agravo de instrumento - 2014.035227-0

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Agravo de Instrumento n. 2014.035227-0, de Caçador Relator: Des. Vanderlei Romer AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TRANSPORTE ESCOLAR. LIMINAR. CONCESSÃO. ARGUMENTAÇÃO RECURSAL DE TODO GENÉRICA E QUE NÃO TEM O CONDÃO DE DERRUIR OS ELEMENTOS TRAZIDOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO COM A PETIÇÃO INICIAL. RECURSO DESPROVIDO. "Educar, certamente, representa algo muito além do oferecimento de vagas em escolas públicas. Garantir o acesso ao ensino médio obrigatório, fornecendo material didático, transporte e alimentação, é, antes de tudo, exercício de cidadania, a fim de proporcionar oportunidade de uma vida mais digna àqueles menos favorecidos economicamente. Na ausência de medidas concretas para efetivação desse direito por parte do Executivo, resta ao Judiciário atentar ao administrador sobre os seus deveres perante a sociedade e a ordem constitucional. Não se trata, no caso em voga, de ingerência deste Poder no âmbito da discricionariedade administrativa. Não há margens para escolha pelo ente público. Proporcionar o acesso à educação é dever do Estado, não havendo alternativas, a não ser oferecer, de fato, os mecanismos essenciais para tanto" (Apelação Cível n. 2009.064001-4, de Timbó, rel. Des. Ricardo Roesler, j. 10-8-2010). Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2014.035227-0, da comarca de Caçador (2ª Vara Cível), em que é agravante município de Caçador, e agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina: A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, desprover o recurso. Custas legais. O julgamento realizado no dia 16 de dezembro de 2014, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Cesar Abreu, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Pedro Manoel Abreu. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Plínio César Moreira. Florianópolis, 7 de janeiro de 2015.

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Page 1: Agravo de instrumento - 2014.035227-0

Agravo de Instrumento n. 2014.035227-0, de CaçadorRelator: Des. Vanderlei Romer

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.TRANSPORTE ESCOLAR. LIMINAR. CONCESSÃO.ARGUMENTAÇÃO RECURSAL DE TODO GENÉRICA E QUENÃO TEM O CONDÃO DE DERRUIR OS ELEMENTOSTRAZIDOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO COM A PETIÇÃOINICIAL. RECURSO DESPROVIDO.

"Educar, certamente, representa algo muito além dooferecimento de vagas em escolas públicas. Garantir o acesso aoensino médio obrigatório, fornecendo material didático, transportee alimentação, é, antes de tudo, exercício de cidadania, a fim deproporcionar oportunidade de uma vida mais digna àquelesmenos favorecidos economicamente. Na ausência de medidasconcretas para efetivação desse direito por parte do Executivo,resta ao Judiciário atentar ao administrador sobre os seusdeveres perante a sociedade e a ordem constitucional. Não setrata, no caso em voga, de ingerência deste Poder no âmbito dadiscricionariedade administrativa. Não há margens para escolhapelo ente público. Proporcionar o acesso à educação é dever doEstado, não havendo alternativas, a não ser oferecer, de fato, osmecanismos essenciais para tanto" (Apelação Cível n.2009.064001-4, de Timbó, rel. Des. Ricardo Roesler, j.10-8-2010).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n.2014.035227-0, da comarca de Caçador (2ª Vara Cível), em que é agravantemunicípio de Caçador, e agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime,desprover o recurso. Custas legais.

O julgamento realizado no dia 16 de dezembro de 2014, foi presididopelo Exmo. Sr. Desembargador Cesar Abreu, com voto, e dele participou o Exmo. Sr.Desembargador Pedro Manoel Abreu. Funcionou como representante do MinistérioPúblico o Exmo. Sr. Dr. Plínio César Moreira.

Florianópolis, 7 de janeiro de 2015.

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Vanderlei RomerRELATOR

Gabinete Des. Vanderlei Romer

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RELATÓRIO

Cuida-se, na origem, de ação civil pública cominatória, com pedidoliminar, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina contra o Estadode Santa Catarina e o município de Caçador, na qual foi concedida o provimento deurgência para impor aos réus

a obrigação de fazer consistente em fornecerem, dentro do prazo de 10 (dez)dias, em todos os dias letivos, transporte público aos alunos residentes na LinhaSeminário que estudem no Colégio Estadual Dom Orlando Dotti, nos períodosmatutino, vespertino e noturno, tanto para a ida quanto para o retorno das aulas, emveículo adequado às normas de segurança (fl. 128).

Irresignada com o teor da prestação jurisdicional entregue, agravou deinstrumento a Municipalidade, forte nas razões de fls. 2-12, que passam a integraresta suma.

