1 crÉdito consignado e superendividamento isabel

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1 CRÉDITO CONSIGNADO E SUPERENDIVIDAMENTO 1 ISABEL CRISTINA BREZOLIN FERREIRA RESUMO: Ainda que de maneira incipiente, o presente artigo identifica a recente questão do superendividamento, fenômeno social que exige a reestrutura do ordenamento jurídico pátrio à luz dos direitos já existentes e dos institutos criados em outros países, no que toca à proteção dos consumidores superendividados e hipervulneráveis. Isso porque, o crédito, principalmente sob forma de consignação, tornou-se um catalisador do endividamento do consumidor, face aos abusos contratuais, à má administração patrimonial do próprio indivíduo, ou, ainda, às circunstâncias supervenientes que tornam a execução da obrigação contratual excessivamente onerosa ao devedor. Defende-se neste artigo a renegociação das dívidas do tomador de crédito, pessoa física, leiga e de boa-fé, no intuito de combater os efeitos do superendividamento, bem como se ressalta a exigência do cumprimento dos deveres de informação e aconselhamento, a consulta aos bancos de dados por parte do fornecedor e a implementação do prazo de reflexão como medidas preventivas. Palavras-chave: consumidor. Superendividamento. Consignação. Renegociação. INTRODUÇÃO Considerando que crédito e endividamento são dois “lados da mesma moeda, são causa e efeito do novo modelo de sociedade endividada e globalizada de consumo”, 2 antes de se analisar o atual fenômeno do superendividamento, é imprescindível verificar sua causa: a concessão de crédito, mais precisamente, sob a forma de consignação – financiamento no qual o tomador de crédito autoriza a retirada do pagamento do débito diretamente de sua conta corrente –. Ocorre que, geralmente, o desconto em folha – por oferecer menores taxas de juros, ser concedido até mesmo a quem tem restrições creditícias de modo rápido, fácil e sem consulta às entidades de proteção ao crédito 3 –, é comumente utilizado pelo consumidor para a aquisição de bens e fruição de serviços, sejam eles essenciais ou não, bem como pelo 1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial à obtenção de grau de Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, aprovado, com grau máximo, pela banca examinadora composta pelo orientador Prof. Dr. Adalberto de Souza Pasqualotto, Prof. Me. Paulo de Tarso Sanseverino e Prof. Me. Fabio Cardoso Machado, em 11 de junho de 2008. 2 MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do consumidor endividado Superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 13. 3 BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz; LIMA, Clarissa Costa de. Adesão ao projeto Conciliar é Legal – CNJ: Projeto-piloto. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 16/63, jul.-set., 2007, p. 177.

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Page 1: 1 CRÉDITO CONSIGNADO E SUPERENDIVIDAMENTO ISABEL

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CRÉDITO CONSIGNADO E SUPERENDIVIDAMENTO1

ISABEL CRISTINA BREZOLIN FERREIRA

RESUMO: Ainda que de maneira incipiente, o presente artigo identifica a recente questão do superendividamento, fenômeno social que exige a reestrutura do ordenamento jurídico pátrio à luz dos direitos já existentes e dos institutos criados em outros países, no que toca à proteção dos consumidores superendividados e hipervulneráveis. Isso porque, o crédito, principalmente sob forma de consignação, tornou-se um catalisador do endividamento do consumidor, face aos abusos contratuais, à má administração patrimonial do próprio indivíduo, ou, ainda, às circunstâncias supervenientes que tornam a execução da obrigação contratual excessivamente onerosa ao devedor. Defende-se neste artigo a renegociação das dívidas do tomador de crédito, pessoa física, leiga e de boa-fé, no intuito de combater os efeitos do superendividamento, bem como se ressalta a exigência do cumprimento dos deveres de informação e aconselhamento, a consulta aos bancos de dados por parte do fornecedor e a implementação do prazo de reflexão como medidas preventivas.

Palavras-chave: consumidor. Superendividamento. Consignação. Renegociação.

INTRODUÇÃO

Considerando que crédito e endividamento são dois “lados da mesma moeda, são

causa e efeito do novo modelo de sociedade endividada e globalizada de consumo”,2 antes de

se analisar o atual fenômeno do superendividamento, é imprescindível verificar sua causa: a

concessão de crédito, mais precisamente, sob a forma de consignação – financiamento no

qual o tomador de crédito autoriza a retirada do pagamento do débito diretamente de sua conta

corrente –.

Ocorre que, geralmente, o desconto em folha – por oferecer menores taxas de juros,

ser concedido até mesmo a quem tem restrições creditícias de modo rápido, fácil e sem

consulta às entidades de proteção ao crédito3 –, é comumente utilizado pelo consumidor para

a aquisição de bens e fruição de serviços, sejam eles essenciais ou não, bem como pelo

1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial à obtenção de grau de Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, aprovado, com grau máximo, pela banca examinadora composta pelo orientador Prof. Dr. Adalberto de Souza Pasqualotto, Prof. Me. Paulo de Tarso Sanseverino e Prof. Me. Fabio Cardoso Machado, em 11 de junho de 2008. 2 MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do consumidor endividado

Superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 13. 3 BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz; LIMA, Clarissa Costa de. Adesão ao projeto Conciliar é Legal – CNJ: Projeto-piloto. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 16/63, jul.-set., 2007, p. 177.

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consumidor endividado na tentativa de reduzir, paliativamente, o montante de dívidas que

possui.4

Contudo, embora aparentemente inocente, o crédito consignado tem sido objeto de

inúmeras ações judiciais, nas quais se pleiteia, na maioria das vezes, o cancelamento

unilateral dos descontos, principalmente, porque os consumidores atingiram um nível tal de

endividamento que sequer conseguem adquirir produtos indispensáveis à sua sobrevivência,

face ao comprometimento de grande parte do salário, remuneração ou benefício

previdenciário, descontada mensalmente, “visto que o crédito consignado automatiza o

empréstimo e dispensa o cuidado do mutuante”.5

Tal fato é constatado por meio dos resultados obtidos em várias pesquisas sobre o

tema, dentre as quais se destaca a pesquisa interinstitucional realizada, em 2005, no Estado do

Rio de Janeiro,6 que aponta que dos 80 endividados selecionados, 39% comprometeram 60%

da renda ou mais para o pagamento do empréstimo.

A partir disso, questiona-se até que ponto o princípio da força dos contratos está

protegida em detrimento do estado de endividamento do devedor? Isso pode afetar o

equilíbrio contratual? Após a desistência do devedor, os descontos não se caracterizariam uma

forma de “penhorabilidade de remuneração”, atualmente, vedada em nosso ordenamento?

Quanto ao fenômeno social e mundial do superendividamento questiona-se: a

legislação pátria tem se mostrado suficiente e eficiente, no que se refere à proteção concedida

aos consumidores que sofrem do “endividamento crônico”?7 O superendividado recebe um

tratamento especial ou se faz necessária uma reformulação legislativa?

Ainda que preliminarmente, constata-se que nosso ordenamento não prevê um

tratamento específico para os superendividados, nem no âmbito das relações civis, na medida

em que “a questão, do ponto de vista do direito, é tratada como um problema pessoal (...) cuja

solução passa apenas pela execução pura e simples do devedor”,8 nem mesmo no das relações

consumeristas, uma vez que não se investiga, dentre outros aspectos, as suas causas.

4 Conforme dados obtidos na pesquisa realizada pelo PROCON-SP, em novembro de 2006, 51,06% dos entrevistados apontam como principal motivo que levou a pedir o empréstimo o pagamento de dívidas em atraso. (Disponível em: <http://www.procon.sp.gov/br/pdf/empconsig.pdf> Acesso em: 20/10/2007). 5 LOPES, José Reinaldo Lima. In prefácio MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do Consumidor Endividado: superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 08. 6 CAVALLAZZI, Rosângela Lunardelli. O Perfil do superendividado: referências no Brasil. In: MARQUES. Direitos do Consumidor Endividado... op. cit. p. 389. 7 MARQUES. Direitos do consumidor endividado...op. cit. p. 13. 8 LOPES, José Reinaldo Lima. Crédito ao consumidor e superendividamento - uma problemática geral. Revista

de Direito do Consumidor, n. 17, jan.-mar, 1996, p. 59.

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3

Tanto o crédito consignado, quanto o superendividamento são recentes em nosso

ordenamento, razão pela qual são tratados com certa timidez, tanto no âmbito legislativo,

quanto no doutrinário. Há manifestações jurisprudenciais, face à necessidade e,

principalmente, ao dever do Poder Judiciário de dar respostas imediatas aos indivíduos que a

ele procuram, ainda que tais objetos litigiosos não estejam legislados.

Ocorre que o recurso às ações revisionais mostrou-se solução momentânea e paliativa,

na medida em que o posicionamento jurisprudencial foi sendo modificado ao longo dos anos.9

Dessa forma, analisa-se a necessidade de uma reorientação do ordenamento jurídico

pátrio, tendo como fonte de estudo o direito comparado, mais especificamente, o Direito

Francês, em virtude de seus avanços legislativos acerca do tema sob análise.

Em suma, é o enfrentamento dessas questões que compõe o corpo do presente

trabalho, como instrumento de exposição e discussão acadêmica.

1 CRÉDITO CONSIGNADO

Vive-se concomitantemente na “era do crédito”10 e na “sociedade do

endividamento”,11 as quais são ilustradas por um universo de consumidores superendividados,

seduzidos pela publicidade e pelo acesso fácil ao dinheiro.

Como dito, embora muitos consumidores façam uso da consignação como um meio

mais rápido e fácil de obtenção de bens e fruição de serviços, ou uma alternativa para saldar

dívidas anteriormente adquiridas, na prática, segundo o Procon, 19,15% dos entrevistados

disseram que precisaram fazer cortes ou atrasar o pagamento de algum item essencial do

orçamento doméstico em razão da contratação do empréstimo consignado.12

Outro dado relevante, divulgado pelo Ministro Interino da Previdência, Carlos

Eduardo Gabas, é o de que no período compreendido entre os anos de 2004 e 2007 foram

concedidos quase 30 bilhões de reais sob forma de empréstimos consignados a aposentados e

pensionistas, sendo que destes, apenas 2,38 bilhões foram quitados.13

9 BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz; LIMA, Clarissa Costa de. Adesão ao projeto ... op. cit. p. 177. 10 COMPARATO, Fábio Konder. p. 09, apud. MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do consumidor endividado... op. cit. p. 13. 11 COSTA, Geraldo de Faria Martins. O direito do consumidor endividado e a técnica do prazo de reflexão.

Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 43, p. 258-260, jul.-set., 2002. 12 PINHEIRO, Márcia. A armadilha do crédito. Carta Capital, n. 438, p. 08-13, abr. 2007. 13 GOVERNO altera o crédito consignado. Veja on line. 08.01.2008. Disponível em: <http://vejaonline.abril.com.br/notitia/servlet/newstorm.ns.presentation.NavigationSerlet?publicationCode=1&pageCode=1&id=135536&textCode=135536&currentDate=1199804100000> Acesso em: 08.01.2008.

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Em suma, o que, a princípio, parecia ser uma solução para os problemas de consumo,

tornou-se um catalisador do endividamento.

