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Ana Maria Barrera Conrad Sackl

Tradução & Paratradução do Popol Wuj:

Paratextos e Excertos do Gênesis

Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação

em Estudos da Tradução, da Universidade Federal

de Santa Catarina, como pré-requisito para a

obtenção do título de Doutor em Estudos da

Tradução.

Orientador: Prof.Dr. Ronaldo Lima (UFSC)

Co-orientador: Prof. Dr. Carlos López (Marshall

University, USA).

Florianópolis

2015

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A Elsa Isabel Conrad

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, ao meu orientador, Dr. Ronaldo Lima,

pelo seu apoio sempre respeituoso com a liberdade de escolha e de

expressão dos seus orientandos, que sinalizou-me os caminhos da

Paratradução que o texto do Popol Wuj representa amplamente.

A elaboração desta tese nasceu com o interesse que me despertou

o Manuscrito Ayer 1515 (1700-1704), cuja digitalização encontrei na

página Web da Universidade de Ohio. Naquele momento eu tinha uma

curiosidade específica por manuscritos, inspirada nas inquietudes do

professor Sergio Romanelli, a quem sou grata por ensinar-me a apreciar

a centelha de vida implícita na caligrafia de um tradutor.

O Professor Dr. Carlos López, da Marshall University, co-

orientador desta tese, autoridade em epistemologia maia, oportunizou-me

a descoberta da sofisticada lógica dos K’iches’ através de explicações

simples e claras. Todos os acadêmicos que contactei para inteirar-me

sobre algum aspecto do Popol Wuj foram absolutamente receptivos e

desinteressados: A Professora Michela Craveri, da Universidade de

Milão; o Dr. Oswaldo Chinchilla Mazariegos, da Universidade Francisco

Marroquin da Guatemala, atualmente docente na Universidade de Yale;

o curador Adolfo Cantú, jornalista e crítico de arte no México; o Dr.

Ricardo Falla, antropólogo e renomado teólogo da Guatemala, todos me

encaminharam materiais valiosíssimos por e-mail e correios. Sou grata

pelo privilégio de tê-los conhecido, mesmo que não tenha sido

pessoalmente.

Com o texto do Popol Wuj fui até a Universidade Artesis de

Antwerpen, na Bélgica, onde existe a biblioteca mais completa da Europa

em Estudos da Tradução. Lá, fui atendida pela professora Dra. Christiane

Stallaert, que me abriu as portas da Instituição e para quem dedico meu

mais sincero agradecimento.

Agradeço aos meus amigos do doutorado: Rosane de Souza,

Adriano Mafra e Esteban Campanela pelo companheirismo, pelas

jornadas de trabalho acadêmico compartilhadas com alegria. Agradeço a

Jorge Dyuri Gubitsch pelo seu apoio incondicional, carinho e paciência.

Agradeço ao meu filho, Francisco Aléxis Sackl, por ter sido

compreensivo e altruista nas minhas ausências por causa dos estudos.

Finalmente sou grata aos maias K‘iches’, ao primeiro copista do

códice no século XV, e aos tradutores através dos quais conheci esta

cosmogonia.

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O dia que nasce, a véspera que vai se fortificar e

dominar parece mais o fim de alguma coisa, o

entardecer do instável. Não é ainda certo que o dia

vá continuar e afirmar-se sobre todas as coisas.

Este sonho está ainda em equilíbrio reversível com

o nada. (VALÉRY, 1916, tradução nossa1)

1 Le jourqui se lève, laveillequivadurcir et dominersemblentplutôtlafin de

quelquechose - lecouchant de l'instable. Il n'est pas encore tout à fait sur que ce

jour va se continuer et s'affirmer sur toutes les choses.Ce rêve est encore en

équilibre réversible avec le rien. (VALÉRY, 1916)

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RESUMO

Esta investigação tem por objetivo a análise e o estudo crítico de um

corpus constituído por paratextos e excertos do gênesis de três traduções

do Popol Wuj, cosmogonia mítica pré-hispânica da Mesoamérica (séculos

II a VII d.C.). A primeira tradução, o Manuscrito de Chichicastenango,

de Ximénez (1700-1704), autógrafo e bilíngue, contém a cópia da

transliteração do k’iche’ fonetizado, representado com caracteres do

alfabeto latino e a tradução para o espanhol do século XVI; a segunda

tradução, de Don Adrián Inés Chávez (1979), revisa a língua k’iche’ e a

traduz para o espanhol contemporâneo a partir de minucioso trabalho em

quatro colunas; a última tradução, de Sam Colop (2011), redigida em

espanhol, é apresentada em forma de poema. Como suporte às análises e

estudo crítico, utiliza-se a noção de paratradução de Yuste Frías (2014),

bases dos Estudos Descritivos da Tradução (EDT), os estudos

antropológicos associados à tradução propostos por Stallaert (2006), os

estudos decoloniais (MIGNOLO, 2001) e as análises epistemológicas de

López (1999). A principal hipótese defendida busca investigar se os

tradutores imprimem no texto o polissistema cultural e linguístico da

língua-alvo e traços da época em que os textos foram traduzidos.

Finalmente, destaca-se que o trabalho desenvolve-se sob “perspectiva

paraliterária abrangente”, justamente por se tratar de um texto mítico. De

fato, trata-se de uma relíquia linguística de valor antropológico que a

noção da paratradução, aqui considerada, parece poder abarcar de modo

satisfatório.

Palavras-chave: tradução, paratradução, literatura, mitos pré-hispânicos,

espanhol, k’iche.

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ABSTRACT

The goal of this research is the analysis and critical study of a corpus that

contains the Paratexts and fragments of the genesis of three translations

of the Popol Wuj, the book that describes the mythic Maya Pre-hispanic

cosmogony that originated in Mesoamerica between the second and

seventh century after Christ. The first one, called the “Manuscript of

Chichicastenango”, was translated by Ximénez between 1700 and 1704,

is bilingual (K’iche'-Spanish); the second one, made by Don Adrián Inés

Chavez (1979) is a phonetic revision, creates new symbols and translates

the text into Spanish in a meticulous way that he organized in four parts;

the third translation, authored by Sam Colop (2011) is bilingual K’iche'-

Spanish and is written in a poetical way. The analysis and critical study

is based on the theory of paratranslation of Yuste Frias (2014), the

Descriptive Studies of Translation, Stallaert's researches (2006) that

combine anthropology and translation, notions of the Studies of

Colonialism (MIGNOLO, 2001) and the epistemological analysis of the

Popol Wuj (LÓPEZ, 1999). The hypothesis here defended seeks to

demonstrate if the translators imprint in the text the cultural and linguistic

polysistem from the target language and the historical context of the times

that the texts were translated. Finally, it is emphasized that this research

is developed in a "comprehensive paraliterary perspective," because

Popol Wuj is a mythical text. In fact, it is a linguistic relic of

anthropological value that the notion of paratranslation considered here

seems to be able to embrace satisfactorily

Keywords: Translation, Paratranslation, Literature, Pre-hispanic myths,

Spanish, K'iche'.2

2 Tradução Jorge Gubitsch.

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RESUMEN

La siguiente investigación propone el estudio crítico de un corpus

constituido por paratextos e párrafos de la génesis de tres traducciones del

Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica

(siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas son: el Manuscrito de

Chichicastenango, de Francisco Ximénez (1700-1704), autógrafo e

bilingüe que contiene la copia de la transliteración del k´iche’ fonetizado

(S.XVI) y escrito en caracteres del alfabeto latino y la traducción para el

español, la obra de Don Adrián Inés Chávez (1979), revisa la lengua

k´iche’ y la traduce para el español contemporáneo a partir de un

minucioso trabajo en cuatro columnas, la tercera traducción de Sam

Colop (2011), redactada en español está presentada en forma de poema.

Como fundamento de este análisis crítico, se utilizan los estudios sobre

paratraducción de Yuste Frias (2011), algunas nociones de los Estudios

Descriptivos de la Traducción (EDT), nociones sobre antropología

asociadas a la traducción propuestos por Stallaert (2006), los estudios

decoloniales (MINOLO, 2011) y los estudios sobre epistemología maya

de López (1999). La principal hipótesis defendida busca investigar se los

traductores imprimen en el texto el polisistema cultural y lingüístico de la

lengua de llegada y de la época en que los textos fueron traducidos.

Finalmente , destacamos que esta investigación se desenvuelve sobre una

perspectiva paraliteraria muy amplia, por tratarse de un texto mítico. Un

documento de grande valor antropológico para cuyo estudio la noción de

paratraducción, aquí considerada, atiende de modo satisfactorio.

Palabras-clave: traducción, paratraducción, literatura, mitos

prehispánicos, español, k’iche.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Murais de San Bartolo ................................................................ 34

Figura 2 - Aguaceiro torrencial ................................................................... 50

Figura 3 - Página 34b do Códice Tro-Cortesiano ........................................ 52

Figura 4 - Escriba maia ensinando.Vaso policromado. ............................... 53

Figura 5 - Colégio Imperial de Santa Cruz de Tlatelolco ............................ 57

Figura 6 - Queima de códices...................................................................... 58

Figura 7 - Le Livre Sacré ............................................................................ 66

Figura 8 - Primeira página do Ms Ayer 1515. ............................................. 77

Figura 9 - Prólogo ....................................................................................... 80

Figura 10 - Fragmento I, “Salutación” ........................................................ 83

Figura 11 - Fragmento II, “Outra Saluctación” ........................................... 84

Figura 12 - Fragmento III ............................................................................ 84

Figura 13 - Cabeçalho do Posfácio ............................................................. 86

Figura 14 - Capa do Pop Wuj. ..................................................................... 96

Figura 15 - Contracapa do Pop Wuj ............................................................ 98

Figura 16 - Amostra de tradução ............................................................... 101

Figura 17 - Amostra de traduções em espanhol ........................................ 102

Figura 18 - Capado Popol Wuj .................................................................. 103

Figura 19 - Excerto Chavez I .................................................................... 110

Figura 20 - Excerto Chavez II ................................................................... 110

Figura 21 - El Maguey .............................................................................. 111

Figura 22 - Deusa da fertilidade ................................................................ 112

Figura 23 - Gravura em Madre Pérola ...................................................... 130

Figura 24 - K´inich Ajaw Deidade solar ................................................... 139

Figura 25 - Serpente emplumada .............................................................. 150

Figura 26 - Governante vestido com roupas de Jaguar ............................. 162

Figura 27 - Vaso: homem abraçando um veado. ....................................... 165

Figura 28 - Notário maia com cabeça de ave. ........................................... 167

Figura 29 - Especificações bibliográficas ................................................. 172

Figura 30 - Primeira imagem do livro ....................................................... 172

Figura 31 - A criação do Universo, Diego Rivera. .................................... 176

Figura 32 - Asombro recolectado .............................................................. 179

Figura 33 - Os Tecolotes mensageiros ...................................................... 180

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Menção da Escritura de Tulán .................................................. 46

Quadro 2 - Traduções estudadas ................................................................. 73

Quadro 3 - Transcrição e tradução do Prólogo I ......................................... 80

Quadro 4 - Transcrição e tradução do Prólogo II ........................................ 81

Quadro 5 - Transcrição e tradução do Prólogo III ....................................... 82

Quadro 6 - Escólios. Prólogo ...................................................................... 87

Quadro 7 - Escólios. Prólogo. (Continuação) ............................................. 88

Quadro 8 - Escólios. Prólogo.(Continuação)............................................... 89

Quadro 9 - Escólios “Sobre el ser de Dios” ................................................ 93

Quadro 10 - Escólio sobre a gestação dos “Gêmeos Heróicos” .................. 94

Quadro 11 - Especificações da capa do Pop Wuj ........................................ 97

Quadro 12 - Popol cabuil .......................................................................... 108

Quadro 13 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 109

Quadro 14 - Terceira e quarta coluna do Pop Vuh .................................... 111

Quadro 15 - Terceira e quarta coluna do Pop Vuh (Continuação) ............ 113

Quadro 16 - Organização textual em Colop .............................................. 114

Quadro 17 - Escolhas tradutórias .............................................................. 115

Quadro 18 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 116

Quadro 19 - Difrasismo ............................................................................. 120

Quadro 20 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 121

Quadro 21 - Escólios. ................................................................................ 121

Quadro 22 - Metáforas orgânicas .............................................................. 122

Quadro 23 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 122

Quadro 24 - “Sobre o ser de Deus” ........................................................... 123

Quadro 25 - Anciãos ................................................................................. 126

Quadro 26 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 126

Quadro 27 - “Sobre o ser de Deus”(Continuação) .................................... 127

Quadro 28 - Nomeação ............................................................................. 129

Quadro 29 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 129

Quadro 30 - Sombra e luz ......................................................................... 131

Quadro 31 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 131

Quadro 32 - Sobre o Popol Wuj. ............................................................... 133

Quadro 33 - Os quatro rumos do universo ................................................ 137

Quadro 34 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 138

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Quadro 35 - Difrasismo mãe e pai. ............................................................ 141

Quadro 36 -Tradução para o português do excerto anterior ...................... 141

Quadro 37 - O silêncio, o vazio e a quietude............................................. 143

Quadro 38 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 145

Quadro 39 - Enumeração dos deuses ......................................................... 148

Quadro 40 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 148

Quadro 41 - Atributos das divindades ....................................................... 151

Quadro 42 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 152

Quadro 43 - Criação da terra ..................................................................... 155

Quadro 44 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 157

Quadro 45 - Traduções do mito da criação dos animais ............................ 159

Quadro 46 - Tradução para o português do excerto anterior ..................... 160

Quadro 47 - A criação dos animais 2 ........................................................ 163

Quadro 48 - Tradução para o português do excerto anterior. .................... 163

Quadro 49 - A criação dos animais (Continuação) .................................... 164

Quadro 50 - Tradução para o português do excerto anterior. .................... 164

Quadro 51 - A criação dos animais (Continuação) .................................... 167

Quadro 52 - Tradução para o português do excerto anterior. .................... 169

Quadro 53 - Texto correspondente à Criação do Homem ......................... 176

Quadro 54 - A história de Ixquic com sua sogra ....................................... 177

Quadro 55 - Criação dos animais .............................................................. 180

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...............................................................................................23

1 POPOL WUJ....................................................................................33

1.1 COMENTÁRIO SOBRE O ENREDO ..................................................... 33

1.2 CRITÉRIOS PARA ANÁLISE DAS TRADUÇÕES. PARATRADUÇÃO ....... 36

1.3 PERSPECTIVA DA PARATRADUÇÃO ................................................. 42

2 ORIGENS DO TEXTO DO POPOL WUJ - OS CÓDICES.......................45

2.1 CONJUNTURA COLONIAL, IDEÁRIO DA CONQUISTA. ....................... 54

3 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS TEXTOS ESTUDADOS..................59

3.1 DETALHES HISTÓRICOS DAS TRADUÇÕES ....................................... 59

3.1.1 Francisco Ximénez, Guatemala e o Popol Wuj ............................. 61

3.1.2 Destino dos manuscritos de Ximénez ........................................... 65

3.1.3 Don AdriánInés Chavez e sua época. ............................................ 69

3.1.4 Biografia de Sam Colop ............................................................... 71

4 PARATEXTOS DAS TRADUÇÕES......................................................73

4.1 ANÁLISE DOS PARATEXTOS E DO PRÓLOGO DO MANUSCRITO MS

AYER 1515 (F. 2R) ......................................................................... 74

4.1.1 Características da grafia do manuscrito ........................................ 74

4.1.2 Características paratextuais do manuscrito ................................... 75

4.1.4 Prólogo .......................................................................................... 79

4.1.5 Posfácios, escólios do manuscrito Ms Ayer (1515) ...................... 84

4.2 POP WUJ, EL LIBRO DEL TIEMPO DE DON ADRIÁN I. CHAVEZ ........... 95

4.2.1 Peritexto editorial Pop Wuj de Don Adrián Inés Chávez -

capa, página de rosto e seus anexos. ............................................. 95

4.2.1.1 capa do pop wuj (chavez,2007) ............................................... 96 4.2.1.2 contracapa. ............................................................................... 98

4.2.2 Prefácio ......................................................................................... 99

4.3 PERITEXTO EDITORAL DO “POPOL WUJ, TRADUCCIÓN

AL ESPAÑOL Y NOTAS DE SAM COLOP 2011”. ............................... 103

4.3.1 Capa ............................................................................................ 103

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5 ANÁLISE DAS TRADUÇÕES (FÓLIOS 1R,1V;2V; 2R,).....................106

5.1 A CRIAÇÃO DOS ANIMAIS ............................................................ 159

5.2 UM EXEMPLO DE EPITEXTO DO POPOL WUJ,

ILUSTRAÇÕES DE DIEGO RIVERA .................................................. 171

6 CONSTATAÇÃO DOS OBJETIVOS E METODOLOGIA......................183

7 CONCLUSÃO.................................................................................187

REFERÊNCIAS............................................................................................195

ANEXO I: MAPA.........................................................................................209

ANEXO II: ILUSTRAÇÕES DE DIEGO RIVERA (1931-1937)...................213

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INTRODUÇÃO

O Popol Wuj é uma obra literária pré-hispânica. Uma

cosmogonia da cultura Maia K'iche’3 que se desenvolveu na Mesoamérica

entre os séculos III a VIII d.C (COE,1989, p. 104). A obra narra as

aventuras mitológicas de dois jovens irmãos: Junajpú e Ixbalanqué, e

relata o Gênesis inicial pelos atos prodigiosos da serpente emplumada e o

furacão. Versa também sobre a genealogia dos povos ancestrais da

Mesoamérica. Os gêmeos heróicos estão apresentados num contexto de

significação cósmica, inseridos num tempo cíclico ligado à produtividade

da terra, e cujas ações guardam um valor simbólico. “O Popol Wuj

contém a mitologia e a história do povo k’iche até a chegada dos

espanhóis no século XVI, quando se encontra a execução dos Senhores

principais Oxib Kej e BelejebTz´i” (COLOP, 2011, p. XVII, tradução

nossa5). O relato mitológico mostra o Gênesis do mundo, os homens, os

animais e as plantas. Também encontramos relatadas a origem e história

dos grupos sociais da região atual da Guatemala central, de Vera Paz e o

rio Candelária, com a descrição de suas dinastias, migrações, guerras e

conquistas. Os relatos encontram-se referenciados em representações

logossilábicas e pictóricas em monumentos, cerâmicas e códices maias.

Aproximadamente entre 1554 e 1557, um escriba K'iche’

realizou a transliteração dos textos, possivelmente pintados e

logossilábicos, do Popol Wuj em língua k’iche para caracteres do alfabeto

latino. Possivelmente a transcrição foi pouco fiel ao texto de base,

sobretudo devido às limitações para as representações dos traços

fonéticos, fonológicos e ortográficos, próprios do K’iche’, em outro

sistema de escrita. Supõe-se que este manuscrito foi realizado em Santa

Cruz del Quiché, que ficava próximo de Q´umarkaaj (Anexo 1), capital

3 De acordo com a grafia do Diccionario K’iche’-Castellano da Direção Geral de

Educação Bilíngue Intercultural de Guatemala .(Richards& Richards, 1996).

4 “Desses séculos, temos testemunhos nas representações e livros em vários

monumentos, entre eles, o palácio conhecido como estrutura 9 N-82 de

Copán” (COE, 1989, p. 10). 5 “El Popol Wuj es el libro que contiene la mitología y la historia del pueblo

k’iche, hasta la llegada de los españoles en el siglo XVI, cuando se

encuentra la ejecución de los Señores principales Oxib Kej y

BelejebTz´i´” (COLOP, 2011, p. XVII).

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do reino, que em 1524 foi tomada e destruída pelos espanhóis.

Posteriormente, não se sabe como, o texto foi levado a Chichicastenango,

onde o frade domínico Francisco Ximénez o encontrou e realizou a

transcrição do K’iche’, seguida da tradução para o castelhano. O frade

teria finalizado a tradução durante o período que residiu em Rabinal6

(entre 1700 e 1704). Francisco Ximénez realizou uma série de obras sobre

a cultura maia, algumas descritivas, outras tradutológicas. O Manuscrito

de Chichicastenango encontra-se hoje na Newberry Library, sob o código

Ayer MS1515.

O corpus de estudo da presente investigação está constituído

pelos paratextos e excertos de três traduções do Popol Wuj, a saber:

Ximénez (1700-1704) Ms Ayer 1515, Chávez (1979)7 e Sam Colop

(2011)8. Faz-se essencial destacar que o manuscrito de Ximénez

fundamentou todas as traduções realizadas a posteriori do Popol Wuj,

pois se acredita existir unicidade, coerência e completude nos chamados

Wujs9 (relatos míticos provenientes da tradição oral ancestral). Trata-se,

com efeito, do único vestígio histórico da obra maia consultado por

tradutores, arqueólogos e antropólogos que analisaram e compararam a

tradução de Ximénez com relatos, crônicas e inscrições hieroglíficas em

monumentos, templos e cerâmicas arqueológicas. O documento vem

também contribuindo, ao longo dos anos, para o desenvolvimento de

estudos sobre a língua K’iche’. As traduções de Chávez (1979) e de Sam

Colop (2011), embora sejam muito diferentes entre si, pontuam

6 Localizado a 180 km da cidade de Guatemala, no departamento de Baja

Verapaz. Fundada em 1537 pelo Frei Bartolomé de las Casas. Rabinal é conhecido

pelo Rabinal Achí, obra teatral dançada, de origem pré-hispânica, declarada obra

mestra da tradição oral e intangível da humanidade, em 2005 pela UNESCO,

inscrita em 2008 na lista representativa do Patrimônio Cultural Imaterial da

Humanidade. Disponível em: http://mundochapin.com/2013/12/guia-turistica-

rabinal-baja-verapaz/21429/ Acesso em: 18 de janeiro de 2015.

7 CHÁVEZ, A.I. POP WUJ. México: Ediciones de la Casa Chata, 1979.

8 COLOP, S. Popol Wuj (traducción al espanhol y notas). Guatemala:

Biblioteca Guatemala, 2011. 9 Cuando aborda el tema de la relación entre la escritura y la oralidad,

bordea el asunto de la multiplicidad de documentos, al mencionar la

existencia de muchos textos en la que existía una relación recíproca entre

escritura y pinturas. (TEDLOCK apud LÓPEZ, 1999, p. 39).

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25

especificidades da língua K'iche’, descrevem traços de sua fonética e

singularidades de sua semântica, sempre associados às tradições antigas,

ligadas a fontes orais, muitas das quais permanecem, até os dias atuais,

vivas na cultura do povo K'iche’. Estes tradutores realizam tarefa

etnografica de grande porte, seguindo os rastros de tradições de registros

ofuscados desde o início da invasão espanhola.

Justifica-se a relevância desta tese na área dos Estudos da

Tradução, sublinhando que o Popol Wuj - embora tenha sido pesquisado

por disciplinas como História, Crítica Literária, Antropologia,

Arqueologia, Religião, além de outras afins - tem sido pouco abordado

até o presente em âmbito brasileiro, inclusive à luz dos Estudos da

Tradução. Destacamos a importância da tradução ao português

acompanhada de enriquecedoras notas realizada pelo professor da UFSC

Sergio Medeiros, juntamente com Gordon Brotherston (2011), fonte de

consulta desta tese. “Os tzijs (verdades, histórias, narrações, tradições)”

(LÓPEZ, 2009, p. 127) contidos no Popol Wuj carregam informações de

ordem mítica, ética, astronômica e agrícola. Em suma, trata-se de um

verdadeiro caleidoscópio epistemológico que, ao ser traduzido, justifica,

sobretudo, sua investigação sob o prisma dos estudos interculturais. A

revisão da literatura evidencia que, de modo geral, o Popol Wuj continua

sendo uma obra pouco investigada nos meios acadêmicos lusófonos, fato

que reforça a importância desta pesquisa.

A leitura do Popol Wuj oportuniza um olhar mais profundo sobre

a visão de universo desenvolvida pelo povo K’iche’, fórum que envolve

sistemas conceituais dinâmicos e simbióticos, implicando complexas

redes entre diversidades, isto é, “relações binárias, antagonismos

simétricos e reversíveis, postulados de multiplicidades e ciclos que

subjazem em todos os episódios” (LÓPEZ, 2009, p. 111, tradução

nossa10). A obra maia abre novas gamas de reflexões que remetem ao

lúdico, ao mágico, ao metafórico, através de articulações discursivas

apresentadas como dramas simbólico-cósmicos, com ênfase, sobretudo,

nos binarismos como paradigma básico para o desenvolvimento do

pensamento (LÓPEZ, 2009, p. 110).

8 “relaciones binarias, antagonismos simétricos y reversibles, postulados de

multiplicidades y ciclos que subyacen en todos los episodios.” (LÓPEZ, 2009, p.

111).

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26

...entender o PW desde dentro,[...] desde seu

momento, como se estivéssemos nascendo para

esse mundo de crenças e símbolos e

participássemos com as pessoas daquela época.

Entender desde dentro significa aprender, ter

humildade, e não vir com desejos de corrigir e de

ensinar. Deixemos o lápis vermelho por um

momento guardado na gaveta. [...] se há idéias

novas do Popol Wuj que vêm à mente, não as

recortemos para que possam entrar na nossa

cabeça, vamos tentar adaptar as gavetas da nossa

mente para que entrem tal e como são. É uma

tarefa difícil, mas é a que nos fará crescer e tirar

do PW, não somente um acúmulo de

conhecimentos com os quais podemos nos

envaidecer e palavras raras que podem se

acumular, porém não mudam nossa perspectiva,

[...] (necessitamos ter) ‘novos olhos’. Os olhos

novos são os que nos farão crescer. (FALLA,

2013, p. 14, tradução nossa11).

Michela Craveri argumenta que na organização retórica do texto

do Popol Wuj existiria uma espécie de “continuidade vital” (CRAVERI,

2012, p. 100) entre todas as manifestações naturais, comparável a um

modelo cognitivo, passível de ser encontrado em textos orais produzidos

por grupos sociais que privilegiam a voz humana em suas comunicações,

em que não existem esferas cognitivas em relação hierárquica, mas sim

conceitos que se relacionam biunivocamente. As sociedades escriturais

articulariam a representação do mundo em conceitos autônomos,

ordenados hierarquicamente. Nas comunicações de sociedades com

amplo uso da oralidade, a mensagem tornar-se-ia contextualizada,

11 …entender el PW desde dentro, […] desde su momento, como si estuviéramos

naciendo a ese mundo de creencias y símbolos y participáramos con las personas

de entonces: Entender desde dentro significa aprender, tener humildad y no venir

con deseos de corregir y enseñar. Dejemos el lápiz rojo por un momento guardado

en la gaveta. […] Si hay ideas nuevas del PW que se vienen a la mente, no las

recortemos para que puedan entrar en la cabeza, sino hagamos el intento de

reajustar los casilleros de nuestra mente para que entren tal y como son. Es una

tarea difícil, pero es la que nos va a hacer crecer para sacar del PW, no solo un

montón de conocimientos con los que podemos presumir y palabras raras que se

pueden amontonar pero no cambian nuestra perspectiva, sino ojos nuevos. Los

ojos nuevos son los que nos harán crecer. (FALLA, 2013, p. 14).

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considerando-se seus vínculos com outras formas naturais como parte

fundamental de sua significação. Sob esta ótica, no texto do Popol Wuj o

mundo organiza-se em redes de conceitos que se erguem a partir de pares

intimamente relacionados, chamados ‘opostos binários’, como, por

exemplo, “cueva-barranco”; “venado-pájaro”; “árbol-bejuco”, onde

cada termo provém de difrasismos12formados por dois elementos, um

deles representa o contexto natural do outro, enfatizando seu significado

de acordo com o aspecto vital que os une. Por este motivo, considera-se

que os difrasismos e disfrasismos13 formam parte do repertório poético

mesoamericano, cuja presença emerge nesta zona cultural e responde ao

mesmo princípio de organização simbólica de realidade, de maneira que

toda enunciação formalizada com funções poéticas e rituais será

fortemente marcada por esta característica.

O Manuscrito de Ximénez representa o pensamento colonial que

abordaremos mais detalhadamente ao longo desta pesquisa. A obra de

Chávez (1979), embora trate, na tradução, dos aspectos fonéticos

associados ao significado do léxico, não utiliza os opostos binários,

contradizendo um dos princípios fundamentais da epistemologia da

mitologia K’iche’ em favor de uma linha de pensamento de cunho euro

centrista. A terceira tradução contemporânea, de Sam Colop (2011)

parece ser a que mais se aproxima dos conceitos tradicionais da cultura

maia clássica em função da atenção concedida ao conteúdo e à forma

(CRAVERI, 2012, p. 99).

Este trabalho pode contribuir como fonte de pesquisa para

professores de Espanhol Língua Estrangeira (ELE) e investigadores dos

Estudos da Tradução interessados na cultura maia. Propomos uma

reflexão sobre o potencial pedagógico do Popol Wuj em contextos

educativos, uma vez que seu conteúdo de grande plasticidade pode ser

associado a aulas de literatura, teatro, artes plásticas ou história da cultura

americana, sendo, ainda, apropriado para alunos de diferentes níveis de

aprendizado, desde o fundamental até o ensino superior. Em algumas

faculdades do Brasil, por exemplo, em cursos de graduação com Espanhol

como Língua Estrangeira, essa obra é considerada muito complexa e de

12 Frase que se rompe em dois elementos paralelos (CRAVERI, 2012, p. 78)

13 Frase que se rompe em muitos elementos léxicos, até 10 ou mais palavras.

(CRAVERI, 2012, p. 78)

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baixo aproveitamento didático, um de nossos objetivos é contribuir para

uma maior compreensão acerca da riqueza da obra. Esta tese pode ser útil

também para leitores que não tenham ainda incursionado na compreensão

dos mitos mesoamericanos. Apresentaremos uma aproximação da sua

narrativa como fundamental à identidade americana, através de uma

abordagem que informa sobre alguns símbolos e imagens míticas pré-

hispânicas. Dois eixos são úteis para cumprir esse objetivo, no ensino do

espanhol e da cultura americana, sendo o primeiro fundamentado no

próprio valor icônico da obra, e o segundo através da leitura realizada

pelos tradutores e suas respectivas interpretações do relato.

No campo dos Estudos da Tradução, esta investigação busca

compreender a importância da transliteração em caracteres latinos do

K’iche’ e a tradução para o espanhol do Popol Wuj, do Manuscrito de

Chichicastenango de Francisco Ximénez (1700-1704), por ter permitido

a sobrevivência de parte da memória da tradição K’iche’. Pretendemos

também entender a conjuntura social e literária da cultura K’iche’ à

adaptação da tradição oral e à escrita pictórica para a escrita alfabética

latina. Valorizar a tradução como principal veículo, responsável pelo

transporte de boa parte do texto de base até o presente, sempre dentro do

objetivo de estudar excertos de três traduções: o Manuscrito colonial de

Francisco Ximénez (1700-1704), a versão descolonialista de Chávez

(1979), e a versão decolonial de Colop (2011), fundamentando

teoricamente conceitos que emergem principalmente a partir da

perspectiva da inflexão decolonial:

...um grupo de intelectuais nascidos em países da

América do Sul e do Caribe, cujo trabalho realiza-

se nesses países e em universidades dos Estados

Unidos, tem formado uma coletividade de

argumentação em torno de um conjunto de

problematizações da modernidade e,

particularmente, sobre o significado de tal

experiência na perspectiva de quem a vive a partir

de uma condição subalterna. (RESTREPO e

ROJAS, 2010, p. 14, tradução nossa14)

14“ ...un grupo de intelectuales nacidos en países de América del Sur y el Caribe, cuyo

trabajo se realiza en dichos países y en universidades de los Estados Unidos, ha

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As hipóteses desta tese consistem prioritariamente de duas

indagações sobre excertos do Popol Wuj. A primeira consiste em

investigar se o texto do tradutor comporta traços do período em que foi

realizada, registrando marcas antropológicas, sociológicas, culturais,

políticas e, naturalmente, linguísticas.

Inicialmente, trata-se de considerar (i) o inconsciente do texto,

que alerta para o exame do papel que onunc e o hic - imbricados com

traços culturais, exercem sobre as escolhas do tradutor. Parte-se da

suposição de Willemart (2005, p. 4) de que “o autor não [é] uma mônada

isolada que pode reivindicar o que ele produz como sendo algo

exclusivamente seu; como qualquer homem, ele é a culminação de uma

série de desejos de sucessivas gerações, o fruto de um momento cultural

preciso”; (ii) o ‘inconsciente estético’, que diferenciaria os mitos

fundadores de civilizações e os mitos individuais, que se evocam como

forma de enfrentar situações impossíveis pela articulação sucessiva de

formas de impossibilidade. Neste sentido, segundo Willemart (2002, p.

27), para que o banal revele seus segredos, lembra Lacan, primeiramente

deverá ser mitificado, o que significaria incorporar numa história

elementos que parecem contraditórios por pertencer a registros diferentes,

como os do mundo da realidade e os do mundo da fantasia. Surge então

uma pergunta que remete a nossas hipóteses acima oferecidas, a saber: até

que ponto o mito K’iche’ foi mitologizado e alterado pelos próprios

tradutores?

Como observado acima, a presente investigação trata de uma

cosmogonia mítica de valor simbólico para uma civilização. Os códices

do texto fonte e a primeira transliteração, com efeito, nunca foram

encontradas, restando tão somente como único vestígio de sua existência

a cópia realizada pelo padre Ximénez (1700-1704). Problematizamos,

através das hipóteses apresentadas, a compreensão de pontos da

epistemologia maia-k’iche’ pelos tradutores, postulando que, com o

advento das teorias sobre decolonialidade15 e dos estudos interculturais,

ido conformando una colectividad de argumentación alrededor de un conjunto de

problematizaciones de la modernidad y particularmente sobre el significado de

dicha experiencia en la perspectiva de quienes la han vivido desde una condición

subalterna.” (RESTREPO; ROJAS, 2010, p. 14).

15 “No se debe confundir descolonización y decolonialidad. Con descolonización se

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poderia ser possível ter acesso a informações mais objetivas a respeito das

bases de constituição do documento maia-k’iche’: o Popol Wuj. A teoria

da Inflexão Decolonial (RESTREPO; ROJAS, 2010) parece anunciar a

valorização da “diferença epistêmica como projeto universal e não mais

a busca dos universais abstratos” (MIGNOLO, 2001, p. 18, tradução

nossa16). No campo da antropologia, abordaremos alguns conceitos de

Stallaert (2006) como forma de ampliar o arcabouço ideológico que

permeia o pensamento na Espanha da conquista, como o casticismo

vigente após a diáspora de 1492, presente na catequese colonizadora das

Américas e reminiscente até nossos dias.

As traduções “Pop Wuj, libro del tiempo” (CHÁVEZ, 1979) e

“Popol Wuj Traducción al Español de Sam Colop” (COLOP, 2011), são

trabalhos de autores falantes nativos da língua K’iche’ que remetem ao

processo de “descolonização”e o de “decolonização”, respectivamente,

de acordo com a teoria de Walsh (2005) que “marca a chegada à

concorrência internacional de protagonistas até então excluídos da própria

idéia de literatura” (CASANOVA, 2002, p. 68). “Estamos perante o

surgimento da consciência histórica, étnica e cultural dos povos nativos

do continente. Este novo fenômeno coloca em evidência que textos como

o Popol Wuj não são relíquias do passado, e sim integram o presente”.

(LÓPEZ, 2009, p. 126, tradução nossa17)

As considerações de Octavio Paz (2008) e Stallaert (2006) sobre

a constituição da ideologia e cultura colonial espanhola permitem

compreender alguns dos parâmetros da tradução de Ximénez (1701-

indica un proceso de superación del colonialismo, generalmente asociado a las

luchas anticoloniales en el marco de estados concretos. La descolonización se

tiende a circunscribir a lo que se ha denominado independencias políticas de las

colonias, [...] La decolonialidad, en cambio, refiere al proceso que busca

trascender históricamente la colegialidad. Por esto la decolonialidad supone un

proyecto con un calado más profundo y una labor urgente en nuestro presente;

supone subvertir el patrón de poder colonial, aun luego de que el colonialismo ha

sido quebrado.” (RESTREPO; ROJAS, 2010, p. 16).

16 “Diferencia epistémica como projeto universal y no más la búsqueda de los

universales abstractos.”(MIGNOLO, 2001, p. 18)

17 “...estamos ante el resurgimiento de la conciencia histórica, étnica y cultural de

los pueblos nativos del continente. Este nuevo fenómeno ha puesto en evidencia

que textos como el Popol Wuj no son una reliquia del pasado, y en cambio sí son

algo que pertenece al presente.” (LÓPEZ, 2009, p. 126).

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1704). Por fim, os estudos de López (2009) viabilizam incursões

aproximativas à epistemologia K’iche’, evocadas principalmente nas

traduções de Chávez (1979) e de Sam Colop (2011). Propomos, pois,

“aproximações interdisciplinares e comparatistas [...], examinando os

diálogos [que se estabelecem, sobretudo] entre literatura e antropologia e

vinculando textualmente os dois pólos temporais18 de nosso fazer

literário: o momento inicial e o atual” (LÓPEZ-BARALT, 2005, p. 19,

tradução nossa19).

De modo a expor algumas noções pertinentes para nossa

investigação, parafraseamos Alfredo López Austin (2009), arqueólogo

que cunhou um critério para fundamentar sua metodologia de pesquisa

sob a perspectiva de uma matriz holística que chamou de “cosmo visão”,

destinada a analisar expressões mesoamericanas, entre as quais o Popol

Wuj, códices, pinturas murais, monumentos, cerâmicas pintadas, danças,

relatos orais, etc. Tal matriz envolve mitos, ritos e ícones de toda a região

da Mesoamérica e tenta dar conta destes objetos de estudo, evitando

analisá-los como expressões isoladas, através do reconhecimento de que

fazem parte de um sistema maior que os circunscreve. Na opinião de

Chinchilla (2011), através dos séculos, os contatos entre as diversas

regiões da Mesoamérica foram intensos e a investigação arqueológica tem

revelado indicações de interação e influência inter-regionais envolvendo

vários lugares e épocas relacionadas aos domínios mesoamericanos. A

interação constante dos povos que habitavam e habitam estas regiões abre

um leque para explicar crenças compartilhadas desde épocas muito

remotas. A etnografia contemporânea revela numerosas narrações

mitológicas, transmitidas até o presente em forma oral tanto na área maia

quanto fora dela. As cerâmicas pintadas estão amplamente distribuídas

nos sítios arqueológicos maias e, por tal razão, aproveitaremos algumas

associações entre estas e o Popol Wuj. “Se temos em mente a origem

comum de todos estes registros expressivos, poderemos avaliar o peso da

traduzibilidade e como se complementam entre si. [...] Se apreciarão as

técnicas destinadas a descobrir e avaliar as equivalências semióticas entre

18 Literatura americana pré-hispânica e hispânica.

19 “Intenta un acercamiento interdisciplinario y comparatista a nuestras letras,

examinando el diálogo entre literatura y antropología y vinculando textualmente

los dos polos temporales de nuestro que hacer literario: el momento inicial y el

actual.” (LÓPEZ-BARALT, 2005, p. 19).

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os distintos âmbitos” (LÓPEZ-AUSTIN, 1996, p. 10, tradução nossa20).

O primeiro passo é compreender que as diversas formas de expressão

devem sua afinidade semiótica a sua origem compartilhada e às suas

interconexões. Por este motivo, a teoria de López-Austin (1996) mostra-

se pertinente para analisar as traduções do texto do Popol Wuj.

Frequentemente, na narração mítica, por exemplo, é possível que não seja

mencionada a vestimenta ou acessórios simbólicos dos personagens,

todavia, nas lâminas de um códice, a observação da indumentária pode

proporcionar informações valiosas. Ainda numa mesma via expressiva, a

variação pode ser grande devido a particularidades das circunstâncias

históricas da criação, como no caso das traduções estudadas nesta tese.

“Um mito [...] nunca é contado duas vezes de igual forma. A pluralidade

de versões faz de cada uma delas fontes de complementaridade no estudo

comparativo” (LÓPEZ-AUSTIN, 1996, p. 14, tradução nossa21). Sendo

assim: “Culturas diferentes implicam objetos simbólicos diferentes que

possibilitam a (para) tradução [...] como as cores, as imagens e os

símbolos em tradução, não são de modo algumas universais, também se

traduzem e, sobretudo, se paratraduzem”. (YUSTE FRIAS, 2014, p.20).

Concluindo, o objetivo principal proposto nesta investigação é

analisar criticamente o corpus constituído pelos paratextos e exertos do

Gêneses de três traduções do Popol Wuj e valorizar a tradução como

principal veículo, responsável pelo transporte de boa parte do texto de

base até o presente. Buscamos também, contribuir como fonte de pesquisa

para professores de Espanhol Língua Estrangeira (ELE) por formar parte

da identidade dos povos da América Latina e para investigadores dos

Estudos da Tradução e dos Estudos Culturais. Compreender a importância

da transliteração em caracteres latinos do K´iche´ respondendo a uma

conjuntura social e literária nos tempos da colônia que levou aos escribas

a realizar a adaptação da tradição oral e à escrita pictórica alfabética latina

em língua K’iche’ fonetizada e sua posterior tradução para o espanhol.

20 “Si se si se tiene en mente el origen común de todas estas formas expresivas, se

podrá evaluar el peso de su traducibilidad y su complementariedad. Se

justipreciarán así las técnicas destinadas a descubrir y evaluar las equivalencias

semióticas entre los distintos ámbitos.” (LÓPEZ-AUSTIN, 1996, p. 10).

21 “Un mito – lo sabemos – nunca es contado dos veces de igual manera. La

pluralidad de versiones hace de cada una de ellas una fuente de

complementariedad en el estudio comparativo.” (LÓPEZ-AUSTIN, 1996, p. 14).

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1 POPOL WUJ

1.1 COMENTÁRIO SOBRE O ENREDO

Antes de comentarmos as teorias tradutológicas adotadas para a

presente investigação, selecionadas em função de características

específicas do Popol Wuj, que sobrevoa o mito e pousa na história como

um ketzal22, apresentaremos alguns comentários sobre o contexto geral

dos acontecimentos míticos relatados no Popol Wuj.

Como já mencionado anteriormente, o Popol Wuj configura-se

como um texto cosmogônico-histórico da cultura maia K’iche’. Em

relação a sua origem, a obra é referenciada como sendo proveniente de

Chichen Itza, onde teria sido entregue, em forma de códice ritual, para

representantes do povo K’iche’ pela entidade chamada Nakxit, um deus

associado à Quetzalcóalt23. Podemos dizer que o relato desse “livro

antigo” (COLOP, 2011, p. XX) trata da criação do mundo a partir das

águas. O ponto de partida do narrador surge do pensamento dialógico de

seus deuses multifacetados, do desejo de que suas criaturas os invoquem.

O relato inicia com a criação do mundo pelo ente difásico

Formador-Construtor, que contém, segundo a tradução de Brotherston e

Medeiros (2011), as seguintes identidades: Portador-Gerador, Caçador-

Gambá, Caçador-Coiote, Grande Porco, Tamanduá, Majestade, Serpente-

Quetzal, Coração do Lago, Coração do Mar, Mulher com Netos, Homem

com Netos, Amparador. O texto apresenta inicialmente ao leitor o desafio

de penetrar em uma lógica cultural estrangeira, passível de gerar certa

opacidade em razão da elasticidade semântica de seus conceitos. A vasta

enumeração de substantivos e adjetivos forma um tecido quase

‘orgânico’, cujo significado pede uma observação microscópica, pelo fato

de os significantes mostrarem-se em abundante desenvolvimento de

sentidos.

As primeiras criaturas da Terra teriam sido os animais que, por

não saberem pronunciar o nome de seus criadores, foram condenados a

converter-se em alimento para os outros seres. Depois, foi criado o

homem de barro, que era inconsistente e desmoronava com a água.

22 Ave sagrada.

23 Serpente emplumada.

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Posteriormente, foram criados homens de madeira, que conversavam e

reproduziam-se, mas careciam de espírito e pensamento, eram maus com

animais e brutos com suas coisas. Por tais razões, e também por não

saberem louvar seus criadores, foram aniquilados por seus próprios

mascotes e utensílios de cozinha. Nessa etapa mítica existiu um ser

insólito chamado Wuqub Kak´ix, que tinha forma de ave e considerava-

se o sol e a lua dos homens de madeira, mas foi eliminado pelos gêmeos

heróicos Junajpu y Xbalamkeque, personagens centrais da cosmogonia.

A Figura 1 apresenta uma cena com Wuqub Kak´ix.

Figura 1 - Murais de San Bartolo

Guatemala, aprox.100 a.C. Pinturas Tracuilolli.24

Fonte: Clairin (2013)

De acordo com a descrição de Nowotny (1992), do lado esquerdo

do fragmento é possível observar um Ahau-Baka, rei-guardião do céu, em

frente à árvore de jícaras25. Acima, destaca-se a ave mitológica Vucub

Kak´ix, que traz uma víbora em seu bico. À direita, identifica-se outra

imagem de Vucub Kak´ix. Na sequência, um trio de aves, cuja

continuidade sugere movimento: primeiro estão pousadas no solo, depois

alçam vôo para a árvore de jícaras.

24 Fragmento de los Murales de San Bartolo Guatemala, pintados por el año 100 a.

C por dos maestros y cuatro ayudantes quienes los impermeabilizaron con Holol,

la resina de un árbol de la Selva Maya que sellaba cristalizando los frescos de tal

suerte que se vitrificaron con los siglos. Los dignatarios mayas los gozaron

durante 50 años y luego los sepultaron al agrandar un templo piramidal adyacente

hasta que en marzo de 2001 fueron descubiertos por el arqueólogo William

Saturno. Narran el Mito de la Creación.

25 Crescentia alata.

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O dançarino sob a ave em vôo a invoca, e emite

um canto ou palavras sagradas com o fio negro

que emerge de sua boca, acompanha-o um texto

hieroglífico ainda não decifrado, e debaixo da

cauda da ave que acreditava ser o sol, aparece o

glifo "Ik" que se traduz como vento ou hálito

sagrado. Justamente, a partir desse glifo e da

dança do indivíduo com bico de pato (similar a

imagens mexicanas - astecas - relacionadas com

Quetzalcóatl), as aves cantam, como indica o fio

negro que emerge de seus bicos, em imagens

anteriores do mesmo mural, outras aves aparecem

na composição e voam em silêncio, então a dança

xamânica, a evocação e o glifo "Ik" deram início

ao som. (NOWOTNY, 1992, p. 10, tradução

nossa26)

Segundo Colop (2011), a partir desse episodio do Popol Wuj

explica-se a procedência dos heróis míticos. O tempo narrativo retrocede,

evocam-se os feitos que levaram à morte dos seus pais no inframundo

maia, chamado Xibalba. Relata-se a fecundação de Ixkik, mãe dos

gêmeos, a partir da saliva de uma cabeça que pendia da árvore de jícaras.

Uma passagem chave é a protagonizada por Jun Bat´z e Jun

Chowen27, irmãos maiores dos gêmeos heróis. Eles eram artesãos e

tocavam instrumentos, mas eram muito brutos e egoístas com os dois

garotos. Além de serem mesquinhos com os alimentos, abandonaram os

gêmeos sobre um formigueiro quando ainda eram bebês, sob a alegação

de que choravam muito. Devido a seus poderes sobrenaturais, os gêmeos

heróis sobreviveram aos maus tratos e, uma vez crescidos, vingaram-se

de seus irmãos, levando-os ao bosque com o pretexto de caçar pássaros,

e os transformaram em macacos. Trata-se de uma cena de grande

26 “El danzante debajo del ave en vuelo la invoca, y emite un canto o palabras

sagradas con el hilo negro que emerge de su boca, lo acompaña un texto jeroglífico

aún no descifrado y debajo a la cola del Ave que se creía el Sol, aparece el glifo

"Ik" que se traduce como viento o hálito sagrado. Justamente, a partir de ese glifo

y la danza del individuo con pico de pato (similar a imágenes mexicah – aztecas -

relacionadas con Quetzalcóatl), las aves cantan como lo indica el hilo negro que

emerge de sus picos, en anteriores imágenes del mismo mural, otras aves aparecen

en la composición y vuelan en silencio, entonces la danza chamánica, la evocación

y el glifo "Ik" dieron inicio al sonido” (NOWOTNY, 1992, p. 10).

27 Dioses de las artes y de las palabras.

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plasticidade, com imagens cômicas e dramáticas ao mesmo tempo. Outro

episódio crucial trata sobre a viagem dos heróis ao inframundo onde

conseguem vencer os senhores de Xibalba, como compensação à morte

de seus pais. Eis, abaixo, o excerto:

ara tudo isso sua avó Ixcumane queima copal em

frente ao milho que eles deixaram plantado e logo

eles ascendem ao céu, onde um torna-se o Sol e o

outro a Lua. Daí em diante inicia-se o que se

conhece como parte ‘histórica’; mas novamente,

há uma transição porque a parte mitológica

continua e vai diluindo-se entre a criação humana

e seus posteriores sucessos. Assim, quatro

animais descobrem o milho que será a essência da

humanidade, são quatro os primeiros homens

criados cuja visão cobria a face da Terra e por isso

tiveram que lhes encobrir a vista para que só

vissem o que estava perto. Foram também quatro

as mulheres criadas e delas se originaram povos e

casas reais. (COLOP, 2011, p. XXI, tradução

nossa28)

1.2 CRITÉRIOS PARA ANÁLISE DAS TRADUÇÕES. PARATRADUÇÃO

A complexidade simbólica da obra exige, para a análise das

traduções, teorias que considerem o icônico, já que a cultura maia se

fundamenta numa complexa epistemologia holística de caráter mítico-

ritual.

O estudo detalhado das entidades iconotextuais, a

análise minuciosa das produções verbais, icônicas

e verbo-icônicas que acompanham, cercam,

envolvem, introduzem e apresentam o texto de um

28 “A todo esto su abuela Ixcumane quema copal frente a las plantas de maiz que

ellos dejaron sembradas y luego ascienden al Cielo donde uno se vuelve Sol y el

outro Luna. De ahí en adelante empieza lo que se conoce como parte “histórica”;

pero de nuevo, hay una transición porque la parte mitológica continúa y se va

diluyendo entre la creación humana y los sucesos posteriores. Así cuatro animales

descubren el maíz que será esencia de la humanidad, son cuatro los primeros

varones creados cuya visión cubría la faz de la Tierra y por eso se les tuvo que

nublar la vista para que solo vieran lo que estaba cercano. Fueron también cuatro

las mujeres creadas y de ellas se originaron pueblos y casas reales.” (COLOP,

2011, p. XXI).