Recebido o recurso na forma instrumental, e apresentada acontraminuta, os autos foram remetidos à douta Procuradoria-Geral de Justiça, que,em parecer da boa lavra do Exmo. Sr. Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira,manifestou-se pela manutenção do decisum combatido.

VOTO

Inicialmente, diante do que ficou decidido no Agravo de Instrumento n.2014.034872-1, igualmente proveniente da comarca de Caçador, e que teve comoobjeto decisão concessiva de liminar, em autos de ação civil pública ajuizada com opropósito de compelir o município de Caçador e o Estado de Santa Catarina afornecerem transporte gratuito aos alunos matriculados em instituição de ensinosituada no primeiro, votou-se pelo não conhecimento do recurso e pela suaredistribuição a uma das Câmaras de Direito Civil.

Confira-se a ementa do aresto:AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE TRANSPORTE

ESCOLAR AOS ADOLESCENTES RESIDENTES NO MUNICÍPIO DE CAÇADOR.INCOMPETÊNCIA DAS CÂMARAS DE DIREITO DE DIREITO PÚBLICO PARAJULGAR A DEMANDA. PRECEDENTES. RECURSO NÃO CONHECIDO.REDISTRIBUIÇÃO DO FEITO A UMA DAS CÂMARAS DE DIREITO CIVIL (Agravode Instrumento n. 2014.034872-1, de Caçador, rel. Des. Cesar Abreu, j. 9-9-2014).

Após a redistribuição dos autos à Terceira Câmara Civil, esta, emjulgado da relatoria do eminente Desembargador Marcus Tulio Sartorato, acordou, porvotação unânime, a suspensão do julgamento, e, ato contínuo, suscitou conflitonegativo de competência perante o Órgão Especial (j. 18-11-2014).

Em consulta ao sítio do Poder Judiciário, verificou-se que o registro e aautuação do processo ainda não foram perfectibilizados.

Sucede que o Órgão Especial, em sessão de julgamento de 3 dedezembro de 2014, houve por bem manter a competência da Câmara de DireitoPúblico.

Daí o conhecimento do agravo, no qual se arguiu que o Ministério

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Público não detém legitimidade para ajuizar a ação civil pública, uma vez que estariapatrocinando um interesse individual, e, de outro vértice, que a concessão da liminarsem prévia oitiva de seu representante judicial ensejou manifesta afronta ao art. 2º daLei n. 8.437/1992. Apontou-se, ainda, que deixou de se considerar que o Municípiofornece transporte escolar aos alunos da rede municipal e estadual, de sorte quecaracterizada a possibilidade de grave lesão à ordem pública.

Lendo-se a inicial da ação civil pública (fls. 62-60), verifica-se que opropósito do Parquet é compelir o Município, ora agravante, a disponibilizar aosalunos do colégio Dom Orlando Dotti, residentes na Linha Seminário, transporteescolar gratuito nos períodos matutino, vespertino e noturno.

Ora, como bem pontuado em precedente da boa lavra do eminenteDesembargador Ricardo Roesler, em caso análogo,

Não é necessário grande esforço para apontar-se a legitimidade do MinistérioPúblico na espécie, sobretudo porque a Lei n.º 8.069/90 prevê, em seu art. 201, V,que compete à entidade, concorrentemente com outros legitimados "promover oinquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusosou coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no art 220, §3º inciso II, da Constituição Federal". Nem poderia ser diferente: se legitimado àtutela dos direitos da criança, seria paradoxal que não pudesse, nesse mister,manejar a ação civil. A prefacial, portanto, não se sustenta (Apelação Cível n.2009.064001-4, de Timbó, j. 10-8-2010).

E de acórdão para o qual foi relator o saudoso Desembargador JoséVolpato de Souza, transcreve-se, por oportuno:

O Município assevera, preliminarmente, que o Ministério Público não é partelegítima para propor a presente ação, pois o direito individual homogêneo que buscaproteger não está dentre aqueles elencados na Lei n. 7.347/85 (Lei da Ação CivilPública).

Nesse aspecto, ao contrário do que sustenta o recorrente, é de se ressaltarque o Ministério Público detém legitimidade para o ajuizamento de toda ação quepretenda garantir o exercício e a proteção de direitos individuais indisponíveis dascrianças e adolescentes, especificamente no que se relaciona à educação, uma vezque constitui um dos pilares fundamentais da sociedade brasileira, e dever de toda asociedade (art. 227 da CRFB).