.

1.1 SUJEITOS ATIVO E PASSIVO DO CONTRATO DE CRÉDITO

1.1.1 Consumidor

O Código de Defesa do Consumidor em seus primeiros artigos pretende delimitar seu

campo de incidência, por meio da identificação dos sujeitos por ele abrangidos: consumidor e

fornecedor, sendo que em seu art. 2°, caput, define, objetivamente, consumidor como sendo

“toda a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário

final”.

Cabe, brevemente, relembrar a existência da divergência doutrinária acerca da

interpretação do referido conceito, representadas pelas correntes finalista e maximalista: para

a primeira é consumidor o “destinatário econômico”, aquele que adquire determinados bens

sem intenção lucrativa, com um destino final, para si próprio.14 Dessa forma, “se o crédito for

utilizado com um fim pessoal ou familiar, teremos uma relação de consumo redigida pelo

Código e Defesa do Consumidor”15 e, portanto, está sob sua tutela o indivíduo que agir como

um consumidor strictu sensu.16 Em contraposição, a corrente maximalista expande a definição

do sujeito passivo da relação consumerista, por meio da concepção de “destinatário

fático”, bastando que o bem seja retirado de circulação do mercado para ser abrangido pelo

Código de Defesa do Consumidor.

Adstrito a essa divisão doutrinária, o CDC ainda possui três conceitos equiparados à

definição básica estabelecida no art. 2°, caput: uma contida no parágrafo único do próprio art.

2°, cujo critério é a coletividade de pessoas; outra disposta no art. 17, que tem como

delimitador a responsabilidade do fornecedor nos casos de acidentes causados pelo defeito de

um produto ou serviço e, por último, a equiparação estabelecida no art. 29 que utiliza como

critério a vulnerabilidade do indivíduo no mercado consumidor, elemento inerente às relações

de consumo. Tal equiparação é a que mais se adequa à discussão da concessão de crédito.

14 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 5° ed., 2005, p. 527. 15 COSTA, Geraldo de Faria Martins da, Superendividamento. A proteção do Consumidor de Crédito em Direito

Comparado Brasileiro e Francês. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 51. 16 PFEIFER, Roberto; PASQUALOTTO, Adalberto (Org.). Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil

de 2002: convergências e assimetrias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 135.

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1.1.2 Fornecedor

O art. 3° do CDC, define amplamente o sujeito ativo das relações de consumo, tendo

como critério delimitador o desenvolvimento de atividades tipicamente profissionais de forma

habitual ou reiterada, sendo que, no que tange ao crédito, nos termos do art. 3°, § 2°, do CDC,

considera-se fornecedor aquele que exerce atividade “de natureza bancária, financeira, de

crédito e securitária (...).”

Importa lembrar que a referida expressão foi objeto da Ação Declaratória de

Inconstitucionalidade 2.591, proposta pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro –

CONSIF17 e, apesar de superada a questão da aplicação das normas do código consumerista

aos contratos bancários e de financiamento, nunca é demais, respectivamente, reforçar e

analisar os argumentos que embasaram a improcedência da referida ADIn e a linha de

pensamento que a ensejou.

De um lado defendeu-se a exclusão das instituições financeiras da disciplina do

referido código, com base em uma interpretação restritiva do disposto nos §§1° e 2°, do art. 3°

do estatuto consumerista,18 visto que foi considerado que “o dinheiro e o crédito (...) são

instrumentos ou meios de pagamento que circulam na sociedade e em relação aos quais não

há destino final (...).”19 De lado oposto, dentre outras argumentações, sustentou-se que tanto o

crédito, quanto o dinheiro são bens considerados juridicamente consumíveis – objetos das

17 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5º, XXXII, DA CF/88. ART. 170, V, DA CF/88.

INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUA ABRANGÊNCIA A DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS OPERAÇÕES ATIVAS E A REMUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS NA EXPLORAÇÃO DA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA ECONOMIA (ART. 3º, § 2º, DO CDC). MOEDA E TAXAS DE JUROS. DEVER-PODER DO BANCO CENTRAL DO BRASIL. SUJEIÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. 1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo código de Defesa do Consumidor. 2. “Consumidor”, para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação do dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência. (...) 6. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegese que submete às normas do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenho da intermediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do controle, pelo Banco Central do Brasil, e do controle e revisão, pelo Poder Judiciário, nos termos do disposto no Código Civil, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual da taxa de juros. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2.591-1/DF. Tribunal Pleno. Rel. Ministro Eros Grau, Brasília, 07 de junho de 2006). 18 COSTA, Geraldo de Faria Martins da, Superendividamento. A proteção do consumidor de crédito em Direito

Comparado Brasileiro e Francês. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 46. 19 WALD, O Direito do Consumidor e suas repercussões em relação às instituições financeiras, p. 7 e ss, apud. COSTA, Superendividamento. A proteção do Consumidor...op. cit. p. 46.

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relações de intermediação habitual e lucrativa das instituições financeiras –, na medida em

que o CDC não utiliza as definições de bem consumível do estatuto civil, mas incluiu todos os

bens materiais e imateriais lato sensu.20

Argumentos à parte, não se pode olvidar que o art. 29 do CDC também serve de

sustento para a aplicação analógica do estatuto aos contratos de mútuo bancário por neles

estar presente a vulnerabilidade: “sendo o CDC lei especial das relações de consumo, é

possível sua aplicação em relações jurídicas outras, que apresentem a mesma nota típica de

vulnerabilidade, e que não dispunham de disciplina particular.”21 Atualmente, é pacífica a

aplicação do CDC às operações creditícias realizadas por bancos e instituições financeiras.22

1.2 PANORAMA LEGISLATIVO

A primeira regulamentação existente sobre o crédito consignado foi o Decreto de

1930, que permitiu o desconto a favor de associações de servidores públicos (informação

verbal),23 sendo que, posteriormente, a Lei 1.046/50 ampliou a consignação aos funcionários

públicos federais, limitando o teto dos juros em 12% ao ano e a 30% da consignação sobre o

vencimento total. Duas restrições marcam o referido quadro legislativo: a primeira no que

toca aos contemplados, apenas servidores públicos, e a segunda no que se refere à parte

consignatária, haja vista que os tomadores não podiam escolher por qual instituição financeira

fariam a negociação, pois o contrato ficava restrito a apenas uma instituição fornecedora de

crédito, demarcando a fragilidade no exercício da autonomia da vontade.

Atualmente, o art. 45, parágrafo único, da Lei n° 8.112/90, − que dispõe sobre o

Estatuto dos Servidores Públicos Federais − estabelece que “mediante autorização do

servidor, poderá haver consignação em folha de pagamento a favor de terceiros, a critério da

administração e com reposição de custos, na forma definida em regulamento”. Tal dispositivo

vem regulamentado pelo Decreto n° 4.961/04.

Já no que toca aos empregados sob regime celetista, a ampliação do crédito

consignado ocorreu por meio da Medida Provisória n° 130/03, posteriormente convertida na

Lei n° 10.820/03, sendo que cabe mencionar que, antes da conversão da referida Medida

20 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 5° ed., 2005, p. 525. 21 PFEIFER, Roberto; PASQUALOTTO, Adalberto (Org.). Código de Defesa do Consumidor... op. cit. p. 135. 22 STJ: Súmula 297 - “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.” 23 Conforme Káren Rick Danilevicz Bertoncello em aula ministrada, em substituição ao Professor Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, em setembro de 2006.

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7

Provisória em lei, esta era regulamentada pelo Decreto n° 4.840/03, o qual ratificou a

concessão de crédito consignado aos trabalhadores da iniciativa privada, bem como trouxe,

em seu art. 12, a característica da irretratabilidade unilateral.

Em 2004, a Lei 10.820/03 teve a redação de seu artigo 6° alterada pela Lei n°

10.953/04, por meio da qual se permitiu que os titulares de benefícios de aposentadoria e

pensão do Regime Geral de Previdência Social autorizem de forma irrevogável e irretratável o

INSS a efetuar mensalmente os descontos em folha para o pagamento de empréstimos.

Entretanto, conforme lembra Heloísa Carpena, segundo a Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílio de 2003, 40% as famílias brasileiras são sustentadas por pessoas de 60

anos, sendo que 65% delas por idosos que ganham até dois salários-mínimos. Dessa forma,

segundo a autora supracitada, “o estado de especial vulnerabilidade dessa população é

patente, e muitos idosos, apesar de contribuir para a renda familiar, são coagidos pelos

parentes a fazerem empréstimos acabam se endividando com medo de perder afeto ou o apoio

dos filhos e netos”.24

Diante das intensas campanhas publicitárias e do crescente número de reclamações

registradas tanto na Ouvidoria-Geral da Previdência Social (OGPS), quanto no Sistema

Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), os Ministérios da Previdência, da Justiça e da

Fazenda desenvolveram um Roteiro Técnico25 com orientações a respeito da concessão do

desconto na folha para aposentados e pensionistas com base nas regulamentações contidas nas

instruções normativas do Instituto Nacional de Previdência Social – INSS. Como exemplo,

cita-se a Instrução Normativa n° 28/2008, na qual, dentre outras previsões, há o

estabelecimento de um limite para o valor das prestações, que não pode exceder a 20% do

valor da aposentadoria ou da pensão (art.1º, § 1º, ‘a’), bem como para o número de

prestações, que não podem exceder a 60 parcelas mensais e sucessivas (art. 13, I).

No que toca ao limite das consignações, Rosângela Lunardelli Cavallazzi, entende

ser “razoável que não se tolere consignar mais de 20% da renda familiar, sob pena de agredir

a dignidade do endividado”.26 Isso porque, segundo pesquisa sobre orçamento familiar

realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no período 2002-2003,

24 CARPENA, Heloísa. Uma lei para os superendividados. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, n. 61, jan.-mar., 2007, p. 79. 25 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. Ouvidoria-Geral da Previdência Social. Roteiro técnico sobre

empréstimo consignado para aposentados e pensionistas do INSS. Brasília: 2005. Disponível em: <http://www.mpas.gov.br/pg_perfisempréstimo_consignado> Acesso em: 19/07/2007. 26 CAVALLAZZI, Rosângela Lunardelli. O Perfil do superendividado: referências no Brasil. In: MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do consumidor endividado.

Superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 388.

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os gastos classificados como correntes e de consumo − alimentação, habitação, vestuário,

transporte, higiene e cuidados pessoais, assistência à saúde, educação, recreação e cultura −

representam, para as famílias do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, 82% da despesa total e

constituem o mais importante componente da estrutura de despesas das famílias e, caso

fiquem comprometidos, repercutem no desenvolvimento digno de suas vidas.27

Apenas a título de demonstração do avanço da produção legislativa acerca da

matéria, cita-se que, recentemente, tramita no Senado Federal o projeto de lei n° 161/2005

que pretende vedar a publicidade com a clientela do INSS − aposentados e pensionistas −,

principalmente idosos (informação verbal)28.

