others

Post on 22-Sep-2020

7 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

1

CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA MAGISTRATURA TJ/RJ

DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3

Data: 13-10-2015

PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO

(RESUMO DE AULA)

Evolução político-constitucional brasileira

Nossa primeira Constituição, a de 1824, teve inspiração ideológica dos franceses e dos ingleses, com suas

ideias liberais, que dominaram o final do século XVIII e o início do século XIX. Tivemos em razão destas

ideias libertárias, inúmeros movimentos de sublevação (as chamadas revoltas populares), que, embora, tivessem

fracassado, trouxeram as primeiras ideias liberais.

Não podemos conceber a CF de 1824, senão à luz dos ideais liberais, ou melhor, do liberalismo reinante, em

especial na Europa, à época. Tal corrente de pensamento, que tem como ponto central colocar o homem,

individualmente considerado, como base de todo o sistema social, foi a inspiração para as principais ideias

contidas na referida Carta Magna, pois as mesmas se opunham frontalmente à monarquia absolutista.

Entretanto, é necessário reconhecer, que este constitucionalismo liberal encontrava plena consonância com os

ideais dominantes na época, inclusive com as elites do país. Porém, não deixaria de encontrar toda a sorte de

dificuldades para se tornar eficaz, como por exemplo, o pequeno desenvolvimento econômico do país, a falta de

participação política, as grandes distâncias, e a precariedade dos transportes e das comunicações.

O liberalismo era uma corrente política que se afirmava na Europa, mas também na América do Norte a partir

de meados do século XVIII. Combate o intervencionismo do Estado em todos os domínios. Na economia

defende a propriedade e a iniciativa privada, assim como a autorregulação econômica através do mercado. Na

política preconiza um Estado mínimo confinado a simples funções judiciais e de defesa.

O pensamento liberal é marcado por uma enorme diversidade de ideias, que foram evoluindo de acordo com a

própria sociedade. John Lock conta-se entre os pioneiros do liberalismo, ao defender um conjunto de direito

naturais inalienáveis do indivíduo anteriores à própria sociedade: a liberdade, a propriedade e a vida.

Em 1934, tivemos a promulgação de nova CF, sob inspiração e influência das constituições do “Weimar” e da

carta de “Bonn”. Verifica-se nesta CF, seu caráter democrático, com um colorido social. Procurou-se conciliar

a democracia liberal, com o socialismo, no domínio econômico-social, o federalismo com o unitarismo, o

presidencialismo com o parlamentarismo.

A Constituição de Weimar (alemão: Weimarer Verfassung) era o documento que governou a curta república de

Weimar (1919-1933) da Alemanha. Formalmente era a Constituição do estado alemão (Die Verfassung des

Deutschen Reiches). O título da Constituição era o mesmo que a constituição imperial que a precedeu. A

palavra alemã Reich é traduzida geralmente como “império”; entretanto, uma tradução mais exata seria “reino”

ou “comunidade”. O termo persistiu mesmo após o fim da monarquia em 1918. O nome do oficial de estado

alemão era Deutsches Reich até a derrota da Alemanha Nazista no final da Segunda Guerra Mundial.

Page 2: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

2

A Constituição de Weimar representa o auge da crise do Estado Liberal do séc. XVIII e a ascensão do Estado

Social do séc. XX. Foi o marco do movimento constitucionalista que consagrou direitos sociais, de 2ª

geração/dimensão (relativos às relações de produção e de trabalho, à educação, à cultura, à previdência) e

reorganizou o Estado em função da Sociedade e não mais do indivíduo.

Porém, com mais um golpe dado pelo então Presidente Getúlio Vargas, instalou-se no Brasil o chamado

“Estado Novo”, outorgando-se nova CF, a de 1937, inspirada na Constituição Polonesa, de cunha extremista,

tanto pela direita, através do nazi-fascismo, chamado na época de ação integralista, quanto pela esquerda, do

partido comunista. Sua inspiração foi de modelo fascista, antiliberal, que dominava a Alemanha e a Itália na

ocasião. Tal Constituição brasileira, suprimiu direitos individuais e colocava o presidente da república como

“autoridade suprema do Estado”.

Fascismo: é uma doutrina totalitária desenvolvida por Benito Mussolini na Itália, a partir de 1919 e durante seu

governo (1922–1943 e 1943–1945). A palavra "fascismo" deriva de fascio, nome de grupos políticos ou

de militância que surgiram na Itália entre fins do século XIX e começo do século XX; mas também de fasces,

que nos tempos do Império Romano era um símbolo dos magistrados: um machado cujo cabo era rodeado de

varas, simbolizando o poder do Estado e a unidade do povo. Os fascistas italianos também ficaram conhecidos

pela expressão: camisas negras, em virtude do uniforme que utilizavam.

Em 1946, a democracia foi restabelecida no Brasil, com a promulgação de outra Constituição, totalmente

antagônica à de 1937. A mesma tinha uma linha de pensamento libertária, cuidava da área social, e dos direitos

individuais dos cidadãos. Entretanto a alegria não durou duas décadas, pois, com o golpe militar de 01 de abril

de 1964, caiu o governo democrático de João Goulart, e, em 1967, nos foi outorgada mais uma CF, agora

centralizadora, que exacerbava os poderes do presidente, uma vez mais, suprimindo, como sempre, os direitos

sociais e individuais. Tal CRFB Emendada em 1969, perdurou até a volta da democracia ao Brasil, em 1985.

Três anos depois, em 1988, nos foi dada a atual CF, a de 05 de outubro. Ela teve o seu processo de criação e

formação iniciado em primeiro de fevereiro de 1987, quando instalou-se a Assembléia Nacional Constituinte,

sob a presidência do Ministro do STF, Moreira Alves. O saudoso Deputado Federal Ulisses Guimarães, foi

eleito seu Presidente. Surgiu assim, como mencionado linhas atrás, nossa CF “cidadã”, a melhor e mais

completa norma constitucional de todos os tempos do Brasil, protegendo inclusive, direitos de todas as

gerações, inclusive indígenas, idosos e ambientais.