Aliás, a legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento desta modalidadede ação é consagrada pela Constituição Federal e reafirmada pelo Estatuto daCriança e do Adolescente, conforme se extrai:

"Art. 127 CRFB - O Ministério Público é instituição permanente, essencial àfunção jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regimedemocrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Art. 129 CRFB - São funções institucionais do Ministério Público:[..]II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de

relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo asmedidas necessárias a sua garantia;

Art. 201 ECA - Compete ao Ministério Público:[...]V - promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos

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interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência,inclusive os definidos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;

VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados àscrianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis

Art. 208 ECA - Regem-se pelas disposições desta Lei as ações deresponsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente,referentes ao não-oferecimento ou oferta irregular:

[...]III - de atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 (zero) a 6 (seis)

anos de idade;"Não restam dúvidas, portanto, que a defesa de direitos individuais indisponíveis

de menores engendra uma das missões institucionais do Ministério Público, seja pelaexegese constitucional, seja pelas disposições do Estatuto da Criança e doAdolescente, consoante já expressei no julgamento da Apelação Cível n.2006.042024-8, de Blumenau, j. em 28/07/2008).

Além disso, os julgados desta egrégia Quarta Câmara de Direito Público têmprestigiado idêntico entendimento, dentre os quais menciono apenas um, em que adiscussão acerca da legitimidade do Ministério Público em garantia e proteção dedireitos individuais indisponíveis foi invocada também em arguição preliminar:

"Possui legitimidade ativa o Ministério Público para ajuizar ação civil pública emdefesa do direito indisponível, ainda que em benefício individual. De fato, 'certosdireitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses ou direitoscoletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuais indisponíveis. Nessescasos, a ação civil pública presta-se à defesa dos mesmos, legitimando o MinistérioPúblico para a causa. C.F., art. 127, caput, e art. 129, III' (STF, RE n. 195.056, Min.Carlos Velloso). Mormente quando o titular do direito é criança que, nos termos doEstatuto do Criança e do Adolescente, pode ser representada em Juízo peloMinistério Público" (Ap. Cível n. 2008.046153-2, de Lages, Rel. Jaime Ramos, j.04/09/2008).

Conclui-se, assim, que o Órgão Ministerial possui legitimidade para oajuizamento de ações dessa modalidade, razão pela qual não deve prosperar apreliminar invocada (Apelação Cível n. 2008.007536-2, j. 3-7-2009).

A título de esclarecimento, observa-se que, sobre a alegação em tela,não houve pronunciamento no Juízo a quo. Entende-se, no entanto, em que pese aquestão não ser pacífica, que, por se cuidar de matéria de ordem pública, é elapassível de cognição a qualquer tempo e grau de jurisdição, como exsurge deilustrado acórdão da boa lavra do Desembargador Sérgio Izidoro Heil, in verbis:

[...] Para tanto, registre-se que a verificação da existência das condição daação, por se tratar de matéria de ordem pública, pode ser feita inclusive de ofício, emsede de agravo de instrumento, sem que reste caracterizada a supressão deinstâncias.

Isso porque o efeito translativo dos recursos, aplicável também ao agravo deinstrumento, possibilita que os Tribunais ordinários conheçam de determinadasmatérias, ainda que sem expressa manifestação de vontade do recorrente, evitandouma desnecessária continuidade do processo.

Sobre a matéria, oportuno colacionar a doutrina de Luiz Guilherme Marinoni:O efeito translativo é ligado à matéria que compete ao Judiciário conhecer em

qualquer tempo ou grau de jurisdição, ainda que sem expressa manifestação das

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partes, a exemplo das questões enumeradas no art. 301 do CPC (exceto seu incisoIX).

Se esses temas devem ser examinados pelo juízo em qualquer tempo e graude jurisdição, eles certamente poderão ser apreciados quando da análise do recurso.O tribunal é autorizado a conhecer esses temas de ordem pública, ainda que nãotenham sido ventilados, seja no juízo a quo, seja nas razões do recurso. Tais temas,então, não se submetem ao efeito devolutivo, e podem ser conhecidos pelo Tribunalsempre, em qualquer circunstância, bastando que tenha sido interposto recursosobre alguma decisão da causa, e que esse recurso chegue a exame do juízo adquem.

Obviamente, esse efeito é inerente a qualquer espécie recursal. (ARENHART,Sérgio Cruz; MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. Processo deConhecimento. V 2. 7ª ed. São Paulo: RT, 2008. P. 526)

E do artigo intitulado "Reflexões sobre a Incidência do Chamado 'EfeitoTranslativo' em Sede de Agravo de Instrumento", extraído da Revista Dialética deDireito Processual:

[...] Crê-se que o tribunal não só pode, como deve extinguir o processo semjulgamento do mérito, ao apreciar agravo de instrumento, quando, icto oculi,reconhecer qualquer afronta a essas matérias de ordem pública.