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37

trabalho de tradução impuseram a criação de uma

nova noção nos Estudos da Tradução: a

‘paratradução’. Houve a necessidade de uma nova

terminologia tradutológica para chamar a atenção

sobre a tradução do que, até então, havia ficado

em segundo plano na tradutologia: os paratextos.

(YUSTE FRIAS, 2014, p. 25)

Berman (2007) considera que a tradutologia baseia-se na reflexão

com fundamento ético, atividade em que o conhecimento do tradutor

sobre o objeto traduzido é fundamental, pois deverá considerar a leitura

das culturas da língua de partida e da língua de chegada, tentando respeitar

as diferenças. A teoria de Berman (2007), com seu abrigar o longínquo, o

distante, oferece-nos essa postura humanística, que transcende a

dicotomia teoria-prática para trabalhar com experiência e reflexão. A

experiência constitui-se dos conhecimentos que o tradutor possui para

entender e interpretar o texto a ser traduzido, e a reflexão refletiria a busca

da tradução, considerando as especificidades de construção daquilo que

Berman (2007) denomina lettre na língua de chegada, ou seja, o respeito

à forma e ao sentido que o autor imprimiu na língua de partida. Como

conseqüência essa teoria aceita que o leitor sinta esse sabor do que é

distante na lettre traduzida.

Parafraseando os critérios de Berman (2007), todas as traduções

respondem a um projeto que, de alguma forma, define a maneira como o

tradutor cumprirá seu trabalho. A tarefa inventiva está implícita e a

adoção de um método pode ser importante, mas deveria evitar

condicioná-lo, uma vez que “traduzir não é um automatismo dependente

de um método fixo, portanto, a noção de projeto não diz respeito a uma

listagem de etapas a seguir” (PARET PASSOS, 2011, p. 18). O projeto

de Ximénez está verbalizado nos prefácios, nos quais deixa claro que seu

objetivo é conhecer a tradição maia para poder catequizar, ao mesmo

tempo em que objetiva preservar o icônico do relato K’iche’, “...a

principal função dos paratextos na tradução seria permitir a existência do

texto traduzido ao qual acompanham , cercam, envolvem, introduzem e

apresentam no mundo editorial.[...] não pode haver texto traduzido sem

seus correspondentes paratextos paratraduzidos.” (YUSTE FRIAS, 2014,

p. 25).

De acordo com Rajagopalan (2000) a prática da tradução muitas

vezes tem estado a serviço da manutenção do poder nos contextos

colonizados, já que tanto a prática da tradução como a condição colonial

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38

se fundamentam nas relações assimétricas que o colonialismo opera. “O

ideal da identidade nacional moderna abarca um grande período da

história européia, cujos marcos mais identificados são as datas

emblemáticas de 1492 e 1942. A primeira data vincula-se com o início da

construção de uma nação homogênea na Espanha e a segunda marca o

início do holocausto. ” (STALLAERT, 2006 p. 174, tradução nossa29).

Ocupamo-nos, em primeira instância, do manuscrito de

Francisco Ximénez (1701-1704). A igreja católica reunia, em seu âmago,

investigadores, intelectuais, pessoas que se dedicavam integralmente aos

estudos, e Francisco Ximénez foi um deles. Sua capacidade investigativa,

aliada a uma sensibilidade apurada permitiram-lhe realizar uma tradução

com certo rigor científico, protegendo-se dos parâmetros repressivos da

inquisição, com as devidas especificações de seus objetivos

catequizadores nos prefácios e explicações de corte castiço nos posfácios

(escólios, analisados no item 4.1.5 desta tese).

Por ser respeitado no ofício, sua tradução do Popol Wuj k'iche’-

espanhol constituiu-se, ao longo do tempo, como modelo para todas as

traduções seguintes. Francisco Ximénez estudou as línguas nativas, tendo

escrito as seguintes obras, todas no início do século XVIII: “Arte das tres

lenguas cakchiquel, quiché y tzutuhi”, que contém, sobretudo, estudos

gramaticais e de vocabulário; “Confessionário” (das mesmas línguas);

“Catecismo para os índios”; “Tratado dos tijolos”; “Relação histórica de

todos os sucessos no tempo que esteve em Guatemala o Visitador, Senhor

Licenciado Francisco Gómez de la Madrid”; “Historia do Beatereo

(Mosteiro) de Santa Rosa: Apologética em que se demonstra que os

domínicos foram os primeiros religiosos de Guatemala”;“Historia Natural

do Reino de Guatemala e Historia da Província de San Vicente de Chiapas

y Guatemala” (1722), que contém a descrição, classificação e anotações

sobre as propriedades medicinais de muitas espécies da flora da

Guatemala.

Consideraremos o alicerce ideológico que influenciou o Vice-

Reinado chamado Nueva España, centro administrativo e religioso deste

período, na região do atual México, e as terras altas da Guatemala, onde

29 “El ideal de la identidad nacional moderna abarca un gran período de la historia

europea, cuyos marcos más identificados son las fechas emblemáticas de 1492 y

1942. La primera fecha se vincula con el inicio de la construcción de una nación

homogénea en España y la segunda marca el inicio del holocausto”

(STALLAERT, 2006, p. 174).

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39

o Popol Wuj foi descoberto por Ximénez. Octavio Paz comenta que “uma

sociedade se define, não somente, pela sua atitude perante o futuro, mas

(principalmente) perante o passado: suas lembranças não são menos

reveladoras do que seus projetos” (PAZ, 2008 p. 23, tradução nossa30).

Segundo o autor, entre o México pré-hispânico e o México moderno há

uma continuidade e uma identidade. O Novo México configura-se tão

somente como um parêntese no período de cativeiro que viveu a nação

mexicana. As raízes do México atual remetem ao mundo pré-hispânico,

os três séculos da Nova Espanha correspondem ao período de gestação, e

a Independência à sua fase adulta. Mencionamos o México pelo simples

motivo de se tratar de uma região na qual a cultura se desenvolveu

concomitantemente, envolvendo a civilização dos K‘iches’ que se

situavam no território da atual Guatemala, e para as quais a invasão

representou uma cisão. A este respeito, o autor comenta: “O corte da

conquista é tão profundo que quase todos sentimos a tentação de ver o

mundo pré-colombiano como um todo compacto e sem fissuras, (mas)

nesse mundo também existiram divisões e descontinuidades.” (PAZ,

2008 p. 24, tradução nossa31). Stallaert (2006) analisa o conceito e o

significado do “casticismo” como alicerce da idiossincrasia espanhola

que acompanhou a conquista de América, uma ideologia que considerava

as famílias cristãs e patrícias da Espanha como “superiores” e foi aplicado

no processo de eugenia que justificou a expulsão dos islâmicos e judeus

da Espanha em 1492.Retomaremos este tema no capítulo 4, que trata dos

paratextos do manuscrito de Francisco Ximénez (1701-1704).

Incluímos uma reflexão de Rajagopalan (2000), que estuda o

perfil da tradutologia colonizadora e a tradutologia pós-moderna. Para o

referido autor, “[o]s colonizados, começam a existir discursivamente só a

partir do instante que são traduzidos, ou devidamente ‘acionados’ pelos

colonizadores, aqueles que retêm o controle exclusivo sobre a língua

hegemônica imperial. A tradução é com freqüência o processo pelo qual

se criam os originais” (RAJAGOPALAN, 2000, p. 23). Tal comentário,

30 “Una sociedad se define no sólo por su actitud ante el futuro sino frente al pasado:

sus recuerdos no son menos reveladores que sus proyectos.” (PAZ, 2008, p. 23).

31 “El tajo de la conquista es de tal modo neto y profundo que casi todos sentimos la

tentación de ver el mundo pre-colombino como un todo compacto y sin fisuras.,

en ese mundo también hubo divisiones e discontinuidades.” (PAZ, 2008, p. 24)

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embora escrito no contexto das questões indianas, demonstra que o

colonialismo exercido pelos europeus possui características

universalizadas. A tradução de Ximénez (1701-1704), como a autora

deduz, converteu-se de uma forma arbitrária no “original” para todos os

tradutores posteriores. No escopo da presente investigação, escolheu-se

empregar a expressão “texto fonte”, já que o termo original poderia

prestar-se a interpretações ambíguas.

A segunda obra de nosso corpus investigativo é o ‘Pop Wuj’, de

Don Adrian Chávez (1979), que, além do mérito de ter feito uma tradução

minuciosa em quatro colunas, com especificações e novos símbolos

fonéticos, como veremos adiante (item 4.2), também tem representado,

em sua tradução, uma intenção descolonial, fundamentada em sua origem

K’iche’, no domínio do idioma, da fonética, das tradições maias, em

oposição com as produções acadêmicas provenientes de traduções do

francês. “O papel essencial desempenhado pelos elementos paratextuais

na tradução, [...], [é a] participação, juntamente com o texto, na

construção do sentido do texto finalmente editado e publicado” (YUSTE

FRIAS, 2014, p. 25).Podemos constatar a importância do paratexto na

seguinte citação do prefácio da obra de Chávez (2007).

Com a aparição deste trabalho, marca-se o fim de

uma era em que foram os estrangeiros quem

falaram e escreveram pelos K’iches’. A partir de

agora, o povo dos Magueyes, pela mão de um de

seus filhos mais esclarecidos, retorna à pena que,

lá pelo ano de 1550 foi deixada em repouso pelo

autor anônimo do manuscrito original, antes de

afundar, ele e sua obra, em uma grande penumbra

de séculos. (BÖCKLER, prólogo CHAVEZ,

2007, p. 13, tradução nossa32)

Böckler (em CHAVEZ,2007, p. 24) refere-se a já mencionada

transliteração feita por um copista escriba maia em 1550, que se perdeu,

32 “Con la aparición de este trabajo se marca el fin de una era en la que fueron los

extranjeros quienes hablaron y escribieron por los k’iches. A partir de ahora, el

pueblo de los Magueyes, por la mano de uno de sus hijos más esclarecidos, retoma

la pluma que, allá por el año de 1550 dejara en reposo el anónimo autor del

manuscrito original, antes de que se hundiera, él y su obra, en una larga penumbra

de siglos.” (BÖCKLER, prólogo en Chavez 2007, p. 13).

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e da qual o padre Ximénez realizou sua cópia em K’iche’ fonetizado.

Reconhecemos em Chávez (2007) a voz da resistência verbalizada no

prólogo do ‘Pop Wuj’, em forma de reivindicação sua autoridade

autóctone, fundamentada na sua descendência K‘iche’ e no domínio da

língua e no conhecimento das tradições. O autor propôs colocar em

cheque as representações feitas pelos tradutores que o precederam.

Seguindo as ponderações de Rajagopalan (2000), é preciso

lembrar que a atividade tradutória tem a característica de ser um gesto de

re-escrever, de re-criar, de re-inventar o texto fonte. “Não é por serem ou

por acharem ser herdeiros legítimos dos textos apropriados pelos

colonizadores que os colonizados podem se contentar com a ilusão [...]

de que as (suas) traduções serão mais fieis às originais. ”

(RAJAGOPALAN, 2000, p. 3). O projeto de Chávez (1979), que incluía

uma revisão minuciosa da obra de Ximénez focada na tradução do

K‘iche’, criou símbolos fonéticos para substituir sons que considerou

omitidos na tradução de Ximénez. “Aqui não há uma simples ruptura com

o passado, mas uma re-escritura radical do mesmo” (RAJAGOPALAN,

2000). Embora na nota preliminar do Pop Vuh Adolfo Colombres faça

menção do documento como “digna reescrita de um K’iche’ reconstituído

em toda sua pureza“ (CHAVEZ, 1979, p. 13).

A terceira tradução desta pesquisa é de Sam Colop (2011),

resultado do trabalho de um investigador de origem K‘iche’ com um

extenso curriculum acadêmico. Formado em Direito, Mestre em

Linguística pela Universidade Iowa City, Doutor pela Universidade de

Nova York em Búfalo, onde escreveu a dissertação Maya Poetics,

recebeu bolsa do Instituto Interamericano de Direitos Humanos da Costa

Rica, da Fundação Guggenheim de Nova York, da Plumsock

Mesoamerican Foundation, e da American Philosophical Society de

Filadélfia. Obteve duas vezes a beca Fulbright, e a Newberry Library de

Chicago lhe concedeu uma bolsa para edição. O objetivo de sua obra

aparece no prólogo, cujo primeiro passo é a transcrição do K’iche’ “para

que os falantes tivessem à sua leitura nesse idioma. Daí derivou sua

inquietação para traduzi-lo para o idioma espanhol [...] as traduções em

geral têm ignorado a linguagem poética” (COLOP, 2011, p. XIII,

tradução nossa33). No capítulo três, no qual trataremos os paratextos,

33 “...para que los hablantes tuvieran acceso a leerlo en ese idioma. De ahí derivó la

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retomaremos o projeto descrito pelo autor. Sua obra, fruto de uma

pesquisa fundamentada na tradição oral K‘iche’ e em investigação

cientifica, constitui-se a partir da pesquisa decolonialista, já que a cultura

maia subsiste até os dias atuais.

Os estudos elaborados pelo Grupo de Investigação de Tradução

& Paratradução (T&P) da Universidade de Vigo resultam em um

arcabouço teórico muito adequado para a análise do Popol Wuj, pois se

trata de um texto construído sobre a transliteração dos paratextos

pictóricos e logo silábicos maias e da tradição oral. A teoria (T&P), que

segue e amplia a linha investigativa de Genette (2009), ultrapassa “o

campo do estudo literário para analisar e estudar as implicações estéticas,

políticas, ideológicas, culturais e sociais de qualquer tipo de paratexto de

tradução. ” (YUSTE FRIAS, 2014).

Nosso objeto de estudo são todas essas produções

paratextuais que não são, a princípio,

consideradas como objeto de estudo da tradução,

tendo em vista que não são textos propriamente

ditos, mas sim, paratextos. [...]. O estudo

detalhado de entidades iconotextuais, a análise

minuciosa das produções verbais, icônicas e

verbo-icônico que acompanham, cercam,

envolvem, introduzem e apresentam o texto de um

trabalho de Tradução: a paratradução. (YUSTE

FRIAS, 2014, p. 25).

Dedicamos especial atenção à paratradução que “nasceu com o

propósito de abordar e analisar o impacto de manipulações de cunho

estético, político, ideológico, cultural e social adotada em todas as

produções paratextuais” (YUSTE FRIAS, 2014, p. 25).

1.3 PERSPECTIVA DA PARATRADUÇÃO

Encontramos, na teoria da Paratradução, um suporte consistente

para a análise crítica das traduções do Popol Wuj, cujo conteúdo se

encontra enraizado numa ampla tradição religiosa e no modus vivendi de

toda Mesoamérica desde tempos ancestrais. Em primeiro lugar, a

inquietud de traducirloal idioma español [... las] traducciones en general han

pasado por alto el lenguaje poético” (COLOP, 2011, p. XIII).

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Paratradução nos ajuda a entender a intencionalidade do primeiro copista

desta obra, quais os aspectos que o influenciaram no século XVI, por qual

motivo toma a decisão de escrever esta verdadeira tradução

intersemiótica? Já que o autor escreve, em caracteres latinos, a fonética

da língua K’iche’ que se encontrava registrada em pinturas e escrita

logossilábica, mas também circulava na tradição oral, a intenção de

preservar esta “antiga palavra” (Ximénez, 1700-1704, fólio 1r.) e a

resistência ideológica e identitária em tempos da invasão espanhola, foi,

ao nosso ver, quase um rito fundacional da memória afetiva.

O paratexto deste primeiro documento, hoje perdido, foi a

própria circunstância emergencial da necessidade de sobrevivência

cultural, caracterizada pelo zelo com que foi escondido do invasor.

“Quando os textos literários, [...] não são lidos pelas instâncias centrais a

não ser traduzidos, ou seja, quando os próprios intermediários literários

não conseguem apreciá-los em sua versão original, estamos então diante

de uma verdadeira ‘língua’ (já sempre) traduzida.” (CASANOVA, 2002,

p. 315). O padre Ximénez soube ganhar a confiança dos K’íches’ e teve

acesso ao documento que copiou e traduziu para a língua espanhola entre

1700 e 1704.

“Os habitantes da antiga Mesoamérica reconheciam uma

diversidade de cultos particulares em cada região e inclusive em cada

cidade, povoado e grupo social, mas as interpretavam como

peculiaridades dentro da mesma ordem cósmica comum a todos eles”

(CHINCHILLA, 2011, p. 18, tradução nossa34). A religião

Mesoamericana era uma totalidade organizada e não um agregado de

crenças de vários lugares que integram, segundo López-Austin (2009),

uma mesma corrente histórica. Chinchilla (2011) comenta que, em

comparação com outros textos indígenas do século XVI, os elementos que

podem ter origem européia no Popol Wuj são escassos e duvidosos. No

seu livro Imagens da Cultura Maia, compara fontes de diversos grupos

étnicos contemporâneos e conclui que os mitos recopilados no Popol Wuj

formavam parte da tradição religiosa mesoamericana desde tempos muito

34 Los habitantes de la antigua Mesoamérica reconocían la diversidad de cultos

particulares de cada región e incluso de cada ciudad, pueblo y grupo social, pero

las entendían como peculiaridades dentro del mismo orden cósmico común a

todos ellos. (CHINCHILLA, 2011, p. 18)

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antigos e que a mitologia forma parte de um elenco de tradições, uma

espécie de versão particular de crenças entre as narrações difundidas na

região mencionada.

O que justifica a explanação referente nesta tese sobre a religião,

epistemologia, tradição oral, escrita e os vários aspectos culturais sobre

os K‘iches’ é justamente a falta do texto e do paratexto fonte que nos

especifique os objetivos da transliteração do século XVI. A investigação

realizada neste sentido nos ajuda a construir a Paratradução do Popol Wuj.

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2 ORIGENS DO TEXTO DO POPOL WUJ - OS CÓDICES

Os habitantes da antiga Mesoamérica reconheciam a diversidade

de cultos particulares de cada região e, inclusive, de cada cidade, vila e

grupo social, “mas as entendiam como particularidades dentro da mesma

ordem cósmica, comum a todos eles. A evangelização não significou o

esquecimento das narrações mitológicas, que continuaram a ser

transmitidas de forma oral.”(CHINCHILLA, 2011, p. 15, tradução

nossa35).

Para sermos coerentes com a característica de cosmogonia-

histórica do Popol Wuj (CRAVERI, 2012, p. 17), torna-se necessário

mencionar suas supostas origens. Tais origens, referenciadas na própria

obra, pertenceriam a um tempo mítico no qual os ‘senhores’ haviam

perdido sua grandeza e, por este motivo, teriam empreendido uma viagem

em direção ao oriente em busca de um ente de linhagem divina chamado

Nacxit Topiltzin Quetzalcoalt, com o qual todos os senhores queriam

vincular-se para receber uma “investidura de poder”, chamado também

de “Instrumento de claridade vindo da beira do mar” (SAM COLOP, 2011

p. XVII, tradução nossa36).

O Popol Wuj teria sido trazido da Península do Iucatã em uma

peregrinação feita a Chichen Itza, onde um grupo seleto de k’iches’

recebeu de Nakxit a ‘escritura de Tulán’ que, “seguramente não era o

texto completo do Popol Wuj, porque a parte histórica ainda estava

acontecendo” (SAM COLOP, 2011 p. XVII, tradução nossa37). Segundo

Edmonson (1971, p. 218), “o Popol Vuh fala dessa ‘escritura de Tulán’”.

Constatamos essa informação na tradução da obra de Brotherston e

Medeiros (2011, p.288-289), demonstrada no Quadro 1 abaixo:

35 “pero las entendían como particularidades dentro do mismo orden cósmico,

común a todos ellos. La evangelización no significó el olvido de las narraciones

mitológicas, que se siguieron transmitiendo en forma oral” (CHINCHILLA, 2011,

p. 15).

36 “Instrumento de claridad venido de la orilla del mar.” (COLOP, 2011, p. XVII).

37 “seguramente no era el texto completo del Popol Wuj, porque la parte histórica

todavía estaba ocurriendo” (COLOP, 2011, p. XVII).

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Quadro 1 - Menção da Escritura de Tulán

E este é o nome da montanha

Para onde eles foram -

Balam Kitze,

Balam Aqab,

Mahuqutah

E iq Balam,

Juntos com os Tamub

E os Ilokab:

Tula,

Zuyua,

Vuqub Peq (Sete Cavernas),

VuqubZivan (Sete gargantas) era o nome da cidade,

Então vieram

Os portadores dos deuses.

LI

E todos chegaram a Tula.

Milhares de pessoas chegaram,

Pois muitas caminharam juntas,

E a vinda de seus deuses aconteceu em ordem.

Fonte: Brotherston e Medeiros(2011, p. 288-289)

Os escritos do Popol Wuj apresentam coerência e coesão, embora

os vários textos possam ter sido escritos e transcritos em diversos

momentos até formar o ‘compêndio’ que conhecemos. Por conter

tradições dos ancestrais e ser um texto religioso, era aceito pela sociedade

colonial sem críticas às possíveis lacunas (LÓPEZ, 1999, p. 41).

Brotherston e Medeiros (2011), no prefácio e introdução da

tradução para o português do Popol Vuh 38, fazem uma explanação sobre

as pesquisas realizadas na vertente das traduções para a língua inglesa da

qual provêm. A tradução de Edmonson, de 1971, do K’iche’, “leva em

conta a estruturação em versos do original; e compara meticulosamente

as soluções que tradutores anteriores deram a passagens opacas e

difíceis.” (BROTHERSTON; MEDEIROS, 2011, p. 9). Estes

pesquisadores polemizam a origem exclusivamente hieroglífica maia do

Popol Wuj, incluindo uma conexão com o tlacuilolli ou “escrita icônica:

termo de conveniência para o que é freqüentemente referido como

Mixteco-Asteca ou sistema de escrita pictórica da Mesoamérica,

38 Ortografia adotada pelos autores.

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especialmente distinto da escrita hieroglífica maia” (BROTHERSTON;

MEDEIROS, 2011, p. 14). Este idioma era compartilhado por várias

culturas como a Tolteca, Mixteca e Asteca, e possui conceitos que

correspondem à letra, à imagem e ao número. De acordo com Chinchilla

(2011, p. 13) o Popol Wuj representa uma fonte primordial para entender

a mitologia maia. Estes autores valorizam os testemunhos etnográficos

contemporâneos de diversas regiões, considerando que:

Os habitantes da antiga Mesoamérica

reconheciam a diversidade de cultos particulares

de cada região e inclusive de cada cidade, vila e

grupo social, mas as entendiam como

particularidades dentro da mesma ordem cósmica,

comum a todos eles. (CHINCHILLA, 2011, p. 14,

tradução nossa39)

Coe (1989, p. 159) comenta o momento histórico de

florescimento cultural em que os personagens do Popol Wuj, os gêmeos

heróicos, aparecem representados inicialmente na arte e na religião

mesoamericana, “na fase inicial de Kaminaljuyú40, 400 a.C a 200 d.C, e

de grandes cidades das terras baixas maias, como El Mirador, Tikal e

Lamanai, com seus prodigiosos complexos arquitetônicos e prósperas

populações.” (COE, 1989, p. 161, tradução nossa41). Segundo León-

Portilla (2012), no século XVI os cronistas espanhóis chamaram ‘livros

de pinturas e caracteres’ aos manuscritos que hoje nomeamos códices. Os

códices eram livros com um formato específico, suas folhas organizavam-

se em forma de acordeão. “Vários são os matérias sobre os quais estão

pintados esses códices, muitos deles tem como suporte o papel feito da

casca da árvore conhecida genericamente como amate (que designa as

várias espécies de fícus)” (LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 19).

39 “Los habitantes de la antigua Mesoamérica reconhecian a diversidad de cultos

particulares de cada región e incluso de cada ciudad, pueblo y grupo social, pero

las entendían como particularidades dentro do mismo orden cósmico, común a

todos ellos.” (CHINCHILLA; COE, 2011, p. 14).

40 Kaminaljuyú atingiu o seu apogeu durante o pré-clássico (400 a.C. a 200 d.C).

41 “fase temprana de Kaminaljuyú y el de grandes ciudades de las tierras bajas

mayas, como El Mirador, Tikal y Lamanai, con sus prodigiosos complejos

arquitectónicos y prósperas poblaciones. Es en este contexto que el ciclo mítico

de los Gemelos Heroicos del Popol Vuh aparece por primera vez en el arte y la

religión de Mesoamérica.” (COE, 1989, p. 161).

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Os códices eram livros compostos por páginas cujas imagens

tinham significados esclarecidos por textos logo silábicos,

Os signos estão formados por imagens. Em alguns

casos, são rostos humanos ou distintos traços

somáticos de seres divinos, humanos ou animais,

flores e múltiplos objetos estilizados. Em outros,

há elementos geométricos de desenhos muito

variados. Esses glíficos se estruturam e se

agrupam de duas formas distintas. Uma apresenta

seqüência de representações de realidades (rostos,

flores etc.) estilizadas, que denotam uma palavra

completa. Ditos glifos foram chamados de

logografemas pelos modernos epigrafistas

interessados na decifração desse sistema de

escrita. [...] as imagens, por si mesmas, eram

portadoras de uma gama de significantes que

abarcavam uma linguagem iconográfica

complexa, que incluía o simbolismo de suas

cores. (LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 26).

Hoje se conservam poucos códices no mundo, os mais famosos

são: o Dresden - na cidade de Dresden, na Alemanha42, sendo que existe

uma reprodução impressa alemã do século XIX, muito fiel à original na

Biblioteca Nacional de Rio de Janeiro43, o Persianus (Paris) e o Tro-

cortesianus (Madrid). O códice de Dresden encontra-se na Biblioteca

Estatal dessa cidade, e, por volta de 1853, foi identificado como

pertencente à cultura maia. Apresenta 39 folhas escritas em ambos os

lados, tem 35 cm de comprimento e contém numerais, figuras míticas,

calendários de rituais e adivinhações, cálculos das fases de Vênus,

descrições de lugares sagrados, etc. Ernst Förstermann (1822-1906),

bibliotecário real de Eleitorado da Saxônia, diretor da Biblioteca Estadual

da Saxônia e da Universidade Técnica de Dresden, foi o principal

pesquisador deste documento no século XIX.

42 “En Alemania poseemos el manuscrito maya más valioso (el Códice de Dresde)

y nuestros estudiosos han jugado el papel más activo en su desciframiento”

(MILLER, 1989, p. 128).

43 No catálogo da Biblioteca Nacional de Rio de Janeiro pode ser achado na seção

de manuscritos com a referência I - 15,05,001 Dresden.

Page 50: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

49

Segundo LEÓN-PORTILLA (2012, p. 241), o códice

proporciona informações sobre astronomia, astrologia e religião.

Incluímosparte da descrição do conteúdo da página 41, que anuncia uma

grande inundação, pela leitura de Eric Thomson44 e Yuri Knorosov45

(Figura 2). Mencionamos aqui alguns glifos a modo de ilustração para

entendermos a riqueza semântica que encerra esta página: o terceiro glifo

da esquerda, por exemplo, significa céus chuvosos, o quarto, ek caanal

ou negro nas alturas, o quinto é a deusa Ixchel, e o sexto é chibal, “a

unidade central da vida política maia era o cah [...] terras comunitárias

compartilhadas pelos habitantes. Os habitantes de um cah se

consideravam emparentados e tinham ancestrais em comum numa região

específica ou chibal. De acordo com ochibal ao que pertenciam era o

reconhecimento do seu status social ou de nobreza.” (RESTALL, 1997,

p. 115).

Depreende-se que a idéia básica expressa nessa

inscrição é que, anuncia um tempo em que o céu

está carregado de água por obra de uma deusa -

Ixchel -, com o céu negro, cai a água na terra

negra sobre os campos de milho. A cena

desenvolve-se sobre um fundo de cor café escuro,

achocolatado, que, segundo Thompson, poderia

ser a evocação da ‘resina abundante que veio do

céu’, mencionada no Popol Wuj ao falar da

inundação que acabou com os seres humanos na

terceira idade do mundo. (LEÓN-PORTILLA,

2012, p. 242)

Sobre este fundo aparece um monstro cujo corpo forma uma

faixa celeste. Nessa faixa há quatro glifos que representam, da esquerda

para direita, Venus, o Céu, o Sol e a Noite. “Tais glifos denotam que o

44 “O inglês J. Eric S. Thompson, falecido em 1975, [...] deixou uma marca profunda

com seus trabalhos sobre epigrafia e códices, neste caso, do âmbito maia. [...]

Além de suas atividades como arqueólogo, Thomson se interessou pela decifração

da escrita maia.” (LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 118).

45 “Yuri Valentinovich Knorosov, nascido na Ucrânia em 1922, estudou egiptologia

na Universidade de Moscou, iniciou estudos da escrita maia em 1947, utilizou o

“alfabeto maia” descrito por Diego de Landa em sua Relación de las cosas del

Yucatán e descobriu os ‘logogramas’ por associação com a escrita egípcia.”

(LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 119).

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50

grande monstro, com faixas cinzas e azuis, tem o seu corpo no universo

celeste” (LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 242). Imediatamente embaixo,

temos um eclipse do Sol e um da Lua. Da boca do monstro e dos eclipses

saem grandes torrentes de água de cor azul que caem sobre a Terra, e entre

as duas quedas de água está Xkitza, segundo Thompson (1988, p. 115),

anciã ancestral do sol e da lua. Embaixo, tem uma deidade com o corpo

pintado de preto que segura dois dardos e um bastão e sobre sua cabeça

pousa uma ave. Thompson (1988) o identifica como o ‘deus L’, deus da

escuridão e da noite associado às inundações.

Figura 2 - Aguaceiro torrencial

Fonte: Códice de Dresde (p. 41)

O Códice de Madrid foi enviado para Carlos I de Espanha (1500-

1558) por Hernan Cortés, junto ao ‘Quinto Real’46. Na primeira carta de

46 El 'quinto delrey',o ‘quinto real’era o tributo que se pagava ao rei da Espanha

quando se capturava ou descobria um tesouro, era igual à quinta parte (20%) do

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51

relação, Cortés descreve “dois livros dos que por aqui possuem os

índios”47. De acordo com Martinez (2010), López de Gómara declara nas

suas crônicas ter visto muitos destes ‘livros’, descrevendo-os como

escritos com figuras no lugar de letras, feitos de tecido ou folhas, e

comenta que os espanhóis não os valorizavam por não entendê-los. De

acordo com García Ruiz (2000), o Códice de Madrid está dividido em

duas partes. Assim, temos o códice Troano, que pertenceu a Juan de Tro,

que aparentemente o teria comprado dos descendentes de Hernán Cortés,

e que passou em 1888 à propriedade do Museu Arqueológico de Madrid.

O códice Cortesano pertenceu a Juan Palacios de Madrid e foi comprado

pelo mesmo museu em 1872. Daí ser chamado códice Tro-cortesiano ou

de Madrid. León de Rosny48 foi o primeiro pesquisador a perceber que

formavam um só compêndio, em 1880.

De acordo com Garcia Ruiz (2000, p. 11) o documento possui 56

folhas pintadas na frente e no verso, encadernadas em forma de leque ou

zig-zag que, unidas, alcançam 6,82 m de longitude. Cada folha mede 22,6

cm de altura e 12,2 cm de largura, e constitui-se como o mais extenso

códice maia conhecido. Possui ainda 25 calendários que seguem a

medição temporal ritual de 260 dias associados a atividades seculares de

subsistência e do cotidiano, como a tecelagem, a apicultura, a caça, a

fabricação de cerâmica, etc., associadas a determinadas deidades e rituais.

Os escribas dos códices maias utilizavam formas codificadas com

determinados caracteres que permitiam identificar as deidades através de

simbolismos nas vestimentas, fisionomia e gestos expressivos. A

narração tradicional do Popol Wuj presta atenção, por exemplo, às

variações anímicas: no códice de Madrid, página 34b, vemos o “Senhor

da Morte” (na parte inferior da folha do Códice) (Figura 3), do lado

esquerdo do leitor - segundo Brotherstone Medeiros (2011) ‘Um morte’,

HumKame -, representado de perfil, segurando uma cabeça degolada com

capturado ou descoberto. Faz referência a um imposto de 20% estabelecido

em1504pela Corona de Castela sobre a extração de metais preciosos e outros

artigos dentro dos territórios do que foi aAmérica espátula.”.

http://diccionario.babylon.com/quinto_del_rey_%28o_ quinto_ real%29/ Acesso em 05/02/2015.

47 “Dos libros de los que acátienenlosindios.” (MARTINEZ, 2010, p. 209)

47 Autor de ‘Les documents écrits de l'antiquité américaine” de 1882. Estudioso que

analisou os documentos do Códice Peresianus.

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52

os dedos das mãos, “A cabeça de Hun Hun Ah Pu foi cortada. Só o seu

corpo foi enterrado com seu irmão mais jovem.” (BROTHERSTON;

MEDEIROS, 2011, p. 143).

Figura 3 - Página 34b do Códice Tro-Cortesiano

ou de Madrid (maia pré-hispânico)

Fonte: Museu de América de Madrid.

O Códice Peresianus encontra-se no Fonds Mexicain de la

Bibliothèque Nationale de France, sem exibição ao público.

Segundo Durand-Forest e Swantonlien (1998, p.20) o documento

tem onze páginas, sendo que, destas, duas são ilegíveis e oito são legíveis

na sua área central, mas apagados nas bordas. Contém rituais mitológicos,

cerimônias, proféticos, calendários de cerimônias e um estudo

astronômico dividido em 364 dias. Para realizar a leitura e interpretação,

de acordo com León-Portilla (2012), o sábio ou ah miatz comentava e

enriquecia o relato com o conhecimento das antigas tradições.

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53

O processo de leitura dos códices realizava-se de uma forma

diferenciada, semelhante a que utilizamos para ler os livros infantis, “por

um lado a criança escuta o texto e contempla a imagem e, por outro, o

adulto que lê o texto em voz alta e o teatraliza” (YUSTE FRIAS, 2001 p.

267, tradução nossa49). Tal leitura consistia, para os aprendizes, na

contemplação das imagens concomitante à escuta dos comentários

realizados pelo sacerdote. “Não tinham que acudir a seu próprio

repertório de idéias e imagens previamente adquiridas. A palavra de quem

ensinava com os livros ampliava de muitas maneiras, com sua linguagem

rica em metáforas, o que propunha transmitir.” (LEÓN-PORTILLA,

2012, p. 28). Na Figura 4, vê-se um vaso maia, de 9,5 cm, policromado,

do período Clássico tardio, que se encontra no museu de arte da

Universidade de Virgínia (EUA):

um ah ts´ib, escriba maia, com um códice

ensinando os seus discípulos[...] seis figuras

humanas aparecem pintadas no vaso, todas

sentadas. Duas delas são de um ancião, ainda que

entre uma e outra aparecem pequenas variantes no

toucado [...] Sobre esse ancião se pode

acrescentar que ele é ‘um deus velho’. Por seus

traços consta que é Itzamná a quem se atribui o

fato de ter concedido a escrita aos homens

(LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 22-24).

Figura 4 - Escriba maia ensinando.Vaso policromado.

Fonte: León Portilla (2012, p. 23)

49 “por un lado el niño escucha el texto y contempla la imagen, y, por otro, el adulto

que lee el texto en voz alta y lo teatraliza” (YUSTE FRIAS, 2001, p. 267).

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54

Resumindo a descrição de LEÓN-PORTILLA (2012, p. 24), o

ancião representa o pintor-escriba, e este atua como um professor que

conversa com seus discípulos e ilustra com o códice. Em uma das

representações, segura um pincel na mão e aponta para o códice no chão.

Há também três conjuntos de glifos no vaso que simbolizam alimento,

semeadura que está amadurecendo, jade e água que propicia a colheita e,

em geral, a vida. Os numerais registrados são 8, 9 e 13.

O sentido do expressado iconograficamente seria

que, na primeira cena, o professor se dirige aos

jovens fazendo-os refletir, utilizando-se a

metáfora do alimento, do jade e da água. Na

segunda, o ah ts´ib contempla e aponta o livro. Ele

vai comentá-lo ou já o está fazendo. (LEÓN-

PORTILLA, 2012, p. 25)

A dupla cena ilustra o processo descrito por vários cronistas,

entre eles frei Diego de Landa50, sobre o ensinar os filhos dos sacerdotes

e os filhos dos senhores, se constatassem que tinham vocação para o

ofício. As disciplinas que se ensinavam nestas escolas eram a conta dos

anos, meses e dias, as festas e cerimônias, as maneiras de adivinhar, os

remédios para males e a ler e escrever os caracteres.

2.1 CONJUNTURA COLONIAL, IDEÁRIO DA CONQUISTA.

A cultura maia persiste nas tradições dos povos da Península de

Yucatán e da Guatemala. Os avatares da história não conseguiram apagar

os traços dessa cultura, que percorreu um caminho difícil desde os tempos

pré-hispânicos até os nossos dias, passando pelo sistema vice-reinal. O

casticismo espanhol foi uma ideologia impregnada pelo modus operandi

inquisitorial, traços provenientes da eugenia medieval que, ao modo dos

cavaleiros das cruzadas, vestia-se com uma ‘moral’ que aniquilava os

infiéis, impondo a fé católica a qualquer preço. Essa empreitada envolveu

trabalhos de ordem militar, administrativa e religiosa, realizados

metodicamente e por muito tempo, até formar uma nova cultura.

50 Diego de Landa foi o primeiro bispo de Yucatan, México. Etnologista autodidata,

também escreveu a história dos maias em 1556, intitulada “Relacion de las Cosas

de Yucatán”.

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55

São válidas as considerações de Octavio Paz (2008, p. 27) sobre

a concepção da histórica na mesoamérica, cujos antigos territórios

formaram parte da “Nova Espanha”. O autor concebe o devir histórico

dessa região como uma justaposição de sociedades distintas, três

entidades históricas estreitamente vinculadas, cada uma separada da outra

por uma negação e uma relação filial e polêmica. Primeiro o conjunto de

nações, línguas, e culturas do mundo pré-hispânico foi negado pela Nova

Espanha - mesmo sendo a Nova Espanha ininteligível sem a presença do

índio -, por sua vez, a República do México nega a Nova Espanha e cada

negação contém a sociedade negada de forma latente. Muitos elementos

pré-hispânicos reaparecem no período colonial, e esses mesmos

elementos são parte do México moderno. “Nova Espanha não se parece

nem com o México pré-colombiano nem com o atual. Tampouco à

Espanha, mesmo que tenha sido um território submetido à coroa

espanhola.” (PAZ, 2008, p. 27, tradução nossa51).

Paz (2008) faz reflexões muito úteis para este estudo. Considera,

por exemplo, que a conquista foi realizada em primeira instância por

conta e risco de colonizadores marinhos, ou seja, por uma empresa

privada cujo capital era o conhecimento sobre navegação, a coragem e a

própria vida, ao mesmo tempo em que a ação espanhola, pelo ponto de

vista econômico, foi uma empreitada imperial, pois os reis católicos

deram empréstimos que financiaram as viagens, “duas palavras definem

a expansão hispânica: conquista e evangelização. São palavras imperiais

e, da mesma forma, palavras medievais” (PAZ, 2008, p. 28, tradução

nossa52). Falamos de uma conquista parecida com as cruzadas, “Nova

Espanha” era outro dos reinos submetidos à coroa. Boff (1992, p. 17) nos

diz que as conquistas foram sempre armadas, seguindo a ordem: espaços

mulçumanos, costa Atlântica da África e Ilhas Canárias, Oceano. A

ideologia de viés medieval carregava também o substrato ideológico da

inquisição, com seus conceitos de limpeza étnica e uniformização

religiosa, que abordaremos na análise dos paratextos do Manuscrito Ayer

1515.

51 ”Nueva España no se parece ni al México precolombino ni al actual. Tampoco a

España, aunque haya sido un territorio sometido a la corona española.” (PAZ,

2008, p. 27).

52 ”dos palabras definen a la expansión hispánica: conquista y evangelización. Son

palabras imperiales y, asimismo, palabras medievales.” (PAZ, 2008, p. 28).

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56

A evangelização foi uma peça importantíssima do maquinário

global da conquista, pois a política dos jesuítas era parte de uma estratégia

geral e incluía outras partes do mundo. Paz (2008, p. 58) pede-nos para

analisar os jesuítas na perspectiva da contra-reforma e consequentemente

da expansão da Europa pela Ásia e pela América. Segundo Boff (1992, p.

17), a expansão do orbis christianus imposto pela violência das armas e

pela submissão pacífica dos indígenas em aldeamentos ou reduções, teve

o medo como base dos procedimentos repressores: “eles nos ensinaram o

medo. Vieram fazer as flores murchar. Para que a sua flor vivesse,

danificaram e engoliram nossa flor.”(BOFF, 1992, p. 22). Segundo

Lienhard (2009, p. 1), a redução é uma operação de transformação que

implica, ao mesmo tempo, a destruição parcial da cultura existente e sua

reconstrução sobre novas bases e, para que tal tarefa seja eficaz, é

necessário conhecer a cultura colonizada. “Por isso na América

Espanholaas novas autoridades ‘a Coroa e a Igreja’ empreenderam,

apenas consolidada a ocupação, um vasto e largo trabalho de coleta de

dados acerca das estruturas político-militares, a organização social, a

economia e as religiões das sociedades nativas” (LIENHARD, 2009, p. 1,

tradução nossa53). Dentro destes parâmetros encontram-se estudiosos

como o Padre Francisco Ximénez, que dedicou a maior parte de sua vida

a estudar as línguas e a cultura maia.

Segundo Okoshi Harada (2000), pouco depois da conquista

espanhola os frades franciscanos iniciaram o ensino do manejo do

alfabeto latino às elites maias. Graças a este trabalho, a partir da segunda

metade do século XVI, membros da nobreza indígena começaram a

escrever numerosos documentos no seu próprio idioma com caracteres

latinos. Estes papéis são uma amostra singular de como lutaram para

conservar suas prerrogativas desde o século XVI. Seu estudo contribui à

compreensão mais profunda das estratégias de sobrevivência da nobreza

indígena ao longo do regime colonial. Exemplo desse esforço conjunto

foi o Colégio Imperial de santa Cruz de Tlatelolco (Figura 5), que em 6

53 “ Por eso, en la América española, las nuevas autoridades “la Corona y la Iglesia”

emprendieron, apenas consolidada la ocupación un vasto y largo trabajo de

recolección de datos acerca de las estructuras político-militares, la organización

social, la economía y las religiones de las sociedades nativas.” (LIENHARD,

2009, p. 1).

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de janeiro de 1536 começou a funcionar sob o conceito dos antigos

calmecac ou escolas sacerdotais pré-hispânicas, com a tutela de Carlos V,

com mestres que eram frades e professores da Sorbonne de Paris.

“Aceitou-se a presença de médicos e escribas indígenas. Um conjunto de

estudantes nahuas, em sua maioria filhos de senhores, assistia ao colégio,

pois se pensava que eles iriam influenciar suas comunidades de origem.”

(LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 80).

Figura 5 - Colégio Imperial de Santa Cruz de Tlatelolco

Fonte: LEÓN-PORTILLA(2012, p. 81).

Essa prática foi comum no século XVII e encontraram-se vários

tipos de documentos sobre: os que foram escritos com fins legais54, os que

descreviam árvores genealógicas de nobres55, e os que se converteram nos

“novos livros sagrados”, como o manuscrito estudado, Popol Wuj, achado

na atual cidade de Chichicastenango na Guatemala. “O Popol Wuj supera

claramente os outros livros, para nos introduzirmos no pensamento mítico

dos maias [...] a data da sua composição, que teve lugar muitos séculos

54 Títulos de propriedade das terras herdadas dos antepassados, neles se

estabeleciam as origens e os acontecimentos mais importantes do povo.

55 HARADA, T. O. Como os Xiu do século XVI. Yucatán identidad y cultura Maya.

Disponível em: <http://www.mayas.uady.mx/ articulos/xiu.html#uno>. Acesso

em 7 de julho de 2011.

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58

depois do fim do império maia, cujo apogeu se situa entre os anos 300 e

900 d.C, realiza uma coleção de lembranças.” (GRIMAL, 1973, p. 199,

tradução nossa56).

León-Portilla (2012) chama a atenção ao fato de que, depois de

consumada a Conquista espanhola, os maias não continuaram a utilizar a

arte de seus códices (Figura 6), “foi, talvez, o trauma deixado pela queima

de seus livros o que lhes determinou seguir outro caminho e não deixar

que suas antigas formas de saber se perdessem” (LEÓN-PORTILLA,

2012, p.63), e optaram pelo alfabeto latino fonetizado, como aconteceu

com o Popol Wuj.

Figura 6 - Queima de códices

Fonte: Crônica de Tlaxcala (LEÓN-PORTILLA, 2012, p. 186).

56 “El Popol Vuh supera, con mucho, a los otros libros, para introducirnos en el

pensamiento mítico de los mayas.[...] la fecha de su composición, que tuvo lugar

numerosos siglos después del fin del imperio maya, cuyo apogeo se sitúa entre

300 y 900 d.C, hace una colección de ‘recuerdos’” (GRIMAL, 1973, p.199).

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3 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS TEXTOS ESTUDADOS

3.1 DETALHES HISTÓRICOS DAS TRADUÇÕES

O manuscrito de Chichicastenango, como também é conhecida a

tradução de Francisco Ximénez (1704-1714), tem sua origem em tempos

pré-hispânicos e num texto transliterado do k’iche do século XVI, hoje

perdido. Os fatos históricos que permeiam as origens do texto remetem-

nos ao período clássico da cultura maia k’iche’ entre os séculos II e VI

d.C., que possuía uma lógica, uma escrita e uma forma de leitura

diferentes da européia. Muitos autores vêem na transliteração do século

XVI um texto híbrido, criado para garantir a subsistência das tradições na

conjuntura da conquista (CRAVERI, 2012, p. 17). A primeira

transliteração foi realizada no século XVI, do códice hoje perdido para o

k’iche’ fonetizado e escrito em caracteres latinos. Segundo Craveri (2012,

p. 17-18) o primeiro copista do século XVI foi um indivíduo culto,

possivelmente indígena, que dominava os dois códigos lingüísticos, o oral

com base logossilábica e o europeio alfabético. Esta transliteração foi a

fonte de Francisco Ximénez, que a transcreveu e traduziu para o idioma

espanhol. De forma resumida, podemos dizer que o Manuscrito MS

AYER 1515 (1700-1704) recolhe uma tradição oral de origem pré-

hispanica, contém a transcrição de um texto do século XVI, hoje perdido

em idioma k’iche’ transliterado, que Francisco Ximénez traduziu para o

espanhol no século XVIII.

Os Tzijs (verdades, histórias, narrações, tradições)

do Popol Wuj foram registrados como o sistema

de escrita ocidental sob condições de

colonização.Isto quer dizer que se fixaram com o

formato e a seleção de relatos com que os

conhecemos atualmente dentro de um marco de

adversidades que se inclinava para sua

erradicação. Talvez esta seja uma das explicações

para entender o motivo de sua trajetória ter sido

uma sucessão de resgates e esquecimentos.

(LÓPEZ, 2009, p.125, tradução nossa57)

57 “Los tzijs (verdades, historias, narraciones, tradiciones) del Popol Wuj fueron

registrados con el sistema de escritura occidental bajo condiciones de

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Inicialmente, tal manuscrito permaneceu na Biblioteca da

Universidade de Guatemala, onde o pesquisador Dr. Karl Scherzer

consultou-o e realizou, por volta de 1850, uma transcrição minuciosa

publicada na Áustria em 1857. Em 1860 passou às mãos do padre Charles

Etienne Brasseur de Bourbourg, que o levou à França. O texto em K’iche’

foi dado a conhecer junto com a tradução para o francês realizada por

Brasseur (1862), com o título “Popol-vuh, le livre sacré et les mythes de

l’antiquité américaine”58, publicada em Paris.

livre já das pressões do zelo evangelizador, o

abade, seguramente influenciado pelas idéias

românticas, observa o conteúdo religioso e antigo

dos textos em pleno século XIX podendo resgatar

o caráter documental de uma religião diferente da

católica sem o temor de ser condenado pela

nquisição. (LÓPEZ, 1999, p. 48)

Após o falecimento de Brasseur, a tradução de Ximénez foi

adquirida por Edward Ayer, que a anexou a sua coleção linguística, que

foi doada à Biblioteca de Newberry, em Chicago, e pode ser consultada

com a referência “AYER MS 1515”59.

Os textos escolhidos, além do Manuscrito Ayer 1515, são os

excertos de duas traduções realizadas por descendentes da cultura maia -

Chávez (1979) e Colop (2011) - e ambos os autores expressam a intenção

de compreensão da tradição K´iche’. O trabalho de Don Adrián Chávez

(1979) segue um relato único que acompanha o desenrolar temático do

Manuscrito de Ximénez. A tradução é apresentada em quatro colunas,

colonización. Esto quiere decir que se fijaron con el formato y la selección de

relatos con que los conocemos actualmente dentro de un marco de adversidades

tendientes a su erradicación. Tal vez esta sea una de las explicaciones para

entender por qué su trayectoria durante la colonia fue una historia de sucesivos

rescates y olvidos” (LÓPEZ, 2009, p.125)

58 BOURBOURG, Brasseur de. Grammarire de la langue quichée. Paris: Bertrand,

1862. Disponível em: <http://www.archive.org/details/pop

olvuyhlelivr00bourgoog>. Acesso em 21 de março de 2011.

59 EWBERRY LIBRARY. AYER MS 1515. Disponível em:

<http://www.newberry.org/>. Acesso em 20 de maio de 2010. THE OHIO

STATE UNIVERSITY LIBRARIES. AYER MS 1515. Disponível em:

<http://library.osu.edu/projects/popolwuj/folios_eng/ Pwfolio_i_r_en.php>.

Acesso em 20 de maio de 2010.

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61

sendo a primeira a versão K'iche’ do Pe. Ximenes, a segunda apresenta a

revisão da língua fonte com a tipografia criada pelo tradutor para

representar fonemas da língua K ‘iche’ omitidos na tradução de Ximenes,

a terceira a tradução literal ao espanhol e a quarta uma versão que a torna

mais compreensível, sendo por tal a edição mais usada nas escolas em

toda América do Sul. O Pop Wuj de Chávez (2007) mostra uma

preocupação lingüística específica e trabalha detalhadamente a fonética e

semântica da obra.Finalmente o Popol Wuj de Colop (2011) apresenta-se

sob a forma de poema, observa a musicalidade da composição, segundo

o autor, conserva as características originais da obra proveniente da

tradição oral.