Desde 1964 estava o Brasil sob o regime da ditadura militar, a partir de 1967 (particularmente subjugado às

alterações decorrentes dos Atos Institucionais) sob uma Constituição imposta pelo governo. O regime de

exceção, em que as garantias individuais e sociais eram diminuídas (ou mesmo ignoradas), e cuja finalidade era

garantir os interesses da ditadura (internalizado em conceitos como segurança nacional, restrição das garantias

fundamentais, etc.) fez crescer, durante o processo de abertura política, o anseio por dotar o Brasil de uma nova

Constituição, defensora dos valores democráticos. Anseio este que se tornou necessidade após o fim da ditadura

militar e a redemocratização do Brasil, a partir de 1985.

Independentemente das controvérsias de cunho político, a Constituição Federal de 1988 assegurou diversas

garantias constitucionais, abrangendo direitos de todas as gerações, com o objetivo de dar maior efetividade aos

direitos fundamentais, permitindo a participação do Poder Judiciário sempre que houver lesão ou ameaça de

lesão a direitos. Para demonstrar a mudança que estava havendo no sistema governamental brasileiro, que saíra

de um regime autoritário recentemente, a constituição de 1988 qualificou como crimes inafiançáveis a tortura e

as ações armadas contra o estado democrático e a ordem constitucional, criando assim dispositivos

constitucionais para bloquear golpes de qualquer natureza.

Com a nova constituição, o direito maior de um cidadão que vive em uma democracia foi conquistado: foi

determinada a eleição direta para os cargos de Presidente da República,Governador do Estado e do Distrito

Federal, Prefeito, Deputado Federal, Estadual e Distrital, Senador e Vereador. A nova Constituição também

previu uma maior responsabilidade fiscal. Pela primeira vez uma Constituição brasileira define a função

Page 3: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

3

social da propriedade privada urbana, prevendo a existência de instrumentos urbanísticos que, interferindo no

direito de propriedade (que a partir de agora não mais seria considerado inviolável), teriam por objetivo romper

com a lógica da especulação imobiliária.

Em suma, a CF de 1988 teve em seu ordenamento, normas de proteção e garantias individuais, coletivas,

sociais, ambientais, etc., ou seja, é um conjunto normativo completo, prevendo inclusive a incorporação do

direito internacional em seu texto, como a incorporação dos tratados e convenções que o Brasil ratificar, em

nível de norma constitucional.

PRINCIPAIS ASPECTOS E CARACTERÍSTICAS DAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

Nossa primogênita Lei Magna foi Outorgada, em 25 de março de 1824, tendo como causas originárias,

a transferência da família Real portuguesa para o Brasil, devido à invasão de Portugal por Napoleão Bonaparte.

Posteriormente à declaração da Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, Dom Pedro I convoca uma

Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, com ideais marcadamente liberais. Todavia, esta vem a ser

desfeita, arbitrariamente, pois divergia dos ideias autoritários do Imperador.

Em substituição a Assembleia Geral Constituinte, Dom Pedro I, em 1824, cria um Conselho de

Estado para elaborar um novo projeto, agora, em total acordo com suas pretensões. A Constituição de 1824,

dentre outras características, foi outorgada, sendo marcada por forte centralismo administrativo e político tendo

em vista o Poder Moderador. Foi a Constituição brasileira que mais tempo durou (67 anos). Conforme

demonstra adiante, em todos os históricos das CFs Brasileiras, a referida Constituição teve as seguintes

características:

Governo: Monárquico, hereditário, Constitucional e representativo. Forma unitária de Estado, isto

significa, que não existia a divisão dos Estados em entes Federativos;

Território: As antigas capitanias hereditárias foram transformadas em províncias;

Dinastia Imperante: Dom Pedro I, durante o império. Tivemos, também, a de D. Pedro II;

Religião oficial do Império: Católica Apostólica Romana;

Capital do Império: Rio de Janeiro (1822/1889);

Organização dos Poderes: Não se adotou a função tripartida de Montesquieu. Pois, além das funções

legislativa, executiva e judiciária, adotou-se a função Moderadora (4º Poder);

Poder Legislativo: exercido pela Assembleia Geral, com sanção do Imperador – bicameral (Câmara

dos Deputados e Senado);

Eleições: Indiretas;

Sufrágio: Censitário (só votava quem tinha renda);

Poder Executivo: exercido pelo Imperador;

Poder Judiciário: independente e composto de juízes e jurados. O órgão de cúpula do judiciário era o

Supremo Tribunal de Justiça;

Poder Moderador: assegurava a estabilidade do trono;

Quanto à alterabilidade: Semi-rígida;

Liberdades públicas: Com Declaração de direitos e garantias;

Com o fim da monarquia em 1889, via vitória das forças políticas descentralizadoras, e a

proclamação da República em 15.11.1889, tivemos em 24 de fevereiro de 1891, a primeira Constituição da

República do Brasil. Seu relator foi o Senador Rui Barbosa, sendo inspirada na Constituição dos EUA, tanto

que o Brasil chamava-se “Estados Unidos do Brasil”. Consagrou o sistema presidencialista e a forma de Estado

Federal. Assim, forma de governo Republicana substituiu à Monarquia. Houve a previsão, pela primeira vez

do Habeas Corpus, que tutelava quaisquer direitos. Suas principais características são:

Page 4: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

4

Forma de Governo e regime representativo: Adotou-se como forma de Governo, sob o regime

representativo, a República Federativa e, ainda, a união perpétua e indissolúvel das antigas Províncias;

Distrito Federal era a Capital de Brasil no Rio de Janeiro;

Estado laico: não há mais religião oficial;

Organização dos Poderes: Extinção do Poder Moderador. Adotando-se a “Tripartição dos

Poderes” de Montesquieu;

Poder Legislativo: Exercido pelo Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República;