Dessa forma, estar-se-ia coadunando à incidência do efeito translativo aorecurso de agravo, subsumido ao princípio inquisitivo, sem se caracterizar o que seconvencionou chamar de "supressão de instância", em face da violação do duplograu de jurisdição.

É que, justamente de por se tratarem de matérias conhecíveis de ofício, aliadoao fato de não se admitir o princípio do duplo grau de jurisdição como garantiaconstitucional expressa, portanto, sem intangibilidade absoluta, abre-se espaço paraa prevalência de outros princípios infraconstitucionais, dentre os quais o inquisitivo eo de economia processual, possibilitando assim o atendimento à tutela jurisdicionaltempestiva.

Não é de se imaginar, repita-se, deixar o processo ser conduzido até asentença, quando o tribunal, já acionado em sede de agravo de instrumento, poderia,por força do efeito translativo, dar solução efetiva ao processo, ao vislumbrar algumvício de ordem pública. Seria, isto sim, não conferir a devida importância à economiaprocessual. (GAIA, Marcio Andre Monteiro. Reflexões sobre a incidência do chamado''efeito translativo'' em sede de agravo de instrumento. Revista Dialética de DireitoProcessual - Rddp, São Paulo, Oliveira Rocha - Comércio e Serviços Ltda. v. 41,ago. 2006, p. 119/120) (Agravo de Instrumento n. 2008.024055-0).

Mudando o que deve ser mudado,Quanto à alegada a ocorrência da prescrição decidida pela Corte de origem

não acarretaria supressão de instância, como quer fazer crer a parte agravante,porquanto se trata de matéria de ordem pública, conhecível de ofício em qualquermomento e grau de jurisdição (EDcl no AREsp 079642, rel. Min. AssuseteMagalhães, p. 30-9-2014).

Em igual norte: REsp n. 691.912, 1ª Turma, rel. Min. Teori Zavascki;Embargos de Declaração em Agravo de Instrumento n. 2010.017601-8/0002.00, deSão Francisco do Sul, rel. Des. José Carlos Carstens Köhler; dentre outros.

No que se refere ao apregoado descumprimento do art. 2º da Lei n.

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8.437/1992, há dizer que, excepcionalmente, é possível conceder liminar sem préviaoitiva da pessoa jurídica de direito público, quando presentes os requisitos legais paraa concessão de medida liminar em ação civil pública.

Esse é o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, que temabrandado a regra, em casos excepcionais, em especial para resguardar bensmaiores (AREsp 603922, rel. Min. Humberto Martins, j. 12--11-2014).

Deveras, admite-se a mitigação da regra em situações excepcionais,que, concessa venia, é o caso dos autos. Sem antecipar um juízo de valor sobre oacerto, ou desacerto, do decisum recorrido, é certo que se alegou prejuízo a menoresque estariam sendo privados de direito constitucional – educação.

Por derradeiro, tem-se que a Municipalidade afirma que assegura aosestudantes da rede municipal e estadual transporte escolar, bem que é patente apossibilidade de grave lesão à ordem pública, no caso de ser mantido o julgadocombatido. Apenas isso. Não é, contudo, o que desponta do acervo documentaltrazido pelo Parquet, suficiente, pelo menos por ora, para demonstrar que era caso,como é, de se conceder a liminar.

No que se refere à lesão à ordem pública, não há nenhum elemento quelhe dê amparo. É assertiva, em última análise, lançada de modo bastante genérico.

Reportamo-nos, uma vez mais, ao julgado da relatoria doDesembargador Ricardo Roesler:

Educar, certamente, representa algo muito além do oferecimento de vagas emescolas públicas. Garantir o acesso ao ensino médio obrigatório, fornecendo materialdidático, transporte e alimentação, é, antes de tudo, exercício de cidadania, a fim deproporcionar oportunidade de uma vida mais digna àqueles menos favorecidoseconomicamente. Na ausência de medidas concretas para efetivação desse direitopor parte do Executivo, resta ao Judiciário atentar ao administrador sobre os seusdeveres perante a sociedade e a ordem constitucional. Não se trata, no caso emvoga, de ingerência deste Poder no âmbito da discricionariedade administrativa. Nãohá margens para escolha pelo ente público. Proporcionar o acesso à educação édever do Estado, não havendo alternativas, a não ser oferecer, de fato, osmecanismos essenciais para tanto.

Ante o exposto, o voto é pelo desprovimento.Este é o voto.

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