apoteóse de schoenberg - cap 4, resenha crÍtica

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RESENHA CRÍTICA Discente: Daniel Henrique Hilario. Docente: Tadeu Taffarello. Disciplina: Análise II 1. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA MENEZES, Flo. Apoteose de Schoenberg. Segunda edição. São Paulo: Ateliê Edit., 2002. O presente trabalho tem como proposto, apresentar o capítulo quatro do livro Apoteose de Shoënberg, “Sobre o fenômeno da polarização acústica (Introdução à teoria de Edmond Costère)”, apresentado na segunda edição, escrito por Flo Menezes, considerado um dos compositores mais representativos da música contemporânea brasileira e também um grande teórico com vasta publicação na área alem de um posicionar-se piamente sobre suas convicções, tem uma escrita de bastante consistente o que acaba por ora exigindo total envolvimento por parte do leitor no texo. Neste capítulo 4 o autor aborda, de forma sintética, algumas ideias sobre o trabalho teórico de Edmond Costère intitulado Mort ou Transfigurations de l’Harmonie publicado em 1962 que surgiu como resposta aos rumos que tomavam a harmonia nas composições contemporâneas da década de 60. Um dos pontos destacados por Menezes, neste capítulo, retrata a relação de parentesco que Costère encontra entre a harmonia dita “atonal” e as harmonias (modal e tonal), aparentemente caracterizado

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Page 1: Apoteóse de Schoenberg - Cap 4, RESENHA CRÍTICA

RESENHA CRÍTICA

Discente: Daniel Henrique Hilario.Docente: Tadeu Taffarello. Disciplina: Análise II

1. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

MENEZES, Flo. Apoteose de Schoenberg. Segunda edição. São Paulo: Ateliê Edit., 2002.

O presente trabalho tem como proposto, apresentar o capítulo quatro do livro

Apoteose de Shoënberg, “Sobre o fenômeno da polarização acústica (Introdução à

teoria de Edmond Costère)”, apresentado na segunda edição, escrito por Flo

Menezes, considerado um dos compositores mais representativos da música

contemporânea brasileira e também um grande teórico com vasta publicação na

área alem de um posicionar-se piamente sobre suas convicções, tem uma escrita de

bastante consistente o que acaba por ora exigindo total envolvimento por parte do

leitor no texo.

Neste capítulo 4 o autor aborda, de forma sintética, algumas ideias sobre o

trabalho teórico de Edmond Costère intitulado Mort ou Transfigurations de

l’Harmonie publicado em 1962 que surgiu como resposta aos rumos que tomavam a

harmonia nas composições contemporâneas da década de 60. Um dos pontos

destacados por Menezes, neste capítulo, retrata a relação de parentesco que

Costère encontra entre a harmonia dita “atonal” e as harmonias (modal e tonal),

aparentemente caracterizado como oposições, sobre a luz de dados acústicos

sustenta um percurso de transformação do tratamento harmônico durante os

períodos da história da música ocidental.

O caminho encontrado por Costère, para comprovar suas ideias sobre o

processo de transformação da harmonia, é pautado no fenômeno da polarização

acústica entendido como a predominância de certas frequências sobre outras em

determinado contexto musical. O fenômeno é considerado pelo teórico como uma

síntese entre as diferentes aplicações da harmonia, para tanto, nos remete à Idade

Média a aplicação da polarização elucidando-a em uma frase de Guido D’Arezzo

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sobre a preponderância da nota final na compreensão da escuta, desta forma,

Costère identifica o conceito de funcionalidade embutido no modalismo primitivo

como um recurso de quebra da expectativa do ouvinte através da mudança de uma

direção com maior grau de polaridade para outro centro acústico.

Em primeira instância, não se trata aqui de uma funcionalidade semelhante à

harmonia tonal a qual identificamos a ultima nota apenas como confirmação do

discurso que se apresenta no decorrer da peça em determinados temas explorado

por regiões harmônicas ou possíveis moudulações. O sistema modal não exclui a

possibilidade de uma direcionalidade, mas tem em vista maior imprevisibilidade em

comparação ao final predeterminado da tonalidade. Em analogia ao modalismo a

harmonia pós-tonal ou “atonal” resgata a imprevisibilidade no discurso, porém, a

aplicação do fenômeno da polarização acústica, neste momento, é utilizada de

maneira múltipla e informativa.

A propósito do fenômeno da polarização acústica, este, designado por

audição seletiva, alega-se uma seleção natural na escuta de determinadas

frequências que são privilegiadas pelo próprio contexto musical desencadeado por

intermédio da forma harmônica ou estrutura intervalar a qual a polarização se efetua.

Para a classificação dos intervalos é necessário uma análise físico-acústica, partindo

do sistema temperado, levando em consideração o grau de polaridade que eles

exercem entre si, são classificados como polar, neutro ou apolar (negação de polo).