Poder Judiciário: Órgão máximo, Supremo Tribunal Federal (surge o controle difuso de

constitucionalidade). Juízes vitalícios e com vencimentos irredutíveis;

Poder Executivo: Exercido pelo Presidente da República;

Quanto à alterabilidade: Rígida;

Declaração de Direitos: Aboliu-se a pena de Galés, banimento e de morte;

Depois da primeira Constituição da República, o Brasil teve nova CF, em 16 de julho de

1934, sob forte influência da Constituição de Weimar, evidenciando Direitos humanos de 2ª geração (direitos

econômicos e sociais) e a perspectiva de um Estado Social de Direito. Infelizmente, recebeu também, influência

do fascismo. São algumas de suas características:

Forma de Governo e regime representativo: Mantém como forma de governo, sob o regime

representativo, a República Federativa;

Capital da República: Distrito Federal, na cidade do Rio de Janeiro;

Inexistência de religião oficial: País laico;

Organização dos Poderes: Teoria clássica de Montesquieu “Tripartição dos Poderes”, porém diminui o

poder dos Estados membros e aumenta o poder da União; Instituiu primeiramente o controle

concentrado de constitucionalidade.

Poder Legislativo: Exercido pela Câmara dos Deputados com a colaboração do Senado federal.

Estabelecia-se um bicameralismo desigual ou unicameralismo perfeito, pois o Senado Federal era mero

colaborador da Câmara dos Deputados;

Poder Executivo: exercido pelo Presidente da República;

Poder Judiciário: Estabelecidos como órgãos do Poder Judiciário: A Corte Suprema; os juízes e

Tribunais federais; os juízes e Tribunais militares; os juízes e Tribunais eleitorais;

Quanto à alterabilidade: Rígida;

Declaração de direitos: Constitucionaliza-se o voto feminino, secreto, mandado de segurança e ação

popular;

Uma nova Constituição seria outorgada ao Brasil, em 10 de novembro de 1937. Getúlio Vargas foi

eleito para governar de 1934 a 1938. Todavia, esse período foi marcado por grande rivalidade política, entre a

direita fascista (Ação Integralista Brasileira – AIB), que defendia um Estado autoritário, e a esquerda, com

ideais sociais, comunistas e sindicais (Aliança Nacional Libertadora – ANL).

Em 11 de julho de 1935, o governo fechou a ANL, por considerá-la ilegal, com base na “Lei de

Segurança Nacional”. Por causa da Intentona Comunista, o Governo decretou o estado de sítio e difundiu um

forte movimento de repressão ao comunismo. Getúlio recebe apoio do Congresso Nacional que decretou

“estado de guerra”.

A Carta de 1937 foi apelidada de “Polaca”, pois sofreu forte influência da Constituição polonesa

fascista de 1935. Dentre outras características, podemos elencar:

Forma de Governo: De acordo com o art. 1º, o Brasil é uma República;

Forma de Estado: Estado Federal, com os poderes todos concentrados na União;

Capital da República: Distrito Federal, na cidade do Rio de Janeiro;

Inexistência de religião oficial: País laico;

Organização dos “Poderes”: Teoria clássica de Montesquieu “Tripartição dos Poderes”;

Page 5: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

5

Poder Legislativo: Desaparece o Senado. Conforme o art. 38, o Poder Legislativo seria exercido pelo

Parlamento Nacional com a colaboração do conselho da Economia Nacional e do Presidente da

República;

Poder Executivo: Segundo o art. 73, o Presidente da República era a autoridade soberana do Estado,

podendo até fechar o Legislativo;

Eleições indiretas para Presidente que, cumpria mandato de seis anos;

Poder Judiciário: Órgãos do judiciário: STF, os juízes e Tribunais dos Estados, do D.F. e dos

Territórios, os juízes e Tribunais militares;

Supressão de direitos fundamentais: Sem previsão do mandado de segurança e da ação popular,

direito de greve. Pena de morte para crimes políticos e homicídio cometido por motivo fútil e com

extremos de perversidade. A tortura foi utilizada como instrumento de repressão. Censura prévia à

imprensa;

Conquista de direitos e vantagens trabalhistas: Consolidação das Leis do Trabalho (CLT);

A participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial ao lado dos aliados trouxe efeitos irreparáveis

para o Estado. Isso porque, imaginava-se que, com essa atitude, o fascismo fosse “apagado” da realidade

brasileira. Seria uma contradição manter uma Constituição baseada no modelo fascista e externamente lutar

contra esse regime.

Assim, em decorrência desta perda de legitimidade, o Estado Novo entra em crise e tem o seu fim em

outubro 1945. Após a queda de Getúlio Vargas, ocorre um período de redemocratização que irá culminar na

promulgação da Constituição de 18 de setembro de 1946, que, restabelecendo a CF de 1934, apresentava as

principais características:

Criação da FEB (Força Expedicionária Brasileira);

Forma do Governo: Republicana;

Forma de Estado: Federativa (com autonomia);

Capital da União: O D.F. continuou como Capital da União (no Rio de Janeiro). Contudo será

transferida para o Planalto Central com a construção de Brasília.

Inexistência de religião oficial: País laico;

Organização dos Poderes: “Tripartição dos Poderes”, de Montesquieu;

Poder Legislativo era Exercido pelo Congresso Nacional;

Poder Executivo: O Presidente da República deveria ser eleito de forma direta para mandato de cinco

anos.

Poder Judiciário: STF, Tribunal Federal de Recursos, juízes e Tribunais militares, juízes e Tribunais

eleitorais, juízes e Tribunais do trabalho; Criou-se a representação de Inconstitucionalidade EC 18 de

1965.