Com o mesmo escopo, há o Ato Normativo n° 418 da Procuradoria-Geral de Justiça

do Estado em São Paulo, que incluiu como uma de suas metas para o ano de 2006 o combate

aos prejuízos e perigos do crédito consignado, principalmente, no que toca à sua

publicidade.29

Por fim, menciona-se a existência no Senado Federal do projeto de lei (sem número)

de 2007,30 que visa a acrescentar à Lei 10.820/03 o art. 7°-A, que prevê, justamente, que a

autorização para a retenção de valores nas contas de benefícios pagos pelo INSS deve ser

formalizada mediante contrato específico e determinado para esse fim, exigida a presença do

tomador, para a assinatura e a entrega dos documentos solicitados.

Muito se tem feito com o fim de se evitar práticas abusivas por parte das instituições

consignatárias, sendo que a título exemplificativo, menciona-se a ação civil pública n°

15829051/2007 ajuizada pela Defensoria Pública do Estado da Bahia, requerendo que as

instituições financeiras somente efetuassem empréstimos consignados a beneficiários da

Previdência Social, pessoas idosas e analfabetas, se os respectivos contratos fossem

registrados em cartório de registro público. Tal pedido foi deferido pelo Juiz de Direito da 2ª

Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso/BA.31

Situação oposta ocorreu em Santa Maria/RS, na qual o Ministério Público Federal

ajuizou a ação civil pública n° 2007.71.02.008647-6/RS contra o INSS e determinadas

27 Ibidem. 28 Conforme Káren Rick Bertoncello em aula ministrada em substituição ao professor Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, em setembro de 2006. 29 CAVALLAZZI, Rosângela Lunardelli. O Perfil do superendividado... op. cit. p. 391. 30 SENADO FEDERAL. Portal Legislativo do Senado Federal do Brasil. Projeto de lei do Senado n°, 2007. Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/pls/prodasen/prodasen.layout_mate_detalhe.show_integral?t=11761> Acesso em: 05.03.2008. 31 CAMPOS, José Raimundo Passos Campos. Juiz determina que empréstimos consignados para idosos analfabetos sejam feitos em cartório. Jusnavegandi. Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/peças/texto.asp?id=788&p=2> Acesso em 10.10.2007.

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instituições bancárias, praticamente nos mesmos termos da primeira ACP citada,32 no entanto,

decidiu-se, em sede liminar, que não caberia ao Poder Judiciário intervir na regulamentação

para as consignações nos benefícios previdenciários, atribuída ao INSS, diante da

discricionariedade dos atos administrativos.

1.3 CONCEITO E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

O crédito consignado, também conhecido como desconto em folha de pagamento, ou

crédito em consignação foi, pioneiramente, delimitado, no âmbito jurisprudencial, pelo Min.

Aldir Passarinho Júnior, no julgamento do Resp n° 728.563/RS,33 e consiste na autorização

irretratável e irrevogável de descontos diretos efetuados mensalmente da remuneração, salário

ou benefício previdenciário, correspondentes ao valor das parcelas devidas, sobre as quais

incidem taxas de juros inferiores à média oferecida no mercado, limitadas a 2.5% ao mês.34

Entretanto, não se pode ignorar que ao mesmo tempo em que tais taxas permitem que

muitos consumidores possam obter bens e fruir de serviços, estas se tornam um atrativo na

busca desenfreada pela concessão do crédito, desempenhando influência tal sobre o exercício

deliberativo do consumidor, a ponto de ele sequer considerar como contrapeso os ônus que

pode arcar ao tomar um empréstimo.

Isso porque, segundo Jason J. Kilborn, “mesmo se o consumidor compreender os

presentes custos potenciais dos empréstimos em excesso, baseado numa renda futura, quando

for chegado o tempo de escolher entre comprar algo a crédito ou guardar o valor, os descontos

exagerados empurrarão poderosamente a decisão a favor da compra de crédito”.35

Por último, no que se refere à irrevogabilidade da consignação reporta-se a leitura à

seção secundária 1.5 do presente artigo, haja vista que tal questão perpassa pela delimitação

da natureza jurídica dos descontos em folha analisada a seguir.

32 MPF/RS quer coibir abusos em empréstimos consignados junto ao INSS. Notícias Internet. Porto Alegre, 05/12/2007. Disponível em: <http://www.prrs.mpf.gov.br/iw/nti/publ.php?idpub=29521> Acesso em: 07/12/2007. 33 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 728.563/RS. Segunda Seção. Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Brasília, 08 de junho de 2005. 34 BRASIL. Instrução Normativa N° 28/INSS/PRES, de 16 de maio de 2008. Estabelece critérios e procedimentos operacionais relativos à consignação de descontos para pagamentos de empréstimos, e cartão de crédito, contraídos nos benefício da Previdência Social. Disponível em: <http://www.mpas.gov.br>. 35 KILBORN, Jason J. Comportamentos econômicos, superendividamento; estudo comparativo da insolvência do consumidor:buscando as causas e avaliando soluções. In: MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do Consumidor endividado: Superendividamento e crédito. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2006. p. 78.

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10

1.4 NATUREZA JURÍDICA

A questão da natureza jurídica do crédito consignado se faz relevante,

principalmente, quando após a autorização para o desconto em folha, o consumidor vem

requerer sua revogação, sendo que, nesses casos, sua vontade e capacidade de livre disposição

do salário (natureza alimentar) entram em conflito com os interesses da instituição

consignatária (manutenção da modalidade de pagamento).36

Para o Ministro Aldir Passarinho Júnior, no julgamento do Resp n° 728.563/RS, o

crédito consignado “não representa, apenas, mera forma de pagamento, mas a garantia do

credor de que haverá o automático adimplemento obrigacional (...) do mútuo”,37 na medida em

que a única forma de assegurar o cumprimento são os descontos das prestações feitas

diretamente da conta corrente do devedor. Tal posicionamento não é compartilhado pela

Ministra Nancy Andrighi que considera o crédito consignado uma modalidade de pagamento,

não sendo dessa forma, objeto principal do contrato, pois o credor pode ver adimplida a

obrigação por meio de outras formas especificas.

Outra questão diz respeito à consignação ser considerada uma forma de

penhorabilidade de remuneração. Nesse sentido, a Ministra supracitada expôs no referido

acórdão do STJ que o adimplemento do débito do trabalhador, oriundo do crédito consignado,

mediante o pagamento efetuado pelo empregador, “implica, em última análise, transferência

do crédito que o obreiro detém perante seu tomador de serviços à instituição financeira. Vale

dizer: o objeto do direito da instituição financeira, em última análise, é a própria remuneração

do trabalhador”.

Apesar de tal consideração, o posicionamento firmado pela Corte Superior é no

sentido de que “(...) não se está diante de processo de execução, de natureza forçada e

constritiva, mas de mero exercício de livre disposição contratual, comum em operações dessa

natureza, quando em geral oferecidas taxas inferiores à média do mercado”,38 razão pela qual

a vedação prevista no art. 469, V, do CPC existe quando o devedor não anuiu com os

descontos e se vê, de inopino, com sua remuneração ceifada para a satisfação de um crédito

36 Conforme voto-vista da Ministra Nancy Andrighi (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 728.563/RS. Segunda Seção. Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Brasília, 08 de junho de 2005.) 37 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 728.563/RS. Segunda Seção. Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Brasília, 08 de junho de 2005. 38 ______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 533.719/RS. Segunda Seção. Min. Aldir Passarinho Júnior, Brasília, 18 de junho de 2004.

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11

“sem preestabelecimento e previsão, portanto, de compatibilidade com o seu orçamento, daí a

proibição legal para tanto (...)”.39

Em sentido contrário, Jorge Rubem Folena de Oliveira entende que a Lei 10.820/03

− que dispõe acerca da concessão de crédito consignado − “foi uma forma engendrada para os

bancos não só fugirem da restrição às penhoras sobre salários e pensões (...) mas ficarem até

em melhor condição para a auto-satisfação de seus créditos”,40 sendo que o mesmo

entendimento parece ter José Reinaldo Lima Lopes, haja vista que este já afirmou que “o

crédito é uma mercadoria e como tal é anunciada e agressivamente promovida, sobretudo no

Brasil, onde se conseguiu a proeza de transformar o salário dos trabalhadores e a pensão dos

aposentados em objetos penhoráveis pelo mecanismo altamente ambíguo do crédito

consignado”.41

Por fim, nesta linha, a jurisprudência do Tribunal de Justiça gaúcho, ainda que em

manifestação minoritária, mas não isolada, já decidiu que o princípio da proteção do caráter

alimentar da remuneração do trabalho está à frente, inclusive, do novo posicionamento

firmado pelo STJ,42 no que toca aos descontos em folha.43 Nesse viés, o Tribunal de Justiça

do Rio de Janeiro, no julgamento da apelação cível n° 2006.00116305,44 chegou a considerar

os descontos em folha uma prática abusiva, análoga à penhorabilidade de vencimentos e que

caracterizava a invasão da “privacidade econômico-financeira” do tomador de crédito.

1.5 IRREVOGABILIDADE DO CONTRATO DE CRÉDITO CONSIGNADO

Segundo a Ministra Nancy Andrighi,45 a possibilidade de se revogar o contrato de

crédito consignado parte da diferenciação estabelecida entre as relações creditícias

estabelecidas entre o consumidor e as instituições financeiras e entre este e as cooperativas de

crédito.

39 ______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 728.563/RS. Segunda Seção. Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Brasília, 08 de junho de 2005. 40 LIVEIRA, Jorge Rubem Folena. A Lei (10.820/2003) do empréstimo consignado e sua inconstitucionalidade. Revista do Senado. n 43./172, out.-dez., 2006, p. 226. 41 LOPES, José Reinaldo Lima. In prefácio MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli. (Coord). Direitos do consumidor endividado... op. cit. p. 06. 42 BRASIL, REsp n° 728.563/RS, Segunda Seção, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, 08/06/2005. 43 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n° 70013537097. Quarta Câmara Cível. Rel. Des. Wellington Pacheco Barros, Porto Alegre, 03 de maio de 2006. 44 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 200600116305. Quinta Câmara Cível. Des. Cristina Tereza Gaulia, Rio de Janeiro, 25 de abril de 2006. 45 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 728.563/RS. Segunda Seção.Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Brasília, 08 de junho de 2005.

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12

Para a Ministra, no caso do empréstimo consignado ser concedido por instituição

financeira, se confrontados os interesses privados desta - manutenção dos descontos - com o

direito do trabalhador à livre fruição de sua remuneração, este se sobreporia, na medida em

que “se a natureza alimentar dos salários autoriza que se abra exceção à par conditio

creditorum em uma falência, que se quebre a ordem do pagamento de um precatório judicial e

que se impeça a penhora dos respectivos valores em qualquer processo judicial”, por

conseqüência, seria contraditório se abrir exceção a essa regra a fim de que se possibilite a

redução de juros na consignação.

O mesmo raciocínio, entretanto, no entendimento da Ministra, não se aplica ao

empréstimo concedido pelas cooperativas de crédito, sendo possível a manutenção da

consignação, mesmo contra a vontade do consumidor, alterada durante a execução contratual,

no intuito de se evitar que o interesse de um indivíduo (a revogação dos descontos) se

sobreponha ao interesse do grupo: a permanente “possibilidade das linhas de crédito

privilegiadas a partir da manutenção da higidez financeira da cooperativa”.46

Tal diferenciação é desconsiderada pelo Ministro Aldir Passarinho Júnior, para quem

independentemente da natureza da credora, a consignação não pode ser suprimida por

deliberação apenas do mutuário devedor.