3.1.1 Francisco Ximénez, Guatemala e o Popol Wuj

Francisco Ximénez foi um religioso espanhol da ordem de Santo

Domingo, nasceu em Écija, Sevilla, em 23 de novembro de 1666

(MARTINEZ BARACS, 2013 p. 35) e faleceu em Santiago de los Treinta

Caballeros em 1730. Iniciou os estudos na sua cidade natal e, ainda

adolescente, entrou na vida religiosa.Segundo Martínez Baracs (2013),

Ximénez embarcou rumo ao ‘novo mundo’ em 1687 chegou à cidade de

Santiago de Guatemala em quatro de fevereiro de 1688. Frei Francisco

continuou e finalizou seus estudos teológicos no grande convento

domínico desta cidade. Concomitantemente, iniciou os estudos das

línguas indígenas e particularmente o K‘iche’ “(uma das 35 línguas do

grupo maia) e suas variantes cakchiquel e zutujil, que se falavam nas

populações das montanhas do sul de Guatemala.” (MARTINEZ

BARACS, 2013 p. 35, tradução nossa60)A palavra K‘iche’ significa

“bosque” (ki: muitos e che: árvores).

Ximénez, imerso na conjuntura histórica hostil da imposição

cultural espanhola, soube observar e entender os K‘iches’ sem

comprometer-se negativamente perante a Igreja e soube conquistar a

confiança da população colonizada. Aprendeu o idioma cakchiquel em

San Juan Sacatepéquez, e ali foi instruído em administração paroquial.

Entre suas funções se encontrava a tarefa de organizar arquivos e

60 “(una de las 35 lenguas del grupo maya) y sus variantes o dialectos cakchiquel y

zutujil, que se hablaban en los pueblos de las montañas del sur de Guatemala.”

(MARTINEZ BARACS, 2013, p. 35)

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bibliotecas dos conventos que visitava e exercia também a função de

“doctrinero” (catequizador). Com estas responsabilidades, viajou por

vários povoados: Xenacó, Chimaltenango, Zacatepec e

Chichicastenango, que era o curato de Santo Tomás Chuilá, onde esteve

entre 1701 e 1703.Ali descobriu e traduziu o manuscrito do século XVI

em K‘iche’ que continha o texto conhecido hoje como Popol

Vuh.Ximénez, com 24 anos, viajou à Ciudad Real, província de Chiapas,

para receber as ordens sacerdotais. No percurso da viagem, observou as

variedades das línguas utilizadas nestas regiões, conheceu a exploração e

a situação de opressão vivida pelos tzotziles e tzeltales do noroeste de

Chiapas.

De acordo com Martinez Baracs (2013), nas paróquias e

conventos que frei Ximénez visitou,encontrou manuscritos chamados

Theologia indorum (teologia dos índios para os índios), que continham

sermões em língua K‘iche’, cakchiquel ou zutuhil. Este material devia ser

memorizado pelos catequizadores para predicar.“Insatisfeito com essas

obras, Ximénez se propôs a elaborar um instrumento mais ambicioso, que

introduzisse verdadeiramente os predicadores ao conhecimento da língua

K‘iche’ e de suas variantes mencionadas, escreveu então a “Arte

(Tesouro) de las tres lenguas cakchiquel, quiché y tzutuhi”(1701-

1703)”(MARTÍNEZ BARACS, 2013, p. 38, tradução nossa61),

constituído por três tomos manuscritos divididos em três partes: um

dicionário K‘iche’ e suas variantes para o espanhol, a segunda parte é uma

explicação de cada letra e seu uso , e a terceira parte consta da “arte” ou

gramáticas das línguas mencionadas, à qual se acrescentaram vários

textos em língua K‘iche’ traduzidos para o espanhol, entre eles o texto

que conhecemos hoje como Popol Wuj ou Popol Vuh, de acordo com

autores. Em 1715, segundo Recinos (1953), começou a escrever sua obra

mais extensa: “Historia de la Provincia de San Vicente de Chiapa y

Guatemala” (Ximénez, 1722). Logo inicia “Historia natural del reino de

Guatemala”, cujo primeiro tomo, informa Recinos (1953), sobreviveu. O

mesmo autor calcula que faleceu perto de 1730. “A família linguística

maia está formada por 31 línguas diferentes. Delas, somente duas são

línguas mortas, as restantes se utilizam como principal meio de

61 Insatisfecho con estas obras, Ximénez se propuso elaborar un instrumento más

ambicioso que introdujera verdaderamente a los predicadores al conocimiento de

la lengua K ‘iche’ ‘’ y de sus variantes mencionadas esta obra fue Arte de las tres

lenguas cakchiquel, quiché y tzutuhi,” (MARTÍNEZ BARACS, 2013, p.38)

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comunicação em numerosas comunidades contemporâneas”

(PÉREZSUÁREZ, 2014, p. 2, tradução nossa62).

A História de la Província de San Vicente de Chiapa y

Guatemala (Ximénez, 1728 aprox.), começa com uma nova versão da sua

primeira tradução do Popol Vuh, continua com a historia dos reis de

K‘iche’, e contém outro capítulo sobre a religião e costumes dos maias.

Logo, narra a história do que ele chama “conquista espanhola de

Guatemala”, a fundação da cidade e os trabalhos dos frades domínicos na

evangelização nas províncias de Chiapas e de Guatemala e outros

assuntos importantes como a rebelião de Cancuc, em 1712.

Em 1712 aconteceu uma rebelião em Cancuc, um movimento

messiânico “produzido [como conseqüência de uma rebelião originada no

sincretismo religioso indígena cristão” (CERUTTI; DOMINGUEZ,

1988, s/p,tradução nossa63). Tal rebelião durou apenas três meses, mas

deixou profundas marcas nos rituais religiosos e na conduta política dos

maias. Alcançou proporções que fizeram fraquejar a persistência do

regime colonial, e a coroa espanhola deixou de perceber tributos em 25

vilas dessa região durante cinco anos. Parafraseando Cerutti e Dominguez

(1988), os maias não permitiram a extinção de suas tradições devido a

vários fatores de ordem histórica, geográfica e cultural: primeiramente o

longo período de lutas acarretadas pelas tentativas de dominação cultural

fracassadas dos espanhóis, reforçado pelo isolamento geográfico e a

descentralização dos povos, também à natureza hostil das relações

interpessoais entre maias e espanhóis se mantiveram durante e após a

conquista, finalmente a sobrevivência da epistemologia maia permaneceu

viva sob a feição do cristianismo, por meio de um sincretismo fortemente

enraizado na religião pré-hispânica. Neste contexto, aconteceu a

mencionada rebelião de Cancuc. Líderes maias criaram uma igreja

sincrética paralela, reivindicando poderes divinos outorgados por santos

da igreja católica que teriam se manifestado em aparições miraculosas. O

grau de convicção e força política foi tal, que chegaram a criar um

exército chamado “soldados de la Virgen” (soldados da Nossa Senhora),

composto por mais de 3000 homens com os quais conseguiram dominar

62 La familia lingüística maya está formada por 31 lenguas distintas. De ellas sólo

dos son lenguas muertas, las restantes se utilizan como principal medio de

comunicación en numerosas comunidades contemporáneas.(PÉREZ-SUÁREZ,

2014, p. 2)

63 Producido por el sincretismo religioso indígena cristiano.

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e fazer recuar aos espanhóis. A opinião de Francisco Ximénez na sua

“História de la Provincia de San Vicente de Chiapas y Guatemala” foi a

seguinte:

Não somente as tiranias que com os índios

impusera o Prefeito Maior e outros espanhóis,

mas, como já dito, o maior motivo foi o senhor

bispo [o novo bispo Juan Bautista Alvarez de

Toledo] com sua desmedida cobiça, porque com a

ânsia de juntar dinheiro para suas pretensões não

ficou meio, por ilícito que fosse, do qual não

tivesse usufruído. (XIMÉNEZ, 1715 apud

VILLACORTA CALDERÓN, 1931, p. 257,

tradução nossa64)

De acordo com as considerações de Martinez Baracs (2013),

Ximénez teve um contato próximo e amistoso com os caciques

“maxeños”65, que lhe transmitiram ampla informação sobre os costumes

e as crenças religiosas de seus antepassados pré-hispânicos. “A confiança

dos caciques de Chichicastenango foi tal, que durante sua estadia ali em

1701-1703, mostraram-lhe um antigo manuscrito que conservaram num

lugar secreto desde o século XVI” (MARTÍNEZ BARACS, 2013, p. 39,

tradução nossa66). Trata-se do texto que hoje conhecemos como Popol

Vuh, ou Popol Wuj (escrita que reflete a fonética correta, escolhida por

López, 1999). Supõe-se que o padre Ximénez, honestamente, devolveu

aos caciques o empréstimo.

Jose Valverde Madrid (1967, p. 4) também afirma que foi em

Chiapas onde Ximénez iniciou a elaboração de sua obra chamada

“Primeira parte del Arte de las tres lenguas cakchiquel, quiché y tzutuhi”,

64 No sólo las tiranias que con los índios obraron el Alcalde Mayor y otros españoles,

sino que, como se había dicho, el mayor motivo fue el señor obispo [el nuevo

obispo Juan Bautista Alvarez de Toledo] con su desmedida codicia, por que con

la ansia de juntar dinero para sus pretensiones, no quedó medio por ilícito que

fuese de que no se valiese. (XIMÉNEZ em edição editada por VILLACORTA

CALDERÓN, 1931 p. 257).

65 Gentilicio que se le da a los pobladores de Chichicastenango, derivado de Max,

que significa Tomás en lengua Quiché. (Diccionário de la Real Academia

española)

66 La confianza de los caciques de Chichicastenango fue tal que durante su estância

allí en 1701-1703 le mostraron al padre Ximénez un antiguo manuscrito que

conservaban en un lugar secreto desde el siglo XVI” MARTINEZ BARACS,

2013, p. 39)

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com tradução dessas línguas para o espanhol, cujo manuscrito se conserva

na Biblioteca Nacional Cordobesa, na Espanha. “Nela nos diz que há

certos animais maléficos cuja simples menção produz terror aos índios,

assim era a lagartixa zumzum, já que se a vissem ou pronunciassem seu

nome cairiam raios por perto”(VALVERDE MADRID, 1967, p. 2,

tradução nossa67)

Ximénez menciona na sua obra “História de la província de San

Vicente” que a população K‘iche’ de Santo Tomás de Chichicastengo

conhecia as histórias relatadas no Popol Wuj desde a infância “Acredito

que mamavam da doutrina junto com o leite materno e todos a levam na

memória” (XIMÉNEZ, 1700-1704, fólio prólogo 2r, tradução

nossa68).Relata, ainda, que as mães K‘iche’s e os velhos contavam as

histórias aos jovens, e estas eram cantadas, dançadas e dramatizadas. A

segunda tradução, formada pelos dicionários das três línguas, e as duas

primeiras partes da segunda tradução do Popol Wuj de sua autoria

(capítulos ii a xxi) foram enviadas em 1722 ao seu antigo convento em

Córdoba.

3.1.2 Destino dos manuscritos de Ximénez

Parafraseando Martínez Baracs (2013, p.40.), após a morte de

Francisco Ximénez, seus escritos ficaram no convento domínico da

cidade de Guatemala. O convento tinha sofrido danos em terremotos em

1717, 1751 e 1773 que destruíram o convento e arrasaram a cidade de

Guatemala, trasladada formalmente em 1775 a um novo local com o nome

de Guatemala de la Asunción (atual cidade de Guatemala). Ali se

estabeleceu um novo convento domínico, e a biblioteca foi transladada

para lá com os livros e papéis do Padre Ximénez.

Em 1829, houve uma revolta política e o governo foi tomado por

uma rebelião encabeçada por tropas salvadorenhas e hondurenhas que

decretaram a expulsão dos frades franciscanos e domínicos de Guatemala,

confiscando seus conventos e bens. O manuscrito do Popol Vuh foi

enviado junto com os documentos do Frei Ximénez para San Carlos, na

67 En Ella nos dice que hay ciertos animales maléficos cuya simple pronunciación

aterra a los indios, así la lagartija Zumzum, pues se a ven o pronuncian caen rayos

enseguida cerca.” (VALVERDE MADRID, 1967, p. 2).

68 Hallé que era la doctrina que primero mamaban con la leche, y que todos ellos

casi la tienen en la memória. (XIMÉNEZ,1700-1704, Fólio prólogo 2r)

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cidade de Guatemala. Em 1855, um estudioso austríaco chamado Carl

Scherzer, obteve uma cópia manuscrita da obra. No ano posterior,

Brasseur de Bourbourg, sacerdote francês, foi presenteado com o original

e o levou a França. Em 1857, Scherzer publicou o texto em Viena sob o

título Las historias del origen de los índios de esta província de

Guatemala, traducidas de la lengua quiche al castellano [...] Por el

R.P.F. Francisco Ximénez. Exactamente según el texto español por el

doctor C.Scherzer. Publicado por primera vez. (SCHERZER, 1857, p. 5).

Brasseur levou o manuscrito a Paris e o comentou amplamente em suas

Histórias des nations civilisées du Mexique et de l´Amerique Centrale,

Durant les siècles anterieurs à Christophe Colom (BERTRAND,1857-

1859), onde o chama Manuscrito quiche de Chichicastenango, depois de

traduzir para o francês a transcrição K‘iche’ de Ximénez, a publica em

1861 sob o nome de Popol Vuh: Le livre Sacré et les mythes de l´antiquite

américaine, avec les livres héroïqueset historiques dês Quichés69 (Figura

7).

Figura 7 - Le Livre Sacré

Fonte: Brasseur de Bourbourg (1862).

69 Pode ser consultado on-line na BibliothèqueNationale de France [gallica.bnf.fr]

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Pascale Casanova (2002) lembra o papel fundamental dos

tradutores que, enquanto traduzem, aumentam sua riqueza intelectual,

enriquecem sua literatura nacional e honram seu próprio nome. O abade

(Brasseur de Bourbourg) não tem medo de reconhecer que era um livro

‘sagrado’. Mas, ao mesmo tempo, recorta o conteúdo em três categorias

bem demarcadas: ‘mito’ - palavra que no século XIX não era muito

prestigiosa -, ‘antiguidade’ e ‘historia’. Nas investigações realizadas

sobre os maias, salvo contadas exceções, “sempre se considerou o texto

do Popol Wuj como pertencente a um passado desaparecido. Muito

raramente é considerado como parte viva das comunidades atuais”.

(LÓPEZ, 2009, p. 23, tradução nossa70).

Brasseur de Bourbourg morreu em Nice, em janeiro de 1874, e

sua coleção de manuscritos dispersou-se. Recinos (1953) comenta que

Alphonse Pinart adquiriu a maioria dos documentos.

O doutor Daniel G. Brinton (1837-1899) comprou

o manuscrito do Memorial de Tecpán Atlitan,os

Anales de los Cakchiqueles,e os publicou em

1885, entre outros documentos que após sua

morte passaram à Biblioteca do Museu da

Universidade de Pensylvania. Hubert Howe

Bancroft (1832-1922) comprou outra parte da

coleção, incluindo vários manuscritos do padre

Ximénez, que passaram à Biblioteca que leva o

nome de Bamcroft da Universidade de California

em Berkeley. Após a morte de Pinart, sua coleção

passou, em sua maior parte, à Biblioteca Nacional

de França. (MARTÍNEZ BARACS, 2013,p. 4571)

70 “siempre se consideró el texto como perteneciente al pasado desaparecido, y es

muy raro ver que se le vea como parte viva de las comunidades actuales”

(LÓPEZ, 2009, p. 23).

71 El doctor Daniel G. Brinton (1837-1899) compro el manuscrito de Memorial de

Tecpán Atlitan, los Anales de los Cakchiqueles, que publicó en 1885, entre otros

documentos que tras su muerte pasaron a la Biblioteca del Museo de la

Universidad de Pennsylvania. Y Hubert Howe Bancroft (1832-1922) compró otra

parte de la colección, incluyendo varios manuscritos del padre Ximénez, que

pasaron a la Biblioteca que lleva el nombre de Bamcroft de la Universidad de

California en Berkeley. Tras la muerte de Pinart, su colección pasó, en su mayor

parte, a la Biblioteca Nacional de Francia. (MARTÍNEZ BARACS, 2013, p. 45)

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68

Alphonse Pinart vendeu o manuscrito do Popol Wuj a Edward

Ayer (1841-1927) junto com outros manuscritos da coleção de Brasseur

(como a Arte de las tres lenguas de Ximénez). Em 1911, Ayer doou sua

grande coleção de 17.000 livros manuscritos sobre a população pré-

hispânica americana à biblioteca Newberry, da Universidade de Chicago.

Em 1941, Recinos realizou uma tradução para o espanhol do texto da

Biblioteca de Newberry sem a transcrição do K‘iche’. Devemos destacar

que a transcrição do texto K‘iche’ e sua tradução para o francês

publicadas em 1861 pelo abade Brasseur de Bourbourg, serviram de base

para quase todas as edições do Popol Wuj por quase 80 anos até a década

de 1940. Temos um exemplo das traduções provenientes da tradição de

Brasseur, no trabalho de Georges Raynaud publicado em Paris em 1927,

sob o título “Los Dioses, los Héroes y los Hombres de Guatemala

Antigua”. Posteriormente se fizeram várias edições, sendo merecedora de

citação a da Biblioteca do Estudante Universitario nas publicações da

Universidade Nacional Autónoma do México: “Popol-vuh: o libro del

consejo de los índios quichés” de Asturias e Mendoza (1998) que, no

prólogo, especifica “Tradução da versão francesa do Professor Georges

Raynaud, diretor de estudos sobre as religiões da América Pré-

colombiana na Escola de Estudos de Paris, pelos alunos titulares da

mesma” (ASTÚRIAS; MENDOZA, 1998, p.5, tradução nossa72).

“Miguel Angel Astúrias segue fielmente a Raynaud” (LÓPEZ, 1999,

p.224).

Em seguida, citamos a cronologia das traduções mais

consagradas até 1991, segundo López (1999, p. 245):

Francisco Ximénez (1703); Brasseur de

Bourbourg (1861); Daniel Brinton (1881);

Georges Raybaud (1925); Villacorta y Rodas

(1927); Adrián Recinos (1947)73; Burgues y Xec

(1955); Antonio Villacorta (1962); Garcia

Aceituno (1965); Martínez Parédez (1968);

Munro Edmonson (1971); Agustín Estrada

72 “ Traducción de la versión francesa del Profesor Georges Raynaud, director de

estudios sobre las religiones de la América Precolombina, en la Escuela de Altos

Estudios de París, por los alumnos titulares de la misma” (ASTURIAS;

MENDOZA, 1998, p. 5)

73 http://www.literaturaguatemalteca.org/popol.html

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Monroy (1973); Adrián I. Chávez (1979); de León

Valdéz - López Perén (1985); Dennis Tedlock

(1986)74; Martha Ilia Nájera (1987); Mary Preuss

(1988) e González Torres (1991).

Brasseur fixou uma tradição referente à divisão em quatro partes

e um preâmbulo, Adrián Recinos acompanha esta organização em sua

edição de 1947. Adrián Chavez segue fielmente o Ayer Ms 1515, não

coloca nenhuma indicação numérica e, finalmente, Sam Colop (2011)

divide a obra em capítulos adotando um formato diferenciado, de acordo

com regras coerentes com a tradição oral que organiza o texto de acordo

com a morfologia das palavras;

3.1.3 Don AdriánInés Chavez e sua época.

Segundo Bautista Cruz (2013), no artigo Semblanza de la vida y

obra de Inés Chavez, o tradutor nasceu em San Francisco el Alto,

Totonicapán, Guatemala, em 1904. Considerado o primeiro maestro

indígena de Guatemala, foi Diretor de Educação e fundador da Academia

de língua Maia - K'iche’. Trabalhou com aspectos fonéticos desta língua

e suas investigações abordaram aspectos etimológicos da língua K ‘iche’.

Chavez chegou a criar um alfabeto com vistas a promover pronúncia

correta das palavras do K’iche’. Atribui-se a ele a pesquisa histórica que

levou ao descobrimento do lugar exato do primeiro encontro entre

espanhóis e autóctones em 152475. Também exerceu um papel político

representativo nas reivindicações em prol das causas indígenas. Seu

trabalho sobre a língua k'iche’, associado ao Popol Wuj, segue critérios

revisionistas na análise dos manuscritos de Francisco Ximénez (1700-

1704), pois questiona a tradução feita pelo frade para o espanhol. Intitula

sua tradução “Pop Wuj”, defendendo que “Pop” é o nome do primeiro

mês dos k'iche’s. Realiza análises etimológicas importantes e elabora uma

tradução do Popol Wuj em quatro colunas, nas quais especifica o sentido

74 http://ambergriscaye.com/pages/mayan/PopolVuhMayanReligiousDocumen

t.htm

75 Que não foi nas lhanuras de Urbina como acreditávase na época, mas em Pacha

de Sha Lajuj. (BAUTISTA CRUZ, 2013, p. 109)

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70

de alguns sons que teriam passado despercebidos por Francisco Ximénez.

A primeira coluna traz a cópia literal do K´iche’de Francisco Ximénez; a

segunda, a revisão fonética do mesmo; a terceira, a tradução literal para o

espanhol; e a quarta uma versão que ‘facilitaria’ a compreensão do texto

por falantes hispânicos. Entre as distinções que recebeu está a de doutor

Honoris Causa pela Unesco.

Chavez ocupa lugar crucial na história das traduções do Popol

Wuj e na história política dos movimentos indígenas, devido à sua origem

K‘iche’ e às suas pesquisas fonéticas e semânticas orientadas para o

resgate da identidade lingüística de seu povo. A tradução do Pop Wuj de

Chávez, além de sua própria pessoa, teve e têm, até hoje, muita

importância nos movimentos de defesa dos interesses culturais e sociais

dos povos indígenas guatemaltecos. Parafraseando Celigueta Comerma

(2008,p. 117), Chavez se dedicou ao ensino do k´iche’, ministrando aulas

àqueles que não tiveram a oportunidade de aprender a língua no seio

familiar.

A carência na aquisição e/ou aprendizado do K’iche’ ocorreu,

sobretudo, devido à heterogeneidade dos grupos indígenas; às situações

de discriminação que sofre o povo k´iche’; o acesso em igualdade de

condições às instituições políticas do Estado. Como resposta a esses

problemas discriminatórios, um grupo de K‘iche’s propôs a formação de

uma organização política: espécie de partido, chamado Xel-ju, que

alcançou grande importância em termos de coesão e de número de

adeptos. O objetivo da organização foi o de constituir uma frente de

defesa dos direitos indígenas e, progressivamente, alcançar representação

junto ao governo. Outras organizações indígenas também se fortaleceram

concomitantemente na sociedade guatemalteca através das chamadas

“irmandades”76: cooperativas agrícolas e comerciais, já que a maioria dos

K‘iches’ dedicava-se à agricultura, ao comércio ou à produção de

artesanato. Finalmente, houve a formação da Academia da Língua

K´iche’, fundada em 1959 por Don Adrián Inés Chavez. Trata-se de um

espaço de encontro e discussão dos k´iches’ de Quetzaltenango para o

fortalecimento e defesa dos indígenas.

76 Dentre elas, a maçônica.

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71

Cabe destacar que a educação na Guatemala passou a atender a

um maior número de pessoas somente a partir de 1944, devido ao impulso

dado pelo governo reformista da época. As Igrejas Católica e Protestante

começaram a expandir os trabalhos de natureza educativa até os pontos

mais remotos do país. Foi nessa época que alguns k´iches’ artesãos e

agricultores prósperos começaram a enviar seus filhos para realizar o

Ensino Médio e, posteriormente, se lançar aos estudos universitários.

Todavia, o deslocamento para as grandes cidades gera o abandono e

esquecimento progressivos do idioma e das tradições k´iches’. Um

fenômeno interessante a ser posto em evidência concerne à preferência

profissional dos estudantes indígenas: a maior parte deles abraçou a

carreira de docência. De acordo com Gemma Celigueta Comerma (2008),

Adrián Inés Chavez foi o precursor e o mestre dos novos líderes

indianistas que apoiaram e promoveram a chegada de prefeitos indígenas

a vários municípios da região. A partir de 1978 se desencadeou uma

grande repressão governamental que ocasionou a desaparição de muitas

das organizações que haviam sido criadas e que haviam, inclusive, se

fortificado nos anos setenta, tal como o Xel-ju.

3.1.4 Biografia de Sam Colop

De acordo com o prólogo do Popol Wuj (COLOP, 2011, p. VII),

Luis Enrique Sam Colop nasceu em Cantel, Quetzalrenango. Advogado

e escrivão formado na Universidade Rafael Landívar (1983), por seu

trabalho de conclusão de curso recebeu um prêmio na Faculdade de

Direito (Universidad Rafael Landívar, 1983). Seu texto versava sobre

uma proposta de lei para educação bilíngue. Obteve título de mestrado em

Lingüística pela Universidade de Iowa City e Doutorado pelo

Departamento de Inglês da Universidade Estatal de New York em

Buffalo, onde escreveu a dissertação Maya Poetics. Entre suas

publicações se encontram: “Anotações sobre alguns temas da gramática

K’iche’” em“Leituras sobre a linguística maia” (Cirma, Guatemala,

1990); “Cinco séculos de encobrimiento: A propósito de 1991”(Editorial

Cholsamaj, Guatemala, 1991), texto o qual foi traduzido para o italiano

(Bonnano Editore, Catania, Italia, 1992) e publicado para o espanhol pela

revista “Global Justice”, da Universidad de Denver, Colorado, e em

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72

inglês, em“Maya Cultural Activism in Guatemala” (editorial da

Universidade de Texas, Austin); “Xajoj Tun vs. Quiché Vinak”,

publicado na revista Encontro do Instituto Guatemalteco de Cultura

Hispánica (1993); Popol Wuj: versão poética k’iche´ (Editorial

Cholsamaj, 1999).

Participou em congressos na Latin American Studies

Association, American Anthropological Association, e do Congresso

Internacional de Americanistas, ministrando conferências sobre

lingüística, literatura maia e temas jurídicos maias em universidades dos

Estados Unidos e Equador. Foi bolsista do Instituto Interamericano de

Derechos Humanos de Costa Rica, da Fundacão Guggenheim de New

York, de Plumsock Mesoamerican Foundation e da American

Philosophical Society de Filadelfia. Obteve duas vezes a beca Fulbright,

e a Newberry Library de Chicago lhe outorgou uma bolsa para edição.

Suas colunas jornalísticas apareciam duas vezes na semana em Prensa

Libre, jornal da Guatemala. Faleceu em 2011.

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4 PARATEXTOS DAS TRADUÇÕES

Seguindo os conceitos de Gérard Genette (2009), o paratexto é

aquilo por meio do qual um texto torna-se ‘livro’ e propõe-se como tal a

seus leitores, “um limiar que oferece a cada um a possibilidade de entrar,

ou de retroceder […] lugar privilegiado de uma pragmática e de uma

estratégia” (GENETTE, 2009, p. 11). Mesmo na época em que os textos

se apresentavam sob a forma de manuscrito, existia uma mensagem no

texto que induzia efeitos paratextuais com uma mensagem oficial do

autor, como o título e/ou o prefácio original.

O paratexto possui como característica a “força ilocutória” de sua

mensagem. Pode ser uma mera informação como o nome do autor, ou a

data de publicação, pode dar a conhecer uma intenção ou uma

interpretação autoral, pode, por fim, indicar o gênero: poema, romance,

conto, cosmogonia etc.

O que diferencia o Ms. Ayer 1515, cuja cópia já era uma forma

de edição, das obras de Chávez (1979) e Sam Colop (2011) estudadas

nesta tese, além da contemporaneidade das duas últimas, são as

características tipográficas e bibliográficas. Os dois últimos são livros que

como tais ultrapassam o formato editorado, concretizam o uso público dos

textos, estão orientados para o consumo dos leitores em forma de produto

intelectual, e podem ser adquiridos por um grande número de pessoas.

Segundo Genette (2009), a capa impressa em papel é um fato que remonta

ao século XIX, portanto bastante recente.

Em resumo as traduções estudadas são:

Quadro 2 - Traduções estudadas

Título Tradutor Data Local

Manuscrito de

Chichicastenango

Pe. Francisco

Ximénez 1704 -1714 Guatemala

Pop Wuj: libro del tiempo.

Poema mito histórico K’iche’

Don Adrián Inés

Chávez 1979 -2007 Guatemala

Popol Wuj. Traducción al

español y notas

Luis Enrique Sam

Colop 2011 Guatemala

Fonte: A autora.

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74

4.1 ANÁLISE DOS PARATEXTOS E DO PRÓLOGO DO MANUSCRITO MS

AYER 1515 (F. 2R)

4.1.1 Características da grafia do manuscrito

O Manuscrito Ayer 1515 possui uma grafia inclinada à direita.

As letras e sílabas de uma mesma palavra estão freqüentemente

separadas, dificultando a leitura. A ortografia apresenta algumas

dificuldades na leitura: as abreviaturas, a escrita arcaica. A própria

situação da gramática-padrão na Espanha do século XVIII não estabelecia

normas específicas de escrita. Como colocam Martinez e Sanchez (1994,

tradução nossa77), “a Real Academia Espanhola da Língua foi fundada

em 1713. Em pouco tempo se publicou o Dicionário de Autoridades, mas

demorou bastante para concluir-se a Gramática Espanhola”.

Quando Nebrija (1492) escreve suas obras

gramaticais não parte do zero. Conta com a rica

tradição greco-latina, que, no caso dele, referência

principalmente três gramáticos latinos: Priciano,

Diomedes e Donato, sem esquecer Quintiliano.

Deles toma base teórica e elabora sua doutrina.

Mas não se deve pensar que acata o estabelecido

pelos seus predecessores latinos, ou que a versão

gramatical espanhola é uma mera tradução da

latina”. (PEÑALVER, 1991-1992, p. 222,

tradução nossa78)

Somente em 1780, Carlos III publicaria um Real Decreto pelo

qual o uso da Gramática tornar-se-ia obrigatório. Até então não existia

uma preocupação com a gramática do castelhano, pois seus parâmetros

77 “la Real Academia Española de laLenguafue fundada en 1713. En poco tiempo se

publicó el Diccionario de Autoridades mientras que hubo que esperar bastante

para que se concluyera la Gramática Española.” (MARTINEZ; SANCHEZ,

1994).

78 “Cuando Nebrija (1492) escribe sus obras gramaticales no parte de cero. Cuenta

con la rica tradición greco-latina, que, en su caso, se circunscribe principalmente

a tres gramáticos latinos: Priciano, Diomedes y Donato, sin olvidar a Quintiliano.

De ellos toma la base teórica y sobre esta elabora su doctrina. Pero no hay que

pensar que acata cuanto dicen sus predecesores latinos, o que la versión gramatical

española es una mera traducción de la latina” (PEÑALVER, 1991-1992, p. 222).

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75

fixavam-se com base no latim. No prólogo do Manuscrito de

Chichicastenango, nota-se a falta de regras de acentuação, característica

das redações em espanhol do início do século XVIII, fato que em

determinados momentos compromete a compreensão do sentido do texto

analisado.

O século XVIII na Espanha foi um período de recuperação

demográfica e econômica. O poder político organizou-se de forma

centralizada, seguindo o modelo francês. O influxo da Ilustração causou

uma diminuição na importância da inquisição que, no fim do século, tinha

dirigido suas atividades à perseguição das novas ideias ilustradas,

procedentes principalmente da França, e à censura de livros. A

perseguição contra judeus e muçulmanos - ou conversos - estava

minimizada pelo número reduzido destas etnias na Espanha. O enorme

impacto que a Revolução Francesa causou na Espanha após a morte de

Luis XVI, assim como nos domínios espanhóis da América, provocou

uma violenta perseguição às pessoas mais representativas das novas

ideias. Ficou proibida a circulação de livros e folhetos, assim como seu

embarque para América.

4.1.2 Características paratextuais do manuscrito

A fonte do manuscrito estudado encontra-se na página eletrônica

da Ohio University Libraries79. As páginas digitalizadas do manuscrito

têm como frase inicial destacada “Empiezan las Histórias del Origen de

los Indios de Esta Provincia de Gvatemala”, e foram transcritas e

traduzidas por Frei Francisco Ximénez, entre 1700 e 1704. O manuscrito

material encontra-se arquivado atualmente na Newberry Library, de

Chicago, Illinois, como parte do Ayer MS 1515. A nomenclatura “Ayer”

deve-se ao nome do colecionista Edward E. Ayer, que o doou à Newberry

Library, “MS” significa manuscrito, e 1515 é o número de catálogo.

O padre Ximénez numerou os fólios até 12, somente no lado

reto80 da folha. A partir desse fólio, a numeração passou a ser escrita com

79 http://library.osu.edu/projects/popolwuj/folios_esp/contents_esp.php

80 Frente da folha.

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76

lápis e com caligrafia diferente. O prólogo consta de oito páginas entre

fólio reto e fólio verso (frente e verso), com a numeração até 8. O texto

principal da tradução do Popol Wuj tem 112 páginas, entre fólio reto e

fólio verso, com numeração até 56.

Os Escólios constam de 12 páginas entre fólio reto e fólio verso,

com a numeração até 6. O tamanho das folhas é de aproximadamente 30

x 40cm, que estão atualmente encadernadas com capas que datam do

século XIX. As folhas são provenientes do sul da Espanha (Andaluzia), e

eram chamadas cuartillas, pois a folha de papel dobrava-se em quatro,

com uma cor branco marfim e marcas verticais (entre 7 e 10) feitas pelo

molde que prensava as folhas. Segundo Genette (2009), usar as folhas de

papel dobradas é uma prática européia que remonta aos séculos III e IV,

quando foram substituídos os códex de pergaminho pelos volumes de

papiro. O formato dobradura não indicava por si só as dimensões planas

de um livro [...] “um volume in-folio dobrado uma vez, (de onde dois

fólios ou quatro páginas por folha) ou in-quatro (dobrando duas vezes, de

onde oito páginas por folha) era um livro grande” (GENETTE, 2009, p.

22).

4.1.3 Título

O título é o primeiro “umbral da obra”. Genette (2009) afirma

que pode ser definido como um micro-texto, uma “unidade discursiva

restringida” de formas e dimensões variáveis que possuem a função de

designar, para o leitor, o objeto ou sistema semiótico que é, neste caso,

uma “história”. Outra função importante do título é a referencial ou

orientativa, que informa sobre o conteúdo da obra ou, quando menos,

sobre alguns de seus componentes. A primeira informação que os leitores

recebem da obra provém do título.

Tal e como o observou Recinos, o manuscrito

copiado pelo padre Ximénez não possuía título

propriamente dito. Os títulos escolhidos pelos

diferentes tradutores com a intenção de apresentar

suas versões são um bom índice para detectar a

interpretação global que projetam sobre o

conjunto dos textos. A partir de Brasseur, a

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77

enorme maioria das edições está identificada sob

o título de Popol Vuh. (LÓPEZ, 1999, pág. 47,

tradução nossa81).

No paratexto, um cabeçalho possui dados que Genette chama

‘oficiais’, ou seja, uma mensagem paratextual que o autor assume

abertamente como responsabilidade sua, cuja força ilocutória expressa

uma intenção ou um compromisso. No caso do manuscrito Ayer, sem

título definido, o seguinte cabeçalho (Figura 8) é a primeira página do

manuscrito, escrita em letras maiúsculas.

O papel do tradutor, de acordo com a teoria dos Estudos

Descritivos da Tradução, consiste em atuar como mediador. O processo

inicia-se quando o tradutor escolhe um ponto de adequação entre os

polissistemas culturais da língua fonte e o da língua alvo. No caso da

tradução da cópia do K‘iche’ fonetizado para o espanhol, realizada pelo

padre Ximénez (1700-1704), fica claro desde o cabeçalho que o autor

escolhe priorizar a cultura da língua espanhola. O sacerdote domínico,

limitado pela autoridade da Igreja Católica, precisa obedecer a

determinados preceitos e verbaliza, desde as primeiras linhas, seu

posicionamento de colonizador.

Figura 8 - Primeira página do Ms Ayer 1515.

Fonte: Ms Ayer 1515(XIMÉNEZ, 1701-1704, fólio i-reto)

81 “Tal como lo observó Recinos (25), el manuscrito copiado por el padre Ximénez

no tiene título. Los títulos elegidos por los distintos traductores a los efectos de

presentar sus versiones son un buen índice para detectar la interpretación global

que proyectan sobre el conjunto de los textos. A partir de Brasseur la enorme

mayoría de las ediciones están identificadas bajo el título de Popol Wuj.”

(LÓPEZ, 1999, p. 47).

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78

O texto deste cabeçalho diz: “Começam as histórias da origem

dos índios desta província de Guatemala traduzido da língua quiche na

língua castelhana para maior conforto dos ministros do Santo Evangelho

pelo R.P.F. Francisco Ximénez Cura Doctrineiro pelo Real Patronato do

Povo de Santo Tomás de Chuíla”(XIMÉNEZ, 1701-1704, p. 1, tradução

nossa82). Trata-se do cabeçalho de uma tradução com as seguintes

especificações:

1) O nome do tradutor: Francisco Ximénez.

2) A língua fonte e a língua alvo: k’iche’ - espanhol.

3) O tema: “as histórias da origem dos indígenas”.

4) A indicação do lugar onde foi criado: “as províncias de

Guatemala - Pueblo de Santo Tomás de Chuíla”.

5) Uma dedicatória expressa: “Aos ministros do Santo

Evangelho”.

Na primeira página do manuscrito, encontramos o que Genette

chama de “um conjunto um pouco complexo” (GENETTE, 2009, p. 55).

O tradutor posiciona-se frente ao público do pólo receptor. “Nota-se

claramente a intenção de resgatar e conservar o texto para usá-lo como

forma de conhecer o sujeito a ser catequizado” (LÓPEZ, 1999, p. 48,

tradução nossa83).

De acordo com Romanelli (2010, p. 101), traduzir é um ato

criativo que consta de um processo comunicativo, e Francisco Ximénez

verbaliza o objetivo da tradução no primeiro folio do manuscrito: facilitar

a compreensão dos textos para as autoridades da Igreja, responder ao

sistema do cânone barroco colonial católico e às normas culturais da

escolástica teocêntrica, posicionando o processo tradutório na perspectiva

do colonizador. Parafraseando Casanova (2002, p. 314), ao observar os

elementos políticos que transitaram durante a colonização, a língua

materna do colonizado foi cedendo paulatinamente à imposição da língua

do colonizador para construir seu lugar e existir na cidade ou no mundo.

82 Empiezan las historias del origen de los indios de estas provincias de gvatemala

traducido de la lengva quiche en la castellana para mas commodidad de los

minístros de el sto. Evangelio por el r.p.f. Franzisco Ximénez CVRA doctrinero

por el real patronato del pueblo de sto. Tomás de chuvilla. (XIMÉNEZ, 1701-

1704, p. 1)

83 “Se ve claramente la intención de rescatar y conservar el texto para utilizarlo como

forma de conocer al sujeto a ser catequizado” (LÓPEZ, 1999, p. 48).

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79

Uma das funções da tradução é a formação dos leitores (Pulido, 2015. s/p)

e a paratradução contribui para a formação de leitores de tradução ao

observar em detalhes os paratextos e sua compatibilidade com o conteúdo

traduzido.

4.1.4 Prólogo

Segundo Genette, o prefácio é um texto liminar, que pode ser

autoral, e consiste num discurso produzido a propósito do texto que o

segue ou que o antecede, de maneira que o posfácio será considerado uma

variedade de prefácio. No prólogo aqui em questão, Francisco Ximénez,

como catequizador, justifica a necessidade de conhecer o sistema de

crenças do povo colonizado, expressa alguns juízos de valor coerentes

com a Instituição da Igreja Católica, que exercia os desígnios da “Santa

Inquisição”. Em tom didático, “o prefácio assume uma função ao mesmo

tempo protocolar e mais circunstancial, ligada mais estreitamente ao

objetivo do texto” (GENETTE, 2009, p. 145).

Segundo Even-Zohar (1999, p. 32), a literatura pode ser

conceituada como uma “ferramenta para entender e atuar no mundo”, o

relato mítico do Popol Vuh proporcionava modelos de atuação, e continha

instruções práticas para o comportamento cotidiano e organização da

sociedade maia desde os tempos pré-hispânicos. “Os k’iches’ e maias que

vivem atualmente na Guatemala vêem no Popol Wuj parte do seu

passado, e talvez do seu futuro. Para eles, são textos aglutinantes e

referenciais da vida cotidiana.” (LÓPEZ, 1999, p. 17, tradução nossa84).

Na tradução de Ximénez, esta diretriz política fica muito mais explícita

que nas outras traduções, o tradutor verbaliza e explica seu ponto de vista,

justificando perante aos seus superiores o motivo que o levou a traduzir o

Popol Wuj, qual seja, a finalidade de conhecer a mitologia do povo

colonizado, para catequizar.

Tanto o Popol Wuj quanto a Bíblia Católica têm em comum esta

característica ‘aglutinante’, que transcende o texto literário, atingindo um

patamar místico reconhecido por uma sociedade, pois promovem uma

coesão social, ambas são culturas muito familiares para o Padre Ximénez,

84 “Los quiches y mayas que viven actualmente en Guatemala van a ver en el Popol

Vuh parte de su pasado y tal vez de su futuro. Para ellos son textos aglutinantes y

referenciales de su a vida cotidiana.” (LÓPEZ, 1999, p. 17).

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80

que estava praticamente imerso nelas. “Jimenes era espanhol. É verdade

que dos 63 anos em que viveu, 41 passou na Guatemala e, destes últimos,

32 nas regiões k’iche’ e kakchikel. Sem dúvida, foi o que teve o contato

mais prolongado e estreito com a população natural, mas não se pode

esquecer que era um frade domínico”(CHÁVEZ, 1979, p. 11, tradução

nossa85)

No prólogo do manuscrito (1701-1704), ele esclarece seus

objetivos, justifica seu ponto de vista perante o corpus escolhido para

traduzir, verbaliza suas impressões sobre as crenças religiosas da cultura

fundamentadas na cosmogonia do Popol Wuj. Na continuação, temos um

recorte do manuscrito (Figura 9), e no fólio ii reto, Ximénez escreve o

prólogo com caligrafia esmerada. Trata-se de uma página editada, cuja

caligrafia diferencia-se das páginas seguintes do mesmo prefácio.

Figura 9 - Prólogo

Fonte:Ms Ayer 1515 (XIMÉNEZ, 1701-1704, fólio ii-r).

Quadro 3 - Transcrição e tradução do Prólogo I

Esta mi obra, y trabaxo discurro, q’avra muchos q’ la tengan por la mas futil y

vana de las q’ he trabaxado, así lo pensaran muchos; y yo lo discurro al contrario,

porq’ entiendo ser la mas util, y necesaria q’ he trabaxado pues ademas de

sacar a luz lo q’avia en la antiguedad entre estos indios

Esta é minha obra. Penso que muitos leitores a considerarão a mais fútil de todas,

eu penso o contrário, creio que será a mais útil e necessária que já trabalhei, pois

ajudará a esclarescer o passado remoto entre os índios.

Fonte: Ximénez (1700-1704, f. ii r)86

. Tradução nossa.

85 “Jimenes era español. Es cierto que los 63 años que vivió, 41 los pasó en

Guatemala y, de estos últimos, 32 en las regiones ki-ché y kakchikel.

Indudablemente fue el que tuvo el contacto más prolongado y estrecho con la

población natural, pero no hay que olvidar que era también un fraile domínico.”

(CHÁVEZ, 1979, p. 11).

86 Disponível em: <http://library.osu.edu/projects/popolwuj/folios_esp/

contents_esp.php>. Acesso em 9 de agosto de 2011.

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81

Ximénez (1700-1704, Fólio ii r.), quando menciona as

características do relato: sincrônico “o que havia na antiguidade”, o

coletivo “entre estes índios”, o cultural “coisa em que em todas as nações

do universo tem gastado muito tempo e trabalho, homens grandes

rastreando os vestígios da venerável antiguidade” (Quadro 3), claramente

o tradutor procura os universais da espécie humana.

Quadro 4 - Transcrição e tradução do Prólogo II

Se reduçe esta mi obra a dar luz, y notiçia de los herrores, q’ tuvieron, en su gentilidad, y q’ todavia conservan entre si. Quise trasladar todas las historias a la

letra de estos indios, y también traduçirla en la lengua Castellana, y ponerle los escolios q’a la fin van puestos, q’son como anotaçiones de la historia en q’se van

declarandolas cosas de los indios, porq’ discurro q’ havra muchos curiosos, q’quieran saberlas, y con eso sino saben la lengua tendran façilidad, en poderlo

saber. y también pa. Desengañara algunos a quienes he oydo hablar de esta materia, q’ oya sea por no saber la lengua, o porq’ lo han oydo, en relaçion

adulterada, de voca de otros juzgan de estas historias, ser cosa muy conforme a razon, y a nuestra Sta. Fe e como yo mesmo lo he oydo de voca de un religioso

grave y q’ ano estar yo enterado ya pora verlo visto, y leydo me persuadiera al mesmo su dictamen por la grande autoridad de su persona, y de las personas q’m

refirio averselo dicho. A quien procuré disuadir de su dictamen, con la verdad de el caso, y prometiendo, q’ quanto antes pudiese tomaria esta materia entre manos,

para desengaño de muchos, q’se hallan engañados como he dicho o por ignorar la

lengua, y no entienden lo q’leen, ó por las falsas relaçiones q’les han dado.

O objetivo da minha obra resume-se em dar luz, e relatar os erros que (os maias)

cometeram em seu paganismo, e que ainda conservam. Quero mostrar todas as estórias escritas destes índios (Popol Wuj), traduzi-las para a língua castelhana, e

introduzir os “escólios”, que são comentários sobre a narração em que se revelam as crenças dos índios, penso que haverá muitos curiosos, que queiram conhecê-

las, e se não sabem a língua (K´iche) terão maior facilidade. Será útil também para alguns que já ouviram falar deste assunto e tal vez não sabem a língua

(Kíche’), pode ser interessante também para os que conheceram uma versão adulterada (da obra) e julgam estas estórias muito coerentes e de acordo com a

nossa santa fé (católica), eu mesmo tenho ouvido esta opinião da boca de um

religioso (enfermo) grave, [...] que quase me convenceu devido a autoridade de sua pessoa, e das pessoas que comentaram com ele estes asuntos. Prometi, que

quanto antes eu pudesse, tomaría este texto entre as mãos, para desilusão de muitos, que estão enganados por falsas interpretações.

Fonte: Ximénez (1700-1704, f. ii r)87

Tradução nossa.

87 Disponível em: http://library.osu.edu/projects/popolwuj/folios_esp/ com

tents_esp.php. Acesso em 9 de agosto de 2011.

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82

Este excerto (Quadro 4) mostra Ximénez colocando-se no papel

central da língua-cultura hegemônica. Sente-se responsável por “dar luz

e notícia dos erros que tiveram no seu paganismo os índios”, colocando

sua tradução no papel de documento de denúncia de um tempo anterior à

catequese. A palavra ‘gentil’, em termos bíblicos, significa pagão88, e é a

justificativa do seu trabalho, já que o objetivo da tradução da língua

k’iche’ para o castelhano é a difusão: “que haverá muitos curiosos que

queiram saber”. Apresenta também o intuito de esclarecer as dúvidas

criadas em torno da semelhança do texto do Popol-Wuj com os

Evangelhos, dizendo que se traçaram falsas relações de semelhança entre

o texto maia e a Bíblia.

Quadro 5 - Transcrição e tradução do Prólogo III

Es verdad q’desde su prinçipio, y q’empieza a tratar de Dios diçe cosas tan conformes a la Sta. escritura, y fee catholica, aludiendo a lo q’sabemos por

revelaçion de el espiritu Sto. en las Sanctas escripturas, pero como quiera q’estos se hallen embueltas en mil mentiras, y quentos, no se le deve dar mas credito q’ el q’ tiene el Pe. de mentiras satanas quien fue su Autor, sin duda, para engañar, y perder a estos miserables saliendo tan impuras las verdades catolicas como lo es la fuente de ado proçeden. como las q’ procura dar porvoca de Arrio, lutero, caluino, Mahvma, y otros heresiarcas, para perder al christianismo; q’ aunq’ sea

asiq’ embuelban tantas verdades catolicas en sus desatinos como se hallan viçiados de falsas inteligençias, y opiniones contrarias a lo q’ N. Sta. Me Yglesia,

tiene y cree, y enseña, de ay es q’no se puede dar credito alguno asemejantes embaydores.

É verdade que desde o início o (Popol Wuj) trata sobre o ser de Deus e expressa idéias que estão de acordo com a Santa escritura e fé católica. Me refiro ao que

conhecemos por revelação do espírito Santo nas Santas escrituras. Este livro maia encontra-se envolvido em mil mentiras e não se deve acreditar nele, pois o “pai da mentira” foi seu autor, sem dúvida, para enganar e perder a estes míseros (os índios), resultando tão desvirtuadas as verdades católicas devido a fonte da qual procedem. (Como a fonte que inspirou Arrio, Lutero, Calvino, Mahoma e outros heresiarcas, para arruinar o cristianismo). Pelo fato de envolver tantas

verdades católicas em seus disparates, mas, como estão acostumados com falsas interpretações e opiniões contrárias ao que a Nossa Santa Igreja acredita e ensina

não se pode dar crédito algum a semelhantes mentirosos (aos autores do Popol Wuj)

Fonte: Ximénez (1700-1704, f. iir)89. Tradução nossa.

88 “Os apóstolos e os irmãos de toda a Judéia ouviram falar que os gentios também

haviam recebido a palavra de Deus.” (Bíblia, Atos 11, vers.1).

89 Disponível em: <http://library.osu.edu/projects/popolwuj/folios_esp/contents

_esp.php>. Acesso em 9 de agosto de 2011.

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83

Observando o sentido do prólogo do manuscrito (Quadro 5),

encontramos verbalizado o conceito colonialista católico, que

considerava que fora da igreja católica não existia religião, e que foi

aplicada ao pé da letra durante a inquisição.