Declaração de direitos: Restabelecidos o mandado de segurança e a ação popular. Reconhecido o

direito de greve. Foi excluída a pena de morte, o banimento e o confisco;

Através do golpe militar de 01.04.1964, que derrubou o Presidente João Goulart, veio,

por outorga, a Constituição de 1967. Nos moldes da Carta de 1937, houve a concentração do poder na esfera

Federal e, por conseqüência disso, conferindo-se amplos poderes ao Presidente da República, destacando-se

algumas peculiaridades:

Forte preocupação com a segurança nacional;

Forma de Governo: República;

Forma de Estado: Embora o art. 1º determinasse ser o Brasil uma República Federativa, este se

aproximava mais de um Estado unitário centralizado do que Federalismo;

Capitão da União: D.F., agora em Brasília;

Page 6: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

6

Inexistência de religião oficial: País laico;

Organização dos Poderes: “Tripartição dos Poderes”, de Montesquieu;

Poder Legislativo: Exercido pelo Congresso Nacional;

Poder Executivo: Fortalecido com Mandato de quatro anos;

Poder Judiciário: STF, Tribunais Federais de Recursos e juízes Federais, Tribunais e juízes militares,

Tribunais e juízes eleitorais, Tribunais e juízes do trabalho;

Declaração de direitos: O art. 151 previa a suspensão, por 10 anos, de direitos políticos, maior eficácia

na previsão dos direitos dos trabalhadores, possibilidade de perda de propriedade para a reforma agrária;

Sistema tributário: Ampliou-se a técnica do federalismo cooperativo.

Anos mais tarde, surge sob tutela militar, com regime duro e autoritário, e com a supressão dos direitos

fundamentais pela Constituição de 1967, ocorreu sua emenda (EC n.1, de 17.10.1969).

Assim, a Constituição Brasileira sofreu profundas alterações em decorrência da emenda constitucional

n. 1, outorgada pela junta militar que assumiu o Poder no período em que o Presidente Costa e Silva

encontrava-se doente. Para considerável parte da doutrina, na verdade, a EC n. 1 de 1969 trata-se na verdade de

nova Constituição. A emenda só serviu como mecanismo de outorga, uma vez que verdadeiramente se

promulgou texto integralmente reformado, a começar pela denominação que se lhe deu: Constituição da

República Federativa do Brasil, enquanto a de 1967 se chamava apenas Constituição do Brasil

As três principais alterações promovidas pela citada emenda constitucional foram:

1. Estabelecimento de eleições indiretas para o cargo de Governador de Estado

2. Ampliação do mandato presidencial para cinco anos

3. Extinção das imunidades parlamentares.

Com fundamento no AI n. 12, de 31.08.1969, instaurou-se no Brasil um governo de “Juntas Militares”

legitimadas pelo referido ato, o qual permitia que, enquanto o Presidente da República (Costa e Silva) estivesse

afastado por motivos de saúde, governassem os Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica

Militar. Desse modo, a EC n. 1/69 foi baixada pelos Militares, já que o Congresso Nacional encontrava-se

fechado.

Por fim, restabelecida a democracia, veio a atual CF de 1988, conhecida como “cidadã”. Cumprindo a

determinação da emenda constitucional n. 26, de 27 de novembro de 1985, houve convocação e uma

Assembléia Nacional Constituinte que, tinha por finalidade, elaborar uma nova Constituição, cujo texto

expressasse a atual realidade social. Isto significa, mais explicitamente, o processo de redemocratização e

término do regime ditatorial. Destarte, em 05 de outubro de 1988 foi promulgada a atual Constituição da

Republica Federativa do Brasil, a qual apresenta as seguintes características:

Ampliação do pluripartidarismo;

Erradicação da censura à imprensa;

Consolidação do sindicalismo e de grandes centrais (CUT, CGT, etc.);

Garantia de direitos de 1ª, 2ª e 3ª gerações, incluindo um capítulo sobre meio ambiente (art. 225);

O povo, finalmente, elege, em regime de dois turnos, no ano de 1989, o Presidente da República

Fernando Collor de Mello ( que em 1992 sofreria “impeachment”);

O primeiro Plebiscito: Manutenção da República Constitucional e do Sistema Presidencialista de

Governo;

Estado Democrático, sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, edificada na harmonia social e

comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias;

Forma de Estado: Federação, composta por Estados-Membros;

Poder Executivo: Presidente da República;

Poder Judiciário: STF é o órgão de cúpula;

Page 7: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

7

A CF/88 criou o Superior Tribunal de Justiça (STJ) – responsável pela uniformização da

interpretação da Lei Federal em todo Brasil;

Declaração de direitos: Consolidação dos princípios democráticos e defesa dos direitos individuais e

coletivos, o racismo e a tortura são considerados crimes inafiançáveis e imprescritíveis.

Criou o mandado de injunção (art. 5º, LXXI); mandado de segurança coletivo (art. 5º,

LXX); habeas data (art. 5º, LXXII).

Inexistência de religião oficial: Estado laico;

Organização dos Poderes: “Tripartição dos Poderes”, de Montesquieu, com descentralização

administrativa, dando-se poderes aos Municípios;

Poder Legislativo: Bicameral, sendo exercido pelo Congresso Nacional;

Quanto à alterabilidade: Constituição Rígida;

Acerca dos elementos formadores da constituição, podemos observar que tanto Ferdinand Lassalle,

quanto Konrad Hesse, defendem a existência da Constituição como o conjunto de leis máxima de um país. A

distinção básica entre as duas obras reside nos elementos formadores da Constituição.

De fato, para Lassalle a Constituição é formada pelos fatores de poder, enquanto que para Hesse os

fatores de poder são um dos elementos formadores da Carta Magna, possuindo a mesma, verdadeira força

normativa, entre outros elementos.

Contudo, e como referido anteriormente, as Constituições, bem como as demais regras que regem uma

sociedade, não podem ser o reflexo somente dos fatores de poder, sob o risco de serem institutos temporários,

que privilegiam a minoria e que necessitam de modificações permanentes, ocasionando insegurança social e

jurídica. Assim, é de essencial importância que se verifique nas Constituições verdadeira força normativa capaz

de criar determinadas normas atinentes a todos os setores da sociedade, outorgando garantias e tutelando os

interesses das camadas da sociedade que se situam externamente aos denominados por Lassalle como fatores de

poder.