Fazendo uma análise jurisprudencial acerca do tema, inicialmente, o Tribunal de

Justiça gaúcho era favorável ao cancelamento unilateral dos descontos, sendo que a título

exemplificativo, reporta-se aos acórdãos proferidos pela Quarta Câmara Cível nos julgamentos

da apelação cível n° 59808639547 e do agravo de instrumento n° 70001586544.48

Inclusive, já se chegou a considerar que “a permissão de manutenção do desconto

contrariamente à vontade do devedor, resultava em burla ao procedimento judicial de

execução de crédito, caracterizando verdadeira execução privada forçada.”49 - 50

46 Ibidem. 47 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 598086395. Quarta Câmara Cível. rel. Des. Wellington Pacheco Barros, Porto Alegre, 12 de agosto de 1998. 48 “Sendo possível a autorização para desconto em folha de pagamento é de ser possível também o seu cancelamento quando bem entenda o autorizante. É a sua manifestação de vontade que autoriza o desconto, não havendo como manter vontade unilateral do beneficiário o desconto quando entenda o servidor de cancelar a autorização.” (Tribunal de Justiça/RS. Agravo de Instrumento n° 70001586544. Quarta Câmara Cível. Agravante: Querino Dornelles Teixeira. Rel. Des. Wellington Pacheco Barros, Porto Alegre, 28 de fevereiro de 2001). 49 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 70014867840. Terceira Câmara Cível. Rel. Des. Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, Porto Alegre, 06 de julho de 2006. 50 Este era o entendimento do Des. Paulo de Tarso Viera Sanseverino antes do posicionamento firmado pela Segunda Seção do STJ no julgamento do REsp 728.563/RS.

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Posteriormente, com o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, declarando a

validade da cláusula de autorização do desconto em folha, bem como da inviabilidade da sua

revogação, o Tribunal gaúcho no julgamento do mandado de segurança n° 70013336359,51

reconhecendo a relativização do princípio da autonomia da vontade, principalmente à luz do

art. 421 do Código Civil de 2002, acabou sendo favorável à manutenção dos descontos em

folha de pagamento, desde que limitados a um percentual de 30% sobre o vencimento bruto

do devedor, patamar utilizado no escopo de proteger ao denominado “mínimo existencial”

(minimum vital)52 do devedor e de sua família,53 sob pena de se estar levando-o a uma

situação de miserabilidade.54

Contudo, há precedentes, posteriores ao julgamento do Resp n° 728.563/RS, em que

há uma flexibilização no que tange a característica da irrevogabilidade, como se depreende do

acórdão proferido no julgamento unânime do agravo de instrumento n° 70013942545,55 no

qual embora tenha se admitido que, no contrato de mútuo, o desconto em folha integra a causa

do negócio jurídico, concluiu-se taxativamente que não podem ser realizados, nem mesmo

mantidos, os descontos nos vencimentos ou nos proventos, sem consentimento do tomador.56

Segundo o princípio geral da obrigatoriedade das convenções (pacta sun servanda),

corporificado no art. 421 do atual Código Civil, uma vez concluído o contrato, ele deve

permanecer incólume, imutável em suas disposições, haja vista que ele se faz lei entre os

contratantes, podendo ser alterado, revisado ou, até mesmo, extinto apenas pela manifestação

conjunta de vontade dos envolvidos.57

Dessa forma, pode-se, de antemão, afirmar que a Lei 10.820/03 – que regula a

consignação em pagamento – sob a redação do dispositivo civil supracitado, inicialmente, não

desvia da perspectiva do princípio geral da obrigatoriedade das convenções, ao conter, em seu

art. 1°, a característica da irretratabilidade. Contudo, não se pode olvidar que em casos

excepcionais – como no abuso de direito ou do enriquecimento ilícito – tem-se admitido a

51 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Mandado de segurança n° 70013336359. Segundo Grupo Cível. Rel. Des. Jaime Piterman, Porto Alegre, 09 de junho de 2006. 52 Expressão utilizada no Code de la consommation - Lei de 29 de julho de 1998. (COSTA, Geraldo de Faria Martins da. Superendividamento: solidariedade e boa-fé. ..op. cit. p. 237). 53 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 70014605760. Quarta Câmara Cível. Rel. Des. Jaime Piterman, Porto Alegre, 26 de abril de 2006 e Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 70014114458. Quinta Câmara Cível. Rel. Des.ª Ana Maria Nedel Scalzilli, Porto Alegre, 25 de maio de 2007. 54______. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n° 70014867840. Terceira Câmara Cível. Rel. Des. Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, Porto Alegre, 06 de julho de 2006. 55 ______. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n° 70013942545. Quarta Câmara Cível. Rel. Des. Araken de Assis, Porto Alegre, 22 de março de 2006. 56 Ibidem. 57 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 3°ed., São Paulo: Atlas, 2003, 463.

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flexibilização desta concepção, por meio do princípio da função social do contrato, havendo a

revisão dos acordos de longa duração, por meio da intervenção judicial, que por substituir a

vontade de uma das partes, deve, prioritariamente, colocar o contrato em bons e atuais limites

de cumprimento, sem rescindí-lo.58 Tal preceito encontra-se esculpido nos arts. 317, 478 e 479

do Código Civil e no art. 6° do estatuto consumerista.

Além do exposto, não se pode simplesmente afastar o grau de vulnerabilidade do

consumidor-devedor, na medida em que o crédito consignado para muitas pessoas, senão a

maioria, representa uma forma de poder adquirir determinados bens sem comprometer de

modo significativo a renda familiar, de maneira que as classes economicamente

desfavorecidas não têm a mesma facilidade de adimplir os contratos de crédito. Isso sem

esquecer do atual fenômeno do superendividamento, conseqüência quase que imediata dos

excessivos empréstimos.59-60

São elucidativos os dados colhidos na pesquisa piloto de 100 casos de

superendividamento de consumidores do Rio Grande do Sul, em que 77% dos entrevistados

afirmaram que nos contratos de crédito não foi exigida qualquer forma de garantia,61 do que

se conclui que mesmo que não se descarte a possibilidade de o crédito consignado se tratar de

uma garantia, as condições em que esta, em muitos casos, é dada se tornam questionáveis: o

consumidor, diante da falta de outras formas convencionais de se assegurar o contrato de

empréstimo, acaba por fazer uso de sua própria remuneração como garantia contratual, sem

ter consciência das conseqüências que tal escolha possa acarretar.

É em razão desta manifestação de vontade viciada e irrefletida, bem como de

circunstâncias supervenientes e imprevisíveis oriundas da perturbação da economia,62 que

58 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil... op. cit. p. 466. 59 Reporta-se à seção primária 02 do presente trabalho, em se trata acerca da questão do superendividamento. 60 Káren Rick Danilevicz Bertoncello, ao analisar a irrevogabilidade e a irretratabilidade da consignação assinala que tais características: (...) já revelam as dificuldades dos consumidores em administrar sua ‘rede’ de credores, porquanto a inexistência de tutela legal no Brasil sobre o superendividamento permita a contratação de variadas dívidas com uma gama diversificada de fornecedores sem a prévia análise da capacidade retributiva do consumidor, viabilizando o comprometimento da renda acima da real possibilidade. Com isso tratando-se o beneficiário do crédito consignado de credor elevado a nova categoria de privilégio no recebimento da sua contraprestação, relega ao consumidor a busca da tutela jurisdicional para a solução do inadimplemento gerado, via de regra, com os demais fornecedores, pois ainda que comprometa, por decorrência de previsão legal, apenas 30% de sua remuneração disponível, no que diz com o crédito consignado, este patamar pode advir exacerbado diante das despesas rotineiras e insuperáveis (...). (BERTONCELLO. Superendividamento ... op. cit. p. 22). 61 MARQUES, Cláudia Lima. Sugestões para uma lei sobre o tratamento dos superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do Sul. In ______. Direitos do consumidor endividado. op. cit. p. 303. 62 ROPPO, Enzo. O contrato. Coimbra:Almedina, 1988, p. 253.

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conduzem ao inadimplemento das obrigações principais63 e, por conseqüência, do contrato

acessório de crédito,64 que se questiona a possibilidade da resolução ou, nos termos do art.

479 do Código Civil, da modificação eqüitativa das condições da consignação, haja vista que

a onerosidade excessiva está adstrita à resolução e não à revisão contratual, propriamente dita,

mas não impede que, no intuito de se manter a relação contratual, sejam alteradas suas

condições.

Dessa forma, adaptando a teoria da imprevisão à situação econômica contemporânea,

é possível constatar que o superendividamento65 favorece a resolução do contrato de

consignação, quando considerado circunstância superveniente, responsável pela

impossibilidade da execução do contrato nos moldes pactuados, situação melhor analisada por

Roppo: “uma ordem de problemas, em muitos sentidos análogas, coloca-se quando a

racionalidade econômica da operação, ou a funcionalidade do contrato, resultam perturbadas

ou até contemporâneas à formação do negócio, mas surgidas posteriormente”.66

Segundo Káren Rick Danilevicz Bertoncello, no que se refere ao tratamento legal e

doutrinário já destinados ao inadimplemento decorrente de superendividamento, “(...)

podemos subsumi-la na teoria da imprevisão, se considerado o superendividamento passivo

[quando o consumidor, por causas alheias e imprevisíveis à sua vontade, se superendivida] e

sob a ótica de sua natureza de impossibilidade advinda dos ‘acidentes da vida’ (desemprego,

divórcio, morte na família etc)”,67 face à superveniência e a imprevisibilidade da causa.

Já no que se refere ao superendividamento ativo inconsciente (consumidor que, de

boa-fé, assume obrigações sem um planejamento adequado) em que não há a

imprevisibilidade da causa do inadimplemento, a constatação da excessiva onerosidade

aproxima a teoria da quebra da base do negócio jurídico que se manifesta sob duas formas:

em razão do fato superveniente o pacto torna-se impraticável, ou face à perda da finalidade do

acordo para uma das partes esta se exime de continuar cumprindo o transigido.68

Por fim, torna-se elucidativa a afirmação feita por Márcio Mello Casado de que

“nenhuma obrigação pode ser motivo de escravidão financeira da pessoa humana desde que 63 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor (resolução). 2. ed., Rio de Janeiro: AIDE, 2003, p. 93. 64 Atualmente, é inegável o reconhecimento da interdependência estabelecida entre o contrato principal e o contrato acessório de crédito, haja vista que se deve levar em conta a unidade econômica da operação, pois o consumidor adere, muitas vezes sem saber, “a um conjunto de contratos organizados pelos profissionais - vendedor e organismo financeiro (...)” (COSTA.Superendividamento: solidariedade e boa-fé...op. cit. p. 234). 65 Para maior compreensão, reporta-se a leitura à seção primária 2 do presente estudo, cujo objeto é, justamente, a análise do fenômeno do superendividamento. 66 ROPPO, Enzo. O contrato. Coimbra: Almedina, 1988. p. 252 67 BERTONCELLO. Superendividamento... op. cit. p. 71. 68 Ibidem.