As páginas seguintes iii-r, iii-v e iv estão escritas em língua

k’iche’, e a caligrafia é mais livre, com características de rascunho. A

página iii-r (Figura 10) intitula-se “Salutación”, e no inicio do texto

encontramos uma frase parcialmente truncada em espanhol: “Para que do

biene a tomar poseción del pueblo el P. Les ha? um gran lengua quiche”,

a continuação do texto está integralmente escrita em k’iche’, com a

palavra ‘Dios’ intercalada de tempos em tempos.

Figura 10 - Fragmento I, “Salutación”

Fonte: Ms Ayer 1515 (XIMENEZ, 1700-1704, f. iii-r)

Na página III-V (Figura 11), encontramos duas saudações sob o

título de “Outra salutación”, esta é a única página do prólogo escrita na

frente e no verso, com algumas rasuras e escrita em k’iche’, com exceção

dos subtítulos.

Page 85: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

84

Figura 11 - Fragmento II, “Outra Saluctación”

Fonte: Ms Ayer 1515 (XIMENEZ, 1700-1704, f. iii-v)

A página iv-r (Figura 12) tem um pequeno texto em modo de

epígrafe, está escrita em k’iche’ somente na página da frente, a caligrafia

é legível e o texto contém uma rasura.

Figura 12 - Fragmento III

Fonte: Ms Ayer 1515 (XIMENEZ, 1700-1704,f. iv-r)

4.1.5 Posfácios, escólios do manuscrito Ms Ayer (1515)

Segundo Genette, os paratextos, no caso pontual os posfácios,

costumam ter “funções prefaciais (que) diferem conforme os tipos de

prefácio” (GENETTE, 2009, p. 175). Os textos escritos por Ximénez

nestes escólios respondem a um “processo tipicamente retórico de

persuasão [...] que a retórica latina chamava captatio benevolentiae,[que]

se trata, mais ou menos, diríamos, em termos mais modernos, de valorizar

Page 86: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

85

o texto sem indispor o leitor” (GENETTE, 2009, p. 177) já que pretende

informar aos Ministros da Igreja sobre as “coisas dos índios”. Devemos

esclarecer que estes leitores que Ximénez menciona eram os Ministros da

Inquisição. Estes notários deviam conhecer leis e ser espanhóis homens,

sem descendência nem casamento com judias, mouras ou mestiças. Eram

cargos muito cobiçados pelo prestígio social que desfrutavam, além dos

altos salários. Para poder exercer esta tarefa, deviam apresentar

documentos dos seus antepassados e provar que tinham a chamada

“pureza de sangue”.

Em Lima, no final do século XVI [...] o inquisidor

dom Juan Ruiz de Prado relatava ao Conselho

Supremo que, ao examinar as provas genealógicas

dos Comissários e familiares, havia podido

comprovar que muitos não ofereceram as

informações de rigor e que outros estavam

casados com quarteironas90 (mestiças), e mouras

(negras), motivo pelo qual teve de afastá-los do

Tribunal. (ESPEJO, 2011, p. 322, tradução

nossa91)

Neste contexto, firma a importância da obra no sentido de

“conservar a lembrança do passado” (GENETTE, 2009, p. 177), relatando

“Histórias da origem dos Índios”, como consta no cabeçalho. Com efeito,

trata-se de “estórias” ou relatos de fatos fantásticos que valorizam o

assunto a partir de um ponto de vista didático, com vistas à catequização

mais eficaz. Existia nas práticas espanholas o conceito de pureza de

sangue, a partir do qual se justificava a tarefa cerceadora da cultura

colonizada. Tal posicionamento parece estar explícito nesses paratextos.

Uma das funções assinaladas por Genette concerne à veracidade. A este

90 cuarterón, na.(Der. del lat. quartarĭus, y este der. de quartus, cuarto, por

tener un cuarto de indio y tres de español).1. adj. Nacido en América de

mestizo y española, o de español y mestiza. U. t. c. s.Real Academia

Española.http://lema.rae.es/drae/?al=cuarterona. Acesso em 12 de janeiro de

2015

91 En Lima, a fines del siglo xvi,[…] el inquisidor don Juan Ruiz de Prado daba

cuenta al Consejo Supremo que, al examinar las pruebas genealógicas de los

Comisarios y Familiares había podido comprobar que muchos no rindieron las

informaciones de rigor y que otros estaban casados con cuarteronas y moriscas,

motivo por el cual hubo de separarles del Tribunal (ESPEJO, 2011, p. 322)

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respeito, o referido autor comenta que: “o único mérito que um autor pode

atribuir-se por meio do prefácio, provavelmente porque depende mais da

consciência do que do talento, é o de veracidade, ou pelo menos de

sinceridade, isto é, do esforço no sentido da veracidade.”(GENETTE,

2009, p. 184). Neste sentido, Ximénez é perfeitamente fidedigno e

coerente com a doutrina católica de sua época, que lhe inspira uma série

de juízos de valor e impressões que registra no posfácio transcrito e

traduzido conforme abaixo reproduzido:

Figura 13 - Cabeçalho do Posfácio

Fonte: MS Ayer 1515(XIMENEZ, 1700-1704, Escólios, Prólogo, fólio 1r.)

Escólios às histórias (estórias) da origem dos

índios, escoliadas pelo R. P. F. Francisco

Ximénez, cura catequista, pelo real patronato da

Vila de Chichicastenango da sagrada ordem de

predicadores para maior noticia aos ministros das

coisas dos índios (XIMENEZ, 1700-1704,

Escólios, Fólio 1r, tradução nossa).

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Os Escólios são paratextos que o padre Ximénez inseriu no

posfácio para informar aos seus superiores eclesiásticos as tradições e o

modus vivendi do povo K’iche’ a partir de seu próprio ponto de vista.

Nele, são expressas impressões sobre religião, mitologia e rituais próprios

dos K’iches’, assim como opiniões sobre algumas dessas manifestações.

Constam de 6 fólios manuscritos que iniciam com um cabeçalho em letras

maiúsculas, tal como pode ser constatado na Figura 13 anteriormente

apresentada.

A transcrição que apresentaremos nos Quadros 6 e 7 foi realizada

em 1879 por Carl Scherzer para sua edição publicada em Viena sob o

título “Las historias del origen de los Indios de esta provincia de

Guatemala”. Na publicação fac-símile da Universidade de Ohio92,

encontramos seis fólios, e embora Scherzer transcreva um texto muito

maior, nos ativemos ao manuscrito que dispomos on-line, cujos subtítulos

são: Prólogo de cinco páginas (Fólios 1r, 2r, 2v, 3r, 3v), transcrito e com

tradução própria para o português, e o subtítulo “Del ser de Dios” (Fólios

4r; 4v).

Quadro 6 - Escólios. Prólogo

PROLOGO

Cosa cierta y averiguada entre todos los que conocen índios, que es la gente más

irregular en sus cosas, que se ha descubierto en toda la redondez de la tierra, y así

muchos hombres de buen talento cada día se ven desatinados en sus cosas, pues,

cuando les parece que ya están al cabo del conocimiento de quienes son los

indios, se hallan tan en los principios de su conocimiento y comprehensión que

todo lo que han adquirido con su estudio y cuidado para mejor poder gobernar,

no le sirve ya en las cosas que de nuevo se le ofrecen.

PRÓLOGO

A opinião de todos os que conhecem índios é de que estes são as pessoas mais

irregulares já vistas sobre a face da terra. Muitos homens inteligentes (espanhóis)

dedicam-se diariamente a compreender como vivem, mas, depois de estudar seus

hábitos e acreditar que alcançaram compreensão sobre seus costumes para poder

governar melhor, surgem mais dúvidas.

Fonte: Ms Ayer 1515(XIMÉNEZ, 1700-1704, Escólios, fólios 1r). Tradução nossa.

92 http://library.osu.edu/projects/popolwuj/folios_esp/contents_esp.php acesso em

28 de dezembro de 2014.

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O padre Ximénez utiliza o adjetivo “irregulares” para definir a

forma como os K’iches’ se comportavam e pensavam. A grande distância

epistemológica entre as duas culturas foi lida desta forma pelo sacerdote

católico que, em seu esforço para compreender os costumes maias,

sempre achava novos desafios em seus estudos que o faziam se sentir

confuso. Devemos destacar que classifica os espanhóis como “homens de

bom talento” enquanto que os maias são classificados como os “piores

que se tem descoberto na face da terra”. Parece que o conceito

eurocentrista de superioridade fica explicitado em seu escrito.

Quadro 7 - Escólios. Prólogo. (Continuação)

Muchos ha habido que han querido dar a entender el conocimiento del indio en

sus escritos de historias y sumas y otros escritos; pero pienso que les ha sucedido

lo que a mi me sucederá en todos mis escritos: que aunque he procurado dar a

entender lo que ellos son, al cabo pienso que no habré dicho nada. El Doctor

Padre Apiano, cosmógrafo del Emperador Carlos V, demarcando la isla española,

les quiere dar a conocer el mundo, diciendo: que son gente, indadis liberalissimi,

in accipiendo cupidissimi, en el dar muy liberales, en el recibir muy codiciosos, y

aunque consumen todo un dia dando vueltas a un palo. […] son gentes codiciosas

y desdichadas, pues convidándose ellos unos a otros en sus fiestas y desde un

pueblo a otro en sus festividades, se le ha de corresponder con el mismo número

y especie que el que dio al otro cuando fue su convidado, y solo um plátano

menos que se le corresponda, es materia de tanto sentimiento que por aquello

solo se acaba la amistad y correspondencia de muchos años. […]

Houve muitos (espanhóis) que tentaram explicar o conhecimento dos índios em

seus registros históricos; porém, acredito que lhes aconteceu o mesmo que a

mim: ainda que tenha tentado fazer isso, no fim, penso que não dissem nada. O

Dr. Padre Apiano, cosmógrafo do Imperador Carlos V, descrevendo os domínios

espanhóis, explica que (os colonizados) são pessoas (indadis liberalissimi, in

accipiendo cupidissimi),desmedidas quando oferecem e gananciosas quando

recebem. São capazes de desperdiçar um dia inteiro dando voltas ao redor de

uma estaca [num ritual] [...].São pessoas gananciosas e infelizes, quando

convidam um ao outro e, às vezes, de um povoado a outro em suas festividades,

esperam uma retribuição com o mesmo número e igual espécie de alimentos que

ofereceram, e apenas uma banana a menos quando são convidados, é o suficiente

para acabar com a amizade de muitos anos.[...]

Fonte: Ms Ayer 1515 (XIMÉNEZ, 1700-1704, Escólios, fólios 1v). Tradução nossa.

Francisco Ximénez menciona o “conhecimento do índio” e

reconhece sua própria dificuldade para compreendê-los. Expressa

claramente a idéia de produtividade ligada ao tempo em benefício da

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ideologia espanhola, quando condena a forma como os K’iches’

“desperdiçavam” o tempo deles em rituais monótonos, porém se

mostravam gananciosos e mesquinhos com coisas corriqueiras como

frutas oferecidas numa festividade.

Quadro 8 - Escólios. Prólogo (Continuação)

Y todo es tan general, que lo mismo es uno que otro, el rico y el pobre, el que es

cacique o Principal, como el más igual; todos son iguales, y tan añadidos unos

con otros, y así dijo bien quien los llamó niños con barbas, y a la verdad ellos son

como muchachos en todo. Ni vale ver las contradicciones que en sí envuelven,

que con la cortedad de su talento no reparan en esto y aquí se conoce la malicia

de la bestia infernal, como les sugirió mentiras tan adecuadas a sus talentos para

más tenerlos embaucados, y como quiera que no solamente en estas historias se

hallen sólo estas mentiras y quimeras, sino también nuestras verdades católicas, y

que tiene y cree nuestra Fe católica, reveladas por el Espíritu Santo de la Sagrada

Escritura. De ahí es que no se debe hacer tampoco caso de estas historias

respecto de la mucha tierra que el demonio gana entre esta gente con estos

errores que entre ellos tiene sembrado desde el tiempo de la gentilidad…

Na sociedade maia não há diferenças no convívio entre ricos e pobres, entre

caciques e Principais; todos se consideram iguais e são muito unidos. Quem os

considerou como “crianças com barbas”, entendeu sua ingenuidade. Eles não

reparam nas diferenças sociais que os diferenciam, devido a sua falta de

inteligência não conseguem entender tais diferenças, neste ponto se reconhece a

malícia do demônio, que lhes ensinou mentiras adequadas a suas capacidades

para dominá-los, deformando também as verdades católicas e nossa Fé, reveladas

pelo Espírito Santo nas Sagradas Escrituras. Mas não devemos dar importância a

estas histórias, sobre o terreno que o demônio ganha entre esta gente, com os

erros que têm semeado entre eles desde o tempo do paganismo.

Fonte: Ms Ayer 1515 (XIMÉNEZ, 1700-1704, fólios 2r).Tradução nossa.

No excerto anterior (Figura 9) Ximénez descreve uma

característica do cotidiano dos K’iches’ sobre a forma de se relacionarem

entre si, expressando que embora existissem diferenças sociais, estas não

interferiam nas interações sociais. Em sua descrição, utiliza juízos de

valor, como por exemplo: “limitados em seus talentos”, e “ingênuos como

crianças”, atribuindo a esta ingenuidade a razão para que a sociedade dos

K’iches’ tenha sido “vítima do demônio”, que teria nela encontrado

“mentiras adequadas aos seus talentos”.

Na tradução do texto, Francisco Ximénez (1700-1704) teve a

preocupação de respeitar o texto fonte. Respeitou também a estrutura

linear do texto e a diversidade temática. Ao justificar-se no prólogo

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perante os desígnios da inquisição e, ao expressar sua opinião sobre a

cosmogonia maia - tão alheia ao seu conhecimento de mundo - como

“obra do demônio”, isentou-se de qualquer suspeita dos inquisidores, e

ganhou certa liberdade para traduzir. Como estudioso e catequizador,

precisava conhecer o ideário teológico maia para concretizar seus

objetivos didáticos que geralmente tentavam aproveitar as crenças, mitos

e a religião dos povos colonizados. Nos escólios da sua tradução, Pe.

Ximénez expressa sua opinião sobre os conceitos que regiam os mitos dos

k’iches sob a perspectiva colonizadora. “... Com esta semente maligna e

planta daninha que o demônio deixou semeada entre eles, destas histórias

da sua origem e ouvindo cada dia e vendo com seus próprios olhos todo

indício das superstições que possuem; alguns acham graça, sem reparar

na origem e raiz de onde provêm, para procurar o remédio a tempo”

(SCHERZER, 1857, p. 145, tradução nossa93). A palavra ‘remédio’,

utilizada no texto anterior, que alude à evangelização, tem uma razão de

ser. Segundo Stallaert (2006, p. 176-178) no prólogo da Gramática

Castelhana de 1492, Antonio de Nebrija interpreta o trabalho dos reis da

Espanha como reconstituição física e depuração espiritual do corpo

nacional. O individual e o comunitário encontravam-se, nessa época, em

relação mimética: assim como um corpo individual, o corpo nacional

proveniente da interpretação do corpo místico, de acordo com a doutrina

cristã, possui uma dimensão material, física. Essa conceituação

organicista da comunidade político-religiosa espanhola explica a

terminologia médica com que se interpretavam as impurezas e

imperfeições do corpo coletivo. No texto Edicto de Expulsión de los

judíos de Castilha (1492)94, aparecem os termos ‘remediar’, ‘remédio’,

‘por contágio’ e, por fim, a mais significativa e cruel: ‘purga’. Interessante

também resulta o relato de uma crença que os religiosos catequistas

católicos tinham no seu imaginário castiço referente à origem dos povos

colonizados, materializados no texto que Ximénez escreve nos escólios,

transcrito por Scherzer:

93 “Con esta mala semilla y zizaña que el demonio dejó sembrada entre ellos, de

estas historias de su origen, y oyendo cada dia y viendo por sus ojos todos los

retoños y asomar de la supersticiones que tienen; los mas lo toman á cosa de

cuentos y risa, sin reparar en el origen y raíz de donde proviene para procurar el

remedio con tiempo” (SCHERZER, 1857, p.145).

94 <http://www.columbia.edu/cu/spanish/courses/spanish3349/03edadmedia/ pdf

s/edicto.pdf>

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91

[...] seguramente estes índios descendem das dez

tribos que se perderam dos judeus, e que não

voltaram para sua pátria e assim conservaram por

tradições todos os acontecimentos que nos refere

o Sagrado Texto, e o demônio os foi envolvendo

em muitíssimos erros, que se não fossem

descendentes das tribos, o demônio como era tão

sábio, suspeitando por algumas conjecturas a

vinda do Santo Evangelho a estes lugares do

mundo, lhes sugeriu mentiras envolvidas em

muitas verdades católicas das que ensinou o

Espírito Santo na Sagrada Escritura, com o fim de

que, ouvindo os índios o que ensinavam os

Ministros do Santo Evangelho de Deus e suas

obras da encarnação do verbo, [...] mais se

apegassem aos seus erros. (SCHERZER, 1857, p.

146, tradução nossa95).

Pela análise realizada, conclui-se que a opinião da suposta

origem judaica atribuída aos maias, embora insólita, justifica-se pelo

processo de eugenia96 praticado no século XV e XVI pela igreja-estado

espanhola contra todos os que fossem ‘infiéis’ e não tivessem a pureza de

sangue dos velhos cristãos. “A construção etnonacional de Espanha pelo

seu caráter teológico se fez presente primeiro nas ordens religiosas, para

cuja depuração se solicitou a instauração da Inquisição.” (STALLAERT,

95“...el venerable Padre Fray Domingo de Vico en el capítulo 101 de la

segunda parte de su ‘Teologia Idorum’: a que estos indios descienden de

las diez tribus que se perdieron de los judíos, y que no volvieron a su

patria, y así conservaron por tradiciones todos los sucesos que nos refiere

el sagrado testo, y el demonio se los fue envolviendo en muchísimos

errores y lo otro, a que de no ser así que descienden de aquellas diez tribus,

el demonio como tan sabio, alcanzando por algunas conjeturas la venida

del Santo Evangelio, a estas partes les sugirió estas mentiras envueltas en

muchas verdades católicas de las que enseñó el Espíritu Santo en la

Sagrada Escritura, con fin de que oyendo los indios lo que habían de

enseñar los Ministros del Santo Evangelio de Dios y sus obras de la

encarnación del verbo […] mas se arragasen en sus errores.”

(SCHERZER, 1857, p.146). 96 E ugenia: termo cunhado por Francis Galton (1904), que significa "bem nascido".

Galton definiu eugenia como o estudo dos agentes sob o controle social, que

podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações, seja

física ou mentalmente. Em outras palavras, “melhoramento genético”.

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92

2006, p. 215). Os colonizadores espanhóis queimaram os códices (quase

todo o acervo escrito maia) movidos por essa ideologia, “como sabia

Heine, onde se queimam livros, depois se queimarão os homens.”

(STALLAERT, 2006, p. 64).

O médico não pode aplicar com acerto os

medicamentos ao enfermo (sem) que conheça de

onde procede a doença [...] Para predicar contra

estas coisas, e ainda para saber se existem, é

imprescindível saber como as usavam em tempos

de idolatria, que por falta de não saberem isto, na

nossa presença, fazem muitas coisas sem que as

entendamos. (DURÁN apud LIENHARD, 2009,

p. 1, tradução nossa97).

Na introdução encontramos uma descrição da estruturação dos

capítulos do Manuscrito de Ximénez (1700): “Este documento curioso

com 112 páginas com letra muito fechada, com uma tinta tão pálida que

provavelmente em poucos anos será impossível ler o original”

(SCHERZER, 1857, p. XVI, tradução nossa98). É considerado pelo autor

como um texto sem divisões, embora reconheça que provêm da oralidade

recolhida em épocas diferentes, mas com a unicidade da tradição. “[...]

Podem notar-se as diferenças básicas entre os períodos clássico, clássico

tardio e pós-clássico. A distinção é tão clara que é difícil conceber como

ideias filosóficas e rituais tão diferentes podem ter lugar no mesmo texto.

A resposta radica, a meu ver, no narrador, que na época da colônia levou

as lendas às letras latinas.” (MEGGED apud LÓPEZ, 1999, p. 40,

tradução nossa99)

97 “El médico no puede acertadamente aplicar las medicinas al enfermo (sin) que

conozca de qué humor, o de qué causa proceda la enfermedad […]. Para predicar

contra estas cosas, y aún para saber si las hay, menester es de saber cómo las

usaban en tiempo de su idolatría, que por falta de no saber esto en nuestra

presencia hacen muchas cosas idolátricas sin que lo entendamos” (DURÁN apud

LIENHARD, 2011, p. 1).

98 “Este documento curioso comprende 112 páginas con letra muy cerrada, con una

tinta tan pálida que probablemente en pocos años será imposible leer el original”.

(SCHERZER, 1857, p. XVI).

99 “pueden percibirse las diferencias básicas entre los periodos clásicos, clásico

tardío y postclásico. La distinción es tan clara que es difícil concebir cómo ideas

filosóficas y rituales tan distintas puedan tener lugar en un mismo texto. La

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93

No subtítulo dos escólios: sobre el ser de Dios, encontramos

alguns comentários do tradutor dirigidos aos seus superiores. Ele emite

opinião sobre os difrasismos utilizados para definir Deus. Afirma que os

K´iches’ foram enganados pelo demônio, e sugere alguns pontos didáticos

específicos para realizar a evangelização. Scherzer, nas notas da edição

de 1857, aborda o problema que os curas tiveram para catequizar,

resultando com frequência em uma tarefa superficial, com objetivos

truncados, causados pela resistência que opunha os povos colonizados aos

espanhóis, e em segundo lugar pela falta de conhecimento dos sacerdotes

sobre as línguas nativas, “...estas misturas singulares das tradições

bíblicas com o paganismo do novo mundo eram principalmente causadas

pela instrução imperfeita que os índios receberam dos primeiros

missionários.”(SCHERZER, 1857, p.146, tradução nossa100). No seguinte

excerto dos escólios, Ximénez se esforça para explicar pontualmente estes

problemas didáticos sobre teologia.

Quadro 9 - Escólios “Sobre el ser de Dios”

Tzacol-bitol, que quiere decir el que hace o fabrica algo, expresa su posita materia pues ese es el nombre que se le halló más adecuado para explicar a

Dios todavía porque se puede discurrir ser dado por el demonio como para dar a entender que no es criador, se deben explicar a los indios estos nombres de Tzacol-bitol, y detestar la inteligencia que el demonio pudo darle llamándole Alomga-holom (el que tiene hijos) y por cuanto esto se dice propiamente del hombre y los animales que per generationem se multiplican, también se les debe explicar no ser nosotros hijos de Dios de la misma forma que lo somos

de nuestros padres.

Tzacol-bitol, em k’ iche’, significa: ‘quem faz ou fabrica alguma coisa’, [...] esse é o nome que os maias acharam mais adequado para explicar a Deus.

Esse nome parece ter sido sugerido pelo demônio para induzir a idéia de que Deus não é o “Criador”. (Os catequizadores) devem explicar aos índios o

significado de Tzacol-bitol, e rejeitar a perspicácia do demônio que o chamou “aquele que tem filhos” (Alomga-holom). [...] Esclarecer que a paternidade de

Deus é diferente da paternidade dos homens e da reprodução dos animais.

Fonte: Ms Ayer 1515 (XIMÉNEZ, 1700-1704, Escólios, prólogo, f. 2v.) Tradução

nossa.

respuesta radica, a mi entender, en el narrador que ya en la época de la colonia

llevó las leyendas a letras latinas.” (MEGGED apud LÓPEZ, 1999, p. 40).

100 Estas mezclas singulares de las tradiciones bíblicas con el gentilismo del nuevo

mundo eran principalmente causadas por la instrucción imperfecta que los indios

recibieron de los primeros misioneros (SCHERZER, 1857, p.146)

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Observa-se o objetivo pedagógico proposto por Ximénez (1700-

1704) ao esclarecer alguns conceitos da doutrina cristã, como a

paternidade do Deus católico que, segundo ele, pela intervenção do

demônio ficou mal explicada: “É certo que são modos de explicar o ser e

o poder de Deus” (XIMENEZ 1700-1704, escólios, fólio 3r),pois, de

acordo com o tradutor, o texto pode confundir a paternidade humana com

a divina.

Quadro 10 - Escólio sobre a gestação dos “Gêmeos Heróicos”

Esto es cierto, que son modos de explicar el ser y el poder de Dios: pero por

cuanto pudo el demonio darles a entender como de facto consta, que

Hunhunahpu, a quien tuvieron por Dios, con la saliva concibió en la doncella

Xquic […] a Hun-ahpu, un tirador. Este Dios que el demonio da a entender lo

hace Duodeidad porque no nombra más que dos sujetos: uno llamado Hunahpu-

Vich, un tirador tacuasin y a Ahpu-Vuh, un tirador lobo

Algumas formas de explicar o ser e o poder de Deus foram influenciadas pelo

demônio, fazendo com que os índios acreditassem [num mito] que

Hunhunahpu101 (Deus pai), teria cuspido na mão de uma donzela chamada

Xquic,o que provocou a gravidez da qual nasceria Hun-ahpu102, um tirador103.

Esta concepção de Deus que o demônio da a entender é um ser “duplo”104, já que

nomeia dois sujeitos: um chamado Hunahpu-Vich, um tirador tacuasin105 e outro

chamado Ahpu-Vuh, um tirador lobo106

Fonte: (XIMENEZ, 1700-1704, fólios 3r). Tradução nossa.

Outro assunto igualmente complexo que Ximénez aborda neste

paratexto (Quadro 10) é o mito da gravidez de uma virgem, fundamentada

num episódio do Popol Wuj que descrevemos em seguida: Hunhunahpu

é o nome de um personagem que foi chamado para descer ao

“inframundo” pelos deuses da morte, onde foi desafiado a uma partida do

jogo de bola maia (Chaaj em K´iche’), a qual ele perdeu e foi morto.

101 Pai dos Gêmeos heróicos

102 Este nome representa os Gêmeos heróicos, Hunahpu-vuh e Hunahpo-Vich, mas

Ximénez não aceita que são duas crianças.

103 Tirador na cultura k’iche’ é sinônimo de caçador, pois eles caçavam atirando com

cerbatanas aos animais, aptidão principal dos gêmeos heróicos.

104 Aqui fala do ser duplo representado pelos dois irmãos gêmeos.

105 Caçador de gambás.

106 Caçador de lobos.

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Depois de muito tempo, cresceu no bosque uma árvore na qual a cabeça

de Hunhunahpu vivia como se fosse um fruto. Xquic era uma jovem

virgem que um dia olhou para esta árvore e se aproximou. Ela conversou

com a cabeça de Hunhunahpu e ele mandou que ela estendesse a sua mão,

onde ele, então, depositou sua saliva sagrada. Depois deste

acontecimento, ela ficou grávida dos gêmeos heróicos. Este mito impôs

aos sacerdotes católicos um grande conflito teológico, cuja linha de

raciocínio chegou até o demônio como o responsável pela constituição de

ideias diferentes daquelas presentes na Bíblia, manifestadas na cultura

K´iche’. Porém, a semelhança de circunstâncias cosmogônicas como a

fecundação de uma virgem em circunstâncias miraculosas, parece ter sido

aproveitada pelos primeiros catequizadores, fato que Ximénez critica.

Logo, comenta o caso da “dupla deidade”, os gêmeos heróicos, que

respondem aos princípios que regem a epistemologia da obra maia, a nível

lingüístico por exemplo os difrasismos se apresentam como conceitos

multifacetados complementares e indissolúveis, esta organização levou

Ximénez a considerá-la como uma heresia contra a Santíssima Trindade.

4.2 POP WUJ, EL LIBRO DEL TIEMPO DE DON ADRIÁN I. CHAVEZ

4.2.1 Peritexto editorial Pop Wuj de Don Adrián Inés Chávez - capa,

página de rosto e seus anexos.

Seguindo os critérios de Gérard Genette (2009), neste subtítulo

realizamos uma descrição das características de uma edição escolar de

bolso do “Pop Wuj” de Don Adrián Inés Chávez (2007).

De acordo com as noções da Paratradução:

Ninguém contestaria a importância da noção de

texto em tradução, já que, reconhecidamente,

tradutores, de fato, traduzem textos. Todavia,

ressalta-se que textos não existem por si próprios.

Ao contrário, para que sua presença seja uma

realidade no mundo editorial, eles sempre

dependerão dos paratextos. Afinal, textos existem

somente para serem lidos, porém não há a

possibilidade de leitura sem uma apresentação

adequada do texto por seus editores, fazendo uso

de diferentes produções paratextuais.(YUSTE

FRIAS, 2014, p. 25)

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4.2.1.1 Capa do Pop Wuj (CHAVEZ,2007)

Na capa desta edição (Figura 14), encontramos informações

bastante detalhadas. O título “Pop Wuj” apresenta a inovação fonética nos

estudos da língua K‘iche’, fruto do trabalho de pesquisa do tradutor, que

acabou demarcando um divisor de águas nesta disciplina, visto que, até o

momento, era utilizada a grafia “Popol Vuh”, proveniente do ano de 1861

quando, segundo López (1999, p. 32), Brasseur de Bourbourg o publicou

em Paris com o título “Popol Vuh. Le livre sacré et les Mithes de

L’Antiquités Américaines, avec Les Livres héroïques des Quichés”.

Alguns tradutores conservam esta grafia do século XIX, outros, como

Sam Colop (2011), reconhecem a grafia atualizada. O título “Pop Wuj:

Libro del Tiempo” de Chávez alude ao tempo mítico da cosmogonia, com

a qual o livro inicia, e ao tempo histórico das dinastias e grupos com a

importância primigênia dos códices: “Os códices eram para os maias algo

mais que o meio de conservar seus conhecimentos e tradições; eram o

símbolo de todo o sagrado e digno de respeito, a chave para compreender

o espaço e o tempo e para situar-se neles, a norma de vida e o princípio

de identidade do seu ser comunitário” (DE LA GARZA, 1998, p. 68,

tradução nossa107)

Figura 14 - Capa do Pop Wuj.

Fonte: Chavez (2007)

107 Los códices eran para los mayas algo más que el médio de conservar sus

conocimientos y tradiciones; eran el símbolo de todo lo sagrado y digno de

respeto, la clave para comprender el espacio y el tiempo y para situarse en ellos,

la norma de vida y el principio de identidad de su ser comunitario”(DE LA

GARZA, 1998, p. 68)

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Esta edição foi escolhida por ser muito utilizada nas escolas da

República Argentina e cuja leitura recomenda-se no Ensino Médio. O

tamanho da capa é de 11 x 19,5cm (ou de bolso), a página de rosto contém

uma ilustração circular e o nome da coleção a que pertence (“Biblioteca

de Cultura Popular”), como anexo apresenta mais uma página com

desenhos zoomorfos maias simplificados em preto e branco, um na parte

superior e outro na parte inferior. Na continuação, encontramos o título

do livro e as especificações autorais do prefácio, a repetição do nome da

coleção e o número 7, que corresponde ao volume, sendo, por fim,

mencionada a editora (“Editora del sol”).

No verso desta página, encontramos a ficha técnica da edição: 1ª

edição, Buenos Aires, cuja edição é de 2007. Possui 176 páginas e ISBN

978-950-9413-13-9. Especifica o nome do diretor da coleção: Adolfo

Colombres, e também do desenhista: Ricardo Deambrosi, e uma nota

explicativa onde se lê: “Ilustrado com signos y dibujos de los códices

mayas”. Referencia a ilustração da capa: “Códice ‘Dresde’ kumatzin Wuj

Jum” (detalhe). Em seguida, tem mais uma ilustração circular sem

nenhuma legenda, especifica a edição, 1ª, e o ISBN.

Quadro 11 - Especificações da capa do Pop Wuj

Título: “Pop Wuj, Libro del tiempo. Poema mito-histórico Ki-chè.”

A tradução de Adrián I. Chavez diferencia-se das outras pelo título, “Pop Wuj,

libro del tiempo”, oferece uma tradução diferenciada das conhecidas

anteriormente, pois não provém da versão francesa de Brasseur de Bourbourg

(1861), oferece uma estrutura contínua e notas.

Nome do tradutor: “Traduzido do texto original por Adrián I. Chavez”

Nome dos prefaciadores e revisor: “Prólogo de Carlos Guzmán Böckler”.

Nota preliminar e Revisão: Adolfo Colombres.

Coleção: Biblioteca de Cultura Popular.

Número dentro da edição: 7

Editora: Ediciones del Sol.

Fonte: Chavez (2007)

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4.2.1.2 Contracapa.

Figura 15 - Contracapa do Pop Wuj

Fonte: Chavez (2007)

Page 100: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

99

Na contracapa (Figura 15), inicia com a classificação da obra

dentro do polissistema literário da América pré-hispânica, e destaca a

importância de ser o primeiro falante nativo K’iche’ a realizar uma

tradução da obra na época contemporânea. O fato de Chávez ter sido o

primeiro professor formado confere-lhe uma especial autoridade para

realizar uma tradução descolonizadora: “O mais valioso é a

descolonização do texto sagrado em que se esmera, que vai desde o título

e estrutura (desaparecem a divisão em partes e capítulos) à natureza dos

personagens, concebidos já não em pares ou gêmeos. Chávez depurou

assim a Antiga Palavra para colocá-la a serviço da Nova Palavra […] A

publicação do presente livro constitui um acontecimento cultural de

grande magnitude na América” (CHAVEZ, 2007, contracapa, tradução

nossa108). Fica clara sua intenção de se diferenciar dos tradutores

anteriores pela sua origem K’iche’ e pela novidade de apresentar a

tradução sem divisões em capítulos como o apresenta o manuscrito de

Ximénez (1700-1704). Porém, neste intuito de renovação,Chávez (2007)

acaba trabalhando o princípio binário dos personagens do Popol Wuj,

como se tratassem de personagens de uma só faceta, o que contradiz a

epistemologia maia. Esta alteração no conceito K’iche’ dos deuses

cosmogônicos coloca a obra de Chavez na categoria de descolonizadora,

por representar traços internalizados do pensamento cristão e

eurocentrista.

4.2.2 Prefácio

A nota preliminar consta de sete páginas assinadas por Adolfo

Colombres, na cidade de Buenos Aires, em agosto de 1986, e nela

encontramos uma explanação sobre a língua K’iche, a descrição dos

méritos do autor e do seu trabalho.

Realiza comentários sobre o “Abade Brasseur de Bourbourg, que

conhecia várias línguas e escreveu que o K’iche’ era não somente o

idioma mais perfeito de Guatemala, senão também um dos mais perfeitos

108 Pero lo más valioso es la descolonización del texto sagrado en que se empeña, que

va desde su nombre y estructura (desaparecen la división en partes y capítulos) a

la naturaleza de los personajes, concebidos no ya en pares o gemelos. Chavez

depuró así la Antigua palabra para ponerla al servicio de la Nueva Palabra […].

La publicación del presente libro constituye un acontecimiento cultural de gran

magnitud en América” (CHAVEZ, 2007, contracapa).

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100

do mundo, pela sua rara beleza e harmonia.” (CHÁVEZ, 2007, p. 9,

tradução nossa109). Explica como Brasseur estudou a língua com rigor

científico, preparando um alfabeto fonético. Relata também as

dificuldades do famoso Diego de Landa em predicar em língua maia,

“sofria, a miúde, quando predicava em língua maia, as conseqüências das

limitações das consoantes castelhanas, pois os índios apenas podiam

conter o impulso do riso, não se burlavam da má pronuncia [...] mas do

ridículo da nova mensagem” (CHÁVEZ, 2007, p. 9, tradução nossa110).

Sublinha o mérito do trabalho de Don Adrián Chávez (1979) que

segue um relato único e acompanha o desenrolar temático do Manuscrito

de Ximénez (1700-1702). Colombres (2007) frisa os detalhes da

arquitetura da tradução, esquematizada em quatro colunas, que

detalharemos na análise das traduções. O estilo textual é categórico e de

tom político:

Afortunadamente, Chávez, formado na

adversidade como todo o seu povo, não desistiu.

Com sua máquina de escrever datilografou as

quatro colunas do texto, às quais acrescentou uma

explicação necessária e um prólogo de Carlos

Guzman Böckler, um estudo comprometido com

o indígena e não com as elites que expropriam sua

produção material e espiritual.” (CHAVEZ, 2007,

p. 11, tradução nossa111)

A tradução da edição de 1979, enviada gentilmente pelo Dr. Prof.

Carlos López, da Marshall University, será utilizada concomitantemente

nesta pesquisa com a edição de 2007. Na primeira, Chávez apresenta as

traduções distribuídas em quatro colunas: a primeira com a transcrição

109 “El abate Brasseur de Bourbourg, que conocía varias lenguas y escribió que el

k’iche era no sólo el idioma más perfecto de Guatemala sino también uno de los

más perfectos del mundo, por su rara belleza y armonía.” (CHÁVEZ, 2007, p. 9).

110 “sufria a menudo cuando predicaba en maya las consecuencias de las limitaciones

de las consonantes castellanas, pues los indios apenas podían contener el estallido

de la risa. No se burlaban de la mala pronunciación [...] sino de la ridiculez del

nuevo mensaje.” (CHÁVEZ, 2007, p. 9).

111 “Por suerte Chávez, formado na adversidad como todo su pueblo, no se arredo.

Con su máquina tipeó las cuatro columnas del texto a las que agrego luego una

explicación necesaria y un prólogo de Carlos Guzman Böckler, un estúdio

comprometido com el indígena y no con las elites que expropian su producción

material y espiritual.” (CHAVES, 2007, p. 11).

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em K’iche’ do M. Ayer 1515; a segunda coluna contém a revisão da

língua fonte com a tipografia criada pelo tradutor para representar

fonemas da língua K’iche’ que o tradutor considerou omitidos na tradução

de Ximenes; a terceira é a tradução literal ao espanhol; e a quarta é uma

versão que a torna mais compreensível. Aplicaremos os critérios de

Berman (2007, p. 67) sobre a “tradução e a sistemática da deformação”

para analisar a adaptação que o tradutor fez da sintaxe K'iche’, traduzida

literalmente para a estrutura sintática espanhola. O Pop Wuj de Chávez

(1979) mostra uma preocupação linguística específica e trabalha

detalhadamente os aspectos fonéticos do K‘iche’, que possui sons que

devem ser produzidos de uma forma específica e que não encontram

analogia na língua espanhola. Casanova (2002) comenta as soluções que

alguns autores de povos colonizados aplicam para atingir um movimento

de diferenciação, o qual atua de uma forma não completamente

consciente na performance tradutória:“... tradução-adoção da língua

dominante, auto tradução, obra dupla tradução simétrica, criação e

promoção de uma língua nacional e/ou popular, criação de uma nova

escrita, simbiose de duas línguas.” (CASANOVA, 2002, p.313).Nas

Figuras 16 e 17 ilustramos um excerto com a transcrição das quatro

colunas mencionadas.

Figura 16 - Amostra de tradução

Fonte: Chávez (1979, p. 3)

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Figura 17 - Amostra de traduções em espanhol

Fonte: Chávez (1979, p. 3b)

Casanova (2002) considera que para todos os escritores oriundos

de países que estiveram por muito tempo sob domínio colonial,“o

bilingüismo (como tradução incorporada) é a marca indelével e principal

da dominação política.[...] As estratégias desses escritores podem ser

descritas como espécies de equações muito complexas, com duas, três ou

quatro incógnitas.” (CASANOVA, 2002, p. 314), o mérito de Chávez foi

iniciar a reflexão descolonizadora na revisão lingüística do texto,

questionando o nível de articulação dos fonemas da língua K ‘iche’ e

como o ouvido do padre Ximénez captou desde sua perspectiva hispânica.

Continuando com a descrição dos prefácios, encontramos na

página 14 uma foto do autor, acompanhada do nome completo e um

curriculum resumido. O prólogo está assinado por Carlos Guzman

Böckler e encontra-se dividido em sete partes. Através de um texto

discretamente apologético sobre a obra de Chávez, que a qualifica como

“a mais fiel tradução para o espanhol já feita do venerável documento.”

(CHÁVEZ, 2007, p. 15, tradução nossa112), o discurso de Böckler (2007)

sublinha a origem K‘iche’ do autor e sua autoridade para compreender as

tradições do seu povo e acrescenta: “com a aparição deste trabalho marca-

se o fim de uma era na que foram os estrangeiros os que falavam e

escreviam pelos K‘iches’ ” (CHAVEZ, 2007, p.20, tradução nossa113). No

112 “La más fiel traducción al español que del venereble documento se haya hecho.”

(CHAVEZ, 2007, p.15).

113 “Con la aparición de este trabajo se marca el fin de una era en la que fueron los

extranjeros quienes hablaron y escribieron por los K ‘iche’ ‘’s.” (CHAVEZ, 2007,

p. 24)

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segundo adendo, descreve brevemente a trajetória histórica do manuscrito

de Ximénez (1700-1704) e das principais traduções realizadas por

estrangeiros, até chegar a Recinos. Na quinta parte resume todos os dados

históricos das traduções e pormenoriza as peculiaridades das traduções de

Ximénez (1700-1704), Brasseur de Bourbourg (1861) e Adrian Recinos

(1953), para finalmente compará-las com o trabalho de Chávez. Da

comparação surgem conclusões como as seguintes: “nos trabalhos dos

três autores citados subjaz a convicção de que o pensamento K’iche’

expressado no Popol Wuj, por mais originalidade, profundidade e

elegância que apresente, não deixam de ser a manifestação ingênua de um

povo conceituado por eles como primitivo e inferior à cultura ocidental.”

(BÖCKLER, 2007, p. 27, tradução nossa114).

No sexto item, Chávez (2007) expressa o esforço por

“descolonizar” o texto, começando pelo título “Pop Wuj”, explicando o

significado de “libro del tiempo”, e aponta um critério sobre a

interpretação da ontologia dos gêmeos heróicos.

4.3 PERITEXTO EDITORAL DO “POPOL WUJ, TRADUCCIÓN AL ESPAÑOL Y

NOTAS DE SAM COLOP 2011”.

4.3.1 Capa

Figura 18 - Capado Popol Wuj

Fonte: Colop (2011)

114 “En los trabajos de los tres autores citados (Ximénez, Brasseur de Bourbourg e

Adrian Recinos) subyace la convicción de que el pensamiento ki-chè expresado

en el Pop Wuj, por mucha que sea su originalidad, su profundidad o su elegancia,

no deja de ser la manifestación ingenua de un pueblo conceptuado por ellos como

primitivo y por ende, inferior a la civilización occidental.” (BÖCKLER, 2007)

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Seguindo os critérios de Genette (2009, p. 21), “a zona

peritextual é o aspecto mais global da realização de um livro [...] a

materialização de um texto para uso do público”. Esta edição (Figura 18)

apresenta características próprias, começando pelo destaque do nome do

tradutor, sua foto na parte superior e o título do livro “Popol Wuj” (grafia

moderna) na parte inferior. Esta tradução representa a decolonialidade,

contém na sua capa o nome do tradutor, acompanhado da foto na parte

superior e o nome da obra “Popol Wuj” na parte inferior com o mesmo

peso visual.

4.3.2 Prefácio do Popol Wuj de Sam Colop (2011)

Luis Enrique Sam Colop formou-se advogado na Universidad

Rafael Landívar em 1983, e seu trabalho de conclusão de curso ganhou

um prêmio na Faculdade de Direito da mesma universidade com uma

proposta de lei sobre educação bilíngüe. Possuía Mestrado em Lingüística

pela Universidade de Iowa City e Doutorado pelo Departamento de Inglês

da Universidade Estatal de New York, em Buffalo, onde escreveu a

dissertação intitulada Maya Poetics. Faleceu em 2011. A edição da

tradução de Colop (2011) inicia com uma biografia do mesmo.

Na introdução, faz uma explanação sobre o conteúdo do Popol

Wuj, o qual “...contém a mitologia e a história do povo K’iche’ até a

chegada dos espanhóis no século XVI” (COLOP, 2011, p. XVII), e

descreve os antecedentes da obra. Explica que o conteúdo mítico-

histórico torna a obra não linear, pois descreve um caminho que parte do

presente em direção ao passado, aludindo à mitologia, aos deuses, e aos

semideuses.

No prólogo, fala sobre a metodologia de elaboração da obra, onde

a primeira versão foi uma transcrição poética do Manuscrito de Ximénes

(1700-1704) para o K’iche’ utilizando o alfabeto latino, e, em seguida,

surgiu a idéia de traduzi-lo para o espanhol. As etapas do trabalho foram,

primeiramente, a tradução da versão poética do manuscrito K’iche’ criada

por ele, cuidando da versificação e esclarecendo os termos, consultando

outros autores e traduções, como Schultze (1940), Edmonson (1971), a

cópia fac-símile de Estrada Monroy (1973) e Adrián Chávez (1979).

Posteriormente, procedeu à leitura do K’iche’ palavra por palavra e frase

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por frase para comparar com a versão em espanhol. É importante destacar

que a origem K’iche’ do tradutor foi fundamental, assim como a ajuda do

seu pai ( Mateo Sam Colop), que conhecia partes do texto pela tradição

oral k’iche’.

Sam Colop (2011), na página XXV do seu prólogo, comenta que

na maioria das traduções do Popol Wuj deixou-se de lado a forma original

de poema, focando-se mais no conteúdo. O tradutor explica que combina

poesia e prosa, versos paralelos de duas a quatro linhas contíguas.

Descreve o conteúdo do livro da seguinte forma: o texto começa com uma

descrição das dificuldades para escrever um ‘livro antigo’, a continuação

fala do silêncio primogênio e da forma como surgiu a terra dentre as

águas. A preocupação inicial dos criadores, os gêmeos heróicos

(principais protagonistas deste panteão mítico) Junajpu e Xbalanque,

eram a criação de seres que os invocariam.

A primeira criação, os animais e as aves, povoaram as montanhas

e os barrancos. Como eles não conseguiam pronunciar o nome dos seus

criadores foram castigados e converteram-se em alimento de outros seres.

Depois, foi criado um único homem de terra e lodo, mas notaram que se

desmanchava com a água e foi destruído. Em seguida, foram criados os

seres de madeira que conversavam e reproduziam-se, mas não tinham

espírito nem pensamentos, e por tal foram aniquilados e atacados pelos

seus próprios animais e utensílios de cozinha. Numa transição narrativa,

aparece Wuquk´ix, ave mítica, que se autoproclamava como sol e lua dos

homens de madeira. Este personagem, cuja manifestação astronômica é a

constelação da Ursa Maior, e Chimalmat, a Ursa Menor, efetivamente

iluminaram o céu de forma muito tênue, motivo pelo qual foram também

eliminados.

Posteriormente, relata-se a morte de Sipakna, primeiro filho de

Wuqub Kak´ix, que tinha matado 400 jovens que, depois, converteriam-

se em estrelas do céu, semeando a abóbada celeste de luz. Sipakna acaba

petrificado, e logo acontece a derrota do segundo filho de Wuqub Kak´ix,

chamado Kabrakan, que literalmente significa ‘terremoto’. O interessante

neste episódio é que não se explicita que Kabraqan não morreu, e foi

enterrado vivo, por isso até hoje os terremotos continuam acontecendo. A

partir daqui o relato volta no tempo com as aventuras dos gêmeos no reino

dos mortos. Uma terceira parte constitui-se como a história com suas

linhagens.

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5 ANÁLISE DAS TRADUÇÕES (FÓLIOS 1R,1V;2V; 2R,)

Parafraseando Premat (2013), a idéia do início da escrita, da

expressão seminal e de sua determinação conseqüente, está em estreita

relação com concepções e valores ligados à temporalidade. Explica,

assim, a especificidade do momento inicial de um texto com a seguinte

reflexão: “interrogar o começo equivale a interrogar o sentido e percorrer

os paradigmas narrativos, marcados pela progressão e cronologia, implica

também colocar em funcionamento determinantes semânticos potentes”

(PREMAT, 2013, p. 1, tradução nossa115). A sintaxe específica do Popol

Wuj utiliza figuras retóricas, repetições e isotopias116 que, de acordo com

Craveri (2012), têm a dinâmica própria da narração oral das tradições

K’iches’, “refiro-me com isso a textos poéticos, místicos e rituais,

altamente formalizados, transmitidos por gerações graças ao uso da

memória humana ou a algum auxílio mnemotécnico, e não às enunciações

cotidianas, que respondem a outro tipo de organização semântica e

gramatical” (CRAVERI, 2012, p. 27, tradução nossa117). Na

transliteração do códice para o alfabeto latino, realizada no século XV,

fixava-se, naquele instante, uma das etapas de um processo de

transculturalização. Quando se integraram elementos contextuais,

referências meta-poéticas, geográficas e temporais, segundo as

ponderações da autora, foram inseridos dados que seriam supérfluos em

um processo de transmissão oral, e esse corpus passou a destinar-se a uma

comunidade submetida a violentos processos de mudança. “O que quero

sublinhar é que o manuscrito de Ximénez apresenta marcas formais de

uma tentativa de integração de elementos contextuais a um texto oral, que

não podia ser decodificado através do tempo e do espaço.” (CRAVERI,

2012, p. 28, tradução nossa118).

115 “interrogar elcomienzo es interrogar el sentido y recurrir a los paradigmas

narrativos tradicionales, marcados por la progresión y la cronología, implica poner

en funcionamiento determinantes semánticos potentes” (PREMAT, 2013, p. 1).

116 “Conjunto redundante de categorias semánticas, que hace posible la lectura

uniforme del relato” (CRAVERI, 2012, p. 26).

117 “me refiero con esto a textos poéticos, míticos y rituales, altamente formalizados,

transmitidos por generaciones gracias al uso de la memoria humana o a algún

auxilio mnemotécnico, y no a las enunciaciones cotidianas, que responden a otro

tipo de organización semántica y gramatical.” (CRAVERI, 2012, p. 27).

118 “Lo que quiero subrayar es que el manuscrito de Ximénez presenta las marcas

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107

Esta compilação de tzijs119

incluída no Popol Wuj

contém em forma quase intacta uma parte

significativa do corpus cognitivo, religioso,

epistemológico e do sistema de representações

simbólicas das culturas maias pré-coloniais.

Também precisamos considerar que a versão

escrita que hoje conhecemos, respondem às

características da colonialidade (no sentido que o

manejam Aníbal Quijano (2000) e Walter

Mignolo) às quais estiveram submetidos todos os

povos indígenas do continente Americano.

(LÓPEZ, 2014, p. 3, tradução nossa120).