Nas Constituições brasileiras, como supracitado, houve forte presença do liberalismo e do

constitucionalismo, inspirados nas revoluções inglesa e francesa, e na Constituição americana, isto na fase do

Império (CF de 1824), que foram substituídos pelos movimentos republicanos e federalistas, com ideais

positivistas, na CF de 1891.

O totalitarismo, o fascismo, a ditadura, a ausência da liberdade de expressão, e a supressão de direitos

individuais e fundamentais caracterizaram nossas Constituições de 1937, 1967 e sua emenda de 1969. Já as

Constituições brasileiras de 1934, 1946 e 1988, foram, ao contrário de tudo isso, marcadas pelo pensamento

democrático e libertário, ou seja, contém os direitos de todas as gerações, em especial, a democratização no

Brasil, tanto que a atual CF brasileira (1988) foi chamada de “cidadã”, ao prever direitos e garantias individuais

e coletivos, sociais, e outros. É importante registrar que todas as Constituições do Brasil tiveram em seus textos

(mesmo as outorgadas) a inserção de Declarações dos Direitos do Homem, normatizando-os e protegendo-os

seja na 1ª, 2ª ou 3ª geração.

Quadros comparativos das Constituições brasileiras:

Page 8: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

8

RESUMINDO:

1. A Constituição de 1824 foi a primeira Constituição brasileira. Outorgada pelo Imperador D. Pedro I,

caracterizou-se pelo extremo liberalismo em relação aos direitos individuais e pelo absolutismo na organização

de poderes. Os direitos e garantias individuais estabelecidos nesta Carta apresentam ligeira relação com os

direitos fundamentais estatuídos na Lei Maior de 1988.

2. A Constituição de 1891 foi a primeira constituição republicana do Brasil. Embora tenha sido promulgada,

esta Carta atendeu aos interesses da oligarquia latifundiária, principalmente em função do “voto de cabresto”.

Caracterizou-se pela supressão dos princípios democráticos e o poder manteve-se com os mesmos dominantes,

apesar da instituição de uma nova forma governamental. Em relação à forma governamental – república -

aproxima-se da Carta Magna de 1988, entretanto, afasta-se desta ao suprimir os princípios democráticos.

3. A Constituição brasileira de 1934 foi bastante progressista para a época, contribuindo significativamente para

consolidar a democracia no Brasil. Concatenou os princípios liberais, corporativistas e autoritários. Os

princípios socialistas também exerceram grande influência na elaboração das leis trabalhistas. Enfim, ela

apresenta aspectos correlativos à Lei Fundamental de 1988, sobretudo no que respeita aos princípios socialistas,

como, por exemplo, as leis trabalhistas.

4. A Constituição de 1937 atendeu aos interesses de grupos políticos dominantes e daqueles que se firmaram

como aliados, corroborando para a consolidação do domínio destas classes. Portanto, a principal característica

dessa carta política era a concentração de poderes sob o domínio do presidente Getúlio Vargas. Tal

Constituição foi a primeira, no Brasil, a apresentar caráter autoritário. Vargas realizou violenta repressão às

manifestações populares. Em relação à Lei Maior de 1988, podemos destacar como ponto divergente, a

eliminação dos direitos políticos e como ponto convergente, a função do Estado em fomentar políticas públicas

de incentivo ao crescimento econômico.

5. Com a necessidade de um novo ordenamento constitucional, a Constituição de 1946 encetou um período de

redemocratização. Concluímos que esta Constituição foi a que mais se assemelhou com a Constituição de 1988.

A Carta de 46 foi um progresso para a democracia e para os direitos fundamentais do cidadão brasileiro,

considerada por muitos como avançada para época. Interessante notar que sob a égide desta Lei Fundamental,

existiram dois sistemas de governo: estabeleceu-se uma República presidencialista, entretanto, pelo Ato

Page 9: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

9

Adicional de 2 de setembro de 1961, foi instaurado o Parlamentarismo. Porém, com o plebiscito ocorrido em

setembro de 1962, foi restabelecido o Presidencialismo.

6. A Constituição de 1967 deu origem ao Regime Militar, também conhecido como os “Anos de Chumbo”. Esta

Magna Carta foi promulgada apesar de os membros da oposição terem sido banidos. Destarte, podemos dizer

que foi uma promulgação “mutilada”. A principal característica é a centralização do poder. O Executivo

exercia, com caráter exclusivo, a prerrogativa de criar emendas constitucionais, sem a anuência do Poder

Judiciário e legislativo. A ditadura militar representou um dos momentos mais deploráveis da política brasileira.

7. A Emenda Constitucional n. 1 de 1969 alterou profundamente a Constituição de 1967, sendo considerada por

parte da doutrina como uma nova Constituição, inclusive com alteração da denominação, já que a Lei Maior de

1967 chamava-se Constituição do Brasil e a Emenda alterou para Constituição da República Federativa do

Brasil.

8. Os Atos Institucionais (AIs) foram tão importantes quanto a própria Constituição de 1967 para a História

constitucional brasileira, levando-se em consideração estritamente o sentido histórico. O mais veemente foi o

Ato Institucional n. 5 ao fixar: fechamento do Congresso Nacional; cassação dos mandatos eletivos; suspensão

dos direitos políticos e liberdades individuais; proibição de manifestações públicas; ao Poder Executivo foi

dada a prerrogativa de legiferar sobre todos os temas.

9. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 difere de todas as demais Constituições existentes

no Brasil, em razão de sua índole humanitária, isto é, atinente ao coletivo, ao global. Por isso mesmo, é

classificada quanto aos direitos fundamentais, na terceira geração, por atentar ao princípio de solidariedade e

aos direitos humanos. Como Estado democrático de direito tem como fundamentos: a soberania, a cidadania, a

dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

Evolução do controle de constitucionalidade nas constituições brasileiras

O controle de constitucionalidade judicial das leis mostra sua flexibilidade e capacidade de se adequar aos mais

diversos sistemas políticos, sendo curioso observar sua expansão na ordem jurídica atual.