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de boa-fé tenha dirigido sua conduta no desenvolvimento obrigacional”,69 até porque,

segundo o autor supracitado, o contrato não está revestido apenas de obrigações e direitos

dele advindos, mas está inserido em uma visão constitucional, devendo servir aos

destinatários das normas constitucionais.70

Assim, embora se reconheça a impossibilidade de revogação unilateral dos contratos

em geral por força do princípio do pacta sun servanda, também admite-se que situações em

que seja constatada abusividade por parte do fornecedor de crédito, bem como, casos

excepcionais nos quais se verificam circunstâncias excessivamente onerosas tornam relativo

tal impedimento, sem que isso afete o princípio da força obrigacional dos contratos, cuja

relevância persiste estando a relação equilibrada econômica e socialmente.

2 SUPERENDIVIDAMENTO 2.1 DELIMITAÇÃO CONCEITUAL

Não muito diferente do direito romano, em que o devedor, ao tomar empréstimos,

obrigava não só a si mesmo, mas também sua família e seus bens, sendo o inadimplemento

considerado uma espécie de delito, autorizador do exercício da justiça de mão própria,

ensejador da escravidão, da perda de direitos civis e, até mesmo, da morte, 71 atualmente, há a

facilitação e, porque não, o induzimento tanto por parte do fornecedor, quanto da sociedade

como um todo ao consumo excessivo e descontrolado do crédito.

O ordenamento brasileiro utiliza a nomenclatura superendividamento para definir a

“impossibilidade global de o devedor, pessoa física, consumidor, leigo e de boa-fé, pagar

todas as suas dívidas atuais e futuras de consumo (excluídas as dívidas com o Fisco, oriundas

de delitos e de alimentos).”72

Em Portugal, tal fenômeno é denominado “sobreendividamento”, sendo que, nas

palavras de Maria Manuel Leitão Marques, “(...) também designado por falência ou

69 CASADO, Márcio Mello. Os princípios fundamentais como ponto de partida para uma primeira análise do sobreendividamento no Brasil. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n .33, jan.-mar. 2000. p.131. 70 Ibidem. 71 BATTELLO, Sílvio Javier. A (in) justiça dos endividados brasileiros, uma análise evolutiva. In: MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do consumidor endividado.

superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 211/227. 72 MARQUES, Cláudia Lima. Sugestões para uma lei sobre o tratamento dos superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do Sul. In:______. Direitos do consumidor endividado. Superendividamento e crédito. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006, p. 256.

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insolvência de consumidores, refere-se às situações em que o devedor se vê impossibilitado,

de uma forma durável ou estrutural, de pagar o conjunto das suas dívidas, ou mesmo quando

existe uma ameaça séria de que o não possa fazer no momento em que elas se tornam

exigíveis.”73

O “endividamento crônico”74 do devedor, fenômeno que afeta inúmeras famílias

brasileiras, principalmente, de baixa e média rendas que dependem do crédito, na maioria das

vezes, para a aquisição de bens e serviços essenciais à sobrevivência, acabam se tornando

escravas quase que permanentemente da necessidade ao crédito, haja vista que “não são

poucos os que se endividam para pagar (...) despesas com serviços indispensáveis que já não

são providos pelo Estado ou que nunca o foram adequadamente.”75 É a chamada escravidão

contemporânea por dívidas.76

Disso se extrai que, a afirmação de que o crédito é um mecanismo de inclusão social

possui verdade apenas relativa, pois, se de um lado vivemos em uma sociedade, cuja

economia desenvolve-se basicamente por meio do crédito, possuí-lo significa estar incluído

nessa sociedade. Em contrapartida, a ausência de crédito corresponde à impossibilidade de

assumir compromissos básicos da vida urbana,77 razão pela qual o superendividamento passou

a ser considerado pela doutrina francesa o “espelho da exclusão social” (mirroir de

e’exclusion).78

A problemática exposta reflete o surgimento de um novo nicho de mercado das

instituições financeiras, responsável pela movimentação de cerca de 200,6 bilhões de reais e

pelo crescimento da oferta de crédito que triplicou nos últimos seis anos. Responsável,

também, pelo crescimento quase que paralelo do índice de superendividados (de 6,9% para

7,3%, entre os meses de fevereiro de 2006 e fevereiro de 2007), em sua maioria, por causas

supervenientes e alheias à vontade do consumidor, como desemprego, acidente, separação

conjugal.79

73 LEITÃO MARQUES, Maria Manuel et al. O endividamento dos consumidores. Lisboa: Almedina, 2000. p. 02, apud. MARQUES, Cláudia Lima. In prefácio COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor ...

op. cit. p. 11. 74 MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli. Direitos do consumidor endividado.

superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 13. 75 LOPES, José Reinaldo Lima. In prefácio MARQUES, Cláudia Lima. CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli. Direitos do consumidor endividado.. op. cit. p. 06. 76 OLIVEIRA, Jorge Rubem Folena. A Lei (10.820/2003) op. cit. p. 225. 77 LOPES, José Reinaldo Lima. In prefácio MARQUES. Direitos do consumidor endividado.. op. cit. p. 06. 78 CHATAIN, Pierre-Laurente,; FERRIÈRE, Frédéric. Le nouveau régime de traitement du surendettement aprés la loi d’orientation n. 98-657 du 29 juillet 1998 relative à la lutte contre les exclusions, Recuiel Dalloz, p. 294, Chronique, Paris, 1999., apud. MARQUES, Cláudia Lima. Direitos do consumidor endividado... op. cit. p. 236. 79 PINHEIRO, Márcia. A armadilha do crédito. Carta Capital, n. 438, p. 08-13, abr. 2007.

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Diante desse quadro, a ausência de um tratamento legislativo específico tornou-se

um problema ainda maior, que deve ser sanado, preferencialmente, na mesma velocidade com

que as suas exigências vêm surgindo.

2.2 A AUTONOMIA DE VONTADE COMO ORIGEM DO SUPERENDIVIDAMENTO

A melhor maneira de se prevenir o surgimento do superendividamento, ou de superar

seus efeitos é dissecar o referido fenômeno, partindo de sua origem, que para Káren

Bertoncello,80 seria o exercício da autonomia de vontade.

Disposta no art. 170 da Constituição Federal e no art. 421 do Código Civil, a

autonomia de vontade consiste no poder proporcionado pela lei a cada pessoa de dispor acerca

de seus interesses e de seus negócios: é a liberdade de contratar propriamente dita e de

estabelecer acerca da modalidade de contratação.81

Não se pode esquecer, entretanto, que diante do novo panorama contratual na qual os

acordos possuem elaboração prévia e generalizada, onde o fornecedor é identificado pelo

profissionalismo na atividade desempenhada, enquanto o consumidor passa a integrar a

relação contratual em desigualdade de condições e desprovido de conhecimento técnico sobre

o produto ou serviço, esta liberdade negocial acaba sendo limitada por meio do exercício

intervencionista do Estado,82 que por sua vez, vem expresso em normas limitadoras, previstas

nos arts. 4°, III; 6°, V; 39 e 51 do Código de Defesa do Consumidor.

Tais normas tem por escopo propiciar o acesso do consumidor ao mercado em

condições de qualidade e de segurança aceitáveis,83 assumem uma dimensão geral de

(r)estabelecer o equilíbrio negocial e outra específica de garantir que a manifestação de

vontade seja livre e plena.

Entretanto, para a autora francesa Nicole Chardin, se a autonomia de vontade

corresponde ao direito do indivíduo de determinar livremente as regras às quais se submete,

na verdade, o consumidor de crédito não manifesta plenamente sua vontade, mas expressa

80 BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz. Superendividamento e Dever de Renegociação. 2006. 117 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006. p. 17. 81 VENOSA. Direito civil.... op. cit. p. 375/376. 82 BERTONCELLO. Superendividamento ... op. cit. p. 16. 83 Ibidem p. 17.

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19

uma vontade heterônoma, movida pelo desejo de bens e de serviços, sem que possa dispor dos

meios imediatos para obtê-los, o que enseja uma contratação impulsiva e irracional.84

Por fim, face à relevância do exercício da manifestação de vontade na relação

contratual, tal princípio “parte do pressuposto de que os contratantes se encontram em pé de

igualdade e que, portanto, são livres de aceitar e rejeitar os termos do contrato.”85 Até porque,

se assim não for, o contrato será passível de anulação, diante do manifesto vício volitivo.

2.3 PERFIL DO SUPERENDIVIDADO

Diante da atualidade e da complexidade do superendividamento, Guilles Paisant

entende ser difícil traçar as características do superendividado: “Este fenómeno es muy

diversificado. (...) El sobreendeudado puede ser um asalariado, obrero o mando, lo mismo que

um funcionário; soltero o um matrimonio y, a menudo, um parado o um indivíduo divorciado.

Em cualquier categoria profesional o personal se pueden encontrar sobreendeudados”,

chegando a afirmar que “No existe un perfil tipo de sobreendeudado”.86

No intuito de desmistificar o referido fenômeno as Defensorias Públicas nos Estados

do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, realizaram uma pesquisa de campo,87 conseguindo,

ao final dos trabalhos, delinear um perfil dos consumidores endividados, “sem entretanto

possibilitar generalizações de cunho científico”.88

Restringindo a análise a nosso estado, a partir dos dados obtidos foi possível definir o

superendividado como sendo, em sua maioria, mulheres (51%) − reflexo do atual quadro

econômico e social em que elas são as mantenedoras do grupo familiar −, com poucos

dependentes (74% têm até dois dependentes), numa faixa etária que oscila entre os 30 e 50

anos de idade (64%), sendo alarmante o percentual de superendividados idosos (24%).89

Outro dado, embora previsível, é que cerca de 66% dos entrevistados ou não auferem

renda alguma ou percebem até dois salários mínimos nacionais, sendo que dos 80% dos

entrevistados que se classificam como passivos, 62,5% responderam que o fator

84 CHARDIN, Nicole. Le contrat de consommation de crédit et l’ autonomie de la volonté. Paris: LGDJ, 1988. p. 33, apud BERTONCELLO. Superendividamento ...op. cit. p. 17/18. 85 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 157.841/SP. Primeira Turma. Rel. Min. José Delgado, Brasília, 27 de abril de 1998. 86 MARQUES, Cláudia Lima. Sugestões para uma lei ... op. cit. p. 259. 87 Em nosso Estado, a pesquisa abrangeu as Comarcas de Porto Alegre, Barra do Ribeiro, Charqueadas, Gravataí, Guaíba, Montenegro, Sapucaia do Sul, São Leopoldo, São Sebastião do Caí e Taquara. 88 CAVALLAZZI, Rosângela Lunardelli. O Perfil do superendividado: referências no Brasil. In: MARQUES. Direitos do Consumidor Endividado...op.cit. p. 389. 89 CONSALTER, Rafaela. O perfil do superendividado no Estado do Rio Grande do Sul. Disponível em: <www.adpergs.org.br/restrito/arq_artigos29.doc> Acesso em: 29/10/2007, p. 16.