Apresentaremos doravante a análise das traduções. Para fazê-lo,

partimos inicialmente de quatro colunas. As duas centrais são de Chávez

(1979, p.3b) - que trabalhou com uma tradução literal do K’iche’ e uma

tradução mais próxima da estrutura do idioma espanhol -, para facilitar a

visualização dos termos empregados pelos tradutores. Devemos recordar

que o Manuscrito Ayer 1515 consiste de uma cópia da transliteração de

um códice perdido, que consideramos aqui como o texto fonte por

convenção, já que o mesmo institucionalizou e foi fixado como tal. “Tudo

começou antes, em outros livros, o texto se prolonga para além de suas

fronteiras, enquanto saber, sonho, desejo, frustrações, recordações,

experiência da memória, experiência do tempo, experiência da ficção,

experiências a secas” (DEL LUNGO apud PREMAT, 2013, p. 12,

tradução nossa121).

formales de una tentativa de integración de elementos contextuales a un texto oral,

que no podía ser decodificado a través del tiempo y el espacio” (CRAVERI, 2012,

p. 28).

119 “En el manuscrito dice “hertzio”, cuya ortografía actual es “ojertzij”, esto es

‘antigua palabra’, ‘historias del pasado’ en el sentido de narraciones. En el

Diccionario K’iche’ se define como“algo cierto”, la “verdad”. O sea que, dada

esta amplia riqueza semántica de la palabra tzij, no tiene una traducción exacta al

castellano o al inglés.” (LÓPEZ, 2014, p. 23 - artigo inédito).

120 “esta compilación de tzijs incluida en el Popol Wuj contiene en forma casi intacta

una parte significativa del corpus cognitivo, religioso, epistemológico y del

sistema de representaciones simbólicas de las culturas mayas pre-coloniales. Por

el otro lado tenemos que la versión escrita que hoy conocemos se inscribe dentro

de las condiciones de colonialidad(en el sentido que lo manejan Aníbal Quijano,

2000, y Walter Mignolo) a las que estuvieron sometidos todos los pueblos

indígenas del continente Americano.” (LÓPEZ, 2014, p. 3).

121 “Todo ha comenzado antes, en otros libros, el libro se prolonga más allá de sus

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Quadro 12 - Popol cabuil

ESTE ES EL PRINCIPIO DE LAS antiguas historias aquí en el quiche. Aquí

escribiremos y empezaremos las antiguas historias su principio, y comienzo de

todo lo que fue hecho en el pueblo de el quiche, su pueblo de los indios quiches;

ES QUE SU ANTIGUAPALABRA122AQUÍ “MAGUEY-ARBOL”SU

NOMBRE

Aquí mismo escribimos123de una vez antigua palabra; su comienzo, su base es

decir, todo hecho en pueblo “magey-árbol” de grandes124 ki-chès gentes

DESDE ANTES DE ESCRIBIRSE

EL POP WUJ125AQUÍ SE HA LLAMADO LOS MAGUEYES

Y aquí escribimos (ya con letra castellana), aquí fijamos la antigua palabra;

principio, es decir, base de todo lo sucedido en el pueblo Los Magueyes, pero de

las grandes gentes kiches

NABE

Capítulo Primero

Este es el origen de la antigua historia de este lugar llamado K‘iche’

Aquí escribiremos

Estableceremos la palabra antigua; el origen el comienzo de todo lo acontecido

en el pueblo K‘iche’

Fonte: Ms Ayer (XIMENEZ, 1700-1704, f. 1r); Chávez (1979, p. 1b); Sam Colop

(2011, p.1)

fronteras en tanto que saber, sueño, deseo, frustración, recuerdo, experiencia de la

memoria, experiencia del tiempo, experiencia de la ficción, experiencia a secas.”

(DEL LUNGO apud PREMAT, 2013, p. 41).

122 ‘Antigua palabra’, es metáfora, se refiere a la antigüedad del Pop Wuj. (CHAVEZ,

1979, p. 1a).

123 “Versión hecha por kichès al cambiar su escritura para emplear la castellana,

siempre en idioma ki-chè.” (CHAVEZ, 1979, p. 1a).

124 “No de tamaño, sino gente culta.” (CHAVEZ, 1979, p. 1a).

125 “Homologo de Antigua palabra o sea de OJER Tzij que aparece en la copia del

padre Jiménez y que en el renglón 27 aparece con el nombre de Pop Wuj,

literalmente significa Libro del Tiempo o Libro de Acontecimientos.” (CHAVEZ,

1979, p. 1a).

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Quadro 13 - Tradução para o português do excerto anterior

I

Esta é a raiz da palavra antiga. Aqui é Quiché seu nome. Aqui escrevemos então,

iniciaremos então as palavras antigas. Os inícios. E a raiz principal. De tudo que

se fez na cidade de Quiché. A tribo do povo quiche.

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.41)

López (1999, p. 23) comenta que este paratexto inicial do Popol

Wuj apresenta o “Popol Cabouil”, isto é o conjunto de divindades maias

no escopo do espaço cósmico. As três traduções tratam de um passado

distante, antigo. Primeiramente, a passagem “podemos presumir que foi

de autoria coletiva e anônima porque o manuscrito disse 'escreveremos'

[xchiqatz’ib’aj] (XIMENEZ, 1700-1704, f. 1r, linhas 23-24)” (LÓPEZ,

2014,tradução nossa126), utiliza o tempo futuro (i) escribiremos, delimita

o relato das antiguas histórias o principio. Configura a localização

espacial, o início da narrativa e a abrangência da mesma: todo lo que fue

hecho; en el pueblo de el quiche, e o povo ao qual se refere: índios

quiches. É importante destacar que esta é a única tradução estudada que

utiliza a palavra índios127.

Na imagem abaixo, apresentamos um recorte da tradução de

Chávez, (transcritas no quadro 13, acima apresentado) contendo as duas

traduções (Figuras 19 e 20) que ele trabalhou, em termos de aproximação

sucessiva. A primeira é uma tradução literal do K‘iche’, enquanto que a

segunda consiste de uma espécie de “clarificação”, aliás, tal conceito

estabelecido por Berman (2007), que remete à racionalização da tradução

em termos de busca pelo que o autor chama de “clareza” dos sentidos das

palavras. De fato, trata-se de uma necessidade de “completá-las” em suas

significações eventualmente lacunares que as possam tornar opacas ao

leitor.

126 “…podemos presumir que fue de autoría colectiva y anónima porque el

manuscrito dice ‘escribiremos’ [xchiqatz’ib’aj] (f.1 r., líneas 23-24)” (LÓPEZ,

2014, s/p).

127 “La palabra indio tiene su origen en la ingenua creencia del gran navegante

genovés Cristóbal Colón, quien, para emprender la aventura que le trajo a nuestro

continente, se aferraba al supuesto de que siendo nuestro planeta de forma esférica

es posible llegar al extremo oriental de la India a fuerza de navegar hacia

occidente” (ESTRADA OCHANTE, 2007, p. 1).

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Figura 19 - Excerto Chavez I

Fonte: Chávez (1979, p. 1a)

Figura 20 - Excerto Chavez II

Fonte: Chávez (1979, p.

A expressão ANTIGUA PALABRA, parece denotar que tais

relatos continuam sendo mantidos nas tradições K‘iches’ até hoje com a

força da palavra proferida como conjuro fundador. Comparando as duas

traduções, observamos que o Popol Wuj torna-se uma espécie de

referência temporal por meio da qual o tradutor divide a linha do tempo.

A “antigua palabra” é uma expressão colocada como sinônimo de “antes

de escribirse el Popol Wuj”. Escolhe a definição, pueblo de los Magueyes,

o maguey é um vegetal de folhas com forma de lança, parente do agave

mexicano, cujas folhas servem para a extração de uma seiva doce.

Segundo López (1999), o autor, possivelmente, fez uma tradução literal

da palavra K‘iche’: ki, que significa maguey e chee, árvore ou talo. Na

Figura 21 temos uma ilustração do Maguey. “As escolhas (dos tradutores)

em matéria linguística [...]não se reduzem à submissão dócil a uma língua

nacional. O dilema da língua é para eles bem mais complexo, e as

soluções que trazem adquirem formas mais singulares” (CASANOVA,

2002, p. 311)

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Figura 21 - El Maguey

Fonte: Códice Florentino, libro XI, ff. 200v.v (VELA, 2014)

Temos um exemplo de passagem de polissemia à monossemia

nos seguintes excertos (Quadro 14) escritos por Don Adrián Inés Chávez

(1979). Trata-se de uma tradução literal do K‘iche’, uma versão mais

aproximada da estrutura do espanhol:

Quadro 14 - Terceira e quarta coluna do Pop Vuh

Es que su antigua palabra128.aqui

“maguey-arbol” su nombre

Desde antes de escribirse El pop wuj129

aquí se ha llamado los magueyes

Fonte: Chávez (1979, p.1a)

128 ‘Antigua palabra’, es metáfora, se refiere a la antigüedad del Pop Wuj.”

(CHAVEZ, 1979, p. 1a).

129 “Homologo de Antigua palabra o sea de OJER Tzij que aparece en la copia del

padre Jiménez y que en el renglón 27 aparece con el nombre de Pop Wuj,

literalmente significa Libro del Tiempo o Libro de Acontecimientos.” (CHAVEZ,

1979, p. 1a).

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Berman (2007) considera que “a explicitação pode ser a

manifestação de algo que não é aparente (na tradução), [...] A passagem

da polissemia à monossemia é um modo de clarificação. As explicações

podem tornar a obra mais “clara”, mas na realidade obscurecem seu modo

próprio de clareza.” (BERMAN, 2007, p. 72). Existe nesta

desambiguação um significado semelhante ao sofrido pelo sentido do

nome do vegetal que tinha uma importância ritual na época pré-

hispânica.Na figura 22 representa-se a “Deusa da fertilidade, desnuda,

com punções na mão e sentada sobre uma tartaruga (a terra que surge do

mar). Se observam também elementos associados à obtenção de aguamiel

do maguey, para elaborar pulque” (VELA, 2014, tradução nossa130) e

passou depois a ser reconhecida como representativa das regiões

mesoamericanas, caracterizando uma grande área e a população, como

explica o autor em artigo publicado na Revista Arqueologia Mexicana, nº

57:

Figura 22 - Deusa da fertilidade

Fonte: Códice Laud131, lám.16

130 Diosa de la fertilidad, aparece desnuda con punzones en las manos y sentada sobre

una tortuga (la tierra que surge del mar). Se observan también elementos asociados

a la obtención de aguamiel del maguey para elaborar pulque. (Vela, 2014)

131 El Códice Laud se encuentra actualmente en la Biblioteca Bodleiana de la

Universidad de Oxford, Inglaterra, catalogado con el número 678. Durante mucho

tiempo se le consideró un documento egipcio, documento del siglo XVII.

(Historias de los códices mexicanos. Manuel A. Hermann Lejarazu.

Disponívelem:http://www.arqueomex.com/S2N3n

Historias110.html . Consultado em 06 de setembro de 2014.

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Maguey é uma das plantas emblemáticas do

México (e de toda Mesoamérica). Fonte do

pulque, bebida herdada da época pré-hispânica. É

uma planta fácil de reconhecer pela sua peculiar

aparência que se destaca na paisagem e pela sua

longevidade. Na época pré-hispânica e nos

primeiros tempos do vice-reinado, as

representações da planta tinham conotações

rituais e um papel identitário em nomes de

pessoas e lugares. Nos séculos seguintes a

situação mudou. As representações em

compêndios botânicos se tornaram mais ou menos

freqüentes e o Maguey, por meio da Virgem dos

Remédios, se incorporou ao imaginário católico.

(VELA, 2014, p. 76, tradução nossa132)

Quadro 15 - Terceira e quarta coluna do Pop Vuh (Continuação)

Aquí mismo escribimos133de una vez

antigua palabra; su comienzo, su base

es decir, todo hecho en pueblo

“magey-árbol” de grandes134 ki-chès

gentes (…)

Y aquí escribimos (ya con letra

castellana), aquí fijamos la antigua

palabra; principio, es decir, base de

todo lo sucedido en el pueblo Los

Magueyes, pero de las grandes gentes

ki-ches

Fonte: Chávez (1979, p. 1a)

132 El maguey es una de las plantas emblemáticas de México. En buena parte ello se

debe a que es la fuente del pulque, bebida que es una de las herencias más

abiertamente gozosas de la época prehispánica. A esto hay que sumar que el

maguey es un elemento con características – como su peculiar apariencia, su

constante presencia y su longevidad – que lo hacen fácilmente reconocible y por

lo tanto un elemento sobresaliente en el paisaje. En la época prehispánica, y en los

primeros tiempos del virreinato, las representaciones de la planta del maguey por

lo general se hacían en función de sus connotaciones rituales o de su papel como

elemento de identidad en nombres de personas o lugares, en los siglos siguientes

la situación cambió. Las representaciones en compendios botánicos se volvieron

más o menos frecuentes y el maguey, por intermedio de la Virgen de los

Remedios, llegó a incorporarse al imaginario católico. (VELA, 2014, p. 76)

Acesso em 20 de dezembro de 2014.http://www.arqueomex.com/S9N5

n0Esp57_01.html

133 “Versión hecha por ki-chès al cambiar su escritura para emplear la

castellana, siempre en idioma ki-chè.” (CHAVEZ, 1979, p. 1a). 134 “No de tamaño, sino gente culta.” (CHAVEZ, 1979, p. 1a).

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Chavez utiliza a expressão gentes Kí-chès no lugar de ‘índios’,

expressando, assim, seu posicionamento descolonialista (Quadro 15). Na

vertente sociológica da Inflexão Decolonial135 (RESTREPO;

ROJAS,2010), observam-se algumas reflexões referentes à colonização e

sua influência no pensamento dos que exercem o poder colonizador e o

seu impacto sobre os colonizados. Um critério que surge dessa interação

é a “coisificação” do colonizado, como pontuam Restrepo e Rojas (2010).

A colonização tem por base e justificativa o desprezo pelo nativo, o que

também afeta, de certo modo, o colonizador, que de alguma forma

desumaniza-se e passa a considerar o povo subjugado como inferior,

deixando de ver seres respeitáveis e considerando os integrantes da

cultura colonizada como objetos que podem ser subjugados. Chávez, ao

utilizar a frase (iv) gentes Ki-chès, deixa claro seu ponto de vista

descolonialista e reivindica o mérito de ser o primeiro tradutor k’iche.

Dos três tradutores, Colop (2011) é o único que se preocupa com o

aspecto formal e organiza o texto como que para ser declamado (Quadro

16).

Quadro 16 - Organização textual em Colop

NABE

CAPÍTULO PRIMERO

Este es el origen de la antigua historia de este lugar llamado K‘iche’

Aquí escribiremos

estableceremos la palabra antigua;

el origen

el comienzo de todo lo acontecido en el pueblo K ‘iche’ ‘’,

nación de la gente k ´iche´. Aquí iniciamos la enseñanza,

la aclaración y

la relación de lo oculto y

lo revelado por Tz´aqol

Bitol

Alom,

K´ajolom nombres de Junajpu Wuch´,

Juajpu Utiw,

Saqi Nim Aq

Sis;

Fonte: Colop (2011, p. 1)

135 “Inflexión Decolonial” (RESTREPO; ROJAS, 2010).

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Emprega uma ordem paradigmática e apresenta o texto com a

estrutura explicada por Craveri (2012), de acordo com sua morfologia:

“A estrutura gramatical do difrasismo [...] ocorre in praesentia na

comunicação oral” (CRAVERI, 2012, p. 88,tradução nossa136). A autora

comenta que a repetição de várias palavras com a mesma função

gramatical cria uma metáfora fácil de recordar e recitar. Destaca também,

na página 38 de sua obra, que Sam Colop registra uma versificação

constante ao longo de todo o texto, seguindo pautas semânticas e

gramaticais variáveis.

Parafraseando Craveri (2012, p. 103), os nomes das deidades

aludem às diferentes manifestações do princípio cósmico criador,

representado por Q´ukumatz, a serpente emplumada. Os paralelismos

criam uma tensão semântica para representar a energia sagrada e a

fertilidade necessárias para a criação. A função do difrasismo é a de

enfatizar o papel formador dos seres divinos e de conotar cada um deles

mediante uma recíproca interação. Colop divide sua tradução em

capítulos, diferenciando-se do Ms Ayer 1515, que é um texto corrido,

mesmo tendo usado o manuscrito como fonte do idioma K’iche’. Como

Chávez (1979), verbaliza e enfatiza o status de gênese da narração,

paralelamente com a gênese da escritura que não simplesmente principia

o relato - como expressam os outros tradutores estudados - mas estabelece

a ‘palavra antiga’ como originária de todos os acontecimentos. Ao iniciar

o relato com o tempo futuro, localiza semanticamente o leitor no passado

mítico como fundador do devir histórico. A semântica fica imbuída de

historicidade que, segundo Pérez Amuchástegui (1977, p. 25),

representam “ações humanas do passado significativas no presente”.

Apresentamos, em três colunas, as traduções estudadas para dispor

visualmente as escolhas tradutórias (Quadros 17 e 18):

Quadro 17 - Escolhas tradutórias

y de aquí tomaremos su ser declarado y manifestado, y su ser relatado, la

escondedura y, por el formador, criador madre, y Padre q’así se llaman, hun ahpu

vuch. hun ahpu vtiu. Zaquinima tzÿz-tepeu. gucumatz. vguxcho. vguxpalo.

nombres, o atributos. q’ significan; vn tirador tacuazín. vn tirador coyote. blanco

pizote.

136 “La estructura gramatical del difrasismo […] se da in praesentia en la

comunicación oral.” (CRAVERI, 2012, p. 88).

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De manera que aquí tomaremos a enseñarlo, a revelarlo, es decir, a relatarlo, lo

dejado e iluminado por el rquitecto, Formador, Creado, Varón Creado, cuyos

nombres, Un cazador de Tacuatzín, un cazador de Lobo,

nación de la gente K ‘iche’ Aquí iniciamos la enseñanza, la aclaración y la

relación de lo oculto y lo revelado por Tz´aqol Bitol Alom K´ajolom Junajpu

Utiw Saqi Nim Aq Sis

Fonte: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1997, p. 31); Sam Colop (2011, p. 1)

Quadro 18 - Tradução para o português do excerto anterior

Assim, isto é o que vamos reunir então. A decifração, o esclarecimento. A

explicação dos mistérios. E a iluminação dos feitos de Tzakol (Construtor) e

Bitol (Modelador); Alom (Portador) e Qhaolom (Gerador) são seus nomes, e

HunAh pu Utiv (Caçador Coiote), Zaqi Nim Aq (Grande porco Branco) e Tziz

(Quati)

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.41)

Os primeiros personagens descritos nas traduções são seres

míticos, cujas identidades desdobram-se em poderes provenientes “(do)

universo, (concebido como) uma grande matriz cósmica que guarda a

latência da vida” (LÓPEZ, 1999, p. 167, tradução nossa137). Craveri

(2012) assinala que os mesmos se apresentam no texto através de uma

constituição linguística polissêmica determinada por sua função, dentro

de uma rede de relações semânticas formado por difrasismos, e o define

como a fratura de elementos léxicos de igual função gramatical.

Encontramos exemplos no parágrafo analisado da tradução de Ximénez

(1700-1704): (ii) formador, criador, referindo-se a uma das “figuras

divinas demiúrgicas [...] que têm um caráter completamente abstrato”

(LÓPEZ, 1999, p. 168, tradução nossa138). Fica explícito na leitura que o

universo já existia antes das formas de vida como uma “matriz gestante”

e esta idéia encontra-se reforçada com os seguintes difrasismos:

escondedura-aclaradura, madre y padre.

137 “Los primeros personajes que se describen en las traducciones, son seres míticos

que cujas identidades se desdoblan en poderes provenientes “(del) universo,

(concebido como) una gran matriz cósmica que guarda la latencia de la vida”

(LÓPEZ, 1999, p. 167).

138 “figuras divinas demiúrgicas, [...] que tienen un caracter completamente

abstracto” (LÓPEZ, 1999, p. 168).

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Em seguida, Ximénez (1700-1704) transcreve a denominação em

língua K’iche’: hun ahpu vuch, hun ahpu vtiu. Zaquinima tzÿz tepeu.

gucumatz. vguxcho. Vguxpalo, que logo traduz entre parênteses de acordo

com sua interpretação: “nombres, o atributos. q’significan; vn tirador

tacuazín(gambá). un tirador coyote(lobo americano de 60cm.) blanco

pizote (quatí de nariz branco). fuerte culebra (serpente)”.

Estes nomes de animais apresentam-nos, desde o início do relato,

seu papel de “intermediários entre o homem e os deuses. Suas

manifestações simbólicas dirigem-se em ambas as direções: são uma

representação do mundo natural frente aos deuses e a expressão da

energia cósmica frente aos homens” (CRAVERI, 2012, p. 127, tradução

nossa139). Colop (2011) coincide com a opção tradutória de Ximénez

(1700-1704) e acrescenta: “Tacuacín [...] deus que escurece o Céu antes

do amanhecer. Recinos (1950) associa a ‘Junajpu Wuch’ como deus do

amanhecer e a Utiw’ como ‘deus da noite’” (COLOP, 2011, p. 201,

tradução nossa140). Nestas primeiras análises do texto podemos perceber

a visão da natureza dos maias como uma manifestação cósmica

interdependente nos mínimos detalhes.

Coerente com os objetivos desta tese, observamos como cada

tradutor leu, em sentido amplo, o texto e como interpretou o Popol Wuj

ao traduzi-lo. Partindo da idéia de que a tradução implica (re)criação,

recordamos as palavras de Willemart: “todos nós, escritores ou críticos,

somos trabalhados pela escritura, deixamos a escritura dizer ou desvelar

o que somos, a tradição, nossa memória, a que aspiramos, as esperanças

os desejos etc.” (WILLEMART, 2009, p. 98). Neste sentido, o autor

assinala que o período temporal da escritura deixa sua marca ideológica,

metodológica, organizativa, nos critérios priorizados e no modo como os

tradutores realizam cortes do real, ou seja, o viés escolhido para a

narrativa.

139 “intermediarios entre el hombre y los dioses. Sus manifestaciones simbólicas se

dirigen en ambas direcciones: son una representación del mundo natural frente a

los dioses y la expresión de la energía cósmica frente a los hombres.” (CRAVERI,

2012, p. 127).

140 “Tacuacín [...] deidad que oscurece el Cielo antes de amanecer. Recinos asocia a

‘Junajpu Wuch’ como ‘dios del amanecer’ y a ‘Junajpu Utiw’ como ‘dios de

noche’” (COLOP, 2011, p. 201).

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De acordo com as considerações de Yuste Frias (2001) em seu

artigo ‘Leituras da imagem para uma tradução simbólica da imaginação’,

a “tradução deveria ser entendida como um ato de comunicação

intercultural, uma forma de chegar a conhecer l´Autre depois de tê-lo

entendido” (YUSTE FRIAS, 2014, p.24). Uma das hipóteses que

propusemos foi a de buscar compreender até que ponto podem ser

constatadas as influências da doutrina maçônica na tradução do Popol

Wuj de Don Adrian Inés Chavez, levando em consideração que:

...o tradutor literário, como co-criador do Texto

Origem (TO) utiliza a imaginação para,

primeiramente, interpretar o TO e, logo,

comunicar o imaginário apreendido no Texto

Término (TT). [...] O tradutor é um autêntico

intérprete que não somente interfere na tríade

autor-texto-leitor, mas que, em cada tradução, cria

um novo ato de comunicação intercultural.”

(YUSTE FRIAS, 2001, p. 800, tradução

nossa141).

Contrastando os termos com aqueles que os tradutores utilizam

para apresentar ao deus, notamos certas diferenças semânticas

significativas entre as traduções: Chávez utiliza a palavra iluminado que,

de acordo com o Dicionário da Real Academia Espátula, significa:

“1.adj. adepto a certa doutrina”. Já Ximénez aponta para a função

que tal ente exerce: aclaradura: tornar alguma coisa clara, perceptível,

manifesta ou inteligível142. Colop segue a linha semântica de Ximénez e

escolhe o substantivo abstrato aclaración (COLOP, 2011, p. 31).

Inclinamo-nos a pensar que Chávez realizou uma

“homogeneização” do texto traduzido, procedimento que consiste em

141 “..el traductor literario. Como co-creador del texto Origen – del TO - utiliza la

imaginación para, primero, interpretar el del TO y, luego, comunicar el imaginario

aprehendido en él al Texto Término – TT […] El traductor es un auténtico

intérprete que no sólo interfiere en la tríada autor—texto-lector sino que, en cada

traducción, crea un nuevo acto de comunicación intercultural” (YUSTE FRIAS,

2001, p. 800).

142 “Hacer claro, perceptible, manifiesto o inteligible algo, ponerlo en claro,

explicarlo.”(Dicionário da Real Academia Espanhola. Disponível em:

<http://www.rae.es/rae.html>. Acesso em 4 de janeiro de 2013.

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“unificar em todos os planos o tecido do original. Embora este seja

originalmente heterogêneo [...], é preciso considerá-la (a

homogeneização) como uma tendência em si, que mergulha

profundamente suas raízes no ser do tradutor” (BERMAN, 2007, p. 77).

Possivelmente, o pensamento de Chávez (2007) esteve influenciado por

uma ideologia que, como mencionamos, poderia ter sido maçônica.

Mackey (2008), em seu livro The Symbolism of Freemasonry Ilustrating

and Explaining Its Science and Philosophy, Its Legends, Myths and

Symbols, tece algumas observações sobre o significado de ‘iluminación’

no escopo da doutrina maçônica, expressando que, de acordo com antigos

sentimentos religiosos, a luz era algo desejado, o mistério a ser alcançado,

assim como o é, atualmente, na maçonaria, o símbolo do conhecimento e

da verdade. Mesmo que as três traduções apontem para um mesmo

significado, a escolha de Chávez (2007) tende a se assemelhar, neste

exemplo - com vários outros que apresentaremos a posteriori -, à doutrina

maçônica, que influencia tanto o estilo de sua escrita quanto a escolha do

léxico.

A mitologia maia tem uma conhecida característica de cunho

solar, como podemos constatar no exemplo que segue. Para tal,

transcrevemos um trecho do Popol Wuj no qual se apresenta o momento

em que as principais tribos haviam sido criadas e encontravam-se na

expectativa de que amanhecesse. Esse amanhecer é representado pela luz

solar como fonte divina. Na tradução de Brotherston e Medeiros (2011)

podemos ler:

E assim ali eles estavam na floresta | Aquele era o

lugar do amanhecer: - Tohil, | Avilix, | Haka Vitz,

como são chamados hoje. | E lá veio-lhes a

claridade então, | Veio-lhes o brilho então, | A

nossos avós, | A nossos pais. |Aqui contaremos o

amanhecer | E o aparecimento do Sol, | Da lua | E

das estrelas.” (BROTHERSTON; MEDEIROS,

2011, p. 219).

Retornando à tradução de Chávez(2007), observamos que se trata

do único tradutor que utiliza as denominações: (iv) Arquitecto-formador,

para traduzir o nome do primeiro deus K’iche’ do popol cabuil143. O

143 “Conjunto de divindades k ´iches’, expressão que se utiliza em substituição a

panteão.” (LÓPEZ, 1999, p. 149).

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difrasismo formador - criador, utilizado por Ximénez (1700-1704) e

escrito com minúscula tem a mesma conotação que em Colop:

“Literalmente, o ‘construtor’ e ‘criador’ Tz’aq e bit ‘criação’ (COLOP,

2011, p. 201, tradução nossa144).

Refletindo sobre o significado das palavras usadas pelos

tradutores (Quadros 19 e 20), aquele que forma ou constrói não será

necessariamente considerado o idealizador de determinado projeto. A

palavra Arquiteto aproxima-nos de uma idéia de plano divino e de um

deus monoteísta que se aproxima da visão maçônica. Mackey (2008, p.

81, tradução nossa145) explica: “E o próprio Deus, o Grande Arquiteto, o

Grande Construtor do mundo, tem trabalhado desde a eternidade: e

trabalhando pela sua onipotente vontade, ele descreve seus planos sobre

um espaço ilimitado, pois o universo é o seu cavalete”.

Segundo López (1999) a epistemologia K’iche’ possui uma

concepção que coloca o conhecimento no centro de sua teleologia, um

começar e recomeçar as origens em múltiplos espaços e planos, de

maneira que o‘destino’ depende de hipóteses e constatações para avançar,

diferentemente do plano divino predeterminado por um “Arquiteto”,

como propõe Chávez (2007).

Quadro 19 - Difrasismo

nombres, o atributos. q’significan; vn tirador tacuazín. vn tirador coyote. blanco

pizote.

cuyos nombres, Un cazador de Tacuatzín, un cazador de Lobo,

Junajpu Utiw Saqi Nim Aq Sis

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1997, p. 31);Sam Colop (2011, p. 1)

144 “Literalmente el ‘constructor’ y ‘creador’. Tz´aq y bit ‘creación’ ” (COLOP, 2011,

p. 201).

145 “And God himself, the Grand Architect, the Master Builder of the word, has

labored from eternity; and working by his omnipotent wills, he describes his plans

upon illimitable space, for the universe is his trestle board.” (MACKEY, 2008, p.

81).

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Quadro 20 - Tradução para o português do excerto anterior

HunAh pu Utiv (Caçador Coiote), Zaqi Nim Aq (Grande porco Branco) e Tziz

(Quati)

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.41)

Ximénez escreve, nos paratextos da sua tradução, um texto

bastante complexo no qual compara a cosmogonia K’iche’ com a Biblia

católica e alude à influência que, segundo ele, o demônio teria exercido

para deformar a imagem de Deus (Quadro 21).

Quadro 21 - Escólios.

Este Dios que el demonio da a entender lo hace Duodeidad porque no nombra más que dos sujetos: uno llamado Hunahpu-Vich, un tirador tacuasin y a Ahpu-

Vuh, un tirador lobo; como Satanás es tan amigo de remedar las cosas de Dios, y como a su Majestad se le dan varios renombres ya de animales, ya de otras cosas

para que nuestra cortedad pueda alcanzar algún rayo de su grandeza, como llamándose león, por la fortaleza de este animal e cordero […] por la

mansedumbre, así mismo Satanás, tomando las metáforas de varios animales, los llamó a estos dos Dioses: Vuch y Vhu tacuacín y lobo por su astucia.

O demônio levou os índios a entender que Deus somente tem “duas dimensões” porque nomeia apenas dois sujeitos: um chamado Hunahpu-Vich, um caçador de gambás, e a Ahpu-Vuh, um caçador de lobos; como Satanás gosta tanto de imitar as manifestações de Deus, inspirou aos índios a chamá-lo com vários nomes de

animais, como metáfora de sua grandeza, como chamando-lhe de leão, pela fortaleza deste animal ou cordeiro [...] por ser manso...Da mesma forma Satanás, tomando as metáforas de vários animais, chamou a estes dois Deuses: gambá e

lobo pela sua astúcia.

Fonte: Ms Ayer 1515 (Ximénez, 1700-1704). Tradução nossa.

No excerto anterior, Ximénez expressa sua interpretação sobre os

nomes dados no difrasismo para o Deus criador, considerando esta

enumeração de animais como metáforas que aludem ao poder de Deus e

que teriam sido sugeridas pelo demônio para zombar da Bíblia católica.

Chávez (2007) segue a opinião do Padre Ximénez (1700-1704)

no que se refere às denominações contidas no primeiro difrasismo

múltiplo da tradução, considerando seus nomes “de valor sinonímico”

(CHÁVEZ, 1979, introdução), como: cuyos nombres, Un cazador de

Tacuatzín, un cazador de Lobo, verdaderos cantores, negando assim se

tratarem de entidades diferenciadas, mesmo que os nomes sejam opostos

e complementares em seus simbolismos. O terceiro elemento do

difrasismo: el pizote (quati) está omitido. Aliás, para o qual não

encontramos explicação.

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Segundo Craveri (2012) o difrasismo vincula o gambá

(comadreja, tacuacín), o lobo mesoamericano (coyote) e o quati (pizote).

O gambá encarna o principio de maternidade, o coiote associa-se com o

masculino e o quati pode estar associado com as atividades diurnas e com

Vênus, que é a estrela do amanhecer. “O animal claramente se associa à

capacidade de engendrar luz e civilização” (CRAVERI, 2012, p. 104,

tradução nossa146). As explicações etimológicas realizadas por Colop

(2011) nas notas de sua obra permitem-nos uma aproximação com

significados zoomórficos Saqi Nim Aq “Literalmente ‘branco grande’ [...]

relaciona a Saqi nim Sis como ‘deusa mãe’ e a Saqi nim aq como seu

consorte” (COLOP, 2011, p. 201, tradução nossa147). Brotherston e

Medeiros (2011, p. 41) traduzem Zaqi Nim Aq como ‘Grande Porco

Branco’.

Quadro 22 - Metáforas orgânicas

fuerte culebra. corazón de la laguna. corazón de el mar.

verdaderos cantores; venidos del infinito, ocultador de serpiente; espíritu del lago

y mar;

Tepew Qúkumatz Corazón del lago Corazon del mar

Fonte: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1997, p. 31); Sam Colop (2011, p. 1)

Quadro 23 - Tradução para o português do excerto anterior

Tepeu (Majestade), Quq Kumatz (Quetzal serpente), U Kux Cho (O Coração do

Lago) e u Kux Palou (O Coração do Mar).

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.41)

A geografia no Popol Wuj descreve-se, às vezes, com metáforas

orgânicas (Quadros 22 e 23) relacionadas com as pulsações de vida, como

as que constam na tradução de Ximénez (1700-1704, f.1r): corazón de la

laguna y corazón del mar. Tais entes formam uma gênese aberta, na qual

as divindades são falíveis e utilizam o princípio do ensaio e da prova “em

que devem combinar as vontades, a ação do imprevisível, e a

146 “el animal claramente se asocia a la capacidadde engendrar luz y civilización”

(CRAVERI, 2012, p. 104).

147 “Literalmente ‘blanco grande’ [...]. Recinos (1953:82) relaciona a Saqi nim Sis

como ‘diosamadre’ e a Saqi nim aq como su consorte.” (COLOP, 2011, p. 201).

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123

materialidade cósmica” (LÓPEZ, 1999, p. 167, tradução nossa148). Como

se pode constatar no próprio enredo dos capítulos seguintes, os deuses

dialogam e criam seres que não os agradam, erram, desfazem sua criação

e aperfeiçoam seres já criados. Mais uma vez, referenciamos a

interpretação de Ximénez nos paratextos “Escólios” no subtítulo que

intitulou “Sobre o ser de Deus” (Quadro 24):

Quadro 24 - “Sobre o ser de Deus”

Y también como a Dios se le dan muchos epítetos de grande, de sabio y otras

cosas, le dan el nombre de Tepeu este significa las bubas149, y en su gentilidad

era grandeza de los señores el tenirlas, porque era señal de más poder para

cohabitar con muchas mujeres , cosa que la gente ordinaria no podía, y de ahí se

tomó por grandeza y majestad el nombre de Tepeu; también le llaman Cucumatz,

este nombre puede ser significar culebra fuerte, y también el emplumado con

plumas verdes, cosa de mucha grandeza en su gentilidad, y que hoy usan en sus

bailes; también le llaman cac (fuego) por el respeto que se hace tener este

elemento, y también cosa de grandísima estimación para ellos, y que fue dado

por mano del ídolo Tohil que se dice más arriba. Danle también título de corazón

de la laguna y del mar, […], en que parece que el demonio tiró a confundir el

texto sagrado que dice: et espitius Dei ferrebatur super aquas (Gen. I. v.2) (Y el

espíritu de Dios se movía sobre la faz de las aguas)

Também como a Deus se lhe atribuem muitos epítetos de grande e de sábio, (os

maias) lhe dão o nome de Tepeu, que significa “erupções na pele”. Em seu

paganismo, ter esses sinais significava “grandeza dos senhores”, porque (de

acordo com suas crenças) era um sinal de mais poder para relacionar-se com

muitas mulheres, coisa que estava proibida para as pessoas comuns, motivo pelo

qual Tepeu era sinônimo de grandeza e majestade; também chamavam o Deus de

Cucumatz, que pode significar “serpente forte”, e também o emplumado com

plumas verdes, símbolo de grandeza para os pagãos, e que hoje usam nas suas

danças; também chamam a Deus com o nome de Cac (fogo) pelo respeito que

infunde ter este elemento, muito respeitado por eles, devido a ter sido entregue

pela mão de um ídolo chamado Tohil, considerado um ser superior. O Deus

também tem o título de “Coração do lago e do mar”, [...], em que, aparentemente,

o demônio teve o objetivo de confundir o texto sagrado que diz: et espiritus Dei

ferrabatur super (Gen.I.v.2) (E o espírito de Deus movia-se sobre a face das

águas)

Fonte: Ximénez (1700-1704, fólios, escólios). Tradução nossa.

148 “en los que se deben combinar las voluntades, la acción de lo impredecible, y la

materialidad cósmica” (LÓPEZ, 1999, p. 167)

149 1. Ganglio linfático.2. Erupções na pele. http://lema.rae.es/drae/?val=Bubas.

Acesso em 03 de janeiro de 2015.

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124

Ximénez lista, neste texto, os atributos de poder que, segundo sua

interpretação, os K’iches’ identificavam como divindade. Seu julgamento

124isse124ário124124as sublinha, frequentemente, que se tratam de

impressões pagãs, idólatras e infundidas pelo demônio. O discurso de

Ximenes sempre cria um paralelismo com a Bíblia e chega a citar um dos

versículos do gênesis que teria sido desvirtuado.

Chávez traduz o mesmo excerto para: “espíritu del lago y mar”,

escolha que coloca a narração num contexto mais abstrato. Chaves (2007)

deixa de lado essas noções de sentido de dependência mútua e vital dos

elementos da natureza e do cosmos e resgata um léxico que se aproxima

da doutrina cristã. “De acordo com as decisões tomadas, as formas,

convenções e crenças que ordenem seu ato de traduzir, o tradutor pode

alterar não somente o cânon de uma cultura, mas modificar,

intencionalmente, toda e cada uma das imagens que se formam da

sociedade desse Outro a quem se está traduzindo” (YUSTE FRÍAS, 2001,

p. 803)

Sam Colop (2011, p.201) menciona o nome Tepew Qúkumatz,

que remete a um deus zoomorfo, mistura da ave quetzal e serpente,

conhecida também como serpente emplumada. De acordo com Craveri

(2012), Qúkumatz reflete a união do fator celeste, encarnado pela ave, e

o terrestre, encarnado pela serpente. Chavez (2007) opta por um dos

significados (v): 124isse124ário124 cantores; venidos del infinito,

ocultador de serpiente.“Este deus representa a expressão do equilíbrio

entre os princípios complementários diurnos e noturnos [...] A serpente,

certamente, encarna a fertilidade da terra e das águas. Entra em contato

com os ciclos vitais celestes e permite a união do cosmos.” (CRAVERI,

2012, p. 105, tradução nossa150).

Para Craveri (2012) os difrasismos constituem uma estrutura que

correspondia às recitações de textos rituais e míticos e, todavia, afirma

que “a tensão semântica nos termos associados e sua força metafórica se

desgastam pelo uso constante e lexicalização” (CRAVERI, 2012, p. 80),

de alguma forma as pessoas responsáveis pelas recitações teriam

150 Esta deidad se representa como la expresión del equilibrio entre los principios

complementarios diurnos y nocturnos, […] La serpiente, en efecto, encarna la

fertilidad de la tierra y de las aguas, entra en contacto con los ciclos vitales celestes

y permite la unión del cosmos.” (CRAVERI, 2012, p. 105).

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125

internalizadas estas regras mnemotécnicas e, de forma semelhante, as

nossas atuais colocações: expressões idiomáticas e 125isse125ár151,

tornando possível que a dificuldade para traduzi-las estivesse justamente

neste fator. Para Derrida, o tradutor “não se apropria de uma língua, nem

mesmo da língua materna, mas deve suportar o corpo-a-corpo com ela

[…] o idiomático, o que é mais próprio de uma língua não se deixa

apropriar. […] é o que resiste à tradução” (OTTONI, 2001, p. 85)

Colop, quando menciona em sua tradução la nación de la gente

K‘iche’ , (página 2 desta tese) oferece uma dimensão nova aos K‘iches’.

Tomamos da teoria da Inflexão Decolonial (RESTREPO; ROJAS, 2010)

algumas noções para fundamentar a análise da tradução de Colop como

uma tradução decolonial. O pesquisador, descendente da cultura K‘iche’,

busca transcender a perspectiva colonial e cristã, objetivando uma visão

intercultural e crítica dos mecanismos que têm subalternizado certos

conhecimentos, marcando-os como folclore ou “étnicos”, em nome do

eurocentrismo que se caracteriza por universalizar o conhecimento.

A decolonialidade postula um movimento argumentativo “ao

redor de um conjunto de problematizações da modernidade e,

particularmente, sobre o significado de dita experiência na perspectiva de

quem a vivenciou a partir de uma condição subalterna.”

(RESTREPO;ROJAS, 2010, p. 14, tradução nossa152). Estes estudos

provêm de universidades da América Latina e do Caribe e, juntamente

com algumas universidades dos Estados Unidos, propõem uma opção

decolonial postulada por Mignolo em 2001. Buscam compreender o

presente para formular o porvir, partindo de uma crítica ao eurocentrismo

em suas concepções orientadas pelo cristianismo, o liberalismo e até

mesmo o marxismo, e se propõem a realizar um trabalho à ótica das

perspectivas de nações indígenas ou de quaisquer outros povos oprimidos

pelos regimes coloniais.

Chávez (2007), desde as primeiras palavras traduzidas, mostra

seu posicionamento em relação ao comentado. Tanto Ximénez quanto

151 1.f.Refrán, proverbio, adagio, sentencia. (RAE - http://rae.es/). 152 “alrededor de un conjunto de problematizaciones de la modernidad y

particularmente sobre el significado de dicha experiencia en la

perspectiva de quienes la han vivido desde una condición subalterna”

(RESTREPO; ROJAS, 2010, p. 14).

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126

Chávez parecem manifestar influências judeo-greco-cristãs que imporiam

uma espécie de resistência em compreender a gênese do universo

apresentadas no Popol Wuj, cuja epistemologia López comenta: “não há

uma única força atuante, mas há múltiplas, não existe unidade, mas

diversidade e fragmentação de origens. Os múltiplos substituem o

absoluto, [...] e o perfectível o perfeito” (LÓPEZ, 1999, p. 149, tradução

nossa153). Tais conceitos parecem ser, por vezes, de difícil compreensão

para a epistemologia ocidental. Neste sentido, Colop (2011) demonstra

expressão aparentemente mais profunda daquilo que López (2009)

denomina “gênese aberta”.

Quadro 25 - Anciãos

el de el verde cagete, el de la verde hícara son llamados. Y juntamente es dicho, y

hablado. (i) de aquella abuela, y abuelo que se llamaban: xpiyacoc, y

Xmucane.

126isse126ário126 superiores, hijos mayores se decía; compañero de plática y

126isse126ário de la partera, abuelo que se llamaba Shpiyakok Shmukané;

los de la bóveda azul, como se dice, se nombra, se menciona a la comadrona (al

abuelo, Xpiyakok Ixmukane,

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1979, p. 31); Sam Colop (2011, p. 1)

Quadro 26 - Tradução para o português do excerto anterior

Ah Raxa Laq (Espírito do Prato Verde -Azul) e Ah Raxa Tzel (Espírito da Tigela

Verde -Azul), como se diz, que são também chamados. Que são também

conhecidos como Iyom (Mulher com netos) e Mamom (Homem com netos).

Xpiacoc e Xcumane são seus nomes,

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011,p.41-43)

Resulta oportuno destacar que, na cultura K‘iche’, os anciãos são

considerados fundadores de genealogias, sendo, por extensão,

reverenciados e respeitados (Quadros 25 e 26). Os deuses mencionados

neste parágrafo são apresentados como avó e avô, bisavó e bisavô: (i) de

153 “No hay una única fuerza actuante, sino que hay múltiples, no hay unidad, sino

diversidad y fragmentación de orígenes. Lo múltiple sustituye a lo absoluto, la

sucesión reemplaza a lo inmutable, y lo perfectible a lo perfecto.” (LÓPEZ, 1999,

p.149).

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127

aquella abuela, y abuelo q’ se llamaban: xpiyacoc, y Xmucane

(XIMÉNEZ, 1700-1704, f. 1r). Nos paratextos Escólios, Ximénez

menciona estas entidades sob a forma de uma dura crítica, desde sua

perspectiva espanhola.Devemos destacar que “nos últimos anos do século

XVII, a esperança de vida ao nascer não superava os trinta anos em muitas

regiões espanholas, ainda nos anos sessenta do século XX girava em torno

dos 50 anos” (GARCIA GONZALES, 2005, p. 12,tradução nossa154).Por

outro lado, na América Pré-colombiana “...a idade não era a mera

acumulação de dias e de meses representados aritmeticamente ao longo

da vida de uma pessoa, mas se organizava em frações de tempo em função

de certas características e capacidades individuais junto com as

necessidades comunitárias”. (GARCIA GONZALES, 2005, p. 24,

tradução nossa155)

Quadro 27 - “Sobre o ser de Deus” (Continuação)

También introducem en estos cuentos a un viejo llamado Xpiva-coc y a una vieja llamada Xmucane, de que trae origen el que el dia de hoy en todas sus cosas sean

los viejos consultados y más en los nacimientos de los niños ellos son los que asisten, y les dicen lo que han de hacer, y no permiten sacar fuego de la casa,

donde criatura recién nacida, hasta tiempo determinado, porque dicen que quemarán las casas en siendo grandes, y en muchos pueblos no sacan a las

criaturas de las casas, porque dicen, no se vuelvan andariegas y se huyan del pueblo, y en otros pueblos queman copal y encienden candelas, por

supersticiones particulares que tienen, y observan en muchos pueblos, luego que nace la criatura, y llevarla ante una el vachinel o devino, quien, obsevando el día de su nacimiento dice lo que ha de ser en adelante, y la inclinación que tendrá: y

para corregir algunas malas propiedades que dicen tendrán , les hacen sacar sangre de alguna parte del cuerpo con que dicen se corrigen algunas malas inclinaciones. Esto lo ven en un libro que tienen como pronóstico desde el

tiempo de su gentilidad, donde tienen todos los meses y signos correspondientes a cada día, que uno de ellos tengo en mi poder, y cada signo o señal de aquel dia es uno de los demonios que fingen en sus historias, y todas estas cosas consultan

a viejos embaidores y mentirosos, y hechiceros que hay entre ellos, aún hasta hoy.

154 “A finales del siglo XVII la esperanza de vida al nacer no superaba los 30 años en

muchas regiones españolas, aún en los años sesenta del siglo XX giraba en torno

a los 50” (GARCIA GONZALES, 2005, p. 12)

155 “…la edad no era la mera acumulación de días y de meses representados

aritméticamente a lo largo de la vida de una persona. Ésta se organizaba más bien

en fracciones de tiempo en función de ciertas características y capacidades

individuales junto con necesidades comunitarias.[ …] (GARCIA GONZALES,

2005, p. 24)

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128

Também introduzem nestes contos a um velho chamado Xpiva-coc e a uma velha

chamada Xmucane, de onde se origina o costume de que hoje em dia os idosos

sejam consultados nos nascimentos, eles são os que assistem, e dizem o que

devem fazer as famílias. Não permitem (por exemplo) tirar o fogo de dentro de

casa, onde a criança recém-nascida está, por um determinado período, porque

dizem que poderão queimar a casa quando ficarem maiores. Em muitos povos

não tiram as crianças das casas, para evitar que se tornem andarilhos e fujam do

povoado. Em outras vilas queimam copal e acendem velas, por superstições

particulares. Logo que nasce a criança, levam-na perante um adivinho, que,

observando o dia do seu nascimento diz o que há de ser no futuro e inclinações

que terá: e para corrigir algumas más tendências futuras, lhes tiram o sangue de

alguma parte do corpo, pois acreditam que isto irá corrigir as más inclinações

profetizadas. Consultam um livro como prognóstico desde o tempo de seu

paganismo, onde eles têm todos os meses e signos correspondentes a cada dia,

que um deles tenho comigo, e cada signo ou sinal daquele dia tem um dos

demônios que fingem em suas histórias, e por todas essas coisas consultam aos

velhos mentirosos e feiticeiros que há entre eles, até hoje.

Fonte: Ximénez (1700-1704, fólio, escólio) Tradução nossa.

No excerto anterior (Quadro 27), Ximénez expressa seu

desacordo com o difrasismo avó-avô (Xpiva-coc e Xmucane) como um

dos componentes do ser de Deus. Realiza uma descrição pormenorizada

do lugar que os idosos ocupavam na sociedade K‘iche’ e os menciona

com certo grau de estigmatização, por considerar que as funções que

exerciam como consultores e adivinhos (as tarefas de adivinhação, de

interpretar os calendários e fazer os mapas astrais ou uma espécie de

horóscopo das crianças, de acordo com o dia do seu nascimento) eram

relacionadas à intervenção do demônio. O que Ximénez tenta deixar claro

é o cotidiano impregnado de tradições e crenças, acompanhadas de rituais

e costumes herdados de geração em geração. Sua explicação é clara e

consegue criar no leitor imagens bem pormenorizadas dos costumes

K’iches’.

Chávez utiliza a palavra “parteira” como responsável pelas vidas

e pelos nascimentos, e abuelo (avô) para representar os progenitores da

humanidade. Para os maias, este parecia ser um vínculo lógico que conota

aos deuses do princípio sagrado de fecundação e fertilidade. Sam Colop,

nas suas notas, esclarece o significado de (ii) bóveda azul como “metáfora

associada ao plano verde da terra e ao azul da abóboda cósmica. Laq

significa prato e tzel redoma. Isto significaria que os guias espirituais

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129

mitológicos oferecem cerimônias a Terra e ao Céu” (COLOP, 2011, p.

202, tradução nossa156). As palavras Xpiyakok e Ixmukane,segundoColop,

significam respectivamente bisavô e bisavó.

Quadro 28 - Nomeação

nombres propios. amparadores, y cubridores dos vezes abuela, y dos vezes

abuelo son dichos en las historias quichées. que comunicaron. todo con los

q’hizieron después en el estado de la claridad y en la palabra de clarídad. Esto

escriviremos ya en la ley de Dios, en la cristiandad lo sacaremos porq’ ya no ay

libro comun, (i) original donde verlo.

amador y trabajador; dos veces partera, dos veces abuelo se decía en lengua

K‘iche’ .Contaron todo lo que hicieron ya en la clara realidad. clara

manifestación. Y si aquí escribimos ya con letra castellana, ya en cristianismo, en

esta forma lo divulgaremos porque ya no se verá del Pop Wuj,

así llamados los protectores, amparadores, dos veces comadrona, dos veces

abuelo, como se les dice en la historia K´iché cuando lo narraron todo, junto con

lo que hicieron en la claridad de la existencia claridad de la palabra.