Com a Constituição de 1988, o controle de constitucionalidade no Brasil sofreu grande mudança, isso porque

houve uma ruptura do chamado “monopólio da ação direta” outorgada ao Procurador-Geral da República, e

essa substituição exclusivista por um amplo direito de propositura sinalizam uma grande alteração em todo o

sistema de controle de constitucionalidade.

Embora se tenha mantido o modelo tradicional de controle “difuso”, a adoção de instrumentos como o mandado

de injunção, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, o mandado de segurança coletivo e,

especialmente a ação direita de inconstitucionalidade, conferiram um novo perfil a esse sistema de controle.

Constituição Imperial de 1824

A Constituição de 1824 não possui qualquer tipo de sistema parecido com os modelos atuais de controle de

constitucionalidade.

Por influência francesa outorgou-se ao Poder Legislativo a incumbência de fazer leis, interpretá-las, suspendê-

las e revogá-las, bem como velar na guarda da Constituição.

Só o poder que faz a lei é o único competente para declarar por via de autoridade ou por disposição geral

obrigatória o pensamento, o preceito dela. Só ele e exclusivamente ele é quem tem o direito de interpretar o seu

Page 10: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

10

próprio ato, suas próprias vistas, sua vontade e seus fins. Nenhum outro poder tem o direito de interpretar por

igual modo, já porque nenhuma lei lhe deu essa faculdade, já porque seria absurda a que lhe desse.

Não havia, nesse contexto, lugar para o menor modelo judicial de controle de constitucionalidade; era, por sua

vez, a consagração da soberania do Parlamento.

Controle de constitucionalidade na Constituição de 1891

Inaugura-se uma nova concepção com o regime republicano e a influência do direito norte-americano parece

ser decisiva para a consolidação do sistema difuso, consagrado já na chamada Constituição provisória de 1890.

Foi através do Decreto n. 848, de 11/10/1890 – que no seu art. 3º determinava que na guarda e aplicação da

Constituição, a magistratura federal só interviria em espécie e por provocação – que se estabelece o julgamento

incidental da inconstitucionalidade, mediante provocação dos litigantes e, tal qual a Constituição provisória,

assentava o controle de constitucionalidade das leis estaduais ou federais.

A Constituição de 1891 reconheceu ao Supremo Tribunal Federal competência para rever, em última instância,

decisões proferidas pelas Justiças dos Estados quando questionados tratados ou leis federais ou quando se

contestasse a validade de leis ou de atos dos governos locais em face da Constituição ou de leis federais.

Os tribunais não intervinham na elaboração da lei, nem na sua aplicação geral. Não são órgãos consultivos, nem

para o legislador, nem para a administração. O judicial review “é um poder de hermenêutica, e não um poder de

legislação.

Nota-se, que fica consolidado o sistema difuso de controle de constitucionalidade do Direito brasileiro, não

havendo mais dúvida sobre o poder outorgado aos órgãos jurisdicionais para exercer esse controle.

Controle de constitucionalidade na Constituição de 1934

A Constituição de 1934 trouxe significativas alterações no sistema de controle de constitucionalidade. O

constituinte determinou que a regra de declaração de inconstitucionalidade somente seria realizada pela maioria

da totalidade de membros dos tribunais, evitando a insegurança jurídica advinda da constante mudança no

entendimento dos tribunais.

Também consagrou a competência do Senado Federal para “suspender a execução, no todo ou em parte, de

qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder

Judiciário”, dando efeito erga omnes à decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. (Constituição Federal

de 1934, arts. 91, IV).

Verifica-se que se buscava resolver o problema relativo à falta de eficácia geral das decisões tomadas pelo

Supremo em sede de controle de constitucionalidade, porém, com base no direito comparado, tinha o

constituinte dado poder excessivo ao Senado, que acabaria por transformar solução em problema, “com a cisão

de competências entre o Supremo Tribunal e o Senado.

Contudo, talvez a mais fecunda e inovadora alteração introduzida pelo Texto Magno de 1934 se refira à

‘declaração de inconstitucionalidade para evitar a intervenção federal. Cuidava-se de fórmula peculiar de

composição judicial dos conflitos federativos que condicionava a eficácia da lei interventiva, de iniciativa do

Senado (art. 12, § 3º), à declaração de sua constitucionalidade pelo Supremo Tribunal (art. 12, § 2º)”.

Page 11: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

11

Percebe-se assim a importância das inovações trazidas por essa Constituição, em especial a regra segundo a

qual a declaração de inconstitucionalidade somente seria realizada pela maioria da totalidade de membros dos

tribunais.

Controle de constitucionalidade na Constituição de 1937

Essa Constituição trouxe inequívoco retrocesso ao sistema de controle de constitucionalidade. Embora não

tenha introduzido modificação no modelo difuso de controle e tenha preservado o quorum especial de exigência

para a declaração de inconstitucionalidade, o constituinte rompeu com a tradição e determinou regra segundo a

qual caso uma lei seja declarada inconstitucional, o Presidente da República poderá, caso afirme que a lei era

necessária ao bem estar do povo, à promoção ou defesa de interesse nacional de alta monta, submetê-la

novamente ao Parlamento. Caso fosse validada por 2/3 de votos em cada uma das Câmaras, tornava-se

inexistente a decisão do Tribunal.

Instituía-se, assim, uma peculiar modalidade de revisão constitucional, pois a lei confirmada passar a ter, na

verdade, a força de uma emenda à Constituição.

A subordinação do julgado sobre a inconstitucionalidade da lei à deliberação do Parlamento coloca o problema

da elaboração democrática da vida legislativa em seus verdadeiros termos, impedindo, em nosso meio, a

continuação de um preceito artificioso, sem realidade histórica para nós e que, hoje, os próprios americanos, por

muitos de seus representantes doutíssimos, reconhecem despido de caráter de universalidade e só explicável em

países que não possuem o sentido orgânico do direito administrativo. A tendência para controlar a

constitucionalidade das leis é um campo aberto para a política, porque a Constituição, em si mesma, é uma

lei sui generis, de feição nitidamente política, que distribui poderes e competências fundamentais.