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20

preponderante para a sua inadimplência foi, ou é o desemprego, e que cerca de 49% de todos

os entrevistados deve para três ou mais credores.90

2.3.1 Distinção entre superendividamento passivo e ativo

A doutrina européia, no intuito de determinar o sujeito superendividado e passível de

proteção, tem classificado o inadimplemento como sendo ativo ou passivo, cujo critério

diferenciador é a relação entre o pressuposto de boa-fé e o superendividamento.91 Para Maria

Manuel Leitão Marques:92

“O sobreendividamento pode ser activo, se o devedor contribui activamente para se colocar em situação de impossibilidade de pagamento (...), ou passivo quando circunstâncias não previsíveis (desemprego, precarização do emprego, divórcio, doença ou morte de um familiar, acidente, etc.) afectam gravemente a capacidade de reembolso do devedor, colocando-o em situação de impossibilidade de cumprimento”.

O superendividamento ativo, ainda, é subdividido em consciente e inconsciente: no

primeiro o devedor deliberadamente assume obrigações creditícias com a intenção de não

pagar, enquanto o segundo se dá quando o consumidor, imprevidente e sem malícia,93 age

compulsivamente, deixando de planejar os custos no ato da contratação,94 subestimando sua

própria suscetibilidade às chances de sofrer um evento adverso, como uma crise de liquidez.95

É a superconfiança aliada à boa-fé na contratação que, sinteticamente, caracterizam-no e o

colocam, junto do superendividado passivo, sob tutela legal.96

No caso do superendividamento passivo ou ativo inconsciente, este não se deve à

única causa oriunda do conjunto de obrigações financeiras assumidas, mas somam-se a esta

90 Ibidem. 91 BERTONCELLO. Superendividamento .. .op.cit. p. 49. 92 LEITÃO MARQUES, Maria Manuel et al. O endividamento dos consumidores. Lisboa: almedina, 2000. p. 2., apud. MARQUES, Cláudia Lima. In prefácio COSTA, Geraldo de Faria Martins da. Superendividamento. A

proteção do consumidor de crédito em Direito Comparado Brasileiro e Francês. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 11 (Grifos no original). 93 KHAYAT, Danielle. Le surendettement des menages. Paris: UF, 1999, apud. BERTONCELLO.

Superendividamento...op. cit. p. 49. 94 LEITÃO MARQUES, Maria Manuel et al. O endividamento dos consumidores. Lisboa: almedina, 2000. p. 2, apud. BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz. Superendividamento... op. cit.. p. 49. 95 KILBORN, Jason J. Comportamentos econômicos, superendividamento; estudo comparativo da insolvência do consumidor: buscando as causas e avaliando soluções. In: MARQUES, Cláudia Lima; CAVALLAZI, Rosângela Lunardelli (Coord). Direitos do Consumidor endividado... op. cit. p. 73/75. 96 Oportuno mencionar que para Geraldo de Faria Martins da Costa “o fenômeno do superendividamento mudou de perfil”, haja vista que a acumulação inconsiderada de dívidas está sendo substituída gradualmente por inúmeras obrigações (habituais ou não) inadimplidas em razão dos chamados acidentes da vida: causas supervenientes e imprevisíveis (COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor... op. cit. p. 109).

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21

outras causas tidas por não-econômicas que vão desde a falta de informação e educação dos

consumidores até os acidentes ou enfermidades crônicas.97

2.3.2 Distinção entre insolvência civil e superendividamento

Embora para José Reinaldo de Lima Lopes, no Brasil, a insolvência civil inexista na

prática,98 é imprescindível fazer um comparativo entre o referido instituto e o

superendividamento a fim de se delimitar diferenças e, mais importante, distinguir os

tratamentos cabíveis ao insolvente e ao superendividado.

Nos termos do artigo 748 do Código de Processo Civil, “Dá-se a insolvência toda vez

que as dívidas excederem a importância dos bens do devedor”, situação semelhante ao

superendividamento, que se caracteriza quando a pessoa física que de boa-fé (objetivamente

considerada) assume compromissos financeiros de caráter não profissional e não consegue,

posteriormente, honrá-los com a renda que percebe,99 seja porque não houve um planejamento

adequado por parte do tomador, seja porque, no momento do contratação, possuía meios

suficientes para adimplir as obrigações assumidas ou, ao menos, previsão de obtê-los e, por

um ou mais fatos imprevisíveis, supervenientes e alheios à sua vontade, houve a sua redução

ou não obtenção.

Como diferenças principais aponta-se o critério para incidência – no

superendividamento verifica-se a presença da boa-fé objetiva, pois, como visto, apenas estará

sob a tutela consumerista o chamado superendividado passivo ou ativo inconsciente e, por

conseguinte, ao superendividado ativo, resta então concluir que o tratamento conferido seria o

estabelecido no instituto da insolvência civil100 –, bem como os efeitos dos referidos

institutos, sendo que os da insolvência civil são análogos ao da falência do empresário,101 e se

fazem sentir de forma objetiva102 e subjetiva,103 perdurando até a sentença declaratória de

extinção de todas as obrigações do insolvente, conforme esclarece o art. 782 do CPC.

97 BATTELLO, Sílvio Javier. A (in) justiça dos endividados brasileiros, uma análise evolutiva. In: MARQUES. Direitos do consumidor endividado... op. cit. p. 226. 98 LOPES, José Reinaldo de Lima. In Prefácio MARQUES. Direitos do Consumidor endividado... op. cit. p. 08. 99 CASADO. Os princípios fundamentais ...op. cit. p. 130. 100 Relevante mencionar que no ordenamento francês, a insolvência se aplica, também, ao superendivdado que, tendo a possibilidade de renegociar suas dívidas, não cumpre, no prazo de 60 dias, os novos acordos estabelecidos com seus credores. Remete-se a leitura à seção terciária 2.6.2 do presente trabalho que trata acerca do dever de renegociação. 101 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 37° ed., 2 v., Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 298. 102 Consistem no vencimento antecipado das dívidas, a arrecadação dos bens penhoráveis atuais e que vieram a ser adquiridos no curso do processo e a execução coletiva, ou juízo universal do concurso dos credores, a perda

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22

Isso porque, o principal objetivo da insolvência “é aceitar e definir o estado

patrimonial do devedor e declarar quais são os credores que participarão do resultado da

execução coletiva”.104

Já os efeitos do superendividamento, por interpretação extensiva e analógica, são

semelhantes ao da recuperação judicial conferido ao empresário: a partir de uma investigação

global e estrutural das causas pessoais e sociais que levaram ao superendividamento, levando-

se em conta “as dívidas vencidas e as dívidas a vencer” (grifos no original)105, tenta-se por

meio de um esquema de negociação manter as relações contratuais de crédito.106

Em síntese, a diferença entre os dois institutos é que a hierarquia de credores (por

conditio creditorum) prevista no Código de Processo Civil tem por fim “facilitar que os

credores sejam pagos e não que o devedor pessoa física alcance condições de pagar”,107 se

resumindo a “uma execução coletiva”,108 na qual se ignora a causa do superendividamento: se

decorrente de atitudes de boa ou de má-fé.

2.4 TRATAMENTO ATUAL CONCEDIDO AO SUPERENDIVIDADO NO DIREITO BRASILEIRO E FRANCÊS: MEDIDAS PREVENTIVAS E PROTETIVAS

Diversos países europeus, por não ignorarem a repercussão social e econômica do

superendividamento e por reconhecerem que a prevenção e a solução do referido fenômeno

perpassam pela esfera jurídica, têm adequado seus ordenamentos com base nas premissas de

cooperação e de lealdade, as quais já se encontram, ainda que sob a forma de instrumentos

gerais de atuação, esculpidos em nosso ordenamento, por meio do Código Civil e,

principalmente, do Código de Defesa do Consumidor, que já abrange “a prevenção ao

endividamento exagerado do consumidor e o controle da oferta e contratação de empréstimos

e financiamentos”.109

da eficácia das penhoras existentes, por meio da força atrativa do juízo universal da insolvência, que trás para junto de si as execuções singulares existentes, impedindo que outras se iniciem. (THEODORO JÚNIOR. Curso

de Direito Processual... op. cit. p. 298). 103 Consiste na perda do direito de administrar os bens e dispor deles, até a liquidação total da massa (art. 752 do CPC). Ibidem. 104 BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz; LIMA, Clarissa Costa de. Adesão ao projeto conciliar é legal – CNJ: Projeto-piloto. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 16/63, jul.-set., 2007, p. 181. 105 COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor... op. cit. p. 90. 106 LOPES. Crédito ao consumidor e superendividamento... op. cit. p. 62. 107 MARQUES, Claudia Lima. Sugestões ... op. cit. p. 266. 108 Ibidem. 109 CEZAR, Fernanda Moreira. O consumidor superendividado: por uma tutela jurídica à luz do direito civil-constitucional. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, n 16/63, jul.-set., 2007, p. 156-157.

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23

Entretanto, no que toca ao tratamento do consumidor já endividado, para que este

seja realmente adequado, demanda do legislador brasileiro uma readaptação do ordenamento

consumerista, por meio da elaboração de uma norma própria: o Direito do Consumidor

Endividado.

2.4.1 Utilização dos bancos de dados

Os bancos de dados de proteção ao crédito,110 na definição de Leonardo Roscoe

Bessa, consistem em “entidades que têm por principal objeto a coleta, o armazenamento e a

transferência a terceiros (credor potencial) de informações pessoais dos pretendentes à

obtenção ao crédito.”111

Na Europa, especialmente no ordenamento francês, a regulamentação dos bancos de

dados está estritamente vinculada às outras formas de prevenção e combate do fenômeno

social do superendividamento, tanto que o projeto de Diretiva de 11 de setembro de 2002,

prevê que “é destinado o dever ao prestador de crédito de avaliar concretamente as condições

de cumprimento do consumidor sobre o crédito contraído, incluindo para tanto, dever de

consulta a banco de dados e dever de aconselhamento a fim de não oferecer crédito em

montante superior às efetivas possibilidades de pagamento do futuro devedor,”112 sendo que

esses deveres devem ser observados antes da conclusão do contrato, sob pena de perda, até

mesmo, dos juros e encargos pactuados.113

Esta consulta, segundo a doutrina francesa, decorre do dever de vigilância, pois

consiste, justamente, na atuação da instituição concedente de crédito de verificar a situação

financeira do tomador, se está ou não em situação irremediavelmente comprometida –

superendividado –, bem como de adequar o crédito às possibilidades de reembolso do

consumidor.114

Dessa forma, tais entidades, a um só tempo, superam o anonimato do consumidor, o

que, por conseqüência, auxilia na concessão do crédito de forma mais rápida115 e segura, na

medida em que, embora seja considerada a parte mais forte na relação consumerista, “não se

110 A disposição acerca dos bancos de dados encontra-se nos arts. 43 e 44 do Código de Defesa do Consumidor. 111

BESSA, Leonardo Roscoe. Os bancos de dados de proteção ao crédito na visão do Superior Tribunal de Justiça. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 16/63, jul.-set., 2007, p. 203. 112 BERTONCELLO. Superendividamento...op. cit. p. 30. 113 Ibidem, p. 31. 114 Ibidem, p. 31. 115 BENJAMIN, Antônio Herman. Código brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do

anteprojeto. 7°. ed., São Paulo: Forense Universitária, 2001. p. 421.