Esto lo escribieron ya dentro de la prédica de dios, en el cristianismo. Vamos a

sacarlo a la luz porque ya no hay donde ver el Popol Wuj

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1997, p. 31); Sam Colop (2011, p. 1)

Quadro 29 - Tradução para o português do excerto anterior

Metzanel (Amparador) e Chuquenel (Protetor), Bisavó e Bisavô. Como se diz em

palavras quiches157. Então eles disseram tudo. E fizeram tudo também, em clara

existência. E claras palavras. Isso escreveremos agora na palavra de Deus, agora

na cristandade. Nós o preservaremos. Porque não existe mais uma visão do Popol

Vuh.

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.41)

As três formas de mencionar a obra que analisamos guardam o

mesmo sentido. Ximénez

156 “…metáfora asociada a lo plano y verde de la Tierra y de la bóveda cósmica. Laq

literalmente es ‘plato’, y tzel es recipiente de forma redonda. Esto quiere decir:

los quías espirituales mitológicos que ofrecen ceremonias a la Tierra y al Cielo.

El color azul está asociado a la bóveda del Cielo” (COLOP, 2011, p. 202).

157 Quiché: grafia escolhida pelos autores para K’ iche’.

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130

Figura 23 - Gravura em Madre Pérola

Fonte: NALDA (2006)

(1700-1704) o traduz como libro comum, Chavez (2007)como

Pop Wuj,e esclarece em seu prólogo com o significado de “livro do

conselho”. Colop (2011), por sua vez, o traduz como: “o livro comum; o

livro do povo, o livro do conselho”. Popol Vuh significa literalmente

“’Livro da esteira’. [...], as esteiras ou ‘petates’ eram símbolos da

autoridade e do poder dos reis. Eram utilizadas como assentos para os

governantes, integrantes da corte de alto escalão e líderes de linhagens.”

(UNIVERSIDAD, tradução nossa158). Na Figura 23, ilustramos estas

considerações com a foto de uma peça trabalhada com jade sobre uma

concha Spondylus, publicada em um artigo de Enrique Nalda na Revista

de Arqueologia Mexicana, nº 82159: “O personagem veste uma saia de

158 La palabra Popol Vuh significa literalmente “libro de la estera”. Entre los

pueblos mesoamericanos, las esteras o petates eran símbolos de la

autoridad y el poder de los reyes. Eran utilizadas como asientos para los

gobernantes, cortesanos de alto rango y cabezas de linajes. Por esta razón,

el título del libro se ha traducido como “Libro del Consejo”.(Disponível

em: <http://www.popolvuh.ufm.edu/index.php/El_Popol_Vuh>. Link

oficial da Universidad Francisco Marroquín. Guatemala. Consultado em

19 de junho de 2014). 159 “La concha grabada del edificio del búho, dzibanché, Quintana

Roomuestra en su interior a un noble que sostiene en sus brazos una

serpiente de cascabel, de la que se distingue su crótalo, su cuerpo con

marcas de diamantes y su cabeza con un jade por ojo y, posiblemente, una

pluma rematándolo. En ambas extremidades de la serpiente aparece una

deidad emergiendo de las fauces de una serpiente; un jade se incrustó en

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131

pele de jaguar e está sentado sobre o trono de esteira enrolada (expressão,

por si própria, de autoridade)” (NALDA, 2006, p. 16-17.tradução

nossa160). De acordo com Recinos (1950), Popol Vuh significa,

literalmente, livro da comunidade. A palavra popol é maia e significa

“junta, reunião ou casa comum. [...] Pop é um verbo quiche que significa

juntar as pessoas, [...] Popol é casa pertencente ao comunal, nacional. Por

esta razão Ximénez interpreta o Popol Vuh como Livro do Comum ou do

conselho.” (RECINOS, 1950, p. 52161).

Quadro 30 - Sombra e luz

De la otra parte de el mar es venido donde se a visto; q’es dicho su ser enseñada

nuestra obscuridad con la míradura de la clara vida. antiguamente avía libro

original q’se escrivío antigua mente; síno q’esta escondido al q’ lo míra, y al q’

lo piensa. Grande es su venida, y su ser enseñado.

ciencia que vino del otro lado del mar y que es relato de nuestro origen,

ciencia de la existencia se decía. Existe el primer libro (el Pop Wuj), es decir, la

antigua escritura. Esto es únicamente para lamentarlo, para meditarlo.

instrumento de claridad venido de la orilla del mar. Donde se cuenta nuestra

oscuridad instrumento de claridad sobre el origen de la vida, como se le dice.

Había un libro original, que fue escrito antiguamente, sólo que están ocultos

quienes lo leen quienes lo interpretan.

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1997, p. 31); Sam Colop (2011, p. 1)

Quadro 31 - Tradução para o português do excerto anterior

Uma visão das coisas claras. Veio do lado mar. A descrição das nossas sombras,

uma visão da vida clara, como é chamada. Houve uma vez o manuscrito disso, e

foi escrito há muito tempo, só que ocultando a face está o seu leitor, o seu

pensador.

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.43)

la lengua bífida y otro en la parte superior de la cabeza de la serpiente. La

deidad de la izquierda es el dios solar K’inich Ajaw.” (NALDA, 2006). 160 El personaje lleva una falda de piel de jaguar y está sentado sobre un trono

de estera enrollada (expresión, por sí misma, de autoridad), revestido

igualmente con una piel de jaguar” (NALDA, 2006)

161 http://www.colegiocalifornia.com.mx/wpcontent/uploads/2013/10/popol-

vuh1.pdf. Consultado em 19 de junho de 2014.

Page 133: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

132

Como mencionado na introdução desta pesquisa, seguimos a

linha investigativa proposta pelo arqueólogo López Austin (2009), que

atende à característica iconográfica do Popol Wuj. Consideraremos o

conceito de “cosmo visão” por constituir um arcabouço teórico que

envolve o mito, o rito e o icônico, associado a uma “última matriz

holística”, que interliga as manifestações pictóricas, escritas e orais

provenientes das várias formas de manifestações culturais da

Mesoamérica. Segundo Chinchilla, “a comparação de outras (várias)

fontes revela que os mitos recopilados no Popol Vuh, formavam parte da

tradição religiosa mesoamericana desde tempos muito antigos”

(CHINCHILLA, 2011, p. 24). O mesmo autor relata162 que, na antiga

Mesoamérica, a fundação de uma cidade e o estabelecimento de uma nova

dinastia era frequentemente equiparada com o nascimento de um novo

sol. De modo similar, a queda de uma cidade e de seus governantes

equiparava-se com o ocaso e a queda do astro.

Neste excerto (Quadros 30 e 31), encontramos a metáfora de

sombra e luz. Ximénez (1700-1704), em sua tradução, escolhe: “miradura

de la clara vida”. “Outra linha isotópica que oferece coerência aos

diferentes episódios é precisamente a manifestação solar luminosa, que

conota todas as atividades humanas, animais e vegetais.” (CRAVERI,

2012, p. 127, tradução nossa163). O arqueólogo Fabio Flores Granados

(2014) considera que o Popol Wuh não somente representa uma sorte de

enciclopédia dos valores substantivos dos K‘iches’, mas observa que os

transcritores do códice para o alfabeto latino o conceberam como um

“instrumento para ver”. Observemos que Ximénez especifica:

“antiguamente avía libro original q’se escrivío antiguamente; síno q’esta

escondido al q’ lo míra, y al q’ lo piensa. grande es su venida, y su ser

enseñado” (XIMÉNEZ 1700-1704). O mencionado autor inclui em sua

tradução o papel da obra como uma referência às tradições com o duplo

papel do mito e do rito, segundo as deduções de Craveri (2012). Granados

(2014) avança um pouco mais na sua perspectiva antropológica e alude

162“Aic yez aic Tlathuiz. Nunca será, nunca amanecerá. La caída de Tloteloco y los

mitos solares mesoamericanos.” (CHINCHILLA, 2011, p. 107)

163 “Otra linea isotópica que da coherencia a los distintos episodios es precisamente

la manifestación solar luminosa, que connota todas as actividades humanas,

animales y vegetales.” (CRAVERI, 2012, p.127)

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ao “quartzo”, cristal de rocha transparente, que os sacerdotes K‘iches’

utilizavam e ainda utilizam hoje nos seus ritos de adivinhação, como

analogia ao uso que os K‘iches’ realizavam com as sinalizações místicas

do Popol Wuj.

Devemos retomar, neste momento da análise, os comentários que

o tradutor registrou nos Escólios. O seguinte excerto no Quadro 32 fala

dos códices que supostamente continham o Popol Wuj, cuja origem já não

se conhecia no século XVIII.

Quadro 32 - Sobre o Popol Wuj

Dice que lo escribe dentro de la cristiandad porque todas estas cosas estaban

escritas y que vino de la otra parte del mar y que hoy no se puede leer, lo cierto

es que tal libro no apareció nunca, ni se ha visto y así no se sabe si este modo de

escribir era por pinturas, como los mejicanos, o por hilos como los peruleros;

puédese creer que era por pinturas en mantas blancas y tejidos; figuras que

denotaban las cosas, como hoy tienen los del pueblo de San Antonio en el

Quiché, como en mapa pintadas todas sus tierras, montes y ríos, en unas mantas

tejidas, y así es factible conservasen las memorias y antiguallas, y también se

puede discurrir que conservaron algo del libro del génesis, dado que

descendiesen de las 10 tribus que en tiempo de Salmanazar se perdieron, y del

libro del Éxodo, porque lo más tratan estas historias como se irá viendo, alude

todo a lo que la Sagrada Escritura

Fonte: Ximénez (1700-1704, fólio, escólios).Tradução nossa.

Neste excerto, volta a afirmar que considera uma hipótese de

origem hebraica para o povo K‘iche’, como descendentes de uma das 10

tribos do livro do Gênesis da Bíblia.

zWallerstein (2006) e Quijano (2000, p. 343) criaram o conceito

de colonialidade para ilustrar a forma como os processos de colonização,

desde seu início no século XV, marcaram os contrastes de poder entre as

metrópoles e as colônias. Ao finalizar a colonização como regime

político, permaneceu uma forma de pensar que legitima as desigualdades:

a colonialidade. Este modo de conhecimento eurocêntrico denominado

segundo os autores de “racional”, dá conta das necessidades cognitivas

do capitalismo e aparece como emblema da modernidade. O

eurocentrismo é uma perspectiva cognitiva compartilhada entre europeus

e colonizados, educados sob sua hegemonia. A característica principal da

colonialidade consiste em continuar funcionando como um esquema

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134

mental atravessando as emancipações políticas. Existe uma série de

especificações e conceitos sobre a colonialidade elaborados, entre outros,

por Quijano (2000), Wallerstein (2006), Mignolo (2001). Por necessidade

de concisão, sublinhamos um dos paradigmas que, de acordo com as

hipóteses desta tese, poderia associar-se com o trabalho de Don Inés

Chavez (2011). Trata-se do “universalismo’:

...o universalismo como epistemologia implica

uma noção da verdade ou do cognitivo do mundo:

A essência desta tese é que existem enunciados

gerais, significados a respeito do mundo - o

mundo físico, o mundo social - que são

verdadeiros universais e permanentes, e que o

objeto da ciência é a busca destes enunciados

gerais que eliminem todos os chamados

elementos subjetivos, quer dizer, todos os

elementos historicamente determinados

(WALLERSTEIN, 2006, p.50, tradução

nossa164).

Don Inés Chavez verbaliza a intenção de resgatar as tradições

K‘iches’ no prólogo de sua elaborada tradução realizada em quatro

colunas. Algumas das escolhas lexicais na tradução estudada chamaram

nossa atenção. Por exemplo, escolhe a palavra (ii) ciência, estabelece uma

analogia entre a noção de: (ii) relato de nuestro origen, e o conceito de

(iii) ciência da existência. Ao utilizar uma conceituação fundamentada

nos enunciados universais e permanentes do catolicismo e reforçar estas

noções pelo paradigma racional e modernista de “ciência”, aproxima-se

dos alicerces da doutrina maçônica. Neste excerto de um texto maçônico,

encontramos alguns pontos que poderiam justificar nossa suposição.

A instituição maçônica pode ser catalogada como

decidida partidária da Ciência e de seus avanços

sem nenhum tipo de receio. Não poderia ser de

164 El universalismo como epistemología implica una noción de la verdad y de lo

cognoscible del mundo: La esencia de esta tesis es que existen enunciados

generales, significativos acerca del mundo — el mundo físico, el mundo social —

que son verdaderos universales y permanentemente, y que el objeto de la ciencia

es la búsqueda de estos enunciados generales de la forma que elimine todos los

llamados elementos subjetivos, es decir, todos los elementos históricamente

determinados. (WALLERSTEIN, 2006 p.50).

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135

outro modo. Um dos grandes princípios

maçônicos, gravados no frontispício do seu

edifício filosófico, é o progresso da humanidade.

Conseqüentemente, tudo o que suponha um

avanço social, uma melhora material ou espiritual

da comunidade[...].(CRUZ, 1989, p. 91, tradução

nossa165)

Com a fundamentação anterior, retomamos as perguntas da

hipótese:

- Chavez responderia aos universais epistemológicos da

colonialidade?

- Chávez estaria inscrito no conceito da descolonialização?

Sabemos que um dos preceitos da Igreja Católica é a proibição

de qualquer forma de adivinhação. A tradução de Chávez homogeneíza

(BERMAN, 2007, p. 77) o texto, eliminando qualquer interpretação que

permitisse o viés de ‘oráculo’ que, de alguma forma, fica sugerido nas

outras duas traduções, e sublinha o aspecto racional da reflexão:Existe el

primer libro (el Pop Wuj), es decir, la antigua escritura. Esto es

únicamente para lamentarlo, para meditarlo.

Retomamos as noções de Willemart (2002, p. 27-28): “Estamos

todos inseridos em alguns mitos que nada mais são senão nossa maneira

de compreender o mundo”, retomando as considerações da introdução

desta tese,na qual propomos como objetivo observar até que ponto os

mitos K‘iches traduzidos poderiam estar ‘mitologizados’ pela

subjetividade dos tradutores. Apresentamos aqui a fundamentação que

demonstraria que Chavez, um descendente de K‘iches’, professor dessa

língua, oferece uma tradução descolonizada, ou seja, fora do período

histórico da colonização com a intenção de ser a primeira tradução escrita

por um K‘iche’, que demonstra uma preocupação com a fonética do

K‘iche’, porém contém elementos ideológicos provenientes da

epistemologia do colonizador.

165 “La institución masónica puede ser catalogada como decidida partidaria de la

Ciencia y de sus avances sin ningún tipo de recelos. No podía ser de otro modo.

Uno de los grandes principios masónicos, grabados en el frontispicio de su edificio

filosófico es el progreso de la humanidad. Consecuentemente con ello, todo lo que

suponga un avance social, una mejora material o espiritual del común de los

hombres, y la ciencia proporciona multitud de ejemplos, recibe los beneplácitos

de la masonería” (CRUZ, 1989, p. 91).

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Segundo Walsh (2005), decolonialidade deve diferenciar-se de

descolonização. Neste último, o mito colonizador permanece, isto é, trata-

se da “colonização do imaginário dos dominados. Quer dizer que atua na

interioridade desse imaginário.” (QUIJANO, 2000, p. 438). Segundo o

mesmo autor, as relações entre Europa ocidental e o resto do mundo,

“foram codificadas num jogo inteiro de novas categorias:

oriente/ocidente, primitivo/civilizado, mágico-mítico/científico,

irracional/racional, tradicional/moderno. Em suma, Europa e não-

Europa” (QUIJANO, 2000, p. 211, tradução nossa166). Parafraseando

Restrepo e Rojas(2010), a nova perspectiva temporal da história

eurocentrista ancorada na modernidade possui o ‘mito’ fundador de que

“a história da civilização humana é uma trajetória que parte de um estado

de natureza pura e culmina na Europa” (QUIJANO, 2000, p. 211,

tradução nossa167). Segundo o mesmo autor, as formas de operação da

colonialidade implicam, no começo, a repetição sistemática dos padrões

de expressão, de conhecimento e significação dos dominados com a

função de interromper definitivamente tais padrões e como meio de

controle social e cultural. Os dominadores impõem seus padrões de

expressão, suas crenças e imagens sobre o sobrenatural.

Sam Colop, no prólogo de sua obra, explica os passos de sua

pesquisa. Primeiramente, realizou a transcrição para o k'iche utilizando o

alfabeto contemporâneo “para que os k'iches falantes tivessem acesso à

leitura nesse idioma” (SAM COLOP, 2011, p. XIII, tradução nossa168).

Esta ação verbalizada na sua obra, por si só, já o inscreve na

decolonialidade.

Assim, falar da colonialidade é visualizar as lutas

contra a colonialidade pensando não somente a

partir de seu paradigma, mas, sobretudo, com base

na perspectiva das pessoas e de suas práticas

sociais, epistêmicas e políticas, considerando a

166 “fueron codificadas en un juego entero de nuevas categorías: Oriente-Occidente,

primitivo-civilizado, mágico/mítico-científico, irracional-racional, tradicional-

moderno. En suma, Europa y no-Europa” (QUIJANO, 2000, p. 211).

167 “la historia de la civilización humana es una trayectoria que parte de un estado de

naturaleza puro y culmina en Europa” (QUIJANO, 2000, p. 211).

168 “para que los K ‘iche’ ‘’´es hablantes tuvieran acceso a leerlo en ese idioma.”

(COLOP, 2011, p. XIII).

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137

presença do que Maldonado-Torres chama atitude

de-colonial.” (WALSH, 2005, p. 23, tradução

nossa169).

Em seguida, comenta a tradução para o espanhol e justifica as

motivações que o levaram a reescrever a obra, considerando sua forma.

Para ele, “Tais traduções, no geral, tem passado por alto a linguagem

poética em que foi escrito o manuscrito original” (COLOP, 2011, p. XIII,

tradução nossa170).

Quadro 33 - Os quatro rumos do universo

Cuando se acabó de formar todo el cielo, y la tierra, su ser cuadrado, su ser repartido en cuatro partes, su ser señalado, su ser amojonado con estacas, su

ser medido amecates, o cuerdas, y su ser estirada la cuerda en el cielo, y en la tierra; q’es dicho de cuatro esquinas, y cuatro lados por el Formador, y Criador,

su Madre y su Padre de la Vida, y de la Creación. q’da respiración, y resuello, paridos, y cuidados, de la paz, claridad de los hijos, pensador, y en- tendedor

(Folio 1 verso) de toda hermosura que hay en el zielo, tierra, lagunas y mar

Es muy extenso, porque relata desde que se terminó de cubrir el cielo y la tierra, ¡Cúspide del cielo! Lados del cielo! se dijo por el Arquitecto, el Formador ,

señora y señor de la existencia y de la humanidad: constructor y espíritu de la pura grandeza, de la clara creación, claridad varonil: meditador y pensador de

todo donde quiera, donde haya ciclo, tierra, Lagos, mares.

Es grande su descripción y el relato de cómo se terminó de crear todo el Cielo y la tierra: sus cuatro esquinas sus cuatro lados, su medición sus cuatro ngulos, Doblez de la cuerda para medir 171extensión total de esa cuerda en el Cielo, en la

tierra: En las cuatro esquinas. En los cuatro lados, como dice por parte de Tz´aqol, Bitol: Madre y Padre de la vida de la existencia, dador de corazón

Creador y Pálpito de la luz, de la eternidad; de las hijas nacidas en claridad de los hijos nacidos en claridad. El que medita, El que conoce de todo lo que existe en

el Cielo y en la Tierra en lagos y mares.172

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1997, p. 31); Sam Colop (2011, p. 1)

169 “Por lo tanto, hablar de la de colonialidad es visibilizar las luchas en contra de la

colonialidad pensando no solo desde su paradigma, sino desde la gente y sus

prácticas sociales, epistémicas y políticas, tomando en cuenta la presencia de lo

que Maldonado-Torres llama una “actitud de-colonial”. (WALSH, 2005, p. 23).

170 “Dichas traducciones, en general han pasado por alto el lenguaje poético en que

fue escrito el manuscrito original” (COLOP, 2011, p. XIII).

171 Aquí está haciendo referencia a la cuerda con que aún se miden los terrenos. Um

ej del manuscrito ha sido traducido como “la mitad”; pero significa ‘doblez’, con

la dobladura de los cortes que visten las mujeres mayas.

172 “cielo tierra” y ‘lago mar’, metonimias para referirse al cosmos y a todas

las aguas de la Tierra, respectivamente.

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Quadro 34 - Tradução para o português do excerto anterior

Grande foi o seu valor e a sua narração. Quando se concluiu o nascimento de

todo o céu e de toda a Terra: As quatro criações, as quatro humilhações, o

conhecimento das quatro punições, a corda de medir e atar, a linha de medir e

atar, o útero do céu, o útero da Terra. Quatro criações, quatro humilhações, como

contavam,

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.45)

Neste excerto (Quadros 33 e 34) está implícita a concepção

cíclica do tempo maia. Chávez (1979) capta esta ideia claramente quando

escreve: meditador y pensador de todo donde quiera, donde haya ciclo,

tierra, Lagos, mares, (meditador e pensador de tudo em todos os lugares,

onde exista ciclo, terra, lagos, mares). Sam Colop (2011) expressa esta

ideia com a palavra ‘eternidade’: Creador y Pálpito de la luz, de la

eternidad, (criador e pulsação da luz, da eternidade). Esta percepção sobre

o significado mais profundo das palavras K´iches’ chegaram até nós

graças à revisão feita por Chavez (1979), motivo pelo qual sua tradução

foi tão importante. O autor, por ter sido o primeiro K’iche’ a revisar os

manuscritos de Ximénez, conseguiu resgatar algumas idéias

fundamentais da epistemologia desse povo. “Tal como o define a visão

cíclica maia da história, no passado está escrito o futuro, que ao mesmo

tempo é uma lembrança do passado. Dito de outra forma, os maias viviam

numa constante interação entre o passado e o futuro a nível cotidiano”

(OKOSHI ARADA, 2000, tradução nossa173)

Ximénez escreve: “ o cuerdas, y su ser estirada la cuerda en el

cielo, y en la tierra; q’es dicho de cuatro esquinas” (ou cordas, e seu ser

com a corda estendida no céu, e na terra; que é dito de quatro cantos)

(XIMÉNEZ, 1700-1704, f. 1r). Edmonson (1971) traduz este excerto

como: “The womb of heaven, / The womb of earth. / four creations, / Four

humiliations,” [O ventre do céu/ o ventre da terra / quatro criações / quatro

quedas]. É a menos literal de todas as traduções, mas talvez seja a que

melhor reflita a cosmovisão maia pré-colonial(LÓPEZ, 2014, p. 24,

173 Tal como lo define la visión cíclica de la historia, en el pasado está escrito el futuro

y este porvenir, al mismo tiempo, es un recuerdo del pasado. Dicho de otra

manera, los mayas vivían una constante interacción entre el pasado y el futuro a

nivel cotidiano. (OKOSHI ARADA, 2000, s/p)

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139

tradução nossa174). O número quatro está relacionado com a organização

dos chamados “rumos do universo”. Para ilustrar este conceito,

exemplificamos com o deus K175 (K’inich Ajaw, Senhor do Olho Solar)

(Figura 24):“Gerador do tempo, da luz, do calor e dos quatro rumos do

universo, o sol chamado K’inich Ajaw(senhor do olho solar), era também

importante como deus criador, pois o concebiam como uma das

manifestações de Itzamnaaj.” (PEREZ SUAREZ, 2007, p. 20, tradução

nossa176)

Figura 24 - K´inich Ajaw Deidade solar

Fonte: PEREZ SUÁREZ (2007 s/p)

174 “Edmonson traduce este fragmento como: 'Thewomb of heaven, /

Thewomb of earth. / fourcreations, / Four humiliations,' [El vientre del

cielo / el vientre de la tierra / cuatro creaciones / cuatro caídas] (8). Es la

menos literal de todas las traducciones pero tal vez sea la que mejor refleja

la cosmovisión maya precolonial.” (LÓPEZ, 2014, p. 24) 175 A principios del siglo XX, identificó las primeras imágenes de ellos en

los códices del Posclásico. Utilizó 15 letras mayúsculas para nombrar

cada uno, de la A a la P, nomenclatura que aunque modificada, aún se

utiliza para identificar las imágenes de los principales dioses. 176 Generador del tiempo, la luz, el calor y los cuatro rumbos del universo, el Sol,

llamado K’inich Ajaw (Señor de Ojo Solar), era tan importante como el dios

creador, pues se concebía como una de las manifestaciones de Itzamnaaj.”

(PEREZ SUAREZ, 2007, p. 20)

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“O símbolo mais freqüente para representá-lo foi a flor de quatro

pétalas do glifo k´in (sol, dia, tempo e festa), que alude aos quatro rumos

do cosmos, razão pela qual a deidade solar se utilizava para representar o

número 4 (chan o k´an).” (PEREZ SUAREZ, 2007, p.18,tradução

nossa177).

Segundo o autor mencionado, os maias consideravam que por

cima da terra existiam treze céus e, por baixo, nove inframundos, cada um

deles com quatro rumos ou lados que coincidiam com os pontos

cardeais.Cada um deles tinha uma cor específica: o Oriente chamava-se

K´in ou sol nascente, sua cor correspondente era o vermelho. O Oeste era

Chi k´in ou sol poente, e sua cor era preto.

O Sul era conhecido como Nohol, sua cor era amarela, e era o

lugar por onde transitava Nohoch Ek, ou Vênus. O Norte era denominado

Xaman, sua cor era branca e o lugar por onde transitava Uh, a lua.

Segundo a autora, cada ponto cardeal era associado com uma ave

mitológica e quatro árvores que sustentavam o mundo. No centro do

mundo encontrava-se Chaak, o deus das chuvas, e suas cores são o verde

e o azul.Menciona a “sobrevivência de narrações recolhidas na época

colonial, como O Ritual dos Bacabes178, onde se descreve o pássaro O’

formando parte das mesmas estruturas simbólicas as quais aparece

associado também o deus da chuva: a árvore e as cores dos quatro rumos”.

(GARCIA BARRIOS, 2009, p.3, tradução nossa179).

Queremos deixar claro nesta explanação que os elementos

iconográficos maias aparecem concatenados e os significados são

complementários. O Popol Wuj responde à mesma lógica, cada conceito

possui profundidade e características tridimensionais que devem ser

observadas como um organismo dentro de um sistema.

177 “El símbolo más frecuente para nombrarlo fue la flor cuadripétala del glifo k’in

(Sol, día, tiempo y fiesta), que hace alusión a los cuatro rumbos del cosmos, razón

por lo que la cabeza de la deidad solar se utilizaba para representar el número 4

(chan o k’an)” (PEREZ SUAREZ, 2007, p. 18).

178 Ritual de sanação.

179 “pervivencia de narraciones recogidas en época colonial, como El Ritual de los

Bacabes, en donde se describe al pájaro O' formando parte de las mismas

estructuras simbólicas a las que aparece asociado también el dios de la lluvia: el

árbol y los colores de los cuatro rumos.”(GARCIA BARRIOS, 2009, p. 3)

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Quadro 35 - Difrasismo mãe e pai.

y cuatro lados por el Formador, y Criador, su Madre y su Padre de la Vida, y de

la Creación. q’da respiración, y resuello, paridos, y cuidados, de la paz, claridad

de los hijos, pensador, y en- tendedor

(Folio 1 verso) de toda hermosura que hay en el zielo, tierra, lagunas y mar

!se dijo por el Arquitecto, el Formador, señora y señor de la existencia y de la

humanidad: constructor y espíritu de la pura grandeza, de la clara creación,

claridad varonil: meditador y pensador de todo donde quiera, donde haya ciclo,

tierra, Lagos, mares.

como dice por parte de Tz ´aqol, Bitol: Madre y Padre de la vida de la

existencia; dador de la respiración, dador del corazón; Creador y Pálpito de la

luz, de la eternidad; de las hijas nacidas en [claridad de los

hijos nacidos en claridad. El que medita, El que conoce de todo lo que existe

en el Cielo y en la Tierra en lagos y ares.180

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1r); Chávez (1997, p. 31); Sam Colop (2011, p. 1)

Quadro 36 -Tradução para o português do excerto anterior

Feitos por Tzakol Bitol, a mãe e o pai da vida e da humanidade, o inspirador e

animador, gerador e animador da luz e da corrida, Zaquil al (Filhos da Mãe da

Luz), Zaquil qahol (Filhos do Pai da Luz), o Meditador, o pensador de tudo o que

existe: Céu, Terra, Lago e Mar.

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.45)

Neste excerto (Quadros 35 e 36) estão mencionadas as figuras de

pai e de mãe. Como observa Miguel Rivera Dorado (2005, p. 14), as

relações de parentesco têm um papel de grande importância na ordem

social maia. O culto aos antepassados constitui uma questão

preponderante, aliás, etno e historicamente discutida e documentada. Os

mesmos representariam a face divina dos fundadores das linhagens,

reforçando as legitimidades dinásticas, a coesão grupal e a identidade

coletiva. Os antepassados representavam o nexo entre o mundo dos vivos

e o outro mundo: o mundo histórico e o mundo mitológico,

protagonizando uma função política e social. Craveri (2012) explica que

as relações de parentesco brindam um valor universal ao grupo social.

180 “Cielo tierra' y ‘lago mar’, metonímias para referirse al cosmos y a todas las aguas

de la Tierra, respectivamente.” (COLOP, 2011, p. 204).

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Mãe e pai se manifestam como princípios de identidade e a

compenetração entre elementos opostos. “O difrasismo ajuda a

compreender a concepção do indivíduo como etapa de um processo

constante de vida, morte e regeneração” (CRAVERI, 2012, p. 111,

tradução nossa181). Os difrasismos apresentados nas três traduções falam

do princípio cósmico criador “Q'ukumatz, o dragão celeste” (CRAVERI,

2012, p. 103, tradução nossa182). Notamos que Ximénez (1700-1704)

traduz as palavras k'iches: Tz'aqol, Bitol, como Formador e Criador, e

Sam Colop (2011) mantém as palavras K'iches com este paralelismo. O

difrasismo reproduz na tradução a tensão semântica identitária que

“carrega os nomes da energia sagrada e da fertilidade necessárias à

criação. A função do difrasismo consiste em enfatizar o papel formador

dos seres divinos e de conotar cada um deles utilizando uma interação

recíproca” (CRAVERI, 2012 p. 103, tradução nossa183).

Chávez (1979) utiliza as palavra “El Arquitecto, el formador”,

outrossim, elimina a conjunção “y”, transformando o difrasismo numa

enumeração. Chávez (2007) traduz ‘mãe e pai’ como señora y señor de

la existencia y de la humanidad, priorizando o sentido de autoridade e

velando, como já observado acima com base em Craveri (2012, p.111), o

principio de “concepção do indivíduo como etapa de um processo

constante de vida, morte e regeneração”. O sentido de autoridade

provinha, para os maias, da transmissão de princípios éticos e religiosos

do passado mítico. A tradução de Chávez (2007) torna opaco o importante

aspecto vital-orgânico das manifestações da cultura maia. Ximénez

(1700-1701) e Chávez (2007) traduzem as palavras Alom e K'ajalom -

engendradora e engendrador em K'iche’ - que aludem justamente à

procriação advinda da parte da mãe e do pai. Parece que existia nos traços

semânticos que compõem o referido conceito a autoridade das linhagens

que Chávez (2007) destaca, mas o aspecto vital, que caracteriza a

181 “El difrasismo ayuda a comprehender la concepción del individuo como etapa de

un proceso constante de vida, muerte y regeneración” (CRAVERI, 2012, p. 111).

182 Q'ukumatz, el dragón celeste. (CRAVERI, 2012, p. 103)

183 “...carga los nombres de la energía sagrada y de la fertilidad y de la fertilidad

necesaria para la creación. La función del difrasismo es la de enfatizar el papel

formador de los seres divinos y de connotar cada uno de ellos por medio de su

recíproca interacción.” (CRAVERI, 2012, p. 111).

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143

mitologia K'iche’, aparentemente foi deixado de lado. Rivera Dorado

(2005), em seus estudos sobre religião maia, sublinha que o sistema de

crenças está intimamente adaptado ao meio da floresta tropical, tanto em

suas representações como em seus conceitos. Por sua vez, o aspecto

“orgânico” da cosmogonia em Chávez está amenizado, por defini-lo de

alguma forma. A frase seguinte da sua tradução é “Construtor e espírito

da pura grandeza, da clara criação, claridade varonil: meditador e

pensador de tudo em todo lugar, onde há céu, terra, lagos e

mares”(CHAVEZ, 2007, p. 31, tradução nossa184). Neste excerto da

tradução, os três tradutores conservam o sentido que aponta Craveri

(2012): “O difrasismo conota a humanidade em referência a elementos

espirituais. O que caracteriza esta humanidade é o seu desenvolvimento

intelectual e a capacidade de lembrar seus procriadores. A luz

proporciona um desenvolvimento humano mais profundo, vinculado com

o pensamento e a memória.”(CRAVERI, 2012, p.101, tradução nossa185)

Quadro 37 - O silêncio, o vazio e a quietude

Folio 1 verso.

ESTE ES SV SER DICHO QVANDO

estaba en suspenso, en calma, en silenzío, sin moverse, sin cosa sino vazío el

zielo. I esta es la primera palabra, y eloquençía. aun no avía hombres, animales,

pajaros, pescado, cangrejo, palo, piedra, hoyo, varranca, paja, ní monte; síno solo

estaba el cíelo. No se manifestava la haz de la tierra; sino q’ solo estaba el mar

represado, y todo lo de el cielo; aun no avía cosa alguna junta, ní sonaba nada, ní

cosa alguna se meneaba, ní cosa q’hízíera, mal. í cosa q’hízíera, cotz. Esto es

ruído, en el cielo. ní avía cosa q’ estuvíese, ní q’estuviese parada em pie; solo el

agua represada, solo la mar sosegada, solo ella represada, ní cosa alguna avía

q’estuviese; solo estaba en sílencio, y sosiego, en la obscuridad, y la noche;

RELATO DE LO QUE TODAVIA ERA SILENCIO, VIBRACIÓN,

FERMENTACION. VIBRABA, ESPASMABA, PALPITABA; ES DECIR

CUANDO ELCIELO ESTABA VACIO. Esta primera palabra es la primera

expresión; no habia gente, ni animal, pajaro, pez, congrejo, árbol, piedra, hoyo,

184 “constructor y espíritu de la pura grandeza, de la clara creación, claridad varonil:

meditador y pensadorde todo donde quiera, donde haya ciclo, tierra, Lagos,

mares.” (CHÁVEZ, 2007, p. 31)

185 “el difrasismo connota a la humanidad en referencia a elementos espirituales. Lo

que caracteriza a esta humanidad es su desarrollo intelectual y la capacidad de

acordarse de sus procreadores. La luz proporciona un desarrollo humano más

profundo, vinculado con el pensamiento y la memoria. “(CRAVERI, 2012, p.101)

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barranco, pajon, bosque; solamente estaba el cielo. No se veía tierra en ninguna

parte, solamente el mar estaba represado; el cielo, todo quieto; nada habia de eso

que es cosa, todo era absorción, nada se movía; recién acababase de hacer el

cielo, tampoco habia nada levantado. Solamente el agua estaba represada, el mar

estaba tendido, represado. No habia eso que es objeto; todo era formación, todo

vibraba en la oscuridad, en la noche.

Esta es, pues, su narración; todo está en suspenso,

todo está en repôs

En sosiego,

todo está en silencio;

Todo es murmullo y

está vacía la bóveda del

[Cielo.

Esta es, pues, la primera

[palabra

la primera expresión:

Cuando todavía no existía una

[persona

ni animal,

pájaro,

pez,

cangrejo,

árbol,

piedra,

cueva,

barranco,

pajón,

bosque,

sólo el Cielo existía.

Todavía no había aparecido la

[faz de la Tierra,

Sólo estaba el mar en calma

al igual que toda la

extensión del Cielo

Todavía no había nada que

estuviera junto

que hiciera ruido,

que se moviera por

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145

[su obra.

No había movimiento,

Nada ocurría en el Cielo.

No había nada que estuviera

[levantado

sólo agua reposada,

sólo el mar apacible,

sólo reposaba la soledad.

Y es que no había nada

[todavía,

Sólo había quietud

Y sosiego en la oscuridad

[en la noche.

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1v); Chávez (1997, p. 3b); Sam Colop (2011, p. 3)

Quadro 38 - Tradução para o português do excerto anterior

II

Aqui está a narração dessas coisas: na verdade, ainda estava quieto, na verdade,

ainda quaestava silencioso. Estava quieto, na verdade, ainda estava quieto, na

verdade estava calmo. Na verdade, estava solitário. E também estava vazio ainda,

o útero do Céu.

III

Estas foram, na verdade as primeiras palavras, as primeiras expressões. Não

havia ainda nenhuma pessoa, nenhum animal, Pássaro, Peixe, Caranguejo,

Árvore, Pedra, Buraco, Desfiladeiro, Campo ou Floresta. Por si só o Céu existiu.

A face da Terra ainda não era visível. Por si só o mar ficou represado. E o útero

do Céu, Tudo. Não havia mais nada, o que quer que fosse, em silencio, ou em

repouso. Cada coisa foi feita silenciosa. Cada coisa foi feita quieta, foi feita

invisível, foi feita para descansar no Céu. Não havia de fato nada então que

estivesse imóvel lá.

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.47)

No excerto acima apresentado (Quadros 37 e 38), que descreve o

silêncio, o vazio e a quietude seminais, existe uma sincronia entre a

gênese mítica e a gênese da obra, o início de ambas está marcado pela

palavra: “...esta é a primeira palavra e eloquência”(XIMÉNEZ,1700-

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1704. f. 1v, tradução nossa186). Chávez (2007) e Sam Colop (2011)

coincidem na tradução: la primeira palabra y expresión.

Premat (2013) analisa o paradigma filosófico do início de um

texto: “o que precede ao existente, pela atualização da crença na primeira

página, no primeiro gesto, na palavra inaugural capaz de atribuir um

sentido inteligível […] a todos os relatos humanos” (PREMAT, 2013, p.

41,tradução nossa187). Essa gênese não concebe um começo absoluto do

nada, do ex nihilo, para os maias, “o cosmos é um sutil receptáculo que

contém infinitas possibilidades de infinitas existências que podem chegar

a ser. Não há coisa no sentido corrente do termo, mas sim a latência da

vida” (LÓPEZ, 1999, p. 171, tradução nossa188). Ximénez (1700-1704) e

Chávez (2007) utilizam o pretérito: “Relato do que, todavia, era silêncio,

vibração, fermentação, vibrava, espasmava, palpitava; [...] quando o céu

estava vazio” (CHÁVEZ, 2007, p. 2a, tradução nossa189). Sam Colop

(2011) inicia a tradução em tempo presente. Explica nas notas que o uso

do tempo presente para narrar acontecimentos passados é uma

característica do discurso K'iche’: “…tudo está em suspenso, tudo está

em repouso. Em sossego, tudo está em silêncio; Tudo é murmúrio e está

vazia a abóbada celeste” (SAM COLOP, 2011, p. 3, tradução nossa190).

“O mito propõe uma identificação mimética entre os dois níveis (histórico

e mítico) e interpreta o momento presente como uma atualização do

passado.” (CRAVERI, 2012, p. 186, tradução nossa191).

186 “sta es la primera palabra y eloquencía” (XIMÉNEZ, 1700-1701, f. 1v).

187 “Lo que precede lo existente, por la actualización de la creencia en una primera

página, en un primer gesto, una palabra inaugural, capaces de atribuirle un sentido

inteligible a lo que sigue, es decir a todos los relatos humanos.” (PREMAT, 2013,

p. 41).

188 “el cosmos es un sutil receptáculo que contiene infinitas posibilidades de infinitas

existencias que pueden llegar a ser. No hay cosa en el sentido corriente del

término, pero si es la latencia de la vida.” (LÓPEZ, 1999, p. 171).

189 “Relato de lo que todavia era silencio, vibración, fermentación. Vibraba,

espasmaba, palpitaba; es decir cuando elcielo estaba vacio.Esta primera palabra

es la primera expresión” (CHAVEZ, 2007, p. 2a).

190 “...todo está en suspenso, todo está en reposo. En sosiego, todo está en silencio;

Todo es murmullo y está vacía la bóveda del Cielo” (COLOP, 2011, p. 3).

191 “El mito propone una identificación mimética entre los dos niveles e interpreta el

momento presente como una actualización del pasado.” (CRAVERI, 2012, p.

186).

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Nas três traduções, o narrador é onisciente, fala-se da criação

utilizando-se uma concatenação de entes ainda não existentes: “não havia

gente, nem animal, pássaro, peixe, caranguejo, árvore, buraco, barranco,

palha, bosque; somente estava o céu”(CHÁVEZ, 2007, p. 2a, tradução

nossa192). Para os maias K'iches’: “Mencionar as formas naturais pode ser

considerado como um ato cosmogônico verbal, no qual os deuses criam a

vida dos seres naturais através da evocação de seus nomes” (CRAVERI,

2012, p. 119, tradução nossa193). A referida autora comenta que o

vocábulo k'iche winaq significa “homem” e carece de uma conotação

própria. Somente adquire sentido simbólico pela relação de contraste com

outros seres e com a própria natureza: animais, vegetais e elementos da

paisagem, assim o ser humano afirma seu papel específico no mundo

interagindo com o meio ambiente. O texto coloca como elemento

primeiro a água, que se menciona em contraste com a terra. Chevallier

(1986) comenta sobre a simbologia da água, “...meio de purificação e

centro de regeneração. [...] As águas, massa indiferenciada, representam

a infinidade do possível, contém todo o virtual, o informal, o germe dos

germes, todas as promessas do desenvolvimento.” (CHEVALLIER,

1986, p. 52, tradução nossa194). A gênese do Popol Wuj se descreve

usando uma enumeração de objetos ausentes e suas manifestações:

“Ainda não havia nada que estivesse junto, que fizesse ruído, que se

movesse por si próprio” (CHÁVEZ, 2007, p. 3, tradução nossa195).

Através da comparação das traduções podemos descobrir algumas

características da semântica K'iche’, seu jogo de conotações por

contrastes. Descreve-se uma situação de quietude com uma alusão

específica à noite e a quietude de vida em potencial nas três traduções.

192 “no habia gente, ni animal, pajaro, pez, congrejo, árbol, piedra, hoyo, barranco,

pajón, bosque; solamente estaba el cielo” (CHAVEZ, 2007, p. 2a).

193 “La mención de las formas naturales puede ser considerada también como un acto

cosmogónico verbal, en que los dioses crean la vida de los seres naturales a través

de la evocación de sus nombres” (CRAVERI, 2012, p. 119).

194 “… medio de purificación y centro de regeneración [...]. Las aguas, masa

indiferenciada, representan la infinidad de lo posible, contienen todo lo virtual, lo

informal, el germen de los gérmenes, todas las promesas de desarrollo.”

(CHEVALLIER, 1986, p. 52).

195 “Todavía no había nada que estuviera junto, que hiciera ruido, que se moviera por

su obra.” (CHÁVEZ, 2007, p. 3).

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Quadro 39 - Enumeração dos deuses

solo estaba el criador y formador, Sor. culebra fuerte, las madres, y Pes. están en

el agua, en una claridad abierta y estaban cubiertos en plumas verdes, por eso se

llama qucumatz

Solamente El Arquitecto, El Formador, El Infinito, El Oculta Serpiente, El

creado, El Varon Creado estaban en el agua despejada, ahí estaban, estaban

ocultos entre el limo, entre el verdor, de cual vino el nombre de Ocultador de

Serpiente,

Sólo estaban Tz´aqol, Bitol, Tepew Q´ukumatz, Alom, K´ajolom en el agua

Dimanaban luz estando envueltas en plumas de quetzal en plumas azules; de ahí

la nominación de “Serpiente Emplumada”.

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 1v); Chávez (1997, p. 3b); Sam Colop (2011, p. 3)

Quadro 40 - Tradução para o português do excerto anterior

Todos sozinhos, Tzakol e Bitol, Tepev, e quq Kumatz, as Mães e os Pais estavam

na água. Luminosos eram eles então, e cobertos de penas de quetzal e de pombos.

Daí veio o nome de Quq Kumatz. Grandes sábios eram eles. E grandes

pensadores em sua essência, pois realmente há Kah (o Céu) E há também u Kux

Kah (o Coração do Céu). Esse é o nome do deus, como se contava.

IV

Assim então chegou a palavra dele aqui. Ela alcançou Tepev. E Quq Qumatz lá

na escuridão, na noite. Ela falou a Tepev. E Quq Qumatz, e eles falaram. Então

eles pensaram;

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.47)

Para analisar as traduções deste complexo excerto, devemos

ressaltar que se trata de uma enumeração de deuses míticos (Quadros 39

e 40), que no relato parecem estar ocultos na água. De fato, formam um

panteão de entes míticos que em K’iche’ se denomina “Popol Cabauil”

(LÓPEZ, 1999, p. 64). Parafraseando Craveri (2012, p. 14), a criação da

terra realiza-se como uma atividade conjunta, as raízes verbais dos nomes

das deidades conotam a cosmogonia como uma fusão de princípios vitais

que se complementam. Alom (Engendradora) e K'ajalom (Engendrador)

aludem à procriação, Tzaqol/B'itol possuem as raízes verbais da criação,

mas neste caso em relação ao modelado físico de uma matéria que já

existia, que pode ser o barro. O radical tz'aq significa: formar e edificar

muros.

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A tradução de Ximénez contextualiza o nome desta deidade em

singular: “somente estava o criador e o formador...” (XIMÉNEZ, 1700-

1704, f. 1v, tradução nossa196). Chávez (2007) também realiza uma

enumeração separada por vírgula, o que nos leva a interpretar que está

falando de um só ser: “Somente O Arquiteto, O Formador...” (CHÁVEZ,

2007, p. 2a, tradução nossa197), por último, Sam Colop (2011) utiliza o

verbo no plural e mantém os nomes em língua K’iche’: “Somente

estavam Tz'aqol Bitol” (SAM COLOP, 2011, p. 4, tradução nossa198),

estes detalhes nos apresentam uma divergência sobre a interpretação da

epistemologia mítica realizada pelos tradutores que identificaram o Popol

Cabauil como uma divindade única.

Craveri (2012) explica que a serpente representa a energia

telúrica e as penas de ketzal o princípio celeste. Chávez (2007) esclarece

nas notas que: “Tz'aqol, Bitol, Tepew Q´ukumatz, Alom, K'ajolom na

agua, […]antecipa que os deuses estavam envoltos em penas (verdes) e

que se encontravam na água, são mencionados como Majestosa serpente

com plumas.” (SAM COLOP, 2011, p. 4-202, tradução nossa199). Na

continuação, Sam Colop (2011) traduz: “Emitiam luz estando envolvidas

em penas azuis [...] Luz que sai dentre as penas. A palavra q'uq significa

quetzal, mas também assim se chamam suas plumas” (COLOP, 2011, p.

4-204, tradução nossa200). Segundo Chevallier (1986, p. 929), os

mesoamericanos - que ele menciona como ‘amerindios’ - dispunham

somente de uma palavra para designar as cores azul e verde. O

simbolismo das pedras azuis ou esverdeadas era duplo: por um lado há

um simbolismo solar associado à cor turquesa como correlata do

vermelho e, logo, do fogo. Por sua vez, a pedra turquesa, que carrega o

196 “...solo estaba el críador y formador” (XIMÉNEZ, 1700-1704, f. 1r.).

197 “Solamente EI Arquitecto, El Formador” (CHAVEZ, 2007, p. 2a).

198 “Sólo estaban Tz´aqolBitol” (COLOP, 2011, p. 4).

199 “Tz´aqol, Bitol, Tepew Q´ukumatz, Alom, K´ajolom en el agua. […] se anticipa

que los dioses que estaban envueltos en plumas y que se encontraban en el agua,

son nombrados como Majestuosa Serpiente emplumada” (COLOP, 2011, p. 4-

202).

200 “Dimanaban luz estando envueltas en plumas de quetzal en plumas azules […]

Luz que sale de entre las plumas. La palabra q´uq significa quetzal, pero también

así se llaman sus plumas.” (COLOP, 2011, p. 4-204.).

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símbolo lunar da fertilidade, de umidade e de renascimento, representava

justamente a cor da serpente emplumada. Craveri (2012, p. 181-182) nos

explica o sentido pelo qual a deidade geradora do universo maia é uma

serpente, imersa nas águas da criação, envolvida com penas de quetzal

(Figura 25). A serpente constitui um símbolo universal da transformação

temporal, da fertilidade e da persistência ancestral. Expressa a capacidade

de regeneração constante, vincula-se com a lua usada nos calendários para

dividir os meses. Seu movimento encarna o próprio princípio da vida e o

poder vivificante do sagrado. A serpente, no seu simbolismo polimorfo,

manifesta a fecundidade telúrica. “A energia da serpente ativa um tempo

cósmico abstrato que não cobre todas as manifestações temporais

vinculadas à vida do homem.” (CRAVERI, 2012, p. 182, tradução

nossa201).