Percebe-se assim que por ter a Constituição feições nitidamente políticas, a competência para confirmar ou não

a inconstitucionalidade declarada pelo Supremo, deve ser aberta ao campo da política.

Controle de constitucionalidade na Constituição de 1946

A Carta Magna de 1946 restaurou a tradição do controle judicial no Direito brasileiro, preservando a exigência

de maioria absoluta dos membros do Tribunal para a eficácia da declaração de inconstitucionalidade, manteve-

se a atribuição do Senado Federal para suspender as leis declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal

Federal e, a par da competência de julgar recursos ordinários, disciplinou-se a apreciação de recursos

extraordinários.

Atribuiu-se ao Procurador-Geral da República a titularidade da representação de inconstitucionalidade, para os

efeitos de intervenção federal, nos casos de violação dos seguintes princípios: a) forma republicana federativa;

b) independência e harmonia entre os Poderes; c) temporariedade das funções eletivas, limitada a duração

destas à das funções federais correspondentes; d) proibição da reeleição de governadores e prefeitos para o

período imediato; e) autonomia municipal; f) prestação de conta da Administração; g) garantias do Poder

Judiciário. (Constituição Federal de 1946, art. 8º, parágrafo único, c/c o art. 7º, VII).

Dessa forma a intervenção federal dependia da declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal

Federal. (Constituição Federal de 1946, art. 8º, parágrafo único).

A emenda n. 16, de 26/11/1965, instituiu, ao lado da representação interventiva, e nos mesmos moldes, o

controle abstrato de normas estaduais e federais.

Vale a pena registrar o parecer aprovado pela Comissão Mista da época, de lavra do Deputado Tarso Dutra,

referindo-se, especificamente, ao novo instituto de controle de constitucionalidade:

Page 12: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

12

“A letra ‘k’, propondo a representação a cargo da Procuradoria-Geral da República, contra a

inconstitucionalidade em tese da lei, constitui uma ampliação da faculdade consignada no parágrafo único do

art. 8º, para tornar igualmente vulneráveis as leis federais por essa medida. Ao anotar-se a conveniência da

modificação alvitrada na espécie, que assegurará, com a rapidez dos julgamentos sumários, uma maior inspeção

jurisdicional da constitucionalidade das leis, não será inútil configurar o impróprio de uma redação, que devia

conferir à representação a idéia nítida de oposição à inconstitucionalidade e o impreciso de uma referência a

atos de natureza normativa de que o nosso sistema de poderes indelegáveis (art. 36, §§ 1º e 2º) conhece apenas

uma exceção no § 2º do art. 123 da Constituição”.

Consagrou-se desta feita, o modelo abstrato de controle de constitucionalidade sob forma de representação que

haveria de ser proposta pelo Procurador-Geral da República, embora a proposta de alterar o art. 64 da

Constituição, conferindo eficácia erga omnes à declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo

Tribunal Federal, fora rejeitada.

Controle de constitucionalidade na Constituição de 1967/69

A Constituição de 1967 não inovou muito no sistema de controle de constitucionalidade. Manteve íntegro o

controle difuso e a ação direta de inconstitucionalidade subsistiu, tal como prevista na Constituição de 1946.

A representação para fins de intervenção, confiada ao Procurador-Geral da República, foi ampliada, com o

objetivo de assegurar não só a observância dos chamados princípios sensíveis (art. 10, VII), mas também prover

a execução de lei federal (art. 10, VI, 1ª parte). A competência para suspender o ato estadual foi transferida para

o Presidente da República (art. 11, §2º). Preservou-se o controle de constitucionalidade in abstracto, tal como

estabelecido pela Emenda n. 16/65 (art. 119, I, l).

Não foi incorporada a disposição que permitia a criação do processo de competência originária nos Tribunais de

Justiça dos Estados, para declaração de lei ou ato dos Municípios que contrariassem as Constituições dos

Estados.

Previu, expressamente, pela Emenda n. 1/69, o controle de constitucionalidade de lei municipal, em face da

Constituição estadual, com referência a intervenção no Município.

A Emenda n. 7/77 introduziu, ao lado da representação de inconstitucionalidade, a representação para fins de

interpretação de lei ou ato normativo federal ou estadual, outorgando ao Procurador-Geral da República

legitimidade para provocar o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal (art. 119, I, e). E, segundo a

Exposição de Motivos apresentada ao Congresso Nacional, esse instituto deveria evitar a proliferação de

demandas, com a fixação imediata da correta exegese da lei.

Finalmente, a Emenda n. 7/77 consagrou o entendimento de que o Supremo Tribunal Federal tem competência

para deferir pedido de cautelar, formulado pelo Procurador-Geral da República, pondo termo à controvérsia.

Em 1970, o único partido representante da oposição no Congresso Nacional, o MDB, solicitou ao Procurador-

Geral da República que instaurasse processo abstrato em desfavor de decreto-lei que legitimava a censura

prévia de livros, jornais e periódico. Este, no entanto, negou-se ao pedido formulado por entender que não

estava constitucionalmente obrigado a fazê-lo.

Na ocasião, o Supremo Tribunal Federal rejeitou a reclamação argumentando que só o Procurador-Geral

poderia decidir se deveria ou não oferecer representação para aferição de constitucionalidade da lei.

Enquanto importantes vozes na doutrina reconheceram o direito de o Procurador-Geral submeter ou não a

questão ao Supremo Tribunal Federal, consoante a sua própria avaliação e discricionariedade, uma vez que

somente ele dispunha de competência constitucional para propor essa ação, sustentavam outros a opinião de que

Page 13: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

13

estaria obrigado a oferecer a argüição ao Supremo Tribunal Federal se houvesse pelo menos sérias dúvidas

sobre a constitucionalidade da lei.