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24

pode negar ao fornecedor o direito de informar-se sobre o crédito do seu cliente na praça, e de

repartir com os demais os dados de que dele dispõe”,116 bem como serve como medida

preventiva do superendividamento.

Entretanto, Cláudia Lima Marques adverte que a recente prática brasileira

demonstrou, porém, que a utilização destes bancos de dados tem sido maliciosa e, por vezes,

negligente por parte dos fornecedores de crédito, pois apesar de o consumidor estar discutindo

em juízo o valor da dívida, este já foi incluído como inadimplente nos cadastros negativos,117

o que constitui constrangimento e ameaça, vedados pelo estatuto consumerista.118

Por fim, a autora supracitada, ainda lembra que, no que tange ao

superendividamento, este “poder-dever” de vigilância conferido aos bancos de dados acaba

servindo como instrumento não de prevenção e combate ao referido fenômeno, mas como

catalisador do superendividamento:

Estes bancos, positivos ou negativos, são apenas a ponta do iceberg do endividamento, pois, assim como eles servem para ‘privar o consumidor de crédito’, servem para fazer comércio com as dificuldades e dados privados alheios, servem para monitorar hábitos de consumo, servem para invadir a privacidade de consumidores especiais (ricos, idosos, homossexuais, doentes) e servem para conceder mais crédito aos que já estão superendividados ou em vias de se superendividarem. (grifos no original).119

2.4.2 Prazo de reflexão

A legislação francesa considerando a autonomia de vontade um exercício relevante

na formação contratual, intervém nas relações de crédito, ao estabelecer o chamado “prazo de

reflexão” (délai de refléxion),120 medida preventiva consistente na faculdade de o consumidor

reconsiderar sua manifestação de vontade.

Conforme explicitado anteriormente, a origem do superendividamento está

estritamente vinculada ao exercício da autonomia de vontade, razão pela qual, parte da

doutrina estima que a técnica do prazo de reflexão ou de ponderação tem por escopo conceder

116 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 22.337/RS. Quarta Turma. Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Brasília, 20 de março de 1995. 117 MARQUES. Contratos...op. cit. p. 823. 118 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 170.281/SC. Quarta Turma. rel. Min. Barros Monteiro, Brasília, 21 de setembro de 1998. 119 MARQUES. Contratos ... op. cit.. 832. 120 Conforme lembra Geraldo de Faria Martins da Costa no ordenamento norte-americano tal instituto é denominado “cooling off-period” - período de resfriamento - (COSTA, Geraldo de Faria Martins da. O direito do consumidor endividado e a técnica do prazo de reflexão. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 43, jul.-set., 2002, p. 258).

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25

ao tomador de crédito a oportunidade de exercer efetiva e plenamente a autonomia de

vontade,121 sem assumir compromissos impensados e/ou conduzidos pelo “impulso

incontrolado do desejo”,122 fruto das imposições da sociedade de consumo.

Em suma, “a técnica do prazo de reflexão fortalece o princípio da vontade, vontade

plena, madura e crítica, temperada pela reflexão”,123 fazendo uso do tempo “como fator de

reequilíbrio da operação”124 creditícia.

Analisando a legislação francesa a respeito da matéria, Geraldo de Faria Martins da

Costa separa os tratamentos conferidos pelo prazo de reflexão no que toca ao crédito

mobiliário e ao imobiliário,125 sendo que no primeiro caso, o prazo de reflexão inicia a partir

da assinatura da oferta, na medida em que o Code de la consommation, em seu art. L. 311-8,

estabelece que a oferta deve ser mantida por quinze dias a contar de sua emissão.

Paralela ao prazo de reflexão, há a faculdade de retratação (faculté de rétractation)

prevista no art. L. 311-5 do Code que determina que quando a oferta prévia não reserve o

credor o direito de aprovar a pessoa do tomador, o contrato torna-se perfeito desde a aceitação

da oferta, sendo facultado ao consumidor reconsiderar seu consentimento no prazo de sete

dias, a partir da aceitação da oferta.

Havendo o tal previsão de aprovação (art. L. 311-16 do Code), a oferta aceita torna-

se perfeita somente se, em sete dias, o tomador não tenha se manifestado em sentido contrário

à contratação e, se o credor tenha informado ao tomador sua decisão de lhe acordar o crédito.

Neste caso o contrato tem seus efeitos suspensos até o prazo final de retratação.126

Ressalte-se que o prazo de retratação pode ser reduzido para, no máximo, três dias,

caso o consumidor tenha expressamente solicitado a entrega antecipada do produto ou da

prestação do serviço, antes de findo o prazo de retratação (art. L.311-24 do Code).

Oportuno considerar, que Geraldo de Faria Martins da Costa embora reconheça a

divergência doutrinária acerca da possibilidade da faculdade de retratação ofender o princípio

da força obrigacional dos contratos, aufere que tal exercício “não tem caráter de desfazimento

do contrato, pois esse ainda não foi concluído por falta de um consentimento definitivo”,127

121 COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor...op. cit. p. 110. 122 BERTONCELLO. Superendividamento . ..op. cit. p. 18. 123 COSTA. O direito do consumidor endividado e a técnica... op. cit. p. 271. 124 COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor de crédito... op. cit. p. 90. 125 Ibidem, p. 89. 126 Ressalte-se que, em ambos os casos, a retratação se faz por meio da carta de recomandée, ou seja, “é necessário que o consumidor envie uma carta equivalente à nossa carta com AR ao fornecedor, exercendo o seu direito de retratação” (BOLSON, Simone Hegele. O direito de arrependimento nos contratos de crédito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n. 16-64, out.-dez., 2007, p. 176). 127 COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor de crédito... op. cit. p. 94.

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26

que somente será dado se, durante o prazo legal de reflexão, a parte não se manifestar de

modo a desfazer a manifestação anteriormente expressa.128

No caso do crédito imobiliário, o prazo de reflexão precede a assinatura da oferta,

sendo que não há a possibilidade de retratação, restando apenas ao tomador o direito de

resguardar a aceitação até a expiração do prazo de dez dias, a partir da recepção da oferta.129

Em nosso ordenamento, o prazo de reflexão encontra-se inserido por meio do Código

de Defesa do Consumidor que, em seu art. 49, prevê o direito de arrependimento, aplicável

apenas aos contratos de consumo que tenham sido concluídos, fisicamente, fora do

estabelecimento comercial.130 Tal redação já foi questionada por Cláudia Lima Marques, no

que toca às operações creditícias que, face os perigos e riscos do superendividamento, deveria

abranger também os contratos celebrados dentro de um estabelecimento comercial clássico.131

Isso porque, a técnica do prazo de reflexão preceitua que “a lei não pode

evidentemente forçar a refletir aquele que não quiser, mas ela pode ao menos obrigar os

profissionais a deixar aos consumidores tempo de reflexão”,132 inclusive, quando os contratos

forem celebrados, inicialmente, dentro dos estabelecimentos comerciais, onde o consumidor

não tem a oportunidade de refletir e de decidir livremente, sem as influências dos interesses

do fornecedor.

2.4.3 Dever de informação do fornecedor de crédito

Segundo, Geraldo de Faria Marins da Costa, o dever de informação do fornecedor,

expressamente delimitado no estatuto consumerista, por meio dos arts. 6°, III; 31; 37, §1°; 38

e 67, consiste numa obrigação acessória, instrumental da prestação contratual principal,133

composta pela obrigação negativa de não enganar o consumidor e pela positiva de fornecer

128 Cabe mencionar, ainda, que o efeito da retratação é a extinção do contrato de crédito e a resolução de pleno direito, sem indenização do contrato de venda ou de prestação de serviços, em vista da qual o empréstimo tinha sido ofertado, sendo que o fornecedor deve restituir as somas pagas à vista (COSTA, Geraldo de Faria Martins da. Superendividamento. op. cit. p. 96). 129 Ibidem. 130 “Assim, as contratações por telefone, telex, fax, videotexto, mala-direta, reembolso postal, catálogo, prospectos, lista de preços, em domicílio, (...)” (Nery Júnior, Nelson. et aliii. Código brasileiro de Defesa do

Consumidor: comentado do pelos autores do anteprojeto. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998. p. 391) são passíveis de arrependimento. 131 MARQUES. Contratos... op. cit. p. 237. 132 JEAN CALAIS-AULOY.L’ influence du droit de la consommation sur lê droit civil des contrats. Revue

Trimestrielle de Droit Civil 2/239-254, Paris, avr-juin.1994. p. 243, apud. COSTA, Geraldo de Faria Martins da. O direito do consumidor endividado e a técnica do prazo de reflexão. Revista de Direito do Consumidor, n. 43, São Paulo: Revista dos Tribunais, jul.-set. 2002. p. 271. 133 MARQUES, Cláudia Lima; BENJAMIN, Antônio H. V; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de

Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 482.

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27

informações completas e adequadas, sendo que, no caso dos contratos de crédito, somam-se a

estas, ainda, uma terceira obrigação: a de aconselhar o consumidor em relação aos riscos da

operação de crédito,134 a qual “implica o dever de revelar ao consumidor os prováveis

problemas da operação de crédito a curto e longo prazos, prevenindo-o e lhe sugerindo

soluções possíveis.”135

Em verdade, “este dever de informar compreende não somente aquelas informações

ou dados de caráter objetivo como a taxa anual e mensal de juros, número de parcelas, datas

dos reembolsos, como também aquelas de caráter subjetivo que estão ligadas à avaliação da

capacidade de reembolso do consumidor”.136

Um exemplo prático da obrigação de aconselhar nas operações de crédito é a

instituição atual do chamado Custo Efetivo Total – CET –, por meio da Resolução n° 3.517,

de 06 de dezembro de 2007, do Conselho Monetário Nacional, que consiste no dever de a

instituição financeira informar ao tomador o custo total da operação de crédito ou de

arrendamento mercantil financeiro, expresso na forma de taxa percentual anual: fluxos

referentes às liberações e aos pagamentos previstos, incluindo taxas de juros a ser pactuada no

contrato, tributos, tarifas, seguros e outras despesas cobradas do cliente, mesmo que relativas

ao pagamento de serviços de terceiros contratados pela instituição,137 cabendo ao fornecedor

de crédito “assegurar-se de que o tomador, na data da contratação, ficou ciente dos fluxos

considerados no cálculo do CET, bem como de que essa taxa percentual anual apresenta as

condições vigentes na data do cálculo.”138

Entretanto, tal dever não será eficiente se os consumidores não forem capazes de

direcionar essas informações à avaliação de possíveis riscos e encargos provenientes das

relações contratuais de crédito em geral. Assim, partindo de uma análise estritamente

subjetiva, que foge de qualquer tutela jurídica, os credores também participam do

superendividamento, principalmente aqueles que “tendem a ser demasiadamente otimistas e

confiantes no que diz respeito a sua própria suscetibilidade e risco”.139

134 COSTA. O direito do consumidor endividado ... op. cit. p. 265. 135 Ibidem. 136 LIMA, Clarissa Costa de. Crédito responsável e superendividamento. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n.16/64, out.-dez., 2007, p. 306. 137 Cf. art. 1°, § 2°, da Resolução 3.517/2007 do Conselho Monetário Nacional 138 Cf. art. 2° da Resolução 3.517/2007 do Conselho Monetário Nacional. 139 KILBORN. Comportamentos.... op. cit. p 73.