Figura 25 - Serpente emplumada

Fonte: Pacal202

201 La energía de la serpiente activa un tiempo cósmico abstracto que no cubre todas

las manifestaciones temporales vinculadas a la vida del hombre”(CRAVERI,

2012, p. 182)

202 http://www.pacal.de/chitchenitza_en.html

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Quadro 41 - Atributos das divindades

grandes sabios, y de grandes entendimientos su ser. y así por eso está el zielo, y ay tambien su corazon de el zielo, este es su nombre q’se le dize a aquel ídolo. Y

entonzes vino aquí su palabra, vino con los Ses. tepeu, qucumatz aquí en bscuridad, en la noche, y abló con tepeu qucumatz. y dixeron, qo consultaron, y qo pensaron, se juntaron, hízíeron consejo, qo se declararon, y pensaron vnos a

otros. y en entonzes parezíeron las críaturas, que consultaron la hechura, y creazíon, de los palos, mecates, y la hechura de la vida, y de la creazíon, en la

obscuridad, y tinieblas, por el corazon de el zielo, q’se llama huracan. (esto es de un píe nombre propío). El primero se llama: caculha huracan. (nombre propio

q’dize: rayo de vna píerna) el Segundo: chípa caculha. (nombre propio q’dize el más pequeño de los rayos). Folio 2 reto y el tercero: RaxaCaculha (nombre ropio

q’ dice: verde rayo) con q’ suertes aquel su Corazón del Cielo, q’ vinieron con Tepeu, Gucumatz, entonces se consulto la vida, y la creación; pues como se

sembrara, y aclarar,

grandes sabios, grandes pensadores se originaron Asi es pues que el cielo estaba etéreo, pero estaba el espiritu del cielo, he aqui su nombre: "Doble Mirada", le

dicen. Vino y habló entonces aquí con el que viene del Infinito. Ocultador de Serpiente aqui en la oscuridad, de noche. se hablaron, pensaron y meditaron; se juntaron y se pusieron de acuerdo en pensamientos y palabras; se quisieron y se

amaron bajo esta claridad. De una vez pensaron crear la humanidade y su subsistencia; crearon el árbol y el bejuco, la subsistencia de Ia vida y de la

humanidad; esto fue en la oscuridad, en la noche por el Espíritu del Cielo llama do "Un Pie" "Rayo Un Pie" el primero, el segundo era "Mefique Rayo", el

terceiro era "Verdadero Rayo". Asi que eran três los espiritus del Cielo; lIegaron a donde el "Venido del Infinito", "Oculta Serpiente"; se ideo desde entonces la

clara existencia: - Cuando se ha de crear? Se ha de aclarar?

De granes sabios, de grandes pensadores en su esencia Asimismo estaba sólo el [Cielo y también Uk´u´x Kaj que es el nombre de dios, como se le dice.M Vino entonces aquí su palavra llegó donde estaba Tepew Q´ukumatz en la oscuridad, en la aurora. Habló con Tepew Q´ukumatz 203 dijeron entonces cuando pensaron cuando meditaron. Se encontraron y juntaron sus palabras y sus pensamentos Estaba claro, se pusieron de acuerdo bajo la luz; se manifestó la humanidad y se dispuso el surgimiento, la generación de árboles, de bejucos y el origen de la

vida, de la existencia en la oscuridad en la aurora, por parte de Uk´u´x Kaj llamado Jun Raqan. Kaqulja Jun Raqan, el primero, el segundo es Ch´ipi Kaqulja y el tercero Raxa Kaqulka cuando vinieron a hablar con Tepeu

Q´ukumatz, cuando se concibió el origen de la vida: ¿Cuándo tendrá que ser la siembra y el amanecer? 204

Fontes: Ximénez (1700-1704, f. 2r); Chávez (1997, p. 3b); Sam Colop (2011, p. 4)

203 “Recinos traduce “hablaron entre si Tepew y Gucumatz” cuando el texto K ‘iche’

‘’ dice que quien habló con ellos fue Uk´u ´x Kaj.” (CHAVEZ, 2007, p. 2a).

204 “La pregunta en el texto k ´iche: [...] está en forma imperativa. Esto quiere decir

que los dioses, después de decidir la creación humana sólo se preguntan por el

momento propicio para hacerlo. La ‘siembra’ y el ‘amanecer’ son expresiones

paralelas en el Popol Wuj, que están asociadas a la siembra de luz en el Cielo y al

surgimiento de vida en laTierra” (COLOP, 2011, p. 206).

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Quadro 42 - Tradução para o português do excerto anterior

Então eles refletiram. Então concluíram entre eles; Eles juntaram suas palavras. Seus pensamentos. Então geraram. Seus pensamentos. Então eles mesmos se encorajaram. Então mandaram que fosse criado. E geraram os homens. Então

conceberam o nascimento. A criação de árvores. E arbustos. E o nascimento da vida. E da humanidade. Na escuridão. Na noite por meio daquele que é u Kux

Kah. Hu r Aqan (Raio Um perna) é o primeiro, e o segundo é Chipi Ka Kukaha (Raio Anão). O terceiro então é Raxa Ka Kulaha (Raio Verde), Assim os três são Kux Kah. Então eles vieram a Tepev. E Quq Qumatz, e então foi a invenção da

luz.

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p.49-51)

Na tradução para o português encontramos esta primeira

manifestação da gênese descrita da seguinte forma: “A primeira união

alterna a atmosfera com a esfera, lança um nome brilhante como um raio

ou pensamento entre u Kux Kah (o coração do Céu) e Quq Kumatz

(Quetzal Serpente), iridescente na água noturna situada abaixo.”

(BROTHERSTON; MEDEIROS, 2011, p. 19).

Este texto pertence a um grupo de escritos muito antigos cuja

elaboração remonta ao período maia clássico, situado entre os anos 300 e

600 d.C.Neste excerto (Quadros 41 e 42) continua-se a descrição dos

atributos das divindades, “o caráter de estas figuras divinas é distante de

uma atitude bélica, comportam-se sempre em conselho (diálogo), [...]

digamos que são figuras hieráticas e telúricas ao mesmo tempo” (LÓPEZ,

1999, p. 64, tradução nossa205). López(2014, p. 24), no artigo inédito “El

Popol Wuj y la colonialidad”, comenta que Ximénez identifica o mundo

divino K'iche’ como uma entidade monolítica e o traduz com a palavra

‘ídolo’. Sam Colop (2011, p. 26) enumera os nomes em K’iche’, mas

finaliza sua enumeração com a palavra “dios” em minúscula. Por último,

Chávez realiza a tradução para “duplo olhar”, explicando nas notas: “Que

olha de noite e de dia: perto e no infinito” (CHÁVEZ, 1979, p. 2b,

tradução nossa206). “Christenson, porém, afirma que se refere ao conjunto

dos antigos deuses” (LÓPEZ, 2014, p. 25, tradução nossa207).

205 “el caracter de estas figuras divinas dista bastante de una actitud belicista, y se

comportan siempre en consejo, [...] digamos que son figuras hieráticas y telúricas

al mismo tiempo” (LÓPEZ, 1999, p. 64).

206 “Doble mirada”, significa que mira de noche cerca y el Infinito” (CHÁVEZ, 1979,

p. 2b).

207 “Christenson en cambio sostiene que se refiere al conjunto de los 'antiguos

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153

O Popol Wuj possui uma característica dialógica que justifica a

tradução muito difundida do seu título por “Livro do Conselho”. As

divindades mencionadas representam energias e símbolos concebidos de

acordo com os calendários maias, e das forças da natureza que se reúnem,

dialogam e integram-se para fundir suas energias, seus pensamentos e

intenções e assim realizam o gênese:

Uk´u´x Kaj que é o nome de deus, como se diz,[...]

no amanhecer falou com Tepew

Q´ukumatz,disseram então quando pensaram,

quando meditaram. Encontraram-se, juntaram

suas palavras e seus pensamentos. Estava claro,

ficaram de acordo sob a luz; se manifestou a

humanidade e se dispôs o surgimento, a geração

de árvores e trepadeiras a origem da vida, da

existência na escuridão na aurora, por parte

Uk´u´x Kaj chamado Jun Raqan.” (COLOP, 2011,

p. 5, tradução nossa208)

Tendo em vista que a superfície da trama pode, eventualmente,

tornar-se confusa para o leitor, evocamos uma explicação de López

(2014) sobre os três raios mencionados nas traduções: “Huracán209 (Jun

Raqan) significa turbilhão de uma perna: Chipí Caculhá (Ch'ipikaqulja)

significa raio pequeno, e Raxa-Caculha (Raxakaqulja), quer dizer raio

verde, talvez se refira ao trovão ou o relâmpago. Em conjunto referem-se

às poderosas descargas de energia que conectam o céu com a

terra”(LÓPEZ, 2014, p. 25, tradução nossa210). Chávez (2007) realiza

dioses'” (LÓPEZ, 2014, p.25).

208 “Uk´u´x Kaj que es el nombre de dios, como se le dice. Vino entonces aquí su

palabra llegó donde estaba Tepew Q´ukumatz en la oscuridad, en la aurora Habló

con Tepew Q´ukumatz dijeron entonces cuando pensaron cuando meditaron. Se

encontraron, juntaron sus palabras y sus pensamientos. Estaba claro, se pusieron

de acuerdo bajo la luz; se manifestó la humanidad y se dispuso el surgimiento, la

generación de árboles, de bejucos y el origen de la vida, de la existencia en la

oscuridad en la aurora, por parte de Uk´u´x Kaj llamado Jun Raqan” (COLOP,

2011, p. 5).

209 Furacão.

210 “Huracán (Jun Raqan) significa torbellino de una pierna; ChipíCaculhá

(Ch’ipiKaqulja) significa rayo pequeño, y Raxa-Caculha (RaxaKaqulja), quiere

decir rayo verde, tal vez se refiere al trueno o al relámpago. En conjunto se refieren

a las poderosas descargas de energía que conectan el cielo con la tierra” (LÓPEZ,

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uma interpretação deste excerto como um encontro extremamente

harmonioso entre Uk'u'x Kaj (Huracán) - que ele chama de “duplo olhar”

- e Gukumatz (serpente emplumada), e chega a defini-lo como amor.

Duplo olhar, lhe dizem. Veio e falou então aqui

com aquele que vem do infinito. Ocultador de

serpente aqui na escuridão, de noite. Se falaram,

pensaram e meditaram: se juntaram e ficaram de

acordo em pensamentos e palavras; se quiseram e

se amaram sob a claridade. De uma vez pensaram

criar a humanidade e sua subsistência; criaram a

árvore e a trepadeira, a subsistência da vida e da

humanidade. (CHÁVEZ, 1979, p. 2b, tradução

nossa211)

É importante destacar que nas notas de sua tradução, Chávez

(2007) escreve: “Um pé, significa que não possui sexo, um eterno, à

diferença do homem que tem dois pés, [...] homem ou mulher. […]

conceito que não está representado nos glifos.” (CHÁVEZ, 2007, p. 2b,

tradução nossa212). O tradutor repete a palavra Arquiteto e Formador,

termos que já foram comentados no início deste capítulo, e, na

continuação, descreve o panteão das divindades maias valorizando seus

atributos: a palavra e o pensamento. Os elementos diferenciados em sua

tradução por comparação com as traduções de Ximénez e Sam Colop

(2011), aqui estudadas, apresenta-se, primeiramente, no nome traduzido

de Hun Raqan para “duplo olhar”. Retomando as analogias propostas nas

hipóteses entre a tradução de Chávez (2007) e alguns elementos da

doutrina maçônica, notamos que um dos principais símbolos da mesma é

o “olho de Horus” da cultura egípcia. Este olho, casualmente, representa

uma forma de ver o infinito, já que possui capacidades divinas, enquanto

2014, p.25).

211 “'Doble Mirada', le dicen. Vino y habló entonces aquí con el que viene del

Infinito. Ocultador de Serpiente aqui en la oscuridad, de noche. se hablaron,

pensaron y meditaron; se juntaron y se pusieron de acuerdo en pensamientos y

palabras; se quisieron y se amaron bajo esta claridad. De una vez pensaron crear

la humanidad su subsistencia; crearon el arbol y el bejuco, la subsistencia de la

vida y de la humanidad” (CHÁVEZ, 1979, p.2b).

212 “...'Un pie', significa que no tiene sexo, un eterno, a diferencia del hombre que

tiene dos pies, es decir; o es hombre o es mujer. Por ser un concepto que no está

representado en ningún griflo” (CHAVEZ, 2007, p. 2b).

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o olho esquerdo representa a visão humana. Segundo Chevallier (1986),

Horus é um Deus egípcio com cabeça de falcão, representado geralmente

por um olho, chamado Olho de Horus, “seu combate legendário com Seth,

o malvado, que lhe feriu o olho, ilustra a luta da luz contra a sombra e a

necessidade de estar atento, de ter o olho aberto na busca da eternidade”

(CHEVALLIER, 1986, p. 578, tradução nossa213). O próprio Chávez

(2007) traça uma analogia entre a cultura maia e a cultura egípcia: “Osiris,

entre os deuses de Egito, aparece com um pé [e Huracán também]”.

(CHÁVEZ, 2007, p. 2b, tradução nossa214). Ambos são conceitos

secretos.

Por fim, encontramos no texto estudado frases que abrem

interrogações ou diálogos entre o Coração do Céu e a Serpente

emplumada. Craveri explica que o esquema comunicativo mais

importante do texto se fundamenta em diálogos “que abrem as ações e as

transformam na realização concreta de um ato verbal dos personagens. A

realidade do Popol Wuj é dinâmica e polissêmica com a incursão de

vários pontos de vista” (CRAVERI, 2012, p. 177, tradução nossa215).

Quadro 43 - Criação da terra

quien será hecho alimentador, y sustentador, dad vuestro voto. Esta agua salga,

desembarace para q’ se produzca la tierra, y sea su juntura, y así se siembre, y

aclare el cielo, y la tierra, y así no les será embarazo a las criaturas, y nuestras

hechuras, cuando fueren criados los hombres criaturas, y formadoras, y dijeron

cuando se formo la tierra por ellos, de solo decirlo se hizo la tierra, y estuvo

su Ser formado. Tierra dijeron, y luego al instante fue hecha. Así como la

neblina, y como nube su ser formado, en retazos cuando se puso como cangrejo

sobre el agua el cerro fue hecho. Solo por milagro, y maravilla fue hecho, y en un

instante juntamente se formo su producir cipreses, Primeramente se crío la tierra,

los montes, y llanos, se dividieron los caminos del agua, y anduvieron muchos

arroyos entre los cerros y en señaladas partes se paró, y detuvo el agua, y

213 “Dios egipcio con cabeza de halcón, hijo de Osiris e Isis, representado a menudo

por un ojo, el Ojo de Horus. Su combate legendario con Seth, el maléfico, que le

reventó un ojo, ilustra la lucha de la luz contra las tinieblas y la necesidad de estar

atento, de tener el ojo abierto en la persecución de la eternidad” (CHEVALLIER,

1986, p.578).

214 “Osiris de entre los dioses de Egipto aparece con un pie” (CHÁVEZ, 2007, p.2b).

215 “que abren las acciones y las transforma en la realización concreta de un acto

verbal del personaje. La realidad del Popol Wuj es dinámica y polisémica con la

incursión de varios puntos de vista” (CRAVERI, 2012, p. 177).

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entonces se mostraron los grandes cerros. Y así su ser formada la tierra, cuando

se crío por aquellos q’ se llaman el Corazón del Cielo, y el Corazón de la

Tierra, y esto es lo primero q’ discurrieron estando el cielo y la tierra dentro del

agua, y así su ser discurrido aquello q’ discurrieron, cuando pensaron su ser

perfeccionado, y su ser hecho por ellos.

Sea quien sea el buscador de la existencia, que se origine, no seais lentos porque

el agua no se quita, no desocupa; que aparezca la Tierra, que se tienda sola; dijo

entonces: - ¡Creaos! [Aclaraos Cielo, Tierra! Acaso no ha de ser el lugar de

invocacion, de contemplación de nuestros construidos, de nuestros formados?

[Originaos gente construida, gente formada! -asi dijeron. De una vez apareció la

Tierra por ellos, solamente por su palabra se hizo la Creación, al momento

apareció la Tierra. - iTierra! -dijeron. De una vez se creo, aparecio como nube,

como neblina fue su aparición. Aqui fue cuando surgio, salieron las montañas

dentro del agua; verdaderas grandes montañas resultaron; por su signo, por su

virtud se hizo la creación de las montañas, de las costas; de una vez aparecieron

con sus cipresales, sus pinares, así fue el aspecto. Se puso feliz el Oculta

Serpiente, -- Estuvo bien que hayas venido tu, Espíritu del Cielo, tu Un Pie, es

decir, tu último Rayo", "Verdadero Rayo"; salió bien nuestra obra, nuestra

formadura -dijeron. Primero apareció el asiento de las montañas y de las costas.

Luego se pensó en el camino de los ríos y corrieron; parecían piernas entre

montañas. Sólo se pensó y ya estaban corriendo los ríos, así se juntaron las

grandes montañas. Así fue como apareció la tierra, se originó por los espíritus del

cielo, por eso se decía “Espíritu de la tierra”, Al momento idearon primero la

existencia de la Tierra que salió del agua. Así fue como se ideó, idearon, se pensó

hacer bien.

¿Quiénes serán los proveedores, los cuidadores? ¡Que se haga la realidad! ¡Las

aguas que se aparten, Que se vacíe! Porque debe surgir la Tierra Su superficie

debe verse. Luego que venga la siembra que nazcan Cielo y Tierra, ¿ No es acaso

el lugar de veneración, de invocación, de nuestros formados, de nuestros seres

creados¡Que se origine la gente formada la gente construida!, dijeron entonces.

Luego surgió la tierra por su obra, sus palabras fueron suficientes para que

esto ocurriera, para que la tierra apareciera: _ ¡Tierra!, dijeron y de inmediato

emergió como si fuera sólo nube, como si fuera neblina empezó a aparecer

empezó a crecer. Del agua empezaron a salir los cerros y de inmediato en

grandes montañas se convirtieron. Sólo por su prodígio Solo por su poder se

consiguió la concepción de las montañas y valles.216 Que de inmediato rebosaron

de cipreses de pinos. Así , pues, se puso contenta la Serpiente Emplumada:

Estuvo bien que hayas venido tú Uk´u´x Kaj, tú Jun Raqulja, tú Ch´ipi Kaqulja.

Raxa Kaqulja.217 Salió bien nuestra obra nuestra construcción, dijeron entonces.

Primero, pues, se originó la Tierra las montañas y valles; se dispuso el camino de

las aguas los arroyos empezaron a caminar entre los cerros; ya se sabía el lugar

216 “Literalmente ‘montaña-valle’, es otra metonimia para referirse a la ‘superficie de

la tierra’” (COLOP, 2011, p. 206).

217 “Aquí se identifican cuatro nombres. Esto clarifica […] que son tres las

manifestaciones de 'Corazón del Cielo'” (COLOP, 2011, p. 206).

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de las aguas cuando parecieron las grandes montañas. Así fue, pues, el origen de

la Tierra cuando fue formada por Uk´u`x Kaj Uk´u´x Ulew, así llamado porque

fueron los primeros en pensarlo. El cielo fue separado y La Tierra fue apartada de

las aguas. Así fue, entonces, lo ejecutado cuando pensaron cuando meditaron

concluir, terminar su obra.

Fontes: Ximénez (1700-1704); Chávez (1997, p. 3a); Sam Colop (2011, p. 7)

Quadro 44 - Tradução para o português do excerto anterior

“Um protetor. Um nutridor: que assim seja. Você deve decidir sobre isso. Existe

água represada.Que deve ser descarregada, para criar isso, a Terra, e tê-la lisa. E

igual. Quando ela for plantada, quando ficar clara. Céu e Terra. Mas não haverá

nenhuma adoração ou glorificação daquilo que construímos. Daquilo que

modelamos, até que tenhamos criado também uma forma humana. Uma figura

humana, adoração ou glorificação daquilo que modelamos. Até que tenhamos

criado também uma forma humana. Uma figura humana”, assim eles disseram.

Assim, a Terra foi criada por eles. Só a palavra deles causou a sua criação. Para

criar a Terra, “Ulev” (“Terra”), eles disseram. Imediatamente ela foi criada. Era

apenas como uma nuvem, como uma névoa então. A criação então. O furacão.

Então à montanha. Foi dito que saísse da água. Imediatamente houve grandes

montanhas. Só o poder deles. Só a magia deles. Causou a criação então. A

invenção de montanhas e vales. Num instante foram também criados bosques de

cedro sobre elas. E florestas de pinheiros sobre elas. Assim Quq Kumatz se

alegrou. “Que bom que você veio, Ó u Kux Kah, Ó, Hu r Aqan. E você, Chipi Ka

Kulaha e Raxa Ka Kukaha. Nossa criação está bem feita. E nossa obra”, eles

disseram. E como eles haviam criado a Terra, as montanhas e vales, os caminhos

das águas ficaram desembaraçados e elas se puseram a descer as colinas. Então

os rios se dividiram mais. Conforme iam as grandes montanhas aparecendo. E

assim foi a criação da terra, que é obra deles, U Kux Kah, U Kuk Alev, como são

chamados. E eles foram os primeiros a pensar nisso. O Céu estava pronto e a

Terra estava pronta sob a água. E assim foi inventado o que eles imaginavam.

Enquanto eles refletiam sobre sua perfeição. Tudo foi feito por eles.

Fonte: Brotherston e Medeiros (orgs.) (2011, p. 52-53)

Segundo Craveri, esse fragmento (Quadros 43 e 44) é um bom

exemplo da estrutura do Popol Wuj. Neste caso, o referente principal é a

criação da terra pelos deuses, porém, a cosmogonia não está relatada

desde um único ponto de vista,mas pela interação de eventos que co-

participam na criação da vida. A narração não respeita uma ordem

cronológica e privilegia uma relação semântica entre referentes, como o

deus e a terra, as montanhas e os vales, a água e os rios. A seqüência

temporal dos acontecimentos está substituída pelos vínculos simbólicos

entre os conceitos, que sugerem a fusão de elementos complementários

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para o surgimento da vida. Menciona a criação da terra, das montanhas e

os vales no seguinte fragmento: “Primeiro, então, se originou a Terra, as

montanhas e vales” (CRAVERI, 2012 p. 33, tradução nossa218)“, mas a

cosmogonia se conclui somente nos seguintes: “Assim foi, então, o

executado quando pensaram, quando meditaram concluir, terminar sua

obra”(CRAVERI, 2012, p. 33, tradução nossa219)nas quais se

ressemantiza o conceito através de uma linha circular de desenvolvimento

cronológico. A vida não se origina somente por um ato unilateral dos

deuses, mas através da participação ativa dos elementos naturais, que

doam ao ato cosmogônico a fertilidade necessária para o nascimento do

universo.

Quando os deuses mencionam a terra, ela se forma, este binômio

palavra-ação realiza-se entre dois seres que estão de acordo (i.e. Huracán

e a Serpente Emplumada). Segundo Craveri (2012, p. 171) este

acontecimento responde a uma concepção mágico-religiosa das palavras,

ou seja, a voz é criadora e poderosa, atua concretamente sobre a realidade.

A voz dos personagens é o impulso da ação. Os deuses realizam sua obra

e ficam satisfeitos com aquilo que criam. Chávez (2007) e Sam Colop

(2011) expressam a concordância dialógica entre os deuses de uma forma

similar neste trecho da tradução. Há um elemento novo mencionado no

final do excerto: o Coração da terra, “no manuscrito linha 42, reza

vquxuleu (Uk’u’xUlew), que significa “coração da Terra, complemento

(feminino) de Uk’u’xKaj, o céu no sentido de Universo.” (LÓPEZ, 2014,

tradução nossa220). As energias masculina e feminina sempre se fazem

presentes para contextualizar a criação.Uma vez concluída a obra, as

deidades ficaram conformadas com ela, criaram a terra, as montanhas, os

arroios e rios. A partir deste momento a natureza está pronta para receber

os animais e os homens. Podemos observar outro recurso estilístico

característico do Popol Wuj proveniente da identidade oral do texto: o

retorno ao mesmo conceito. “Outro elemento [...] consiste na distribuição

218 Primero, pues, se originó la Tierra las montañas y valles (CRAVERI, 2012, p. 33)

219 “Así fue, entonces, lo ejecutado cuando pensaron, cuando meditaron concluir,

terminar su obra” (CRAVERI, 2012, p.33)

220 “En el manuscrito, línea 42, reza vquxuleu (Uk’u’xUlew), que quiere decir Corazón

de la Tierra, complemento (femenino) de Uk’u’xKaj, el cielo en el sentido de

Universo” (LÓPEZ, 2014, s/p)

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circular dos significados no texto, a narração não segue rigorosamente

uma ordem linear e progressiva, mas frequentemente retorna a agir sobre

si mesma para aprofundar conceitos já expressos e antecipar outros.”

(CRAVERI, 2012, p. 57, tradução nossa221).

Ximénez cria um texto mais conciso, eliminando algumas

reiterações. Chávez (2007) inclui um diálogo entre o “Espírito do Céu” e

utiliza a distribuição circular que retorna ao já mencionado para

aprofundar as idéias. Sam Colop (2011) escreve os nomes das deidades

em K'iche’ e sua tradução necessita de uma constante consulta às notas.

5.1 A CRIAÇÃO DOS ANIMAIS

No Popol Wuj o momento que antecede a gênese é carente de

luz, sua aparição delimita um novo ciclo de vida. A dualidade escuridão

e luz funciona, segundo López (1999, p. 179), como “matriz gestante de

transformação”. Nos relatos do Popol Wuj, as etapas não possuem um

sentido de complementaridade entre elas, o sentido reside no conjunto.

Existe uma tensão entre o realizado e o não realizado, entre o almejado

pelos deuses criadores e o realizado por eles. Existe um movimento em

etapas com o sentido de superação da imperfeição, se comparado com o

anteriormente feito e em relação com a intenção final do ato criativo, o

telos, o que nos apresenta uma concepção de criação não definitiva nem

perfeita, já que a perfeição,para a epistemologia maia,se alcança em

etapas aproximativas.

Quadro 45 - Traduções do mito da criação dos animais

Fólio 2v

Y después discurrieron los animales de el monte guardianes suyos de los montes

todos, sus criaturas de el monte, el venado, el paxaro, el leon, el tigre, la culebra,

la vívora, el cantí, guardas de los mecates, y dixo el criador sí solo ha de estar en

silencio, o han de estar en suspension debaxo de los palos, y mecates?

221 “Otro elemento[…], consiste en la distribución circular de los significados en el

texto, la narración no sigue rigurosamente un orden lineal y progresivo, sino que

frecuentemente vuelve sobre si misma para profundizar conceptos ya expressados

y anticipar otros” (CRAVERI, 2012, p. 57).

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De una vez crearon los animales de las montañas, los guardianes de las selvas,

los moradores de las montañas, venados, pájaros, tigres, leones, serpientes:

cascabel, cantí, bejuquillo. Dijo el Creado, Varón Creado. ¿Acaso sólo es

soledad? ¿Es bueno que haya silencio bajo los árboles y bejucos?

Luego se pensó en los animales del monte, cuidadores de cerros; En todas las

criaturas del bosque; venados; pájaros; pumas; jaguares; serpientes; cascabel;

barbamarilla; guardianes de los bejucos: Luego dijeron Alom

K’ajolom: ¿Es solo silencio o murmullo lo que ha de haber debajo de los árboles

y de los bejucos?

Fonte: Ximénez (1700-1704); Chavez (2007, p.4b); Colop (2011, p. 7)

Quadro 46 - Tradução para o português do excerto anterior

V

Então eles pensaram mais ainda nos animais selvagens, protetores da floresta, em

toda a população da floresta: Veado, Pássaros, Jaguares, Serpentes, Cascavéis,

Jararacas, Protetores de plantas. A Mãe disse isto, E o Pai: Deveria apenas estar

quieto. Ou não deveria estar quieto sob as árvores e os arbustos?

Fonte: Brotherston e Medeiros (2011, p. 55)

Na transcrição do manuscrito de Ximénez (1700-1704), o

tradutor coloca o ser que cria no singular: “el criador”,utiliza pronomes

possessivos, indicando que os animais criados pertencem ao criador:

“guardiões seus dos montes todos” (XIMÉNEZ, 1700-1704, Folio 2v,

tradução nossa222), enumera os animais, e intercala entre eles um animal

que não existe nas Américas, o leão, referindo-se possivelmente ao jaguar

americano.Ximénez utiliza a palavra “mecates”223, a mesma palavra que

foi traduzida por Chávez e Colop como ‘bejuco”, que significa planta

rasteira.

A função dos animais neste excerto (Quadros 45 e 46), segundo

os três tradutores, é cuidar das matas, da selva, dos morros. Chavez (2007,

p. 4b) fala dos criadores em plural, especifica que os animais foram

criados de uma só vez. Na tradução de Sam Colop (2011.p.7), utiliza-se

222 “guardianes suyos de los montes todos” (XIMÉNEZ, 1700-1704, Folio 2v.)

223 Que, de acordo com o dicionário da Real Academia Espanhola, é uma voz nauatl:

(Del náhuatl mecatl).1. m. Am. Cen., Méx. y Ven. Cordel o cuerda hecha

de cabuya (planta amarilidácea)”http://lema.rae.es/drae/?val= mecates. Acesso

em 24 de dezembro de 2014.

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o verbo impessoal “pensou-se”. Tal “pensamento” já traz implícito o

poder criador dos deuses, cujos nomes aparecem em língua K‘iche’,

“Alom K’ajolom”. Segundo o mesmo autor (2011, p. 201), Alom provém

da palavra “menina”, K’ajolom provém da palavra “menino” e a

partícula-Omfaz referência à “mulher que concebe” e o “homem que

engendra”. São adjetivos que fazem referência ao par criador numa leitura

antropomórfica. O excerto conclui com uma pergunta, obedecendo ao

caráter dialógico da obra: estes deuses multifacetados se perguntam se nas

árvores e matas não deveria existir alguma coisa além do silêncio, criando

uma expectativa e convidando à reflexão.

Segundo Nicholas J. Saunders (2005), em seu artigo “O jaguar

em Mesoamérica” publicado na revista de Arqueología Mexicana nº72,

comenta que o jaguar é o mais poderoso felino das Américas, e por mais

de três mil anos foi um dos mais importantes animais simbólicos da

Mesoamérica.

As imagens simbólicas mediante as quais se

representam os felinos e outros animais

emblemáticos não se limitam à mera

representação artística; esta reflete idéias e

crenças fundamentais, refere-se a um conceito

cultural do que se considera forte e valente,

perigoso e triunfante: é a representação por

excelência das forças elementares que escapam do

controle do ser humano. (SAUNDERS, 2005, p.

1,tradução nossa224)

A imagem do jaguar, como a da onça (ocelote) e a do puma,

aparece nas artes de todas as civilizações pré-hispânicas. Por representar

o poder e estar associada ao governo, os senhores costumavam proclamar

uma relação mítica com este grande felino, frequentemente utilizando

elementos próprios do jaguar e, em ocasiões especiais, vestiam-se com

seus atributos. Temos um exemplo nesta pintura mural de Cacaxtla,

224 La imaginería simbólica mediante la cual se representa a felinos y a otros animales

emblemáticos no se limita a la mera representación artística; ésta refleja ideas y

creencias fundamentales, se refiere a un concepto cultural de lo que se considera

fuerte y valiente, peligroso y triunfante: es la representación por excelencia de

fuerzas elementales que escapan del control del hombre. (SAUNDERS, 2005, p.

1)

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Tlaxcaxtlaque representa um governante praticamente coberto com uma

pele de jaguar e com garras no lugar de pés (Figura 26).

O primeiro estágio é a criação dos animais, primeira tentativa e

primeiro resultado para a formação de criaturas. Estes seres são

introduzidos subitamente, não se especificam os materiais utilizados, mas

são detalhados pelos seus nomes: “Veado, Pássaros, Jaguares, Serpentes,

Cascavéis, Jararacas” e pela sua função como guardiões da selva, função

que: “inaugura o lugar cósmico [que lhe corresponde dentro da criação]

[...] Isto evidencia que cada coisa é criada para uma determinada função

e os seres não são feitos ad labitum [...]. Perante o objetivo fixado, abrem-

se várias possibilidades alternativas[...]não há uma relação causa-efeito

entre a vontade e o ato” (LOPEZ, 1999, p.179,tradução nossa225).

Figura 26 - Governante vestido com roupas de Jaguar

Fonte: Saunders (2005)

225 Inaugura el lugar cósmico [...] Esto evidencia que cada cosa es creada para una

determinada función, y no son seres hechos ad libitum. […] Ante el objetivo fijado

se abren varias posibilidades alternativas. […] no hay una relación causa-efecto

entre la voluntad y el acto.” (LOPEZ, 1999, p. 179).

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Quadro 47 - A criação dos animais 2

y solo ha de estar bueno el q’aiga quien los guarde; dixeron cuando lo

consultaron, y parlaron y luego fueron produzidos venados, y paxaros, y entonzes

les repartieron sus casas a los venados, y a los pájaros.

Es bueno que hayan guardianes- dijeron. Entonces idearon, mejor dicho

platicaron y al momento aparecieron venados, pájaros. Les regalaron su casa al

venado, pájaro.

Es mejor que tengan sus guardianes, dijeron. Fue entonces cuando pensaron

cuando decidieron Y fueron creados de una vez los venados y a los pájaros

Fonte: Ximénez (1701-1704, Fólios 2v. e 3r.); Chávez (1979, p. 4a e 5a); Sam Colop,

(2011, p. 10-11)

Quadro 48 - Tradução para o português do excerto anterior.

“Na verdade, se existissem protetores seria bom”, disseram. E quando eles

pensaram e falaram, Repentinamente aquilo aconteceu. E foram criados veados e

pássaros.

Fonte: Brotherston e Medeiros (2011, p. 55)

Neste excerto (Quadros 47 e 48), Ximénez se refere aos deuses

em plural, e frisa o diálogo entre eles, de cuja pronúncia miraculosa

surgiram os animais: “e falaram [os deuses] e logo foram produzidos os

veados e os pássaros” (XIMÉNEZ, 1700-1704, f.2v,tradução nossa226).

Chávez (2007) deixa este poder da palavra fundadora muito claro: “É bom

que haja guardiões - disseram. Então idearam, melhor dito, conversaram

e, no mesmo momento, apareceram os veados, pássaros. (CHÁVEZ,

1979, p. 4b, tradução nossa227). Sam Colop acrescenta o pensamento à

palavra, e a tomada de decisão ao ato da criação: “‘É melhor que tenham

seus guardiões’, disseram.Foi então, quando pensaram, quando

decidiram,que foram criados de uma vez os veados e os

pássaros”.(COLOP, 2011, p. 7,tradução nossa228).

226 “y parlaron y luego fueron producidos venados, y paxaros” (Ximénez, 1700-1704,

f. 2v)

227 Es bueno que hayan guardianes- dijeron. Entonces idearon, mejor dicho platicaron

y al momento aparecieron venados, pájaros” (CHAVEZ, 1979, p. 4b)

228 Es mejor que tengan sus guardianes, dijeron. Fue entonces cuando pensaron

cuando decidieron y fueron creados de una vez los venados y a los pájaros”

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Quadro 49 - A criação dos animais (Continuação)

tu venado en los caminos de el agua; y en las barrancas dormíreís. aquí estarás,

en la paja, y en las yervas, en el monte de multiplicarás. en cuatro pies andarás, y

en cuatro pies te pararás les fue dícho cuando se les afírmo su morada a los

grandes, y pequeños paxaros. vosotros, vosotros paxaros sobre los palos, y

mecates haréis casas, y habitazíon, y allí multiplicaréis, os sacudiréis sobre las

ramas de los palos, y mecates les fue dicho a los venados y paxaros cuando

hizieron sus obras paxaros.

Tú bestia en los causes, en los barrancos dormiréis; permaneceréis entre el pajón,

en el llano; en la selva procrearéis, tendréis cuatro patas, serán vuestro sostén -

les dijeron. Se dispuso las moradas de los pequeños y grandes pájaros, sobre

árboles, sobre bejucos viviréis y haréis vuestros nidos ahí procrearéis; os

multiplicaréis en las ramas de los árboles en las ramas de los bejucos les dijeros a

las bestias y a los pájaros. Luego todos tomaron sus extremidades e hicieron sus

tareas. Así dispuso el creado, el Varón Creado que fueran los lechos de los

animales de la tierra; lo hicieron bien todos, bestias y a los pájaros

_ Tú, venado, en las orillas de los ríos en los barrancos has de dormir; Aquí has

de habitar : en el pajón entre la hierba; En el bosque se han de multiplicar. En

cuatro patas han de andar y sostenerse, les fue dicho. Luego establecieron

morada a los pequeños pájaros a los grandes pájaros; _Ustedes, aves, sobre los

árboles sobre los bejucos han de anidar han de habitar, aquí se han de reproducir

se han de multiplicar, en las ramas de los árboles en las ramas de los bejucos, les

fue dicho a los venados a los pájaros. Cuando hicieron Lo que había que hacer;

Todos tomaron sus habitaciones y lugar de estancia.

Fonte: Ximénez (1701-1704, Fólios 2v. e 3r.); Chavez (1979, p. 4a e 5a); Sam Colop,

(2011, p. 10-11)

Quadro 50 - Tradução para o português do excerto anterior.

Então concederam refúgios para o veado e para os pássaros. “Você, Veado, nas

margens e nos desfiladeiros irá dormir então. Lá você estará então, no pasto, nos

frutos. Na floresta vocês se multiplicarão então. De quatro vocês andarão, seu

modo de andar assim será”. Foi-lhes comunicado, e então eles esboçaram as

casas dos passarinhos e dos grandes pássaros, nas árvores, nos arbustos façam

suas moradias então. Façam suas casas então. Multipliquem-se ali então.

Cresçam, então, sobre os galhos das árvores nos galhos dos arbustos, foi

comunicado ao veado e aos pássaros. Quando eles fizeram sua criação, deram a

eles tudo: seus ninhos e tocas. E assim as casas dos animais estavam na terra.

Eles deram isso, a Mãe e o Pai. E também as atribuições de todos os veados e dos

pássaros.

Fonte: Brotherston e Medeiros (2011, p. 56)

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165

No excerto anterior (Quadros 49 e 50) os deuses determinam o

lugar que os animais ocuparão na natureza,para se proteger das

intempéries, procriar e se alimentar. Ximénez e Chávez utilizam os verbos

no imperativo, e Colop modaliza a ordem convertendo-a em um conjuro,

numa exortação. São mencionados os pássaros e o veado. Deste último,

no entanto, de acordo com Chinchilla (2011), não se encontra nenhuma

referência específica no Popol Wuj. “O Popol Vuh não contém nenhum

episódio que envolva explicitamente os gêmeos heróicos com um veado,

razão pela qual Coe qualificou a interpretação destas cenas como “um

problema ainda sem tratamento”(CHINCHILLA, 2011 p. 153, tradução

nossa229).A representação deste animal, entretanto, aparece em cerâmicas

da costa Sul (Figura 27).

Figura 27 - Vaso: homem abraçando um veado.

Fonte: Coleção do Museu Popol Vuh.(CHINCHILLA, 2011. p.177)

229 El Popol Vuh no contiene ningún episodio que involucre explícitamente a los

Héroes Gemelos con un venado, razón por la cual Cae calificó la interpretación

de estas escenas como "un problema todavía intratable". (CHINCHILLA, 2011 p.

153.)

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Parafraseando Montolíu (1976, p.154), o cervo teve um papel

muito importante no cerimonial religioso dos maias. Prova deste fato são

as inúmeras representações de veados e de oferendas deste animal que

aparecem nos códices, geralmente associado com os deuses, com outros

animais e com a época de secas. As características dos cervos pintados

nos códices de Madrid e Paris são as seguintes: cabeças e orelhas longas,

rabo longo e vertical (posição de corrida), chifres e presença de dentes

caninos. Alguns cervos são representados com a glândula lacrimal

exageradamente desenvolvida, pois existia a ideia de que o veado devia

morrer chorando, porque suas lágrimas iriam atrair as chuvas.

No excerto da tradução, relata-se a criação dos animais e seus

contextos. A obra mítica não apresenta especificações nem detalhes sobre

os animais que ultrapasse o relatado até aqui pelos K’ iches’.

Parafraseando De La Garza (1998,p.1),na mitologia K’iche’ as forças

naturais, o céu, o sol, a chuva, o vento,a terra etc.,eram concebidas com

características humanas, já que tinham mudanças de “humor”, ficavam

iradas, se alegravam e se alimentavam das oferendas que os homens

ofereciam. Os deuses podiam ter uma representação de animal e outra

antropomorfa.

As manifestações humanas das deidades, explica a

autora,possuem sempre alguma característica extraordinária, como dentes

caninos exagerados, olhos retilíneos, garras ou asas. As representações

mais presentes são as feições de serpente, de grande felino ou de ave

(Figura 28), os principais animais simbólicos na religião maia.As aves

aparecem em toda Mesoamérica representadas de formas diversas: “As

aves ocupam um importante lugar nas representações artísticas maias. Em

especial a ‘Ave Principal’ ou Bird Deity.[...] As diferentes narrativas

mostram, entre outros temas,governantes caracterizados de aves, assim

como a relação destas aves com as árvores”(GARCIA BARRIOS, 2009,

p.1).

De acordo com a mesma autora, durante o Clássico Temprano

diminuem as representações de aves em monumentos pétreos e aumentam

tais representações nos objetos de cerâmica.

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Figura 28 - Notário maia com cabeça de ave.

Fonte: Revista Mexicana de Arqueologia Nº 44.230

Quadro 51 - A criação dos animais (Continuação)

Fólio 2 v.

80 Entonzes se les dixo otra vez por el criador y formador a los venados, y a las aves: hablad, gritad, no hagaís íol, íol. no gríteís. hablad cada vno en su espeçie, en cada diferencia, se les fue dicho a los venados y pajaros, a los leones, tígres, y

culebras dezíd nuestro nombre, alabadnos, dezid q’somos vuestras madres, y vuestros Padres. huracan, chípí caculha, raxa caculha vquxcah, vquxuleu,

formadores, críadores, madres, y Padres. hablad, invocadnos.

Fólio 3 r

saludadnos se les fue dicho. y no pudieron hablar como los hombres; síno q’chíllaron, y cacaraquearon, y grítaron dizí endo voh, voh. no aparezío su habla, sino q’ cada vno gríto, y chíllo diferentemente y cuando los formadores oyeron que no hablaron dixeron otra vez entre sí, no se pudo acabar q’díxesen nuestro

nombre, porq’ somos nosotros sus formadores. y se les fue dicho seréis troca dos porq’ no pudísteís hablar, y así mudamos nuestra palabra, vuestra comída pasto,

y vuestro dormitorío, y habitazíon seran las barrancas, y montes, porq’ no acabasteís de saludarnos, no nos ínvocasteís, todavía ay quíen nos invoque, haremos otra vez quien nos obedezca.Vuestra carne será mascada y de eso

servíreís. se les fue dicho quando se les notifíco a todos los animales chicos y

230 Imagen: La cabeza de esta figurilla estaba desprendida cuando se le

localizó como parte de una ofrenda funeraria. La cabeza es la

representación de un pavo ocelado y el personaje es un dignatario por la

forma en que tiene colocados sus brazos y por estar sentado en una

banqueta; en el braguero lleva un signo con forma de cruz, que significa

aliento vital o viento. Tumba 1, Edificio 3, Grupo B. Palenque, Chiapas.

Clásico Tardío. Museo de Sitio Alberto Ruz Lhuillier.

Foto: Jorge Pérez de Lara / Raíces. Revista Mexicana de Arqueologia,

Nº44.

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gran des q’ay sobre la tíerra. y entonzes quísíeron otra vez probar su día, y quísíeron reprobar otra vez, y quisieron juntar otra vez, su salutazíon, y ya no se

entendíeron su habla entre sí mesmos, de nínguna suerte se ajusto, ní se pudo hazer, y así fueron ultrajados y desechadas sus carnes, tributaron, fueron comídos todos y muertos todos los animales q’ay aquí sobre la tíerra y así

probaron otra vez otras críaturas por el críador, y pruebese otra vez, ya se azerco la sembradura, y amanezímíento, hagamos sustentador nuestro, y mantenedor

nuestro. como seremos ínvocados, y q’se acuerden de nosotros sobre la tierra, ya probamos nuestras primeras hechuras, y formaduras.

El Arquitecto, Formador, Creado, Varón Creado les dijo enseguida a las bestias y a los pájaros: -Hablad, llamadme! No estes encogidos ambulando, no oláis nada más, cada uno, cada grupo, cada manada hablad diferente- les dijo a los venados,

a los pájaros, a los tigres, a los leones y culebras. Decid ahora mis nombres invocadme, soy vuestra madre, vuestro dueño. Hablad pues a “un pie” Último

Rayo, Verdadero Rayo, al Espíritu del Cielo, al Espíritu de la Tierra, al Arquitecto Formador, Creado, Varón Creado. Hablad, llamadnos, invocadnos-le dijeron. Pero no hablaron bien como la gente; Solo tonteaban, cacareaban, sólo

gritaban; como iban a ser buenas sus hablas; cada uno gritaba diferente. Al instante lo oyeron el Arquitecto, formador. - No hablaron bien - dijeron entre sí - dónde iban a decir nuestros nombres. Para eso somos sus constructores, es decir, sus formadores; dónde iba a ser bueno -dijeron entre si el Creado, Varon Creado - Y les dijeron: -Os cambiaremos porque no fuisteis Buenos, no hablasteis. Así que cambiamos nuestro parecer. Vuestro zacate, vuestro grano, vuestro lecho,

vuestro deambular, vuestro destino es el barranco, la selva, porque no fue buena invocación, no nos llamasteis. Todavía miro que habrá invocadores, los haremos

grandes. Tomarán vuestro servicio: vuestras carnes serán comidas, es vuestro destino. De manera pues, servíosles dijeron-.Así advirtieron a los pequeños

animales y a los grandes animales que hay sobre la tierra. Lucharon otra vez, probaron otra vez, invocaron otra vez. Pero oyeron sus palabras y no sirvió.

Y estando terminada la creación de los cuadrúpedos y Aves por el Creador

Formador; Alom K’ ajolom: _ ¡ Hablen Invoquen, que no sólo sean gorjeos deben invocar! Que hable cada quien según su especie

según su grupo, les fue dicho a los venados, a las aves, a los pumas,

a los jaguares, a las serpientes. _ ¡Digan nuestros nombres, Alábennos, a nosotros su madre creadora a nosotros su padre creador! _ ¡Digan nuestros

nombres, Alábennos, a nosotros su madre creadora a nosotros su padre creador! Digan entonces: Jun Raqan, Ch´ ipi Kaqulja, Raxa Kaqulja; Uk´u´x kaj, Uk´u´x Ulew; Tz´aqol, Bitol; Alom, K´ajolom; ¡Hablen, Invóquennos, adórennos!, les

fue dicho. Pero no pudieron hablar, no como la gente; Solo chilaban, Sólo cacareaban, Sólo aullaban. Su lenguaje no se manifestó claramente Cada quien gritó diferente. Cuando escucharon esto el Creador y el Formador, -No resultó bien, No hablaron, se dijeron entre sí. -No ha sido posible que digam nuestros nombres, el de nosotros sus creadores sus formadores. -No está bien, dijeron entre sí Alom, K´ajolom. Entonces les dijeron: -Serán cambiados, porque no resultaron bien no hablaron. Hemos cambiado nuestro parecer: su comida sus porciones; Sus habitaciones, su lugar de reproducción. Lo de ustedes serán los barrancos Los bosques porque no lograron adorarnos No lograron invocarnos

Fonte: Ximénez (1701-1704, Fólios 2v. e 3r.); Chavez (1979, p. 4a e 5a); Sam Colop,

(2011, p. 10-11)

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Quadro 52 - Tradução para o português do excerto anterior.

VII

Então também aos veados e aos pássaros disseram Tzakol e Bitol. A mãe e o Pai:

“Falem, então, clamem, então. Não gorjeiem, não gritem. Tentem se entender

entre si, dentro de cada espécie, em cada grupo” Ao Veado foi dito, e aos

Pássaros, Pantera, Jaguares, Serpentes... “agora digam então nossos nomes.

Adorem-nos, sua Mãe e seu Pai. Agora então digam isto: Hu r Aqan, Chipi Ka

Kulaha, Raxa Ka Kulaha, U Kux Kah, U Kux Alev, Tzakol, Bitol, Mãe e Pai.

Falem então, e nos chamem. Adorem-nos”, foi-lhes dito. Mas eles não puderam

falar como eles. Mas eles não puderam falar como homens. Apenas só emitiram

um ruído; e apenas grasnaram. A expressão da fala deles não se desenvolveu. Ao

contrário, deram gritos, cada um separadamente. Quando Tzakol ouviu isso,

eBitol, “Não se conseguiu ainda fazê-los falar”. Eles repetiram entre si. “Eles não

puderam pronunciar nossos nomes, embora sejamos seu Tzakol e seu Bitol. Não

é bom”, eles repetiram entre si, eles, a Mãe e o Pai. E eles disseram entre si

“Agora vocês se modifiquem, porque não se obteve sucesso. Já que não falaram,

iremos, portanto, alterar nossa palavra. Sua comida, seu alimento, seu lugar de

dormir, suas tocas, o que lhes pertence estará nos desfiladeiros e nas florestas.

Porque nossa veneração não foi obtida; vocês ainda não nos invocaram”. De fato

existe, ou tinha de existir um louvador.

Fonte:Brotherston e Medeiros (2011, p. 55 e 57)

A continuação, os deuses ordenaram-lhes que falassem, “mas

eles [os animais] não puderam falar como eles [os deuses]. Mas eles não

puderam falar como homens. Apenas só emitiram um ruído”

(BROTHERSTON; MEDEIROS, 2011, p.55). Definem-se, portanto, dois

aspectos: o das formas dos animais(aves, veados, felinos, etc.)e avaliação

da capacidade que demonstram para falar.

A criação dos animais apresenta-se como um

ensaio geral prévio, como uma preparação [para o

resto da criação][...] Isto se percebe no tom

imperativo com que repreendem as criaturas,

[reivindicando]que falem e que os reconheçam

como seus pais e mães, quer dizer, como os

dadores de vida. A forma correspondente aos

animais introduz a primeira diferenciação do

universo recém-manifestado, a palavra assume

um papel fundamental para definir a condição do

criado [...]:os animais não conseguem reconhecer

seus criadores e, como consequência, não podem

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reconhecer a si mesmos, por este motivo não se

constituíram como vinac (pessoas)(LÓPEZ,

1999, p. 182, tradução nossa231)

A partir daí os animais passam a ser considerados inferiores no

habitat criado e se convertem em alimentos para outros seres. Não

significa um retorno ao caos, mas implica uma reorganização da ordem

do desenvolvimento das manifestações da vida, ordem esta que se elabora

em etapas. Parafraseando López (1999,p.182), com esta mutação da

categoria dos animais, se expõe outro dos traços básicos da cosmovisão

Maia-K‘iche’: um ser perece para dar vida a outro, conotando uma cadeia

alimentar. Desta forma, a vida em permanente mudança e transformação

aparece como o único bem,realmente perene. Observamos a seguir as

escolhas tradutórias do corpus, e notamos algumas diferenças no léxico

utilizado e nos conceitos entre os três tradutores.