Posição intermediária foi sustentada por Celso Bastos, segundo a qual o Procurador-Geral da República não

poderia negar-se a formular a representação se o requerimento lhe fosse encaminhado por algum órgão público,

uma vez que, nesse caso, não se poderia ter dúvida quanto ao interesse público na aferição da

constitucionalidade da lei ou do ato normativo.

O esforço, no entanto, não precisou a natureza do instituto. Demorou-se para perceber que a representação de

inconstitucionalidade tinha, na verdade, caráter dúplice ou natureza ambivalente, permitindo que o Procurador-

Geral submetesse a questão quer estando convencido da inconstitucionalidade da norma, quer houvesse

demonstrado que a questão apresentasse controvérsias relevantes sobre sua constitucionalidade.

Com isso posto, não se fazia mister que o Procurador-Geral estivesse convencido da inconstitucionalidade,

bastava a “controvérsia constitucional”, ou seja, não era necessário sua plena convicção sobre a

inconstitucionalidade da norma em questão.

Essa existência de controvérsia constitucional relevante caracterizava a necessidade do Procurador-Geral da

República submeter o questionamento ao Supremo Tribunal, ainda estando convencido de sua improcedência,

em outros termos, restando configurada a controvérsia constitucional relevante, não poderia furtar-se do dever

de submetê-la ao Supremo Tribunal, mesmo que fosse manifestamente a favor da improcedência do

requerimento (pedido de declaração de constitucionalidade).

Controle de constitucionalidade na Constituição de 1988

A Constituição de 1988 amplia significativamente os meios de proteção judicial e conseqüentemente o controle

de constitucionalidade das leis.

A Constituição preservou a representação interventiva, destinada à aferição da compatibilidade de direito

estadual com os chamados princípios sensíveis (CF, art. 34, VII, c/c o art. 36, III). Esse processo constitui

pressuposto da intervenção federal, que, nos termos do art. 36, III, e § 1º, da Constituição, há de ser executada

pelo Presidente da República. Tradicionalmente, é o Supremo Tribunal Federal competente para conhecer as

causas e conflitos entre a União e os Estados, entre a União e o Distrito Federal ou entre os Estados entre si (art.

102, I, f). Tal como os outros países da América Latina, não dispõe a ordem jurídica brasileira de instrumento

único para defesa de direitos subjetivos públicos.

O legislador constituinte dedicou particular atenção à chamada “omissão do legislador”. Ao lado do mandado

de injunção foi introduzido o processo de controle abstrato de omissão.

A grande mudança acontece no controle abstrato de normas com a criação da ação direta de

inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou federal. Se a intensa discussão causada na vigência da

Constituição anterior sobre o monopólio da ação por parte do Procurador-Geral não levou a uma mudança da

jurisprudência, fica claro que na Carta Magna de 1988 houve uma ampliação do direito de propositura.

Nos termos do art. 103 da Constituição de 1988, dispõem de legitimidade para propor a ação de

inconstitucionalidade o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados,

a Mesa de uma Assembléia Legislativa, o Governador do Estado, o Procurador-Geral da República, o Conselho

Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional, as

confederações sindicais ou entidade de classe de âmbito nacional.

A Constituição Federal reduziu o significado do controle de constitucionalidade difuso ao ampliar a legitimação

para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade, permitindo que as controvérsias constitucionais

relevantes sejam submetidas ao Supremo Tribunal Federal.

Page 14: CURSO INTENSIVO AVANÇADO PARA O XLVII CONCURSO DA ... … · DIR. CONSTITUCIONAL - AULA 3 Data: 13-10-2015 PROF. DES. NAGIB SLAIBI FILHO (RESUMO DE AULA) Evolução político-constitucional

14

A Emenda Constitucional n. 3 firmou a competência do STF para conhecer e julgar a ação declaratória de

constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, processo que teria eficácia contra todos e efeito vinculante

relativamente aos demais órgãos do Executivo e do Judiciário.

A prática constitucional demonstra que, muitas vezes, a representação interventiva e, sobretudo a representação

de inconstitucionalidade foram utilizadas com o fito de afastar qualquer dúvida sobre a legitimidade de uma

norma.

A Emenda Constitucional n.45, de 2004, estabelece que estariam legitimados para a ADC os mesmo

legitimados para a ADI.

A argüição de descumprimento de preceito fundamental, no entanto, veio prevista de forma singela na

Constituição: “a argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será

apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei” (art. 102, § 1º).

Esse instituto trouxe significativas mudanças no sistema de controle de constitucionalidade brasileiro

Em primeiro lugar, porque permite a antecipação de decisões sobre controvérsias constitucionais relevantes,

evitando que elas venham a ter um desfecho definitivo após longos anos, quando muitas situações já se

consolidaram ao arrepio da ‘interpretação autêntica’ do Supremo Tribunal Federal.

Em segundo lugar, porque poderá ser utilizado para – de forma definitiva e com eficácia geral – solver

controvérsia relevante sobre a legitimidade do direito ordinário pré-constitucional em face da nova Constituição

que, até o momento, somente poderia ser veiculada mediante a utilização do recurso extraordinário.

Em terceiro, porque as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nesses processos, haja vista a

eficácia erga omnes e o efeito vinculante, fornecerão a diretriz segura para o juízo sobre a legitimidade ou a

ilegitimidade de atos de teor idêntico, editados pelas diversas entidades municipais.

Finalmente, deve-se observar que o novo instituto pode oferecer respostas adequadas para dois problemas

básicos do controle de constitucionalidade no Brasil: o controle da omissão inconstitucional e a ação

declaratória nos planos estadual e municipal.

Diante desse exposto, fica claro que a ADPF veio completar o sistema de controle de constitucionalidade de

perfil relativamente concentrado no STF, já que as questões excluídas de apreciação no âmbito do controle

abstrato de normas podem ser objeto de exame no âmbito desse novo procedimento.