Entre os doze intervalos contidos no sistema temperado, na relação de uma

oitava, há estatisticamente números diferentes de intervalos polares, neutros e

apolares. Os intervalos polares configuram-se através do grau de reforço acústico

que se instaura no ato da escuta, sendo eles a oitava, quinta justa, quarta justa,

segunda menos e sétima maior. A oitava e quinta justa são, respectivamente, o

segundo e o terceiro parcial da série harmônica, a primeira é apenas um

desdobramento da fundamental. Já a quinta justa é a primeira nota distinta de

fundamental que aparece na série harmônica revelando um grande potencial por

instituir o “menor caminho” entre os intervalos divergentes da ressonância natural da

série.

O caso da quarta justa pode ser considerado polar pela relação resultante

entre o terceiro e quarto parcial da série harmônica, tomemos como exemplo a nota

dó como fundamental, teremos respectivamente o Sol e o Dó na relação de quarta

ou também há a interpretação de uma nota Fá como geradora do fundamental de Dó

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que neste caso, torna-se terceiro parcial da série harmônica de Fá. Entre segunda

menor e sétima maior, são intervalos que podem ser interpretados como inversão

um do outro, porem, há a presença da sensível ascendente e descendente entre a

nota fundamental, consideradas como o menor caminho entre a nota de referência

(a tônica) a nível melódico, em vista que a relação de quintas e oitavas ocorre por

meio da ressonância da série harmônica.

Quanto aos intervalos considerados neutros, historicamente comprovados

pela presença dos modos maior e menor, as terças não alteram a estabilidade de

uma tríade modificando apenas seu caráter. Na audição, percebemos uma

“coexistência pacífica” entre ela e as respectivas inversões de forças que se

neutralizam e por consequência atuam como mediação entre as potencialidades

polares e as apolares. Como exemplo, temos na relação de terça menor, entre a o

modo maior e menor das funções relativas e anti-relativas o caminho de ampliação

da unidirecionalidade tonal pelas relações mediânticas, desembocando na

atonalidade.

Em relação aos intervalos considerados apolares como asegunda maior,

sétima menor e trítono (Quarta Aumentada ou Quinta Diminuta) eles brigam entre si

pela hegemonia da polarização, num estado de repugnância recíproca, ocasiona

instabilidade acústica, uma repulsa instável. Comparados aos intervalos polares que

nos transmite uma sensação de estabilidade e os intervalos de neutralização uma

coexistência de forças pacífica aqui, entre os intervalos apolares, ocorre uma

repulsa, são caracterizados como as tensões do sistema tonal.

Entre estes intervalos encontramos uma hierárquica quanto á força ou

potencialidade polar, no caso de intervalos polares estabelece a seguinte ordem

(Oitava; Quinta; Quarta; e sensíveis). No caso dos intervalos de negação polar, o

Trítono é classificado como o intervalo de maior potencial apolar, ou seja, quando

temos uma tônica em Dó, seus intervalos polares serão (Ré bemol, Si, Sol e Fá),

comparando os resultantes polares de Dó a seus intervalos apolares (Ré, Si bemol e

Fá sustenido), estes últimos atraem para si o foco de atenção da escuta tornando os

sons polares de Dó relações de polaridade e neutralidade entre os apolares segunda

maior e sétima menor, porem no caso do Trítono todos os intervalos polares em Dó

se tornam seus polares, portanto, ele tem para si todos os sons polares de Dó.

Compreender a potencialidade de polarização dos intervalos do ponto de vista

acústico, nos permite avaliar melhor não apenas a música pós-tonal, mas também

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repensar e entender fenômenos da própria tonalidade tais como o conceito de

dissonância estabelecida historicamente entre a sétima maior como dissonante em

relação à quinta justa e a aplicação da sétima menor em acordes dominantes

caracterizada por não estabelecer polaridade com as notas da sua tríade. Outra

questão é a relação dos ciclos de quinta pensando a partir da constituição da série

harmônica encontramos a sétima menor como sétimo parcial harmônico, isto é, a

constituição natural do som produz uma mobilidade permanente de focos auditivos.

Sobre tudo ao apresentar a teoria de Costère, Menezes apenas faz uma

introdução sobre o assunto e nos dá um referencial para compreender a relação das

possibilidades polares entre os intervalos, portanto, não tem como proposto esgotar

o assunto neste capítulo, no entanto, a leitura deste material é uma ótima opção

para um primeiro contato com os elementos básicos desta teoria que de certa forma

já se faz presente em nossa escuta seletiva, talvez, de forma até inconsciente. Por

fim, este trabalho nos abre perspectivas em relação ao tratamento e aplicação da

sonoridade funcional referente ao grau de polarização, desmistificando o assunto

não apenas como um recurso próprio da música pós-tonal, mas como um fenômeno

presente na natureza explicado pela física acústica.