Este excerto (Quadros 51 e 52) manifesta uma das unidades

simbólicas do Popol Wuj, pois explicita,por um lado,que o objetivo dos

seres criados é adorar os deuses, entender suas palavras e obedecer aseus

desígnios. Por outro lado, mostra deuses que experimentam suas

hipóteses e que constroem o mundo por aproximações sucessivas.A

narrativa apresenta uma descrição dos sons produzidos pelos animais que

cria uma imagem digna de representação teatral, inclusive com certo

senso de humor, já que os criadores, como deuses, ordenam uma

performance que as suas criaturas não conseguem realizar, produzindo a

reorganização dos fatos na narração e uma estranheza sarcástica pela falta

de verossimilhança no leitor. Os animais não os compreendem e são

retirados do eixo da criação para se converter em alimentos de outros

seres. Segundo Sam Colop (2011, p. 207), a criação de veados e pássaros

são metáforas que implicam a criação de todos os animais.Em linhas mais

adiante, identificaremos outra classe de animais que equivale aos

guardiões das matas.

231 la creación de los animales se presenta como un ensayo general previo, como una

preparación [...] Esto se percibe en el tono imperativo con el que reclaman a las

criaturas, que hablen y los reconozcan como sus padres y madres, es decir, como

los dadores de vida. La forma correspondiente a los animales introduce la primera

diferenciación en el universo recién manifestado, y la palabra se pone como piedra

de toque para definir la condición de lo creado.[…] como los animales no

pudieron reconocer a sus creadores, tampoco pudieron reconocerse a sí mismos,

y por lo tanto no se constituyeron en vinac (personas)”(LÓPEZ, 1999, p. 182).

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171

5.2 UM EXEMPLO DE EPITEXTO DO POPOL WUJ, ILUSTRAÇÕES DE DIEGO

RIVERA

O material ícono-textual sobre o “Pop Wuj”, abaixo apresentado,

nos foi disponibilizado pelo colecionador e curador Dr. Adolfo Cantú, do

seu acervo, que promove o espaço CantuArt232, no México. As

reproduções que seguem foram digitalizadas e enviadas on-line, no mês

de outubro de 2013, especialmente para constar nas páginas desta tese.

Com base no presente material, lançamos apreciações a respeito

de componentes e características epitextuais nos desenhos de Diego

Rivera, inspirados no Popol Wuj. Incluímos aqui cinco aquarelas de

Diego Rivera, pintadas entre 1931 e 1937 e selecionadas entre as vinte

que compõem as ilustrações de uma edição limitada da tradução de

Chávez, de 2008.

Justificamos a inclusão deste material em razão dos objetivos

estabelecidos para a tese, no sentido de oferecer um catálogo de fontes

primordiais, em grau peritextual e epitextual, que permitam uma

abordagem didática do Popol Wuj para pesquisadores e educadores. A

partir de ponto de vista antropológico, estas obras do artista plástico

representam a vigência das tradições maias na cultura mesoamericana

contemporânea. Rivera, com suas criações, infunde, em pleno século XX,

nova vida aos antigos códices destruídos pela intervenção espanhola

devastadora ocorrida durante o século XVI.

O critério distintivo do Epitexto em relação ao

Peritexto é, em princípio, puramente espacial. É

epitexto todo elemento paratextual que não se

encontra anexado materialmente ao texto no

mesmo volume, mas que circula de algum modo

ao ar livre, num espaço físico e social

virtualmente ilimitado. O lugar do epitexto é,

pois, [...] em qualquer lugar fora do livro - sem

prejuízo, é claro, de uma inscrição posterior no

peritexto, sempre possível e da qual

encontraremos diversos exemplos (GENETTE,

2009, p.303)

232 http://cydtmuseum.blogspot.com.br/2007/08/diego-rivera-en-el-dibujo-sala-

iv.html.

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Incluímos aqui um exemplo de Epitextos do Popol Wuj

produzidos por Diego Rivera nos anos trinta e incluídos numa edição

limitada em 2008 para ilustrar a tradução de Chávez. Eis, na Figura 29, a

ficha catalográfica do trabalho aqui referido:

Figura 29 - Especificações bibliográficas

Fonte: “Pop Wuj, El libro del tiempo” (CHÁVEZ, 2008,p. 5)

Como se pode constatar, trata-se de uma edição em formato de

livro, medindo 28 x 21 cm. Comporta um total de 314 folhas e foi editado

pela Fundação Diego Rivera em 2008. Consta no prefácio que a aquarela

da Figura 30 foi o primeiro trabalho elaborado por Diego Rivera sobre o

Popol Vuh, razão pela qual também foi escolhida como a primeira

ilustração para o presente livro (RIVERA MARIN apud CHÁVEZ, 2008.

Ttradução nossa233).

Figura 30 - Primeira imagem do livro

Fonte: “Pop Wuj, El libro del tiempo” (CHÁVEZ, 2008, p. 5)

233 “De acuerdo con la información a nuestro alcance esta acuarela es la primera que

elaboro Diego Rivera sobre el Popol Vuh, razón por la cual fue elegida para la

portada del presente libro” (RIVERA MARIN apud CHÁVEZ, 2008)

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Na primeira ilustração, Diego Rivera representa a gênese da

criação circunscrita por duas serpentes emplumadas. No vão central da

pintura, observa-se as três versões do ser humano: (i) o homem de barro:

a primeira tentativa falha, desarticulada e rude; (ii) o homem de madeira

e, finalmente; (iii) o homem “de milho”, acompanhado pela última das

criaturas humanas a ser criada, a mulher, mas que aparece topicalizada

em primeiro plano na seqüência evolutiva. Representa os animais dos

oceanos, os seres terrestres e os entes voadores. Retrata também as

florestas e o inframundo. Todos os elementos da cosmogonia

relacionados com o simbolismo da serpente emplumada, que segundo

Chevallier (1986), reúne os elementos celestes e a força telúrica. O artista

respeita o formato canônico do universo, reproduzindo os quatro rumos

do universo maia. “Rivera consegue sintetizar o espírito da tradição

indígena, assim como a força do ritual e adoração das culturas pré-

colombianas, para mostrar sua riqueza e complexidade”234(ROMERO

HIKS apud CHÁVEZ, 2008, p.11, tradução nossa).

No prefácio desta edição (CHÁVEZ, 2008), encontramos o

índice, seguido de um prólogo com comentários de três autores. O

primeiro texto, de Romero Hiks235, se encontra nas páginas 11 e 12 sob o

seguinte título: “Palavras preliminares”. O autor explica a importância da

obra e as instituições envolvidas na edição236, explica, ainda, que esta obra

é a primeira no México com a incorporação das aquarelas realizadas pelo

artista Diego Rivera, em 1931. Entre outras informações, cabe destacar o

conteúdo do seguinte excerto: “Esta publicação proporciona elementos de

história, antropologia social e lingüística […] para resgatar nossas

origens, como uma sociedade que surge das raízes da época pré-hispânica,

forjando nossa identidade nacional”(ROMERO HICKS apud CHÁVEZ,

2008, p. 12, tradução nossa237).

234 Rivera logra sintetizar el espíritu de la tradición indígena, así como la fuerza del

rito y adoración de las culturas precolombinas, para mostrar su riqueza y

complejidad. (ROMERO HIKS en CHÁVEZ, 2008, p.11)

235 Director general del Consejo Nacional de Ciencia y Tecnología.

236 (CIESAS) Centro de Investigaciones y Estudios Superiores en Antropología

Social. (INAH) Instituto Nacional de Antropología e Historia y la Fundación

Diego Rivera.

237 Esta publicación proporciona elementos de historia, antropología social y

lingüística [...] para rescatar nuestros orígenes, como una sociedad que no surge a

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Na continuação, encontramos o segundo texto, de Virginia

Garcia Acosta, Diretora Geral do Centro de Investigações e Estudos

Superiores em Antropologia Social, que explica que a referida publicação

foi escolhida como o título número 1000 do fundo editorial desse Centro.

Também realiza uma explanação detalhada da relação que Diego Rivera

teve com a obra: “o maestro teve sempre (o Popol Wuj) como livro de

cabeceira” (GARCIA ACOSTA apud CHÁVEZ, 2008, p. 13,tradução

nossa.238). Explica que o projeto de publicação das obras de Rivera, como

ilustração da obra de Chávez, foi sugerida pela filha do artista, Guadalupe

Rivera Marin, que assina o terceiro texto do prefácio, uma crônica com

pinceladas biográficas da carreira artística de seu pai, relacionada com a

identidade mesoamericana. Ela transcreve alguns excertos das falas de

Diego Rivera: “Na Bíblia Maia-K’iché narra-se a história da criação do

mundo, do homem e do descobrimento do alimento. Eu acho graça, pois

adoro esse episódio que referencia como o homem inventou a Deus,

depois de que o raio o deixou meio imbécil e cheio de medo das forças

naturais. É quase um materialismo dialético. Excelente!” (RIVERA

MARIN apud CHÁVEZ, 2008, p. 26, tradução nossa239). Todavia, este

prólogo acrescenta alguns dados biográficos importantes sobre Don

Adrián Inés Chavez: “Em 1976, varias organizações indígenas o

condecoraram com o Colar de Jade na categoria Nimalaj eta’ manel (o

grande sábio), [...] [Também] leva seu nome a Declaração de

Totonicapán sobre o direito dos Povos à Língua, Guatemala outubro de

2002.” (RIVERA MARIN apud CHÁVEZ, 2008, p. 24, tradução

nossa240).

partir de la conquista, sino de raíces que nacen en la época prehispánica […]

forjando nuestra identidad nacional”(ROMERO HICKS en CHÁVEZ, 2008, p.

12)

238 El maestro tuvo siempre (al Popol Wuj) como libro de cabecera.” (GARCIA

ACOSTA en CHÁVEZ 2008, p. 13)

239 En la Biblia maya-quiché se narra la historia de la creación del mundo, del hombre

y del descubrimiento del alimento...Yo me rio porque me encanta ese episodio

que refiere cómo el hombre invento a Dios después de que el rayo lo dejó medio

imbécil y lleno de miedo por las fuerzas naturales. Es casi materialismo dialéctico.

Excelente!” (RIVERA MARIN en CHÁVEZ, 2008, p. 26)

240 “En 1976 varias organizaciones indígenas lo condecoraron con el Collar de Jade

en la categoría de Nimalaj eta’ manel (gran sabio), [...] lleva su nombre la

Declaración de Totonicapán sobre el derecho de los Pueblos a la Lengua, en

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No prefácio, constam também as circunstâncias que levaram à

criação dos desenhos e aquarelas:“A primeira série de ilustrações se deve

à iniciativa do escritor norte-americano Jhon Weatherwax (1900-1984),

[...] [que] levou a cabo uma tradução do Popol Vuj para um inglês não

acadêmico, mas coloquial; a tradução se intitula Seven-Times-the-Color-

of-fire: The Ancient American Mythology of the Popol Vuh e data do ano

de 1931 (RIVERA MARÍN apud CHÁVEZ, 2008, p. 27, tradução

nossa241). Cabe destacar que foram criados dois desenhos e três aquarelas

que não foram incluídas nesta edição, pois foram vendidas pelo artista em

1982 e se encontram, atualmente, dispersas em diferentes coleções

privadas.

De acordo com Giese (1999), houve uma segunda série realizada

por Rivera com o tema do Popol Wuj, formada por 17 aquarelas que

deixaram alguns questionamentos pela carência de referências. Não ficou

claro, no devir histórico, se o artista pretendia incluí-las em algum projeto

editorial. “Na opinião de Emma Lou Packar, assistente em 1940 do

maestro [...], a série das 17 aquarelas foi realizada entre 1934 e 1940.”

(GIESE, 1999, p.6). Das 17 aquarelas, 11 são de 31x48 cm, e6 de 24x24

cm e a assinatura das 17 aquarelas da segunda série possui as iniciais D e

R superpostas em forma de logotipo, como no exemplo da Figura 31

intitulada “A criação do Homem”. Aliás, chamamos a atenção do leitor

para observar o referido dado no canto inferior direito da pintura. O tema

escolhido está centrado nos primeiros relatos do Popol Wuj. É possível

observar cenas retratando os gêmeos heróicos e temáticas míticas muito

utilizadas na plástica maia. A título de ilustração, escolhemos um dos

excertos correspondente ao tema “a criação do homem” da tradução de

Chávez (Quadro 53). Cabe destacar que Diego Rivera não conheceu esse

texto e que sua associação com o mesmo foi escolhida per sua filha,

Guadalupe Rivera Marin, e pelas instituições já mencionadas,

responsáveis pela edição.

Guatemala, en octubre de 2002.”(Rivera Marín en Chávez, 2008, p. 24)

241 La primera serie de ilustraciones se debe a la iniciativa del escritor norteamericano

John Weatherwax (1900-1984),[...] (que) llevó a cabo , una traducción del Popol

Vuh a un inglés no académico sino coloquial ; la traducción se titula ‘Seven-

Times-the–Color-of-fire: The Ancient American Mythology of the Popol Vuh y

data del año 1931.” (RIVERA MARÍN em CHÁVEZ, 2008, p.27.kj)

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Quadro 53 - Texto correspondente à criação do homem

…grandes sabios, grandes pensadores se originaron así es pues que el cielo

estaba etéreo, pero estaba el espíritu del cielo, he aquí su nombre:

"Doble Mirada", le dicen.

Vino y habló entonces aquí con el que viene del Infinito. Ocultador de Serpiente

aquí en la oscuridad, de noche. Se hablaron, pensaron y meditaron; se juntaron y

se pusieron de acuerdo en pensamientos y palabras; se quisieron y se amaron

bajo esta claridad. De una vez pensaron crear la humanidad y su subsistencia;

...grandes sábios, grandes pensadores se originaram. Assim é, que o céu estava

etéreo, mas estava o espírito do céu, e este é seu nome: “Duplo olhar”, lhe dizem.

Veio e falou então aqui com aquele que veio do infinito. Ocultador de Serpente,

aqui na escuridão, de noite. Falaram-se, pensaram e meditaram; juntaram-se e

chegaram a um acordo em pensamentos e palavras; amaram-se sob a claridade.

De uma vez, pensaram em criar a humanidade e sua subsistência;

Fonte: Chávez (2007, p. 2b) Tradução nossa.

Figura 31 - A criação do Universo, Diego Rivera.

Fonte: “Pop Wuj, El libro del tiempo” (CHÁVEZ, 2008, p. 15)

Nas aquarelas de Diego Rivera, as formas de homens e animais,

deuses e astros são coerentes com o estilo do desenho dos maias

chamados “tlacuilolli”, que, segundo Brotherston e Medeiros (2011),

significa “coisa escrita ou pintada”,em língua nauátle (Figura 1 desta

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tese), e com os desenhos do códice de Dresde (Figura 2desta tese). O

pintor respeita essa estética: todos os indivíduos se apresentam de perfil,

seus olhos e suas características físicas seguem um modelo definido, os

enfeites são feitos com plumas, como os códices maias. Aproveita os

temas do rito e o mito.

As pinturas de Rivera se constituem como epitexto, já que se

encontravam “em qualquer lugar fora do livro [...] eventualmente

destinadas a uma publicação posterior, ântuma ou póstuma” (GENETTE,

2009, p.303-304). A função do epitexto, segundo o mesmo autor, não é

sempre exclusivamente paratextual, mas pode nos fornecer “fragmentos

de interesse, por vezes, capital de paratexto” (GENETTE, 2009, p. 304).

Neste caso, o interesse nas ilustrações se fundamenta na vigência das

imagens icônicas geradas pelo Popol Wuj na imaginação de um povo,

uma cosmogonia proveniente das terras altas de Guatemala (Anexo 1),que

concentra grande parte das tradições mesoamericanas capaz de ser

representada pelo artista plástico mexicano mais importante do século

XX.No Quadro 54, transcrevemos a história de Ixquic e sua sogra, para

buscar entender o conteúdo da pintura de Diego Rivera intitulada

“asombro recolectado” (Colheita do assombro) (Figura 32).

Quadro 54 - A história de Ixquic com sua sogra

Al llegar la mujer ante la anciana, le dijo la mujer a la abuela: —He llegado,

señora madre; yo soy vuestra nuera y vuestra hija, señora madre. Así dijo cuando

entró a la casa de la abuela. —¿De dónde vienes tú? ¿En dónde están mis hijos?

¿Por ventura no murieron en Xibalbá? ¿No ves a éstos a quienes les quedaron su

descendencia y linaje y que se llaman Hunbatz y Hunchouén? ¡Sal de aquí!

¡Vete!, gritó la vieja a la muchacha. —Y sin embargo, es la verdad que soy

vuestra nuera; ha tiempo que lo soy. Pertenezco a Hun-Hunahpú. Ellos viven en

lo que llevo, no han muerto Hun Hunahpú y Vucub-Hunahpú: volverán a

mostrarse claramente, mi señora suegra. Y así, pronto veréis su imagen en lo que

traigo, le fue dicho a la vieja. Entonces se enfurecieron Hunbatz y Hunchouén.

Sólo se entretenían en tocar la flauta y cantar, en pintar y esculpir, en lo que

pasaban todo el día, y eran el consuelo de la vieja. Habló luego la vieja y dijo: —

No quiero que tú seas mi nuera, porque lo que llevas en el vientre es fruto de tu

deshonestidad. Además, eres una embustera: mis hijos de quienes hablas ya son

muertos. Luego agregó la abuela: —Esto que te digo es la pura verdad; pero en

fin, está bien, tú eres mi nuera, según he oído. Anda, pues, a traer la comida

parados que hay que alimentar. Anda a cosechar una red grande (de maíz) y

vuelve en seguida, puesto que eres mi nuera, según lo que oigo, le dijo a la

muchacha. —Muy bien, replicó la joven, y se fue en seguida para la milpa que

poseían Hunbatz y Hunchouén. El camino había sido abierto por ellos y la joven

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lo tomó y así llegó a la milpa; pero no encontró más que una mata de maíz;[ no

había dos, ni tres, y viendo que sólo había una mata con su espiga, ]se llenó de

angustia el corazón de la muchacha. —¡Ay, desgraciada de mí! ¿A dónde he de

ir a conseguir una red de maíz, como se me ha ordenado?, exclamó. Y en seguida

se puso a invocar al Chahal de la comida [para que llegara y se la llevase.] —

lxtoh, Ixcanil, Ixcacau, vosotras las que cocéis el maíz; y tú Chahal, guardián de

la comida de Hunbaíz; y Hunchouén!, dijo la muchacha. Y a continuación cogió

las barbas, los pelos rojos de la mazorca. Luego los arregló en la red como

mazorcas de maíz y la gran red se llenó completamente. Volvióse en seguida la

joven; los animales del campo iban cargando la red, y cuando llegaron, fueron a

dejar la carga a un rincón de la casa, como si ella la hubiera llevado. Llegó

entonces la vieja y luego que vio el maíz que había en la gran red, exclamó: —

¿De dónde has traído todo este maíz? ¿Por ventura acabaste con nuestra milpa y

te la has traído toda para acá? Iré a ver al instante, dijo la vieja, y se puso en

camino para ir a ver la milpa. Pero la única mata de maíz estaba allí todavía y

asimismo se veía el lugar donde había estado la red al pie de la mata. La vieja

regresó entonces a toda prisa a su casa y dijo a la muchacha; —Esta es prueba

suficiente de que realmente eres mi nuera. Veré ahora tus obras, aquellos que

llevas (en el vientre) y que también son sabios, le dijo a la muchacha.

Chegando a mulher (Ixquic) perante a anciã, falou para a avó: - Cheguei, senhora

mãe; eu sou sua nora e sua filha, senhora mãe. Assim falou quando entrou na

casa da avó. - De onde tu vens? Onde estão meus filhos? Por acaso (não sabes

que) morreram em Xibalba? Não vês a estes (mostrando os dois netos presentes)

a quem lhes deixaram sua descendência e linhagem e que se chamam Hunbatz e

Hunchouén?! Sai daqui! Vai!, gritou a velha. - Porém, é verdade que sou sua

nora, faz tempo que sou. Pertenço a Hun- Hunahpú. Eles vivem no que levo (está

grávida), Hun Hunahpú e Vucub Hunahpú (filhos da idosa que foram dados por

mortos no inframundo) não morreram: voltarão a aparecer claramente, minha

senhora sogra. E, assim, logo vai ver sua imagem (nos netos que vão nascer),

disse à velha. Então, agitaram-se Hunbatz e Hunchouén (os outros netos ali

presentes). Estes somente se entretinham tocando flauta e cantando, pintando e

esculpindo, e nessas atividades passavam o dia todo e eram o consolo da anciã. E

a velha mulher disse: - Não quero que tu sejas minha nora, porque o que levas no

ventre é fruto de tua desonestidade. Além disso, és mentirosa: meus filhos estão

mortos. Logo, acrescentou a avó: [...] Enfim, está bem, és minha nora. Vá então

trazer comida para estes dois que tenho de alimentar. Vá colher uma rede grande

(de milho) e volta logo. _ Muito bem, disse a moça, e foi para a Milpa242

de

Hunbatz e Hunchouén. A estrada tinha sido aberta por eles, e a jovem foi por ela

até a milpa; mas encontrou somente um pé de milho com espiga, [...] e seu

coração se encheu de angustia. _ Ai, desgraçada de mim! Aonde irei para

conseguir uma rede de milho como foi ordenado para mim? - exclamou. E logo

começou a invocar ao Chahal243[...] - Ixtoh, Ixcanil, Ixcacau, vós que cozinhais

o milho e tu,Chahal, guardião da comida! [...] e a grande rede se encheu de

milho. A jovem voltou, os animais do campo carregando a rede e, quando

242 Medida de terra plantada com milho.

243 Guardião da comida.

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chegaram, (os animais) deixaram a carga num canto da casa, como se tivesse sido

ela quem a tivesse carregado. Chegou, então, a velha, e logo que viu o milho que

tinha na grande rede, exclamou: - De onde veio todo esse milho? Por um acaso

acabaste com nossa milpa? [...] Irei ver - e foi em direção à milpa. Mas o único

pé estava lá, com a marca da rede no chão. A velha, então, voltou rápido para sua

casa e disse: - Isto é prova suficiente de que realmente és minha nora. Verei

agora tuas obras e àqueles que levas (no ventre) e que são sábios.

Fonte: Recinos (1950, p.18). Tradução nossa.

Figura 32 - Asombro recolectado

Fonte: “Pop Wuj, El libro del tiempo” (CHÁVEZ, 2008, p. 15)

Os gêmeos heróicos são personagens que aparecem

representados em toda Mesoamérica, desde a Guatemala até o Norte do

México. “Numerosas variantes de uma narração amplamente difundida

entre os mixes, mixtecas, chinantecas, zapotecas, (etc.) [...] se referem a

historia dos gêmeos que, em alguns relatos, são menino e menina. Ao

final de suas aventuras, se convertem em sol e lua” (CHINCHILLA, 2011,

p. 31, tradução nossa244). Segundo Michael Coe, “o tema principal da

historia dos Heróis Gêmeos no Popol Wuj, (é) uma história de morte e

ressurreição” (COE, prólogo em CHINCHILLA, 2011,p. 11,tradução

244 “Numerosas variantes de una narración ampliamente difundida entre los mixes,

mixtecas, chinantecas, zapotecas, (etc.) […] se refieren a la historia de los gemelos

que en algunos relatos son niño y niña. Al fin de sus aventuras se convierten en

sol y luna.” (CHINCHILLA, 2013, p. 31).

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nossa245). No relato do excerto que Rivera ilustra, os gêmeos Hunahpu e

Ixbalanque, mesmo antes de nascer, já tinham o poder de produzir fatos

miraculosos, como multiplicar a quantidade da colheita e receber ajuda

dos animais para transportá-la.

Quadro 55 - Criação dos animais

Los cuatro mensajeros tenían la dignidad de Ahpop-Achih. Saliendo de Xibalbá

llegaron rápidamente, llevando su mensaje, al patio donde estaban jugando a la

pelota Hun-Hunahpú y Vucub-Hunahpú, en el juego de pelota que se llamaba

Nim-Xob Carchah. Los búhos mensajeros se dirigieron al juego de la pelota y

presentaron su mensaje.

Os quatro mensageiros tinham a dignidade de Ahpop-Achih246. Saindo de

Xibalba247, chegaram rapidamente, levando sua mensagem ao pátio onde

estavam jogando bola Hun-Hunahpú e Vucub-Hunahpu248, no jogo de bola que

se chamava Nim-Xob Carchah. As corujas mensageiras se dirigiram ao jogo e

apresentaram sua mensagem.

Fonte: Recinos (1950, p.14). Tradução nossa.

Figura 33 - Os Tecolotes mensageiros

Fonte: Recinos (1961, p. 8)

245 “El tema principal de la historia de los Heroes Gemelos en el Popol Wuj, (es) una

historia de muerte y resurrección.” (COE, en CHINCHILLA, 2013, p. 11)

246 Un dos deuses do inframundo.

247 Xibalba: o inframundo, mundo dos mortos.

248 Pais dos gêmeos heróicos, que foram vencidos em Xibalba.

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A Editora Choukoron - Shinsha, de Tokio, publicou, em 1961, a

tradução do Popol Vuh em japonês, a partir da versão de Recinos (1953),

ilustrada a cores com as 17 aquarelas realizadas 30 anos antes por Diego

Rivera.Uma das ilustrações (Figura 33) apresentadas relata justamente a

história das corujas que foram enviadas do inframundo para chamar e

evocar os gêmeos heróicos para jogar bola com os senhores da morte

(Quadro 55). Mencionamos esta edição para destacar a característica

destes epitextos como “epitextos privados [...] o que para nós definiria

essa presença interposta, entre o autor e um eventual público”

(GENETTE, 2009, p. 327). Parafraseando o autor mencionado, no

epitexto público, o autor se dirige diretamente ao público; no epitexto

privado, existe um intermediário cuja personalidade influencia.Neste

caso, a filha de Diego Rivera foi quem exerceu este papel e também quem

escolheu as traduções e os países onde seriam publicadas as pinturas

como ilustrações.

No Anexo 2encontram-se as reproduções de outras cinco

aquarelas de Diego Rivera que ilustram a gênese K‘iche’, sob o título de

“Custodia de la milpa”, “Adoración de los hombres”, “Muerte de

Cabracán”, “Mansiones de Xibalba” e “Sacrificio y autosacrificio ante

el Dios”.

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6 CONSTATAÇÃO DOS OBJETIVOS E METODOLOGIA

Realizou-se uma descrição do Popol Wuj, um resumo do seu

conteúdo narrativo geral, e um estudo do devir histórico das traduções,

observando os fatores culturais e ideológicos que influenciaram seus

tradutores.

Através do estudo dos excertos das traduções correspondentes

aos fólios 1reto, 1verso, 2reto, 2verso, 3reto e 3verso do Ms Ayer 1515,

traçamos uma perspectiva antropológica que nos permitiu vislumbrar

uma epistemologia subjacente nas traduções estudadas, desde a tradução

colonial de Ximénez (1700-1704), passando pela tradução

“descolonizada” de Chávez (1979), cuja introdução reivindica uma

emancipação da colônia, por ser um descendente de k’iche’s, porém se

revelando bastante próximo da ideologia eurocêntrica, católica e com

traços de identificação com o pensamento maçônico nas suas escolhas

lexicais e semânticas. Finalmente, concluímos que a tradução de Sam

Colop (2011) pode ser considerada decolonial, já que representa uma

perspectiva cultural K’iche’ fundamentada na sua própria descendência

maia e nas suas atividades como pesquisador etnográfico do povo K’iche’

contemporâneo, conscientizado sobre a conjuntura cultural da

modernidade, que trouxe luz às epistemologias consideradas periféricas.

O capítulo dedicado às ilustrações de Diego Rivera tem como objetivo

comprovar a vigência da obra na identidade cultural de toda

Mesoamérica.

Houve um bom resultado na pesquisa de fontes confiáveis para a

construção da tese. A intenção inicial de apresentar um catálogo de

material investigativo foi enriquecida com a colaboração de estudiosos

que, desinteressadamente, esclareceram dúvidas e, gentilmente,

disponibilizaram bibliografia, livros raros e artigos inéditos. São eles:

Carlos Lopez (1999) e Michela Craveri (2012), especialistas e autoridades

em cultura maia; Ricardo Falla (2014), teólogo e antropólogo da

Guatemala; Christiane Stallaert, antropóloga cultural (Universidade

Artesis, Bélgica); Oswaldo Chinchilla Mazariegos (Universidad

Francisco Marroquin, Guatemala), que disponibilizou o livro de sua

autoria, “Imágenes de la Mitología Maya” (2011), cuja pesquisa

arqueológica das cerâmicas mesoamericanas apresenta o fundamento

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visual sobre a investigação da importância dos mitos do Popol Wuj no

cotidiano das Maias-K’iches’ do período Clássico (300 -900d.C); além do

curador mexicano Adolfo Cantú, que colaborou com material artístico e

bibliográfico sobre a obra de Diego Rivera relacionada ao Popol Wuj.

Um importante objetivo proposto foi a construção de um material

didático sobre o Popol Wuj que oferecesse uma visualização objetiva

desta obra pré-hispânica no ambiente acadêmico e escolar do Brasil. Tal

objetivo justifica a inserção de ilustrações e a adoção de uma

“cosmovisão” que nos permitiu referenciar alguns conceitos com imagens

e peças arqueológicas de toda mesoamérica e não somente das terras altas

da Guatemala, onde foi encontrado o manuscrito pré-hispânico pelo Padre

Ximénez.

Para atingir este objetivo, valemo-nos, principalmente, dos

Estudos da Tradução, através da análise de três excertos de traduções do

Popol Wuj produzidas em épocas diferentes, observando seus

polissistemas literários e algumas noções dos Estudos Culturais, da

História da Arte e da Arqueologia. O objetivo da análise das traduções foi

observar como Ximénez (1700-1704), Chávez (1979) e Sam Colop

(2011) interpretaram o Popol Wuj desde suas perspectivas sincrônicas e

ideológicas. Referenciamos estudos sobre linguística, religião e arte pré-

hispânica relacionadas com o Popol Wuj, associando os excertos com

exemplos de peças arqueológicas, cerâmicas, códices e pinturas

provenientes de toda Mesoamérica sob uma “cosmovisão” que, segundo

López Austin(2009, p. 228), ultrapassa os diferentes grupos pré-

hispânicos e se constituem como uma “matriz” que envolve mitos, ritos e

ícones bastante semelhantes, em uma vasta região localizada entre o sul

da Guatemala e o norte do México.

A metodologia se tornou um caminho complexo perante a

riqueza do tema, a amplitude da conotação cultural e a profundidade

existencial da cosmogonia. Cada página escrita foi o resultado de árduas

pesquisas e comparações de teorias e opiniões de vários autores. As obras

que versam sobre estudos do mito também sofreram e sofrem a influência

da ideologia e da época em que foram escritos, assim, para construir um

texto o mais objetivo possível, escolhemos autores que não nos levassem

em direção a uma ideologia hegemônica, mas, ao contrário, procuramos

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o alicerce da teoria decolonial, que observa as manifestações culturais

desde o ponto de vista do sujeito oprimido historicamente. Tentamos

escutar, assim, a voz dos colonizados Maias-K’ iches’.

Mediante uma análise descritiva das traduções,se observou, por

comparação, as diferenças e semelhanças entre as escolhas tradutórias dos

autores em estudo. Conseguimos vislumbrar o viés ideológico de cada

tradução de acordo com o contexto histórico em que foi produzido. Por

fim, apresentamos uma tradução para o português de Brotherston e

Medeiros (2011) para oferecer uma compreensão mais clara aos leitores

luso-falantes. Por tratar-se de uma linguagem mítica, o tempo dedicado à

pesquisa de cada palavra, difrasismo e disfrasismo requereu especial

cuidado e dedicação, fazendo desta tese um texto conciso, porém o mais

aprofundado e didático que nos foi possível. Devemos destacar que a

autora desta tese não domina a língua maia K’iche’, motivo pelo qual a

análise ficou concentrada nas traduções para a língua espanhola.

“Com esta tese amplia-se a função que a tradução possui de

“formar leitores” para a função de “formar leitores de tradução”, na

página 81 menciona-se a decolonialidade fazendo referência à foto do

tradutor, Sam Colop, que aparece sobre a capa do livro outorgando-lhe

visibilidade de autor. É importante lembrar que neste pequeno país,

Guatemala, a tradução é de importância governamental. [...] (Sobre) a

“função intercultural da tradução” sublinha essa imersão que Ximénez

teve dentro da cultura k’iche’, pelo fato de ter convivido por mais de 40

anos com eles, ter aprendido sua língua e estudado seriamente sua cultura,

tanto quanto pesquisadores como Girard e Christenson, até o ponto de

perder o status de “estrangeiros”.

Considero que para os missioneiros como Ximénez a tradução

era uma estratégia que lhes permitia mostrar a grandeza desse mundo

novo e surpreendente, por meio do qual justificavam o seu interesse pelos

atos profanos, os ritos celebrados pelos k´iches’ e os inúmeros deuses que

(de acordo com a concepção maia) mudavam constantemente. [...] O

objetivo da tradução de Ximénez não poderia ser outro do que alcançar

uma catequização mais eficaz. De outra forma ela não teria sido realizada.

Os administradores dos assuntos da Igreja no contexto histórico de

Ximénez, acreditavam nisso, os cronistas podiam esquivar os castigos e

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acusações da Inquisição evitando a censura e até a morte.[...] Nos escólios

de Ximénez percebe-se um texto subjacente (como sucede com os textos

de muitos cronistas e cronistas missioneiros da época). Na p.68-69,

encontramos um excerto sobre a falta de inteligência dos índios,

enunciado seguido de adjetivos qualificativos nos que ‘suspeitamos’ sua

admiração pela inteligência que está negando. Esta é a função dupla da

tradução de “encobrir e revelar” ao mesmo tempo. A tradução como

estratégia para ocultar e ao mesmo tempo revelar, mostra a conhecida

prática na literatura a través da história. Ximénez revela um segredo que

espera seja compreendido pela posteridade. Ele é um intelectual,

lingüista, historiógrafo, etnógrafo e missionário. (Cabem então vários

questionamentos): Por qual motivo se expôs dessa forma perante a

Inquisição? O que ele procurava? Desprestigiar aos indígenas e a sua

história? Era preciso revelar esse segredo? Quais foram as contribuições

do Popol Wuj para a Igreja? Qual foi a conseqüência deste descobrimento

para a cultura maia- k´iche´? Quais foram as conseqüências para o próprio

Ximénez ? Por qual motivo correu estes riscos? Esta é Função mágica

da tradução: a tradução como reveladora de segredos.”

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7 CONCLUSÃO

Os paratextos analisados nesta tese correspondem aos fólios do

MS Ayer 1515249 (XIMENEZ, 1700-1704), a saber: prólogo (i-reto, i-v,

ii-r, iii-r, iii-v, iv-r e iv-verso); escólios (folios 1reto, 2r, 2v, 3r, 3v, 4r e 4

verso). Do texto traduzido do K`iche` para o espanhola gênese maia, o

excerto analisado corresponde aos fólios (1reto, 1v, 2r, 2v, e 3 reto).A

análise das traduções dos primeiros quatro fólios trata sobre o Popol

Cabuil, ou panteão mítico maia e a gênese. Nas traduções, observamos as

características do estilo de cada tradutor e a forma como cada um deles

interpretou a cosmogonia maia. Os objetivos propostos para a presente

investigação foram observados com o maior cuidado possível, a saber:

informar didaticamente sobre os antecedentes do Popol Wuj, ou seja, em

que consiste e quando foi escrito, qual o contexto histórico da criação do

primeiro códice perdido, as circunstâncias da sua transliteração por um

remanescente K‘iche’ e a posterior cópia e tradução realizada pelo Padre

Francisco Ximénez (1700-1704). Dentre os posteriores tradutores, que

foram muitos, escolhemos Adrian I. Chávez (1979 e 2007) e Sam Colop

(2011), que realizaram, respectivamente, uma tradução descolonialista e

uma decolonial.

O corpus apresentou obstáculos à sua compreensão,

principalmente nas entrelinhas. Aliás, dificuldades inerentes a sua

essência, provenientes de suas características mítico-religiosas, aliadas a

questões idiossincráticas, dentre as quais as próprias interpretações e

traduções de cada autor. A iconicidade que possuem as várias deidades

maias que aparecem na obra apresenta ontologias que respondem a uma

lógica complexa de sentidos integrados como um “Cubo de Rubik”. Suas

descrições escapam a eventuais pretensões canônicas, sendo que não

seguem uma semântica linear e os sentidos de seus atributos se

“iluminam” por contraste. Esta lógica maia apresenta uma forma holística

de pensar a realidade e descreve um DNA epistemológico que ultrapassa

o tecido superficial do relato para desafiar o leitor a se questionar sobre o

papel do ser humano no cosmo. Um simples exemplo concerne ao fato de

que a língua K'iche’ não possui uma palavra específica para “homem”

(genericamente falando). Seu significado constrói-se por contrastes aos

249 http://library.osu.edu/projects/popolwuj/folios_esp/PWfolio3r_es.php Aces- -so

em 06 de janeiro de 2015.

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188

nomes dos animais, das plantas e dos elementos da paisagem. O ser

humano não está categorizado de forma hiperonímica, ou seja, posto em

patamar superior ao das outras espécies, mas ganha sentido ao lado delas.

Outra característica do Popol Wuj é a integração entre mito e história, o

que justifica a origem divina das altas camadas políticas, da nobreza maia

e da divisão social do poder.

O caráter oral do texto inicial explicita o esforço do copista

K'iche’ em condensar as informações inicialmente desenhadas e escritas

ideográfica e logossilabicamente nos códices, paratraduzi-las na escrita

alfabética. De fato, um trabalho intersemiótico, cujas fontes

desapareceram. Esta transliteração provocou a formação de metáforas

específicas, de repetições, de contrastes, que desembocam em uma forma

dialógica que, no momento da gênese, converte-se em verdadeiras

invocações.

Para os Estudos da Tradução parece importante buscar maior

entendimento a respeito de uma obra cujos manuscritos de base não

existem mais. A exemplo de outros textos clássicos, como Kalila e

Dimna, As mil e uma noites, entre outros, há, efetivamente, traduções

que, por sua antiguidade, adquiriram status de texto fonte, como é o caso

do manuscrito de Ximénez (1700-1704). Observamos os rumos culturais

e epistemológicos do referido texto analisando-o à ótica do conceito de

‘colonialidade’ (MIGNOLO, 2001). Na mesma linha dos estudos

interculturais, adotamos o conceito de ‘descolonialista’ (WALSH, 2005,

p. 16) para analisar a tradução de Chávez (1979-2007). Os autores

fundamentados nas teorias de Walsh (2005, p. 9) consideram que

descolonização é um processo de superação do colonialismo, geralmente

associado às lutas anti-colonialistas no plano político, que ainda se

encontra impregnado da epistemologia do colonizador no seu substrato

ideológico. Por último, a obra que representa a decolonialidade, que,

segundo uma de suas idealizadoras, consiste em uma “renovada atenção

posta por grupos indígenas ao pensamento como campo de luta,

intervenção e criação, assim fazendo evidente um projeto da

interculturalidade que ultrapasse o político e alcance o epistêmico”

(WALSH, 2005, p. 7, tradução nossa250),foi caracterizada pela tradução

250 “renovada atención puesta por grupos indígenas y afros al pensamiento como

campo de lucha, intervención y creación, así haciendo evidente un proyecto de la

interculturalidad que no es solo político sino a la vez epistémico” (WALSH, 2005,

p.7).

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realizada por Sam Colop (2011), cuja análise permitiu concluir que o

tradutor expressa uma intenção de retomar as tradições K'iches’, por ter

sido inicialmente idealizada para leitores K'iches’ da atualidade, e por

considerar dados de pesquisa etnográfica realizada com maias

contemporâneos. A partir da análise descritiva destes três textos, foi

possível escutar pistas, rastros e fragmentos que remetem às vozes dos

tradutores, de acordo com as conjunturas históricas e ideológicas de cada

um deles.

Entendemos que o processo tradutório é muito mais que uma

mera transmissão de informações entre duas culturas. A tradução é uma

parte ativa de um sistema literário principal no qual intervém uma série

de forças, tanto internas quanto externas, que competem para adquirir

uma posição dominante. Entre as forças externas, poderiam se mencionar

as forças dos sistemas político e religioso, que se justificam, no caso do

Popol Wuj, em sua tradução e em sua transliteração.

A análise das traduções sob esta perspectiva foi pertinente para

que se observasse o momento histórico que permeia os textos, assim como

para identificar os contextos com o qual se crê terem interagido.

Observamos, então, os polissistemas da época maia clássica (300-900

d.C.), limitados, naturalmente, pelos condicionamentos intrínsecos ao

escopo de realização de uma tese de doutorado. Pincelamos os

antecedentes da primeira transliteração para buscar entender parte da

importância deste documento parcialmente perdido, que se instaura na

atualidade como símbolo cultural de resistência, texto que ficou

escondido pelos escribas K'iches’ já na época da colônia por quase um

século, até ser descoberto pelo Padre Francisco Ximénez. A tradução de

Ximénez (1700-1704) é minuciosa, parece respeitar e registrar a

mitologia K'iche’ dentro dos parâmetros de um colonizador-catequizador.

Justamente por tal motivo, surpreende em relação à forma com que foi

elaborada, ou seja, com respeito às tradições e um generoso cuidado

acadêmico.

Dom Inês Chávez apresenta um texto traduzido muito elaborado,

especialmente no que concerne ao aspecto fonético. Foi mestre da língua,

e pode-se afirmar que,até hoje, sua tradução é uma referência de pesquisa.

Pelo domínio do idioma K'iche’, sua obra é muito respeitada, tendo sido,

inclusive, lançada uma edição póstuma com ilustrações do artista plástico

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Diego Rivera. Adotamos o termo descolonialista (WALSH, 2005) para a

tradução de Chávez (2007), já que ele mesmo reivindicou autoridade

sobre a obra por ser um descendente K'iche’, porém, com uma

característica paradoxal: a de ter sido um católico praticante e

simpatizante da ideologia maçônica: duas características do pensamento

euro centrista (MIGNOLO, 2001).

Uma das hipóteses levantada no escopo desta investigação foi o

questionamento sobre alguns traços de ideologia maçônica na tradução de

Chávez (1979-2007). Pesquisamos algumas escolhas lexicais e símbolos;

buscamos bibliografia confiável sobre o tema; realizamos algumas

associações que não nos permitiram fazer uma afirmação categórica, mas

que no mínimo demonstram uma identificação do tradutor com esta

ideologia. Alguns exemplos das páginas analisadas são: redução dos

difrasismos de alguns dos deuses do panteão maia como se tratasse de um

só ser; menção da divindade como “Arquiteto”; associações das

características das deidades maias como “Huracán” com “Osiris”;

tradução da divindade “Coração do céu” para “espírito do céu” ou “duplo

olhar” que nos remete ao “olho de Horus”, ícone da simbologia maçônica.

A língua do Popol Wuj, o k'iche’, manifestou-se icônica,

colorida, fecunda de significados. Graças à leitura da obra “El leguaje del

mito: Voces, formas y estructuras del Popol Wuj” de Michela Craveri

(2012), enviada gentilmente pela autora desde Milão, foi possível

entender estas nuances e características da língua fonte da obra. A escrita

logossilábica à miúdes utiliza uma mesma representação para um número,

um deus, um animal sagrado ou uma planta. A estrutura sonora das

palavras completa a concepção tridimensional das imagens literárias:

paronímias, difrasismos, isotopias. De forma paradoxal, a narrativa

parece situar-se na superfície de um profundo lago mítico que nos convida

a mergulhar num “zenote”, ou, nos eleva até o vôo dos ketzales. O Popol

Wuj, sugestivo e distante no tempo, aproxima-nos de uma consciência

integrada com o meio ambiente, demonstrando grande respeito para com

as outras espécies. Neste sentido, a obra estudada aborda as preocupações

com o ecossistema vigente na nossa sociedade contemporânea. No

período clássico maia, utilizava-se exaustivamente a imagem no

cotidiano, nas vasilhas de cerâmica e nos utensílios. Fazia-se, igualmente,

uso da imagem nos templos, nos monumentos, nos alto-relevos, nas jóias

e nos adornos, nas tatuagens, nos códices, enfim, usaram em todos os

lugares e situações sua escrita e seus desenhos, visando representar mitos,

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adivinhações e linhagens. Para apreciar parte destas imagens

arqueológicas, uma excelente leitura é o livro de Chinchilla,“Imágenes

de la Mitologia maya”251.

A tradução inter-semiótica da primeira transliteração do Popol

Wuj provinha de imagens e de uma escrita logossilábica. Comentamos,

ao longo deste trabalho, a semelhança entre as representações culturais

mesoamericanas de diversas regiões e realizadas com base em diferentes

suportes. Cada comunidade respondia aos mesmos princípios, mas cada

uma delas as recriava de uma forma específica. Os diferentes meios de

registro eram utilizados de acordo com os temas representados: “Os

distintos suportes possivelmente se especializaram desde cedo, a pedra

[era utilizada] para representar acontecimentos dinásticos, a argila para

imagens mitológicas e o papel para as adivinhações e as circunstâncias

astronômicas calendáricas” (RIVERA DORADO, 2005, p. 29, tradução

nossa252). A título de ilustração, inserimos algumas reproduções e fotos

destes vestígios arqueológicos para fundamentar a importância do Popol

Wuj como registro das tradições maias.

A fonte mais importante desta investigação foram as páginas do

Ms Ayer 1515 e suas transcrições disponíveis no site da Biblioteca da

OSU (The Ohio State University Libraries -Departamento de Español y

Portugués del Centro de Estúdios Latinoamericanos), cujas fotografias

digitais pertencem à Newberry Library, de Chicago. Também, destacam-

se os esclarecimentos incondicionais e conversações realizadas on-line

com o professor Carlos López, da Marshal University, co-orientador

desta tese, autor de “los Popol Wuj y sus Epistemologias” (1999). Todos

estes foram recursos que permitiram atribuir um maior grau de clareza à

intrincada lógica k'iche’.

Sabemos que ainda existe no Brasil uma grande carência de

bibliografia sobre o Popol Wuj em português. A tradução de Brotherston

e Medeiros (2011) possui um prefácio com informações importantes

sobre a obra e seu contexto histórico. Trata-se de uma tradução bilíngue

k'iche’-espanhol, que referencia os nomes em k'iche’ e seus significados

251 CHINCHILLA, W. Imágenes de la mitología maya. Museo Popol Vuh. Primera

Edición. Guatemala: Universidad Francisco Marroquín, 2011.

252 Los distintos soportes parece que se especializaron ya en época temprana, la

piedra para los acontecimientos dinásticos, la arcilla para las imágenes

mitológicas, el papel para los vaticinios y las circunstancias astronómico-

calendáricas.” (RIVERA DORADO, 2005, p. 29).

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entre parênteses. Comparando a tradução de Chávez (2007), cuja edição

de bolso é a mais usada nas escolas argentinas e uruguaias, com a edição

em língua portuguesa, notaremos um claro contraste de qualidade

editorial e de conteúdo. Paradoxalmente, embora a edição argentina seja

concisa e contenha somente a quarta coluna da tradução de Chávez

(2007), quase todos os estudantes argentinos e uruguaios do Ensino

Médio já leram e/ou conhecem a importância do Popol Wuj para a cultura

americana. Seria interessante incentivar sua leitura e compreensão

também no Brasil, berço de etnias tão importantes quanto a maia k'iche’

da Guatemala, já que esta obra pertence às Américas como um todo,

independentemente do idioma trazido pelo colonizador. Com esta tese,

pretendemos trazer uma pequena luz neste sentido.

O Popol Wuj oferece um material muito fecundo para

investigação e pretendemos continuar esta pesquisa, ampliando a análise

dos textos que se encontram na continuação destes fólios. Chamou-nos

especial atenção a forma como as representações arqueológicas

relacionam-se com o texto, complementando seu sentido e esclarecendo

os contextos histórico e mítico, sua característica dialógica e a forma

como interpretavam suas realidades: como se fosse uma rede ou tecido,

dedução esta extraída dos vários núcleos narrativos que surgem na obra,

que encontram uma organização lógica na concepção cíclica criada por

reiterações e ampliações das ideias.

O tempo cíclico maia se apresenta desafiador, também, para um

dos mais importantes estudiosos do mito da nossa época, Joseph

Campbell.

Nos seus últimos anos, ele buscava uma nova

síntese entre ciência e espírito. “A mudança de

uma visão geocêntrica para uma visão

heliocêntrica do mundo”, escreveu ele, depois que

os astronautas chegaram à lua, “parece ter

removido o homem do centro e o centro parece

tão importante. Espiritualmente, porém, o centro

está onde está o olhar. Poste-se numa elevação e

contemple o horizonte. Poste-se na Lua e

contemple a Terra inteira se erguendo - ainda que

através da televisão, na sua sala de visita”. O

resultado é uma insuspeitada expansão do

horizonte, que poderia servir, em nossa época,

como as antigas mitologias serviram, no passado,

para abrir as portas da percepção “para o prodígio,

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ao mesmo tempo terrível e fascinante, de nós

mesmos e do universo”. Para ele, não foi a ciência

que diminuiu os seres humanos ou nos divorciou

da divindade. Ao contrário, as novas descobertas

da ciência “nos reúnem aos antigos”.

(CAMPBELL, introdução de Bill MOYERS,

1990, p.11).

Fica em aberto mais um desafio, uma gênese aberta que parece

reunir os dois conceitos filosóficos do gênesis ocidental: o criacionismo

e o evolucionismo. No início maia não existe caos, porém existe vida

latente, e esta questão seria justamente o ponto de partida para outras

investigações.

Fonte: Original photo Thumb (2014)

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Page 210: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

ANEXO I: MAPA

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210

Page 212: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

211

Localização do Reino K’iche’, Q’umarkaaj y Chichicastenango nas

terras altas de Guatemala

Fonte: Lopez (2014)

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Page 214: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

ANEXO II: ILUSTRAÇÕES DE DIEGO RIVERA (1931-1937)

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214

Page 216: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

215

Custódia da milpa.

Adoración de los hombres.

Page 217: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

216

Muerte de Cabracán.

Sacrifício y autosacrifício ante el Dios.

Page 218: Ana Maria Barrera Conrad Sackl - Joseyustefrias€¦ · Popol Wuj, cosmogonía mítica prehispánica de la región de Mesoamérica (siglos II a VII d. C.). Las traducciones estudiadas

217

Mansiones de Xibalbá