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28

2.4.4 Dever de renegociação

Segundo Cláudia Lima Marques, a boa-fé, no CDC, possui três finalidades distintas,

porém interdependentes: é princípio geral (art. 4°, III), é conceito indeterminado (art. 51,

caput e IV) e é cláusula geral (art. 51, IV)140 que gera um dever de cooperação entre

fornecedor e consumidor, concretizado no dever geral de renegociação, cuja finalidade é

adaptar e preservar os contratos de longa duração, face ao inadimplemento, principalmente, se

oriundo do superendividamento.

Dessa forma, o Código de Defesa do Consumidor pátrio oferece também como

instrumento de defesa do superendividado o dever de renegociação, chamado por Cláudia

Lima Marques de “cooperação parceiro-fornecedor”,141 sendo que tal estatuto prevê em seu

art. 6°, inciso V, como mencionado anteriormente, o direito de o consumidor requerer a

modificação do contrato, no caso de onerosidade excessiva, a fim de readaptar e manter o

contrato nos moldes da boa-fé, estabelecida no art. 4°, III, do CDC, e da previsão contida no

art 51, § 2°, do CDC que estabelece que: “Art. 51. (...) §2°. A nulidade de uma cláusula

contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços

de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes.” No Código Civil o dever de

renegociação encontra-se mensurado nos arts. 157, § 2º, 479 e 422.

Káren Bertoncello, lembra que o dever de renegociação ora exposto em nada se

confunde com as renegociações promovidas pelas instituições financeiras, nas quais ocorre a

consolidação das dívidas por meio da elaboração de um novo contrato, sem reavaliar as

condições do inadimplente,142 mas sim, defende-se a repactuação negocial, na qual se

distribuem os riscos oriundos das circunstâncias supervenientes entre os contraentes.143

Segundo Francesco Macário, há no contrato um “pacto implícito de renegociação”

cujos fundamentos estão, justamente, nos princípios da boa-fé e da eqüidade, a partir do que é

possível pensar que o dever de renegociação está incluído no negócio jurídico antes mesmo

que circunstâncias que possam gerar onerosidade excessiva desequilibrem a relação

contratual,144 sendo que, no caso dos contratos de longa duração, tal dever torna-se uma

“conseqüência da eqüidade integrativa”, em razão da renegociação nascer da lei.

140 MARQUES. Sugestões... op. cit. p. 276. 141 MARQUES, Cláudia Lima. Prefácio. In: COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor... op. cit. p. 23/24. 142 BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz. Superendividamento... op. cit. p. 73. 143 ROPPO, Enzo. O contrato. Coimbra: Almedina, 1988, p. 253. 144 MACARIO. Adeguamento... p. 83, apud. BERTONCELLO. Superendividamento... op. cit. p. 82.

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Dessa forma, constatada a existência em nosso ordenamento do dever de

renegociação, cabe analisar como tal obrigação pode servir como medida de atenuação do

superendividamento. É a doutrina francesa que o identifica como uma alternativa para a

superação do referido fenômeno social, e, assim como Káren Bertoncello, menciona-se

Sébastien Pimont, para quem o dever de renegociação parte da análise econômica do contrato,

com base na exigência da boa-fé, considerada um prolongamento da obrigação de lealdade ou

de cooperação, como conseqüência natural, impositiva da função econômica do contrato145.

O dever de renegociação é bastante estimulado na França, que por meio da Lei n°

98/1010 – de 31 de dezembro de 1989 –, que dispõe acerca do endividamento de

consumidores, posteriormente, incorporada ao Code de la consommation – Lei 93/949, de 26

de julho de 1993 –, no art. 331, institui a comissão que investiga os casos de

superendividamento (surendettement), as chamadas comissões de superendividamento dos

particulares (commissions de suredettement), por meio das quais “pessoas físicas de boa-fé

que se encontram na impossibilidade manifesta de fazer face ao conjunto de suas dívidas não

profissionais exigíveis e a vencer”146 requerem “um procedimento amigável de convenção das

condições de pagamento de todos os credores (art. 331-2) (...). O plano é solicitado pelo

devedor e pode conter: abatimento ou redução de juros, remissão de valores, consolidação ou

substituição de garantias ou formas de sua execução.”147

Vencida a instrução e a decisão de admissibilidade da demanda, a comissão estimula

a conciliação entre devedor e credores por meio de um plano convencional de recuperação

(plan conventionnel de redressement art. L. 331-6 do Code de la consommation) que prevê

medidas de aditamentos ou de escalonamento dos pagamentos, bem como a supressão ou

redução das taxas de juros, ou, ainda, o perdão de dívidas. Aprovado e assinado, o acordo

recebe força executória.148

Seguindo os mesmos passos, no Brasil, diante da omissão legislativa, não só a

doutrina quanto a jurisprudência têm servido como instrumentos de atuação na defesa do

superendividado, mas também a prática instituída pela Defensoria Pública do Estado do Rio

de Janeiro, por meio da criação da Comissão de Defesa do Consumidor Superendividado, que

145 PIMONT, Sébastien. L’ économie du contrat. Aix-en-Provence: Presses Universitaires D’ Aix-Marseille, 2004, p. 271, apud. BERTONCELLO. Superendividamento...op. cit. p. 85. 146 COSTA. A proteção do consumidor de crédito... op. cit. p. 116. 147 LOPES, José Reinaldo Lima. Crédito ao consumidor e superendividamento - uma problemática geral. Revista de Direito do Consumidor, n. 17, jan.-mar, 1996, p. 60. 148 COSTA. Superendividamento. A proteção do consumidor... op. cit. p. 116.

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nada mais é do que a concretização do dever de renegociação, em moldes muito semelhantes

ao instituto francês.

Por meio dessas comissões, todos os credores do superendividado são convidados a

participar de uma audiência conjunta de conciliação onde, a partir da análise conjunta das

dívidas do consumidor, são feitas propostas a cada credor, seja no sentido de reduzir as taxas

de juros, seja no de ampliar os parcelamentos. Posteriormente, são marcadas novas

audiências, desta vez, exclusivas com cada credor, nas quais são efetivados os acordos

baseados nas propostas iniciais.

Por fim, em nosso Estado, aderindo ao Projeto “Conciliar é Legal” do Conselho

Nacional de Justiça, houve a elaboração de um Projeto-piloto pelas magistradas Dra. Káren

Rick Danilevicz Bertoncello e Dra. Clarissa Costa de Lima, que prevê a renegociação

conjunta das dívidas por meio da realização de audiências com os credores indicados pelo

superendividado, inicialmente, nas Comarcas de Charqueadas e Sapucaia do Sul, a partir de

novembro de 2006, não se restringindo, contudo, aos consumidores residentes nestas

comarcas.

CONCLUSÃO

Que o consumidor seja reabilitado e que as relações contratuais se mantenham

(r)equilibradas.

No contexto atual do superendividamento e da consignação em folha de pagamento

não são contraditórias as referidas aspirações, em virtude de ser válido e legal o desconto em

folha, na medida em que o fornecedor de crédito respeite a capacidade de pagamento do

consumidor, bem como um prazo mínimo de reflexão, exerça seu dever de informação, e se

disponha a renegociar o montante de dívidas que porventura o tomador possua, caso se mostre

superendividado.

É provável que alguém se pergunte como pode ser possível que o consumidor se

(super)endivide, fazendo uso da consignação em folha, na qual há a imposição de um limite

consignável de 20% do salário, remuneração ou provento − restrição esta que assegura,

justamente, que o tomador não comprometa quantidade significativa de sua renda −.

Todavia, se forem considerados os inúmeros contratos abusivos em que a referida

margem consignável não é observada, os consumidores − cuja situação econômica já se

encontra bastante abalada por outras dívidas − que fazem uso da consignação apenas para

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substituírem parte do débito por outra obrigação de pagar com menor taxa de juros e maior

prazo, ou, até mesmo, o tomador que no ato da contratação possuía condições de adimplir a

obrigação assumida e, posteriormente, em razão de fatos supervenientes e excessivamente

onerosos não consegue mais adimplir o contrato de crédito, sim é possível o

superendividamento.

Vislumbradas as situações supracitadas é fácil perceber porque têm sido ajuizadas

inúmeras ações judiciais postulando o cancelamento dos descontos em folha. Ora, o reflexo

da insuportabilidade econômica e social decorrente do superendividamento induz o

endividado a cortar gastos para redirecioná-los a outras obrigações, geralmente, para o

pagamento de itens essenciais a sua sobrevivência. Daí decorre a divergência jurisprudencial:

é possível, ou não cancelar os descontos em folha?

Nem o devedor, nem o Poder Judiciário podem, simplesmente, dissolver o contrato

acessório de consignação e ignorar os efeitos dele decorrentes, de forma que deve haver

cautela nas intervenções judiciais nos contratos, haja vista que, em princípio, eles se

concretizam pela livre manifestação de vontades de ambas as partes. Ou seja, no caso da

consignação, como bem lembrado pelo Desembargador Araken de Assis,149 a forma de

pagamento integra a causa do negócio jurídico, de modo que o tomador somente obtém o

crédito com taxa de juros e prazo mais vantajosos sob a condição de autorizar os descontos

diretos da prestação do empréstimo de sua remuneração, salário ou benefício previdenciário.

Entretanto, o caso concreto traz situações específicas nas quais se faz necessária uma

análise mais criteriosa e flexível.

A primeira delas é a de que não se pode viver na utopia de acreditar que os contratos

de crédito nunca serão abusivos, pois, como se demonstrou brevemente no presente estudo,

simples exigências − como a de a consignação ser expressamente autorizada −, comumente,

não são observadas pelas instituições financeiras, principalmente, quando o consumidor é

beneficiário do INSS. Nesse caso, forçoso reconhecer o cancelamento, na medida em que

falta elemento volitivo essencial. Além disso, não se pode fechar os olhos ao fenômeno do

superendividamento, situação que pode ensejar o cancelamento dos descontos em folha.

Por fim, no que toca ao referido fenômeno, constata-se a necessidade de

reformulação legislativa, principalmente, quanto ao tratamento ao superendividado, haja vista

que as medidas de prevenção existentes – embora ainda insuficientes –, possuem respaldo na

legislação atual.

149 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n° 70013942545. Quarta Câmara Cível. Rel. Des. Araken de Assis, Porto Alegre, 22 de março de 2006. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>.

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Para tanto, como já mencionado, a alternativa mais adequada parece ser a de

seguir os ordenamentos que estão mais avançados na questão da prevenção e proteção do

superendividamento, como a detalhada legislação francesa, no intuito de se consolidar o

Direito do Consumidor Endividado, tão necessário e urgente.

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